RESUMO: O artigo tem como objetivo analisar a possibilidade de cumulação dos Adicionais de insalubridade e Periculosidade. Assim, será realizada uma análise sobre os aspectos do meio ambiente do trabalho, segurança e medicina do trabalho, explanando também acerca das normas jurídicas que contribuem para o alcance da saúde do trabalhador. Será abordado sobre os dados gerais dos Adicionais de insalubridade e Periculosidade, bem como sua previsão frente à Constituição Federal e sua regulamentação na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Posteriormente, serão analisadas as características específicas de cada um dos referidos acréscimos salariais, abordando acerca da viabilidade de cumulação dos mesmos. Finalmente, essa pesquisa será corroborada por doutrinas e julgados que analisam a tese apresentada neste trabalho.
PALAVRAS-CHAVE: Adicionais; Cumulação; Insalubridade; Periculosidade; Trabalhador.
ABSTRACT: The present of this article analyzes the possibility of cumulation of the Unsafe Abilities and Hazards. Thus, an analysis will be carried out on the environmental aspects of work, safety and occupational medicine, also explaining the legal norms that contribute to the health of the worker. It will be approached on the general data of the Unsafe Abilities and Hazards, as well as its prediction in front of the Constitution of the federative Republic of Brazil and its regulation in the Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT). Subsequently, the specific characteristics of each of these salary increases will be analyzed, addressing the feasibility of cumulation. Finally, this research will be corroborated by doctrines and judgments that analyze the thesis presented in this paper.
KEY WORDS: Additional; Cumulation, Dangerousness; Unhealthy; Worker.
INTRODUÇÃO
O presente Artigo tem como objetivo analisar a possibilidade de cumulação simultânea dos Adicionais de Insalubridade e Periculosidade, demonstrando essa possibilidade através do ordenamento jurídico brasileiro, seja pela Constituição Federal de 1988, e pelas Convenções Internacionais da OIT ratificada pelo Brasil, bem como as demais normas infraconstitucionais.
A legislação infraconstitucional que regulamenta os institutos coíbe a cumulação dos adicionais, essa proibição está regulamentada no artigo 193 § 2º, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
O tema do presente estudo é de suma importância, pois se esse entendimento for pacificado pelos julgadores e doutrinadores, trará benefícios a um grande número de trabalhadores no país, além de estar relacionado à efetividade dos direitos fundamentais.
Assim, essa obra acadêmica visa o aprimoramento dos conhecimentos acerca da possibilidade de cumulação dos Adicionais de Insalubridade e Periculosidade para a população interessada. Para a elaboração deste artigo foram utilizados estudos bibliográficos em obras doutrinárias da área jurídica trabalhista, bem como análises de julgados relacionados ao tema.
Ademais, a elaboração do artigo científico está organizada em três capítulos quais sejam: No primeiro capítulo versou-se sobre o recinto do trabalho, apontando o conceito e as características gerais acerca dos temas, bem como os meios de precauções tomadas pelo empregador para evitar possíveis acidentes e doenças, apresentando também à importância da segurança e medicina do trabalho no ambiente de trabalho.
No segundo capítulo referiu-se sobre os Adicionais de Insalubridade e Periculosidade, iniciando com o Adicional de Insalubridade, sua definição e regulamentação, bem como desde quem são os beneficiados, quando é devido, suas características e base de cálculo. Posteriormente, retratou-se sobre o adicional de Periculosidade, novamente tratando de quem são seus beneficiados, quando é devido, as características e base de cálculo.
No terceiro capítulo aludiu-se acerca da possibilidade de cumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade, apresentando a importância da cumulação para os trabalhadores que laboram em locais perigosos e insalubres, apontando também que se possível à percepção simultânea dos adicionais obrigará o empregador melhorar as condições de higiene no ambiente de trabalho.
Finalizando o trabalho, abordaram-se as Considerações Finais, trazendo possíveis alternativas para a efetivação da Possibilidade de Cumulação dos referidos Adicionais.
2 RECINTO DO TRABALHO
O legislador constituinte no artigo 225 da Carta Magna assegurou a todos o direito do meio ambiente ecologicamente equilibrado. Com mesmo intuito, Mascaro Nascimento (2014, p. 882-883) conceitua o meio ambiente do trabalho nos seguintes termos: O meio ambiente do trabalho é, exatamente, o complexo máquina-trabalho de proteção individual, iluminação, conforto térmico, instalações elétricas, condições de salubridade ou insalubridade, de periculosidade ou não, meio de prevenção à fadiga, outras medidas de proteção ao trabalhador, jornadas de trabalho e horas, intervalos, descansos, férias, movimentação, armazenagem e manuseio de materiais que formam o conjunto de condições de trabalho, etc. A matéria é trabalhista porque o meio ambiente do trabalho é a relação entre o homem e o fato técnico, disciplinado não pela lei acidentária, que trata de nexos causais em situações consumadas, muito menos pela lei de defesa ambiental, que dispõe sobre direitos difusos e não trabalhistas, mas pela consolidação das Leis do trabalho.
Então, o ambiente de trabalho é o lugar onde o trabalhador passa determinado tempo na atividade laboral, assim, o ambiente deve tutelar a saúde e a segurança do obreiro. Assim, a prestação onde é laborado o serviço deve ser considerada adequada para o trabalho, e apresentar além de condições salubres, ausência de agentes que coloquem em risco a integridade psíquica e física do indivíduo.
O artigo 3º da lei nº 6.938/81 que trata da política nacional do meio ambiente conceitua meio ambiente da seguinte forma: Artigo 3º: “Meio Ambiente é o conjunto de condições, leis, influências e integrações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”. Nessa situação, o meio ambiente é o espaço que é essencial para a vida, considerando que deva ser um local seguro e salubre para a prestação laboral. Neste sentido, Barros (2009), assevera que as condições em que se realiza o trabalho não estão adaptadas à capacidade física e mental do empregado. Assim, a proteção ao trabalhador é recente, sendo prevista após a Constituição Federal de 1988, pois esses direitos foram elevados à categoria de direito fundamental, o inciso XXII, do artigo 7º da Constituição Federativa do Brasil assegura ao trabalhador, proteção contra os riscos à vida e à saúde. À vista disso, o empregador deverá adotar todas as medidas necessárias para oferecer um ambiente salubre para o empregado, evitando assim acidentes e doenças no ambiente de trabalho. (Nascimento ,2007) pontifica que “Dentre os direitos fundamentais do trabalhador está à proteção à vida e integridade física, que começa pela preservação do meio ambiente do trabalho”.
Portanto, a proteção do meio ambiente do trabalho visa assegurar um local adequado para a prestação da atividade laboral, assegurando assim sua efetivação através de normas jurídicas que visem proteção ao obreiro.
3 ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE E PERICULOSIDADE
O presente tópico tem como objetivo abordar e descrever os adicionais de insalubridade e periculosidade, analisando aspectos gerais e específicos sobre cada adicional.
O Adicional de Insalubridade é um direito que está assegurado Constitucionalmente, visando assim uma proteção para a classe trabalhadora. O trabalho insalubre é aquele que resulta em prejuízo constante na saúde do empregado.
Explana a quem é devido o adicional: O adicional de insalubridade é devido ao empregado que presta serviços em condições insalubres, acima dos limites de tolerância estabelecidos pelo Ministério do Trabalho e Emprego (Vicente, 2013 ). Assim, O adicional é devido para os empregados que trabalham com incidência de atividades ou operações insalubres, acima do limite permitido pelo órgão competente. Nesse seguimento, Vólia Bomfim (2013), descreve o Adicional de Insalubridade: O adicional de insalubridade é devido ao trabalhador que estiver exposto a situações nocivas à sua saúde, enquanto executar o serviço, e que as agressões podem ser causadas por agentes físicos, químicos ou biológicos, e para que compensar o trabalho realizado nestas condições, o empregador deve pagar ao empregado adicional legal integral, independentemente do tempo em que o empregado ficar exposto ao agente nocivo. Dessa maneira, o empregador é obrigado a pagar o obreiro pelas exposições aos agentes considerados nocivos à saúde no momento da execução do trabalho. Em relação ao adicional a sua previsão legal encontra-se no artigo 189 da CLT, nessa situação, o limite de tolerância mencionado no artigo anterior é definido pelo Ministério do Trabalho, que estabelecerá normas e critérios de caracterização da insalubridade, e os meios de proteção e o tempo máximo de exposição do empregado aos agentes considerados insalubres. Para caracterização da insalubridade é preciso: a) exposição a agentes nocivos à saúde do trabalhador; b) que essa exposição seja acima dos limites de tolerância fixados em razão da natureza e da intensidade do agente e do tempo de exposição, pois se a exposição estiver nos limites de tolerância, não há direito ao adicional (Martins, 2014). Logo, a atividade só será considerada insalubre quando os agentes prejudiciais estiverem acima do limite de tolerância fixada pelo Ministério do Trabalho. Insta salientar, que se o empregador fornecer aparelho de proteção ao trabalhador, o direito de recebimento do adicional não será mais obrigatório, porém caso o aparelho não seja adequado para a eliminação da insalubridade, o adicional será devido. Destarte, os aparelhos de proteção fornecidos pelo empregador deverão ser aptos para o uso, resguardando completamente o empregado de possíveis acidentes de trabalho.
Desse modo, se houver a verificação da Insalubridade gera o direito ao adicional, a eliminação ou neutralização faz com que o adicional não seja devido, como dispõe o artigo. 191 da CLT. Nessa situação, com a adoção de medidas tomadas pelo empregador para conservar o ambiente de trabalho, como a utilização de equipamentos apropriados, o direito ao recebimento cessará.
Como se sabe, é a Norma Regulamentadora nº 15 da Portaria 3.214/78 do Ministério do Trabalho que relata as atividades, operações e agentes insalubres constatados no ambiente de trabalho, descrevendo até mesmo seus limites de tolerância, discriminando assim, as diversas situações vivenciadas no trabalho que enseja a caracterização do agente insalubre. Portanto, as operações e os agentes insalubres estão elencados na NR 15, e o empregador deverá cumpri-la, atentando-se pela observância de todos os anexos constantes na norma.
Explica que a natureza jurídica do adicional de insalubridade não possui natureza indenizatória, mas sim salarial, pois visa remunerar o trabalho prestado sob tal condição, como forma de compensação ao empregado (Martins, 2015). À vista disso, o valor pago ao trabalhador é medido pelo grau de exposição do empregado ao agente nocivo, conforme o artigo 192 da CLT. Neste contexto, o adicional será pago de acordo com a exposição do trabalhador ao agente insalubre, tendo o direito de receber conforme o grau de exposição em que está submetido no ambiente de trabalho. E a base de cálculo do adicional de insalubridade será sobre o salário mínimo.
A respeito das condições insalubres e remuneratórias Barros (2007, p. 767) relata da seguinte maneira: O trabalho em condições insalubres, ainda que intermitente, envolve maior perigo a saúde do trabalhador e, por isso mesmo, ocasiona um aumento na remuneração do empregado. Em consequência, o trabalho nessas condições, acima dos limites de tolerância estabelecidos pelo Ministério do Trabalho, assegura ao empregado o direito ao recebimento de um adicional, de 10%, 20%, ou 40% sobre o salário mínimo, ou mínimo profissional, conforme se classifique a insalubridade, respectivamente, no grau mínimo, médio ou máximo, segundo apurado por perito, medico ou engenheiro do trabalho registrado no Ministério do Trabalho. Por isso, o trabalhador que labora em locais insalubres tem o direito de receber o adicional de acordo com sua exposição ao agente insalubre.
Expõe que a avaliação da caracterização é feito de forma quantitativa, no caso de ruídos, pressões, vibrações, poeiras, ou até mesmo de forma qualitativa, quando o agente está submetido ao frio, umidade, agentes biológicos, entre outros (Martins, 2014)
Insta salientar, que se faz necessário que o agente nocivo esteja previsto em norma regulamentadora emitida pelo Ministério Público do Trabalho e Emprego, especificamente na NR 15, neste caso, não sendo possível a comprovação da insalubridade somente por laudo pericial. Nesse mesmo sentido, assevera o inciso I da súmula 448 do TST: SÚMULA Nº 448. ATIVIDADE INSALUBRE. CARACTERIZAÇÃO. PREVISÃO NA NORMA REGULAMENTADORA Nº 15 DA PORTARIA DO MINISTÉRIO DO TRABALHO Nº 3.214/78. INSTALAÇÕES SANITÁRIAS. I - Não basta a constatação da insalubridade por meio de laudo pericial para que o empregado tenha direito ao respectivo adicional, sendo necessária a classificação da atividade insalubre na relação oficial elaborada pelo Ministério do Trabalho. (Res. 19/4/2014, DEJT 21 e 22 e 23.05.2014).
Destarte, o obreiro só terá direito ao recebimento do adicional se estiver especificado pela NR 15 do Ministério do Trabalho e Emprego, comprovado também mediante a perícia técnica. Por isso, para a comprovação da condição insalubre no ambiente de trabalho é obrigatória à realização da perícia técnica, caso isso não seja possível, como no caso do fechamento da empresa é plausível que o juiz se utilize de outros meios de provas.
Conforme dispõe a OJ 278 da SDS-1 do TST: ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. PERÍCIA. LOCAL DE TRABALHO DESATIVADO. A realização de perícia é obrigatória para a verificação de insalubridade. Quando não for possível sua realização, como em caso de fechamento da empresa, poderá o julgador utilizar-se de outros meios de prova. (DJ – 11.08-2003).
Neste caso, o magistrado poderá utilizar outras medidas para verificar se realmente o trabalhador laborava em local insalubre. É interessante ressaltar, ainda, que o artigo 472 do NCPC, dispõe que o julgador poderá dispensar à prova pericial caso as partes, na petição inicial e na contestação, apresentarem, sobre as questões de fato, pareceres técnicos ou documentos elucidativos que considerar suficientes para a comprovação da insalubridade no ambiente de trabalho. Nesse caso, a prova pericial não será necessária quando no início do processo as partes comunicarem que realmente o trabalhador laborava em local insalubre, assim não há necessidade para o juiz determinar a prova pericial. Portanto, para a caracterização do referido Adicional, exige-se dois critérios: Primeiro, que seja realizada perícia para a constatação da Insalubridade, e segundo, que a mesma esteja prevista no rol da NR 15 do Ministério do Trabalho e Emprego.
A Periculosidade está presente nas atividades que resultam em prejuízo iminente a saúde e na vida do trabalhador, podendo lhe causar um infortúnio súbito, capaz de perder a vida ou provocar lesões graves em qualquer instante.
A respeito do Adicional (Alexandrino, 2013) leciona que, “o Adicional de Periculosidade é o acréscimo devido ao trabalhador que presta serviços em condições perigosas”. Nesse caso, o Adicional de Periculosidade é um acréscimo salarial para aqueles que estão sujeitos a agentes considerados perigosos no momento da execução do serviço. (Martins, 2016) também define periculosidade da seguinte maneira, “na periculosidade é o risco, possibilidade de ocorrer o infortúnio”.
Diante disso, a qualquer momento o trabalhador poderá sofrer uma fatalidade no momento da execução do serviço. Dessa maneira, o adicional de periculosidade é devido para aqueles que laboram em atividades ou operações perigosas, como por exemplo elementos inflamáveis ou explosivos. As atividades consideradas perigosas são caracterizadas por perícia feita através de Engenheiro de Segurança e Medicina do Trabalho ou Médico do Trabalho, registrados no Ministério do Trabalho. Assim, a CLT em seu artigo 193 caput, incisos I e II, tipifica as atividades consideradas perigosas. Então, considera-se, portanto, atividades perigosas àquelas que possam levar a óbito, mutilação ou lesões graves ao trabalhador no momento em que se presta a atividade laboral.
E quem regulamenta esse instituto é a Norma Regulamentadora nº 16 da Portaria 3.214/78 do Ministério do Trabalho que descreve as atividades e operações perigosas, definindo assim as situações que ensejam a caracterização do exercício de periculosidade.
Portanto, as atividades perigosas estão elencadas na NR 16, e o empregador deverá cumpri-la, atentando–se pela observância de todos os anexos constantes na norma. (Martins, 2015) descrevem que a natureza jurídica do adicional de periculosidade tem natureza salarial, pois remunera o trabalhador em condições perigosas e não de indenização, pois o referido adicional não tem por objetivo indenizar nada, mas sim remunerar o trabalho em condições perigosas, na forma definida em lei. Assim, o valor assegurado ao empregado que exerce atividades perigosas é de 30% sobre o salário sem os acréscimos, conforme preceitua o artigo 193, § 1º da CLT. Nessa situação, o pagamento do adicional de periculosidade será apenas sobre o salário estabelecido pela lei, sendo 30% sobre o salário básico, não podendo ser acrescido de nenhuma retribuição pago pelo empregador.
Esse mesmo posicionamento se consolidou através da súmula 191 do TST ao falar da incidência do adicional de periculosidade: PERICULOSIDADE. ADICIONAL. INCIDÊNCIA. BASE DE CÁLCULO. ELETRICITÁRIO. CLT, ART. 193. O adicional de periculosidade incide apenas sobre o salário básico e não sobre este acrescido de outros adicionais. Em relação aos eletricitários, o cálculo do adicional de periculosidade deverá ser efetuado sobre a totalidade das parcelas de natureza salarial. (Res. 121/2003. DJU de 08.03.2017). Consequentemente, o empregador só pagará o adicional de periculosidade sobre o salário básico do empregado, não incidindo assim nas demais gratificações.
Contudo, pela súmula 191 do TST, em relação aos eletricistas, o cálculo do adicional de periculosidade deverá ser efetuado sobre a totalidade das parcelas de natureza salarial e não apenas sobre o salário básico como nos demais casos.
4 POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DOS ADICIONAIS
Superados e analisados as principais características dos adicionais de insalubridade e de periculosidade, adentra-se à centralidade do tema aqui proposto, qual seja, a possibilidade de cumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade.
Inicialmente é necessário falar de alguns princípios que corroboram com o mesmo entendimento do estudo apresentado, esses princípios não poderiam deixar de ser citados, pois são de suma importância para a proteção dos trabalhadores.
(Nascimento, 2011) faz a citação desses princípios da seguinte maneira: O princípio protetor, é subdividido em três outros princípios, in dubio pro operário, a prevalência da norma mais favorável ao trabalhador e a preservação da condição mais benéfica. O primeiro, o in dubio pro operário, é o princípio de interpretação do direito do trabalho, significando que, adiante de um texto jurídico que posso oferecer dúvidas a respeito do seu verdadeiro sentido e alcance, o intérprete deverá pender, entre as hipóteses interpretativas cabíveis, para a mais benéfica ao trabalhador. O segundo, a prevalência da norma mais favorável ao trabalhador, é o princípio de hierarquia para dar solução ao problema da aplicação de direito do trabalho no caso concreto quando duas normas dispuserem sobre o mesmo tipo de direito, caso em que prioritária será a que favorecer o trabalhador. O terceiro, a preservação da condição mais benéfica, tem a função de solucionar o problema da aplicação da norma no tempo para resguardar as vantagens que o trabalhador tem nos casos de transformações prejudiciais que poderiam afetá-lo, sendo, portanto, a aplicação, no direito do trabalho, do princípio do direito adquirido do direito comum. Destarte, percebe-se que esses princípios estão recheados de garantias que visam proteger o trabalhador, os mesmos corroboram com o entendimento de que é possível sim o recebimento cumulativo dos adicionais de insalubridade e periculosidade.
Ademais, a cumulação dos adicionais é possível porque visa à proteção da saúde e da vida dos trabalhadores, pois tal possibilidade está de acordo com os princípios trabalhistas que visam à proteção do trabalhador. Como visto, os princípios norteadores do direito trabalhista visam proteger a classe trabalhadora, e buscam um equilíbrio na relação de trabalho, cumprindo assim uma função importantíssima, pois os mesmos exigem o cumprimento das normas mais benéficas ao trabalhador, e nesse caso, a proibição contida em lei infraconstitucional não deve prevalecer. Nesse mesmo viés, a atual doutrina preceitua que a previsão contida no artigo 193, § 2º, da CLT não foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988, ao proibir a cumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade.
E o artigo que proíbe a cumulação está previsto no artigo 193, § 2º, da CLT, nesse sentido, observa – se que tal dispositivo não foi recepcionado pela Carta Magna de 1988, pois a mesma trouxe consigo garantias e direitos que não podem ser violados por lei infraconstitucional.
(Monteio de Barros, 2009) tem esse mesmo entendimento e expõe que se as condições de trabalho do empregado são duplamente gravosas, é cabível o pagamento dos dois adicionais, pois houve exposição a dois agentes insalubres diferentes, que podem ocasionar prejuízos a diversos órgãos do corpo humano. Por isto, a possibilidade de cumulação se justifica em virtude de os fatos geradores serem diversos, pois na insalubridade o bem tutelado é a saúde do trabalhador, já a periculosidade trata-se de uma situação de perigo iminente que, uma vez ocorrida, pode ceifar a vida do obreiro, sendo este o bem a que se visa proteger. (Melo, 2004) também diverge da proibição contida no artigo 193, § 2º, da CLT apontando que os riscos a que está exposto o trabalhador são múltiplos, não havendo razões para tal vedação, pois a exposição do trabalhador a mais de um agente agressivo reduz a sua resistência multiplicando os danos à saúde, o que, desde já, contraria as normas tuteladas constitucionalmente os princípios do direito do trabalho e da higiene ocupacional, destinados a prevenir acidentes e danos à saúde, na busca da redução dos riscos existentes no meio ambiente de trabalho. Então, o que se busca proteger é a vida e à saúde do trabalhador, e essa garantia está prevista em norma constitucional, visando assim uma proteção para a parte a hipossuficiente na relação de trabalho, que neste caso é o empregado.
Outro fator importante que sustenta a inaplicabilidade do artigo 193, § 2º, da CLT é a introdução das Convenções da Organização do Trabalho 148 e 155 no sistema jurídico interno. As convenções 148 e 155, da OIT ratificadas pelo Brasil são hierarquicamente superiores à legislação infraconstitucional, com status de norma materialmente constitucional. Desta forma, (Morais, 2016) leciona a importância da supralegalidade das convenções internacionais, dispondo que as normas previstas nos atos, tratados, convenções ou pactos internacionais devidamente aprovados pelo Poder Legislativo e promulgadas pelo Presidente da República, inclusive quando preveem normas sobre direitos fundamentais, ingressam ao ordenamento jurídico como atos normativos infraconstitucionais, salvo na hipótese do § 3º, do art. 5º, pelo qual a EC nº 45/04 estabeleceu que os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.
Portanto, vale consignar que as convenções internacionais da OIT são tratados especiais de direitos humanos e têm prevalência sob as normas domésticas, como é, indubitavelmente, o caso do artigo 193, parágrafo 2º, da CLT. Nesse mesmo fundamento, (Barbosa, 2015) descreve a natureza das convenções da OIT da seguinte forma: as convenções da OIT possuem natureza de Tratados internacionais multilaterais, estabelecendo normas obrigatórias àqueles Estados que as ratificaram, e elas podem ser de três modalidades: a) Autoaplicáveis, dispensando qualquer regulamentação; b) De princípios, estabelecendo apenas normas gerais a serem reguladas pelos Estados; c) Promocionais, fixando programas a serem disciplinados por normas nacionais a médio e longo prazo. Em vista disso, as convenções da OIT possuem normas obrigatórias podendo ser autoaplicáveis dispensando qualquer regulamentação, surtindo seus efeitos para o Estado Membro.
Por isso, a Constituição Federal Brasileira de 1988 ao inseri capítulos relativos aos direitos humanos, permitiu também que eles fossem ampliados por meio de tratados internacionais, que no caso de versar sobre direitos humanos, ao serem positivados, efetivam-se em direitos fundamentais, conforme previstos no artigo 5º, §2º e 3º da Constituição da República Federativa do Brasil. Assim, os direitos fundamentais devem prevalecer acima de qualquer norma infraconstitucional, pois os mesmo são recheados de garantias que visam tutelar a vida e a saúde do indivíduo.
A convenção nº 148 da OIT, ratificada pelo decreto nº. 93.413 -1986 apresenta recomendações a respeito da insalubridade de meio ambiente de trabalho e consagra a proteção dos trabalhadores contra os riscos profissionais devidos à contaminação do Ar, do Ruído e às Vibrações no local de trabalho. A referida convenção em seu artigo 8º anexo 3 (1977), aduz os critérios e limites de exposição da seguinte maneira: Os critérios e os limites de exposição deverão ser fixados, completados e revistos com regularidade, à luz dos conhecimentos e dos novos dados nacionais e internacionais, tendo em conta, na medida do possível, todos os aumentos dos riscos profissionais resultantes da exposição simultânea a vários fatores nocivos no local de trabalho. Pelo exposto, as medidas de prevenção e proteção ao trabalhador devem estar sempre em regularidade, buscando assegurar um local seguro que não venha prejudicar o trabalhador.
Já a convenção da OIT nº 155, ratificada pelo Brasil através do Decreto nº 1.254-1994, trata, essencialmente, a respeito de política nacional sobre segurança e saúde dos trabalhadores e determina que sejam levados em conta os riscos para a saúde decorrente da exposição a diversas substâncias ou agentes que possam afetar a vida do trabalhador. A referida convenção nº155, prevê em seu artigo 11, alínea “b”: A determinação das operações e processos que estarão proibidos, limitados ou sujeitos a autorização ou ao controle da autoridade ou autoridades competentes, bem como a determinação das substâncias e agente as quais a exposição no trabalho estará proibida limitada ou sujeita à autorização ou ao controle da autoridade ou das autoridades competentes; deverão levar-se em consideração os riscos para a saúde causados pela exposição simultânea a várias substâncias ou agentes. Isto posto, a referida convenção define que os trabalhos prestados em condições insalubres ou perigosos, necessariamente, não devem existir, mas caso existam, as mesmas se submetem ao controle da autoridade competente. Também, o artigo 21 da referida norma internacional preceitua que “as medidas de segurança e higiene do trabalho não deverão implicar nenhum ônus financeiro para o trabalhador”.
Diante disso, percebe-se que os dispositivos da convenção 155 não estão de acordo com a vedação contida no artigo 193 § 2º, da CLT, ao coibir a possibilidade de cumulações dos adicionais de insalubridade e periculosidade.
Como apontado por Silva (2011), as convenções internacionais em relação à saúde, a segurança e meio ambiente de trabalho possuem um espirito de proteção universal ao trabalhador, ratificando toda a conquista que se operou no mundo do trabalho desde o século XVIII. Destarte, a vedação contida no artigo 193, § 2º, da CLT encontra-se suplantada pelos princípios constitucionais, especialmente o princípio da dignidade da pessoa humana.
Inclusive, já está em tramitação na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 2.137/2015, que altera a redação contida no § 2º do artigo 193 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), para dispor sobre a possibilidade de pagamento simultâneo dos adicionais de Insalubridade e Periculosidade, apresentada pela deputada Erika Kokay (PT/DF). Assim, com a tramitação desse projeto de lei só ratifica que realmente é necessária a mudança do artigo 193 § 2º da CLT que veda a percepção simultânea dos adicionais. Desta forma, não há mais espaço para essa proibição, pois se o empregado está sujeito a condições insalubres no ambiente de trabalho, e tem majorada essa situação pela exposição à condições de perigo, exercida durante a atividade laboral, é inaceitável que se tenha que optar apenas por um dos adicionais.
Nesse mesmo viés, o TST negou provimento ao recurso interposto pela empresa Whirlpool S.A, contra decisão que a condenou ao pagamento cumulativo dos adicionais de insalubridade e periculosidade ao trabalhador exposto à radiação não ionizante e manipulação de produtos químicos e ruído, havendo, in casu, causas de pedir ou fatos geradores são distintos. Julgando da seguinte maneira: CUMULAÇÃO DOS ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE E DE PERICULOSIDADE DECORRENTES DE FATOS GERADORES DISTINTOS. POSSIBILIDADE.
O TRT manteve a condenação ao pagamento simultâneo do adicional de periculosidade e do adicional de insalubridade. Ao adotar os fundamentos da sentença, baseados na Convenção nº 155 da OIT, a Corte Regional entendeu que a vedação disposta no artigo 193, § 2º da CLT não deveria prevalecer na hipótese dos autos. Tem-se que a SBDI-1 do TST, (sessão do dia 28/4/2016, da SBDI-1, E-ARR-1081-60.2012.5.03.0064) ao analisar o mesmo tema, firmou entendimento quanto à impossibilidade de cumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade. Concluiu que, nessas situações, tão somente remanesce a opção do empregado pelo adicional que lhe for mais benéfico. Não obstante, ponderou que a vedação de cumulatividade do adicional de insalubridade com o adicional de periculosidade, disposta pelo artigo 193, § 2º da CLT, não se revela absoluta. Invocou a necessidade de uma interpretação teleológica e conforme a Constituição Federal, para concluir que mencionada vedação justifica-se apenas nas hipóteses em que os adicionais decorrem da mesma causa de pedir. Entende, assim, a SBDI-1 do TST que restando comprovada a existência de dois fatos geradores distintos, específicos para cada um dos adicionais, deve ser reconhecido o direito à sua percepção de forma cumulativa. (TST-RR-7092-95.2011.5.12.0030, Ministro Relator João Oreste Dalazen, Data de Julgamento: 28/04/16 data de Publicação: DEJT 17/06/2016).
Então, a corte do Tribunal Superior do Trabalho, baseada na decisão da SDI-1 do TST de abril de 2016, confirmou o entendimento e consentiu que os referidos adicionais fossem cumulados, entendendo se tratar de fatos geradores diversos, baseando sua decisão através das Convenções Internacionais ratificadas pelo Brasil.
Diante o exposto, defende-se que mesmo sendo a doutrina minoria que adota essa corrente da possibilidade de incidência de cumulação dos adicionais, essa expectativa traria grandes benefícios para a classe trabalhadora, e se tal entendimento for aplicado nos demais casos similares como no julgado supracitado, os empregadores preocupar-se-iam mais com melhores condições de trabalho, proporcionando assim um ambiente saudável e equilibrado, o que viria ao encontro de um dos fundamentos constitucionais mais importantes da República Federativa do Brasil que é a dignidade da pessoa humana.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente artigo teve como objetivo verificar a possibilidade de cumulação dos Adicionais de Insalubridade e Periculosidade. Com propósito de uma análise crítica acerca do tema aqui apresentado.
Tratou-se do ambiente de trabalho e segurança e medicina do trabalho, mostrando a importância de conservação do local em que é prestado o serviço pelo obreiro.
Foi apresentada também a necessidade de efetivação da proteção trazida pela norma constitucional, como sendo um dos meios de maior proteção para a classe trabalhadora durante sua jornada laboral.
Analisou-se a importância das Convenções Internacionais no âmbito jurídico nacional acerca da sua efetivação para a proteção dos trabalhadores, trazendo assim à inserção de medidas protetivas nas empresas em que o obreiro está submetido a agentes nocivos a saúde.
Posteriormente, analisou-se os adicionais de insalubridade e periculosidade, bem como seus conceitos e suas respectivas regulamentações no sistema jurídico brasileiro, enfatizando assim sua incidência e base de calculo, especificando quem tem o direito de recebê-los.
Enfim, tratou-se da possibilidade de cumulação dos referidos adicionais, analisando as possibilidades trazidas pelo sistema jurídico nacional e internacional, enfatizando quais seriam as benfeitorias trazidas no caso do amparo da possibilidade de cumulação dos adicionais referidos institutos.
Portanto, insta frisar que a tese apresentada ainda está em desenvolvimento, sendo adotada pela doutrina minoritária, devendo desta forma, o trabalhador buscar a tutela jurisdicional para comprovar que tem o direito de receber cumulativamente os referidos adicionais aos quais estava exposto no ambiente de trabalho.
Por todo o exposto, espera-se que esse trabalho sirva de guia para os profissionais do direito que atuam nesta área, visando efetivar os referidos direitos dos cidadãos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: petterson. Possibilidade de cumulação dos adicionais de insalubridade e periculosidade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 21 jun 2018, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/51938/possibilidade-de-cumulacao-dos-adicionais-de-insalubridade-e-periculosidade. Acesso em: 02 nov 2024.
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