FÁBIO BARBOSA CHAVES
(Orientador)[1]
RESUMO: O presente artigo aborda os desafios no rastreamento de criptomoedas para efetivação da penhora, dentro de uma abordagem qualitativa, por meio de método dedutivo e exploratório, afim de explicitar possíveis soluções para a advocacia processualista. Aborda-se acerca da viabilidade de se utilizar como penhora o que atualmente se denomina “criptomoedas”, considerando a disposições pertinentes inseridas na atual legislação processual civil. Para considerar tal possibilidade, são apresentadas as possíveis tratativas, sem desconsiderar cada tipo de armazenamento virtual, utilizando a criptomoeda Bitcoin. O material obtido e retratado neste trabalho decorre de coleta bibliográfica, além de destacar a inédita decisão proferida pelo Poder Judiciário, por meio da 36ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo. O direito comparado oferece importante fonte de pesquisa, e direciona a conduta e os possíveis marcos regulatórios. O rastreio das operações criptografadas por parte do credor compromete a suposta garantia de anonimato, apesar do difícil acesso, considerando a necessária expertise. A conduta do credor, e as consequências jurídicas impactam a processualística, no que pertine à garantia de pagamento.
PALAVRAS CHAVE: CRIPTOMOEDA. PENHORA. GARANTIA.
RESUMEN: El presente artículo aborda los desafíos en el rastreo de criptomoedas para la efectivización del embargo, dentro de un abordaje cualitativo, por medio de método deductivo y exploratorio, a fin de explicitar posibles soluciones para la abogacía procesualista. Se aborda la viabilidad de utilizar como embargo lo que actualmente se denomina "criptomoedas", considerando las disposiciones pertinentes insertadas en la actual legislación procesal civil. Para considerar tal posibilidad, se presentan las posibles trataTivas, sin desconsiderar cada tipo de almacenamiento virtual, utilizando la criptomoeda Bitcoin. El material obtenido y retratado en este trabajo proviene de colecta bibliográfica, además de destacar la inédita decisión dictada por el Poder Judicial, por medio de la 36ª Cámara de Derecho Privado del Tribunal de Justicia de São Paulo. El derecho comparado ofrece una importante fuente de investigación, y dirige la conducta y los posibles marcos regulatorios. El rastreo de las operaciones encriptadas por el acreedor compromete la supuesta garantía de anonimato, a pesar del difícil acceso, considerando la necesaria experiencia. La conducta del acreedor, y las consecuencias jurídicas afectan a la procesualística, en lo que pertenecía a la garantía de pago.
PALABRAS CLAVE: CRIPTOMOEDA. ADJUNTO. GARANTÍA.
SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO. 2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA E A TEORIA MONETÁRIA. 3. A CRIPTOMOEDA. 4. A PENHORA NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. 5. EXIGIBILIDADE E EXECUTORIEDADE DA CRIPTOMOEDA. 6. DECISÕES E SOLUÇÕES INTERNACIONAIS VOLTADAS A PENHORA DE CRIPTOMOEDAS. 7. CONSIDERAÇÕES FINAIS. 8. REFERÊNCIAS.
Busca-se demonstrar, por meio do presente artigo, a possibilidade de rastreamento e a posterior penhora de moedas virtuais pertencentes a executados em face do novo Código de Processo Civil, e a margem conferida ao magistrado para determinar as medidas necessárias ao cumprimento de ordem judicial, objetivando, as soluções processuais para cada tipo de armazenamento.
O artigo está organizado em quatro tópicos. Na primeira, denominada evolução histórica e a teoria monetária, discute-se o nascimento da moeda e o seu poder, não só como moeda de troca, mas como poder de reserva de valor.
A segunda, intitulada como criptomoeda, aborda-se a sua criação, o seu objetivo e como tem influenciado o mercado.
No terceiro tópico, discute-se o novo código de Processo Civil, que visa garantir maior celeridade e efetividade aos processos de execução.
Concluindo, na quarta seção, a exigibilidade e executoriedade da moeda virtual, a partir dos precedentes jurisprudenciais posicionados à favor da possibilidade de penhora da criptomoeda, com a atualização do bancen-jud 2.0 e sua ampliação a instituições financeiras, bem como as soluções utilizadas pelos países que conseguiram penhorar e satisfazer seus créditos. Com isso, busca-se estabelecer um paralelo de soluções que levem o credor a satisfação do seu crédito.
Pesquisas arqueólogicas apontam que as moedas surgiram há cerca de 2.500 a.C no reino da Lídia (atualmente a Turquia), e outras pesquisas atribuem à China o surgimento das primeiras moedas. Mas somente por volta de 630 a.C, foi materializada e grafada por meio da cunhagem, técnica de gravação de imagens com relevos, o que é usado hodiernamente.
Com o fim do Império Romano, mudou-se a forma de comercialização de mercadorias, que passou a ser operacionalizado por meio de trocas, perdendo a moeda o seu espaço para o escambo.
Com a evolução social, buscava-se uma forma mais equânime e rápida nas trocas, surgindo a moeda como elemento intermediador de trocas, e com o intuito de reserva de valor.
A primeira moeda criada no período da Idade Média foi denominada Dénario. Com a evolução das moedas métalicas e a prática de acúmulo de capital, nasceram os primeiros bancos, que tinham como função primordial, a de guarda do patrimônio dos proprietários de terras e de chefes de Estado, resultando, nos sistemas bancários, a criação do papel moeda para o financiamento do Ouro.
Mais tarde, com o criação do modelo constitucional e o reforço ao poder central do Estado, nasceram os bancos centrais, que passaram a criar e regular toda a economia sob sua jurisdição.
No Brasil, em dezembro de 1964, foi criado o banco central do brasil, autoridade monetária central responsável por toda política monetária nacional.
Nesse ínterim, Fernando Ulrich (2014) aborda as duas teorias clássicas que embasam a criação do dinheiro e a manutenção do seu valor no mercado, classificadas por Ludwig Von Mises a partir da dicotomia cataláctica e acataláctica.
Dentro da teoria monetária acataláctica, a teoria estatal da moeda, de Georg Friedrich Knapp, explicita que o valor da moeda é derivado de um decreto governamental, seu poder de compra e valor depende de autoridade estatal, ou seja, para essa teoria, uma moeda virtual criada por outros organismos que não o Estado, não deveria persistir.
A teoria cataláctica, por outro lado, explica os fenômenos monetários por meio das leis de troca de mercado, onde a oferta e a demanda são os maiores responsáveis pela criação e valoração do dinheiro.Karl Marx, em seu livro O capital - o processo de produção do capital (1867), aprofundou e apontou algumas diretrizes que aplicam-se perfeitamente às demandas contemporâneas, demonstrando que no próprio curso natural do dinheiro, há uma separação de seu seu valor real do valor nominal bem como, sua existência real e metálica, podendo a moeda tornar todas as formas físicas e ainda assim manter seu valor econômico. Para Marx, com o surgimento da moeda e o seu poder de reserva de valor, o indivíduo passou a ter cobiça, em face da valoração do dinheiro, e busca pela riqueza.
O entesouramento cumpre diferentes funções na economia da circulação metálica. A função mais imediata deriva das condições de circulação das moedas de ouro e de prata. Vimos que a quantidade de dinheiro em circulação sofre altas e baixas em razão das oscilações constantes que a circulação das mercadorias apresenta quanto à sua extensão, seus preços e sua velocidade. Portanto, ela tem de ser capaz de contração e expansão (MARX, 2015, p. 276)
Reservando ao entesourador o conceito de um capitalista, que procura atingir um aumento incessante de capital, mantendo o seu dinheiro fora de circulação social.
O Bitcoin, a primeira criptomoeda, foi criada em 2008, por Satoshi Nakamoto, com o auxílio de programadores de softwares, tendo como base um sistema chamado blockchain¹. Nas palavras do economista Fernando Ulrich, o bitcoin é uma forma de dinheiro, assim como as moedas oficiais de qualquer país ou bloco econômico, com a diferença de ser puramente digital e não ser emitido por nenhum governo (ULRICH, 2014, p.5).
O ingresso no mercado de moedas virtuais se dá por meio da intermediação nas agências denominada de exchanges² ou por meio da tecnologia peer-to-peer[2], possibilitando ao usuário a compra e o armazenamento das criptomoedas. Esse sistema registra todas as operações realizadas com a moeda virtual por meio de duas chaves, sendo uma privada, que é mantida em segredo com os dados do usuário, e outra pública, onde é facilmente identificável o usuário e suas operações.
A grande vantagem da moeda virtual, nas palavras do economista Fernando Ulrich, é que esta dispensa um mediador, um “terceiro” na transação. Não é necessário confiar em um banco que guardará seu dinheiro, tampouco precisa assegurar-se de que uma empresa de liquidação de pagamentos processará corretamente o seu pedido, acima de tudo, você não precisa torcer para que um banco central não deprecie a moeda. Para um melhor entendimento da operação, Ulrich exemplifica da seguinte forma:
Quando a Maria decide transferir bitcoins ao João, ela cria uma mensagem, chamada de “transação”, que contém a chave pública do João, assinando com sua chave privada. Olhando a chave pública da Maria, qualquer um pode verificar que a transação foi de fato assinada com sua chave privada, sendo, assim, uma troca autêntica, e que João é o novo proprietário dos fundos. A transação – e portanto uma transferência de propriedade dos bitcoins – é registrada, carimbada com data e hora e exposta em um “bloco” do blockchain. A criptografia de chave pública garante que todos os computadores na rede tenham um registro constantemente atualizado e verificado de todas as transações dentro da rede Bitcoin, o que impede o gasto duplo e qualquer tipo de fraude. (ULRICH, 2014, p.19-20.)
Quem adquire criptomoedas tem três possibilidades de comportamento: o armazenamento na agência comercializadora de moedas, o armazenamento frio e/ou offline ou se tornar um minerador autônomo e comercializar suas criptomoedas de forma independente.
É notável a influência desse novo mercado de operações monetárias criptografadas no Brasil, que ultrapassou a noção de moeda virtual para adquirir bens de uso comum, para tomar proporções de acúmulo de capital. Segundo alguns sites especializados, como o bitcoin news, portal do bitcoin e o guia do bitcoin, enquanto o bitcoin se estabiliza, outras moedas vêm crescendo, prevendo a FOXBIT, a maior corretora do Brasil, um aumento de 50 bilhões de reais em transações em 2018, devido ao crescimento de outras moedas como a Litecoin, Ethereum, Monero e Naga Coin.
A atual bitcoin fragmentou-se em outras duas moedas, gerando o bitcoin Cash e o Bitcoin Gold. Pesquisadores do Imperial College, de Londres, realizam uma pesquisa e concluíram que a moeda virtual substituirá a moeda tradicional dos governos dentro de dez anos.
Nas palavras de Alexandre Freitas Câmara (2017), a execução representa uma atividade processual, destinada a transformar um ato certificador de um Direito em uma realidade prática, satisfazendo seu titular.
Define-a, pois, como uma atividade destinada a fazer com que se produza, na prática, o mesmo resultado prático, ou um equivalente seu, do que se produziria se o direito tivesse sido voluntariamente realizado pelo sujeito passivo da relação jurídica obrigacional. Ressalta ainda que “Este ponto precisa ser reforçado: a execução de que se trata no Direito Processual Civil é, sempre, forçada (2017, pg. 277)”.
No atual código de Processo Civil, o referido instituto encontra-se disciplinado tanto nos artigos 513 a 538, quando se tratar de título executivo judicial, sendo definido como cumprimento de sentença, quanto nos artigos 771 a 782, para regulamentar o processo de execução de títulos executivos extrajudiciais, sendo nomeado de cumprimento de sentença. (BRASIL, 2015)
Nos artigos 783 a 785, estão disciplinadas as disposições gerais para a realização de qualquer execução, partindo da premissa de que são requisitos essenciais para a realização de qualquer penhora, o título executivo a exigibilidade da obrigação. (BRASIL, 2015)
Para que se possa invadir um determinado patrimônio, em observância ao princípio constitucional do devido processo legal, tal título deve ser legítimo e a agressão ser a menos onerosa possível, conforme aponta o art. 805 do instrumento processual em análise.
Alexandre Câmara define o título judicial como sendo “o ato jurídico capaz de legitimar a prática dos atos de agressão a serem praticados sobre os bens que integram um dado patrimônio, de forma a tornar viável sua utilização na satisfação de um crédito (2017, pg. 283)”, ou seja, o título constitui um instrumento na via processual para efetivar o direito material postulado, passando então a ser exigível quando, voluntariamente, não é adimplido.
Sob o mesmo ponto de vista do autor, no que tange as partes legítimas a requerer medidas executórias, além das partes da relação processual originária, o Ministério Público é igualmente um legítimo ativo para requerer a execução, como nos casos de Ação Civil Pública, por exemplo.
No caso de morte do exequente, podem requerer a execução do seu crédito, o seu espólio, seus herdeiros ou sucessores, se aplicando, de igual modo ao devedor, podendo ser estendida nesse caso, a execução aos fiadores, o responsável ou titular do bem em discussão, no caso de sucessão processual.
Outrossim, destaca o autor, que com a relação formada entre credor e devedor, inicia-se o processo para a liquidação e cumprimento da sentença, que deve observar as regras de competência contida no Artigo 516 do NCPC/15º.
No caso de competência originária dos Tribunais, esses executarão suas decisões. Em sede de processo de conhecimento, será competente o juízo do qual emanou a decisão exequenda. Nos casos de decisão estrangeira homologada pelo Superior Tribunal Justiça, compete a Justiça Federal tal execução e na decisão de arbitragem, deve-se estabelecer sua competência conforme o objeto da relação processual, nos moldes dos artigos 42 a 53 do referido código.
Por fim, é imperioso ressaltar que nos casos de procedimento comum e de juízo cível competente, poderá o exequente optar pelo juízo do atual domicílio do devedor, do local onde os bens se encontram ou o local onde deverá ser realizada a obrigação. Em relação à execução de títulos executivos extrajudiciais, a competência será as regras gerais dos artigos 42 a 53 do Código de Processo Civil.
Ainda nas palavras de Câmara, desenvolve-se a atividade executiva através de dois grupos de meios executivos: os meios de coerção e os meios de sub-rogação. Os meios de coerção são para constranger o devedor ao pagamento da obrigação exequenda, utilizando para tal, a título de exemplo, a prisão civil no caso do devedor de alimentos, multas periódicas em razão da mora, protesto do título executivo ou inscrição do devedor em cadastro de inadimplentes, ou ainda, no caso de bens imóveis, fazer averbação em cartório, na escritura do bem a fim de que não se proceda à alienação fraudulenta do bem, tolerando a acumulação desses meios, até o limite da satisfação do bem.
Já nos meios de sub-rogação, o Juiz age de ofício, substituindo o devedor, para garantir a resolução da demanda executiva. Nesse caso, são utilizadas as medidas de busca e apreensão dos bens do executado ou a expropriação e leilão desses.
Consoante ao entendimento acima e não menos importante, cumpre salientar, que todos os bens do devedor, sejam presentes ou futuros, devem responder pelo cumprimento da dívida exequenda, entretanto, existem bens que não podem ser objeto de penhora, os quais a lei atribui imunidade quanto ao processo executivo.
São absolutamente impenhoráveis os bens elencados no artigo 883, e relativamente impenhoráveis os bens contidos no artigo 884, ambos do novo Código de Processo Civil. Nos termos da Lei no 8.009/1990, é impenhorável o imóvel destinado a garantir a residência do executado ou de sua família.
Diante do exposto, em relação ao Código de Processo Civil de 1973, Câmara (2017) aponta inovações substanciais, dentre elas, uma mudança na hermenêutica processual, que passou a ser interpretada sob uma ótica constitucional, a prevalência da solução consensual dos conflitos, o dever do contraditório, ainda que em matérias em que o Juiz deva decidir de ofício, o tipo de processo, que passou a ser sincrético e mais célere e a imposição do dever das partes de procederem com boa-fé e lealdade processual.
Mais especificamente ao processo de execução, impôs ao credor o encargo de requerer e promover a execução do seu crédito e permitiu ao Juiz, diante da atipicidade do caso, permitir outros tipos de execução de bem que entenda ser de valor, bem como de autorizar qualquer medida necessária para a obtenção do bem em pretensão.
Dentro desse contexto, é possível inferir que a rastreabilidade e penhora das moedas virtuais são possíveis em face do novo código de Processo Civil, ante ao desenvolvimento social e atenção as demandas contemporâneas.
Diante disso, quais os mecanismos processuais que estão a disposição do credor para o devido cumprimento? Como efetivar os precedentes judiciais no processo de penhora e execução das criptomoedas?
A 36ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, na pessoa do relator do caso, o Desembargador Milton Paulo de Carvalho Filho, em dezembro de 2017, proferiu a primeira decisão do Brasil sobre o pedido de penhora da moeda virtual Bitcoin, no julgamento do Agravo de Instrumento nº 2202157-35.2017.8.26.0000 - Voto nº 19863, conforme ementa:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. Execução de título extrajudicial. Penhora de moeda virtual (bitcoin). Indeferimento. Pedido genérico. Ausência de indícios de que os executados sejam titulares de bens dessa natureza. Decisão mantida. Recurso desprovido. TJ-SP 22021573520178260000, SP 2202157-35.2017.8.26.0000, Relator: Milton Carvalho, Data do Julgamento: 21/11/2017, 36ª Câmara de Direito Privado, Data da Publicação: 21/11/2017)
Com esse julgado, o relator seguiu uma análise hermenêutica conforme os usos e os costumes para garantir a justa aplicação da norma, evidenciando o princípio da sociabilidade. Acabou por fixar algumas diretrizes fundamentais para a penhora, quais sejam, a de que não há óbice para a penhora de uma moeda virtual e que ao credor, compete a comprovação da existência desses bens de renda variável para que se possa exigi-la. Ou seja, o cumprimento da penhora só é possível ao credor que consiga ou saiba como comprovar a aquisição de moedas virtuais por parte do devedor e essencialmente a forma de armazenamento dessas moedas virtuais.
Ratificando esse entendimento, a Juíza do Tribunal de Justiça de São Paulo, Renata Souto Maior Baião, palestrante sobre “Blockchain” e Direito Digital, produziu um artigo em que aborda a exigibilidade e liquidez da penhora das criptomoedas, apresentando algumas soluções aos credores para o recebimento do seu crédito, demonstrando como exemplo a apreensão das moedas, o bloqueio da conta virtual na agência para posterior conversão em moeda local ou a criação de uma carteira privada virtual para cada processo que tramitar no Tribunal, para a guarda das criptomoedas.
Outra inovação importante que permite a execução das moedas virtuais em aplicações financeiras, é a atualização do sistema Bacen-Jud 2.0, que em 2018 passou a alcançar tanto os investimentos em renda fixa quanto os de renda variáveis, ampliando o rol de instituições financeiras abarcadas pelo sistema. Tal incremento entrou em vigor por meio dos comunicados do Banco Central do Brasil de n. 31.293 e 31.506 de 2017 e possibilitou ao credor, não só o rastreamento da moeda virtual perante a instituição e o conhecimento de onde partiu a compra dessas moedas, quanto o bloqueio direito pelo Poder Judiciário, evitando assim, uma dilapidação de patrimônio em uma execução forçada.
As criptomoedas tem como desafio a volatibilidade, pois sua alteração ocorre de forma dinâmica e imprevisível. O valor flutuante faz com que muitos observadores permaneçam descrentes quanto ao futuro das criptomoeda. Outro não menos importante desafio, é a violação do sigilo dos “blockchain”, que nas palavras de Ulring
As carteiras de Bitcoin agora podem ser protegidas por criptografia, mas os usuários devem selecionar a ativação da criptografia. Se um usuário não cifra a sua carteira, os bitcoins podem ser roubados por malware. (ULRING, 2014, p.26)
Sendo assim, uma vez hackeados, o usuário perde a criptomoeda, sem chance de recuperação.
Os Estados Unidos, pioneiro nas apreensões de Bitcoins por exemplo, das várias apreensões feitas, tanto online quanto offline, optou por leiloar as unidades da moeda, que em 2016 já passavam de 2.700 bitcoins acumulados e leiloados. A Bulgária, por outro lado, apreendeu ao equivalente a US$ 3 bilhões em maio de 2017 e busca o desbloqueio da carteira para converter a moeda virtual em moeda local, para sanar sua dívida Pública. A Finlândia, que confiscou em 2016, US$ 22,8 milhões em Bitcoins, até que se encontre uma melhor solução ao caso, optou por armazená-las em modo offline para evitar hackeamentos e roubos. Com os exemplos dos governos, é de se captar que há várias soluções para a satisfação do crédito, devendo cada uma ser aplicada de forma in casu ou o que melhor desejar o credor.
Diante de todo o contexto exposto, no curso de um processo de execução, quando o credor toma conhecimento de que o seu devedor adquiriu moedas virtuais, poderá ele, de início, postular a quebra do sigilo bancário do devedor para que se obtenha a agência, uma vez que todo o processo de compra é feito de forma identificada por fotos e documentos do comprador.
Se o credor tem conhecimento de que as moedas estão armazenadas em alguma “exchange” determinada ou determinável, pode requerer, nesse caso, que a agência ou o credor apresente a chave privada para o acesso da carteira ou a chave pública, respectivamente, com as informações das transações realizadas pelo devedor, em conformidade com o princípio hodierno processual da não surpresa. Pode ainda, postular o bloqueio da conta do devedor e a transferência para a carteira virtual do credor ou para um armazenamento frio/offline de posse do credor.
Tal medida deve ser tomada de forma razoável e proporcional, de forma a evitar um excesso de execução e violações a ordem Constitucional, devendo ser penhorado e transferido o valor atualizado do débito, o que ultrapassar disso, deve ser restituído de imediato ao devedor.
No entanto, se o armazenamento dessas moedas estiver de forma “offline” ou em algum tipo de armazenamento offline, incube ao credor requerer a entrega do dispositivo em atenção ao aludido princípio da não surpresa. Entretanto, sendo uma execução forçada, cabe ao credor especificar tal medida de busca e apreensão e o local do bem de armazenamento, que pode ser em casa, no trabalho ou lugar habitual diverso, graças ao novo código de Processo Civil, que concedeu ao juiz a liberalidade de determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária.
Para as alegações de possibilidade de perdimento de valores das criptomoedas ou ainda, a desvalorização da moeda virtual no mercado de ações, poderá o credor, para que haja a apuração do que está penhorado, requerer a expropriação imediata de bens perecíveis, pois é o que sugere Alexandre Câmara (2017), como forma de aplicação analógica.
É possível inferir que apesar de a criptomoeda ser sigilosa e de difícil acesso, não é sinônimo de anonimato absoluto, como é difundido socialmente.
No atual sistema Constitucional-Processual, a penhora das moedas virtuais, ainda que não reguladas pelo banco Central do Brasil, não é impeditivo para a sua penhora e satisfação da dívida exequenda, graças ao novo Código de Processo Civil, que proporcionou ao credor a liberalidade de escolha em como buscar o seu crédito, bem como ao juiz, a discricionariedade de se exigir tudo o que resultar em valor e que possa liquidar a dívida no decorrer da execução, e a Jurisprudência, nesse sentido, vem indicando ser possível a exigibilidade desse tipo de moeda virtual, ressaltando apenas, que o pedido não pode ser genérico, por ser de difícil rastreamento.
Outra ferramenta importante que contribui para a satisfação do crédito é a do sistema de penhora on-line Bacen-Jud 2.0, propiciando uma maior concretude e rapidez no atendimento das ordens judiciais, apoiando o credor e o Judiciário no alcance dessas rendas aplicadas de forma fixa ou variáveis.
As criptomoedas e a tecnologia do Blockhain são formas de armazenamentos de dados e bens que estão cada vez mais presentes na vida em sociedade e que por óbvio, em um curto espaço de tempo, fará parte da vida das pessoas no dia a dia. O estudo, por exemplo, da responsabilidade civil e criminal dos hackers que roubam as moedas e os dados, da regulamentação pelos governos dessas operações bancárias que não passam pelos bancos credenciados e do recolhimento do imposto de renda advindo dos lucros dessas moedas virtuais, contribuem significativamente para que haja uma maior segurança, no meio virtual, aos seus usuários.
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[1] Doutor em Direito Privado pela PUC MINAS. Mestre em Direito e Relações Internacionais pela PUC GOIÁS. Especialista em Direito Processual pela UNAMA. MBA em Gestão Pública pela UNITINS. Professor Universitário. E-mail: [email protected]
¹ Tipo de Base de Dados Distribuída que guarda um registro de transações permanente e à prova de violação;
² Corretoras que comercializam criptomoedas;
³Ponto a ponto; É a transação feita de forma direta em pessoas.
Acadêmica de Direito da Faculdade Serra do Carmo.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTOS, Kelly Cristina Martins. A penhora de criptomoedas: os desafios no rastreamento e penhora da moeda virtual para a efetivação da execução em face do novo Código de Processo Civil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 30 out 2018, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/52356/a-penhora-de-criptomoedas-os-desafios-no-rastreamento-e-penhora-da-moeda-virtual-para-a-efetivacao-da-execucao-em-face-do-novo-codigo-de-processo-civil. Acesso em: 31 out 2024.
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Por: mariana oliveira do espirito santo tavares
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