RESUMO: Este artigo pretende analisar os assassinatos dos defensores de direitos humanos Bruno da Cunha Araújo Pereira e Dominic Mark Phillips à luz do relatório de país publicado no ano de 2021 pela Comissão Interamericana de Direitos humanos que concluiu, entre outros temas, pelo reconhecimento de grave preocupação com a segurança dos defensores e ativistas em direitos humanos no Brasil.
Palavras-chave: Comissão interamericana, Relatório de país 2021. Violência a defensores direitos humanos.
ABSTRACT: This article intends to analyze the murders of human rights defenders Bruno da Cunha Araújo Pereira and Dominic Mark Phillips in the light of the country report published in 2021 by the Inter-American Commission on Human Rights which concluded, among other topics, by the recognition of serious concern with the security of human rights defenders and activists in Brazil.
Keywords: Inter-American Commission, Country Report 2021. Violence against human rights defenders.
1.Introdução
O presente artigo pretende analisar as recomendações contidas no relatório de país publicado no ano de 2021 com os fatos ocorridos no dia 05 de junho do ano de 2022, na reserva indígena do Vale do Javari, local em que Bruno da Cunha de Araújo Pereira, indigenista e servidor da Funai (Fundação Nacional do Índio) e Dom Phillips, Jornalista e ativista em direitos ambientais, foram assassinados.
Nesse sentido, será feita uma análise dos principais argumentos e das recomendações formuladas ao Estado, descortinando, desta maneira, as diversas implicações acerca do tema.
Por outro lado, buscará abordar os principais fundamentos jurídicos sobre o caso no plano nacional e internacional com destaque para as informações contidas no relatório produzido pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos, notadamente, no que tange ao capítulo em que se discutiu a ocorrência de mortes violentas de pessoas ativistas e defensoras de direitos humanos, objetivando racionalizar o debate.
2.Relatórios da Comissão Interamericana de Direitos Humanos
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), na condição de órgão autônomo, é responsável pela promoção e proteção dos direitos humanos no continente americano. Em sua estrutura, a Comissão é composta por 7 membros, incumbidos do desempenho das funções da Comissão em caráter pessoal e independente.
Assim, a Comissão, em conjunto com a Corte Interamericana de Direitos Humanos, compõe o Sistema Interamericano de Direitos Humanos.
Dentre os relevantes trabalhos realizados pela CIDH, tem-se a possibilidade de confecção de relatórios relativos a denúncias de direitos humanos, bem como relatórios especiais e anuais.
A competência da Comissão para formalização de relatórios e recomendações tem previsão expressa na Convenção Americana de Direitos Humanos:
Artigo 41. A Comissão tem a função principal de promover a observância e a defesa dos direitos humanos e, no exercício do seu mandato, tem as seguintes funções e atribuições:
(...)
b. formular recomendações aos governos dos Estados membros, quando o considerar conveniente, no sentido de que adotem medidas progressivas em prol dos direitos humanos no âmbito de suas leis internas e seus preceitos constitucionais, bem como disposições apropriadas para promover o devido respeito a esses direitos;
c. preparar os estudos ou relatórios que considerar convenientes para o desempenho de suas funções;
Destarte, “Os relatórios sobre temas gerais consistem, em estudos da Comissão sobre a observância dos Direitos Humanos em vários Estados do sistema, concluindo igualmente com a apresentação de recomendações.” (Paulo, 2000, p. 81).
2.1 Relatório de País 2021 da Comissão Interamericana de Direitos Humanos sobre mortes violentas de pessoas ativistas e defensoras de direitos humanos
Ocorre que, a CIDH, após a realização de visita in loco, nos dias 5 a 12 de novembro de 2018, publicou relatório sobre Brasil, abordando no capítulo 4, a recorrência dos assassinatos de pessoas ativistas e defensoras de direitos humanos, aduzindo que apesar da existência de dados que comprovem a ocorrência sistemática de violação aos direitos humanos de ativistas e defensores de direitos humanos, o Estado segue o hostil apresentado casos de violência e mortes.
Desse modo, o relatório mencionou grande preocupação com situação histórica de violação dos direitos de ativistas no Estado:
Nos últimos anos, observou- se com grande consternação que ativistas e defensoras e defensores de direitos humanos têm frequentemente sido vítimas de crimes de homicídio ou outras formas de violência e admoestação cometidas por indivíduos privados, bem como por agentes estatais agindo à margem de suas atribuições.
(...)
Por sua vez, em junho de 2018, a CIDH condenou os assassinatos de defensores e defensoras de direitos humanos, especialmente em casos envolvendo a defesa do meio ambiente, dos direitos dos trabalhadores rurais, e do direito à terra em meio rural. Durante a visita, a CIDH pode comprovar, por informação recebida, sobre o aumento desses casos. De acordo com relatório publicado em 2017 pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), durante aquele ano foram registrados 71 homicídios de ativistas ou defensoras e defensores de direitos no campo, o que representou um aumento significativo em relação às 61 mortes dessa mesma natureza em 2016, assim como aos 50 casos de 2015 (Inter-American Commission on Human Rights., 2021, pp. 110-111).
Por este motivo, a CIDH ressaltou que o Brasil vem chamando atenção no cenário internacional em razão da crescente violência impingida aos ativistas e defensores de direitos humanos, acrescentando ainda, que esses ataques não só revelam omissão do Estado em garantir os direitos fundamentais dessas pessoas, como também retratam violação a própria democracia, em razão do papel importante desenvolvido por esses agentes.
2.2 Análise do relatório de país 2021 com os assassinatos de Dominic Mark Phillips e Bruno da Cunha de Araújo Pereira.
No Brasil, os assassinatos de Dom Phillips e Bruno Pereira, descortinam um profundo debate acerca da grave omissão estatal na defesa de agentes fundamentais à proteção dos direitos humanos.
Posto que, ambos desempenharam papéis de profunda importância na proteção de direitos ambientais, dentre eles, a realização de diversas expedições para a Amazônia, onde contribuíram com reportagens sobre desmatamento e crimes, ao passo que Bruno ensinava aos indígenas a monitorar as próprias terras com auxílio da tecnologia (BBC, 2022).
Por outro lado, torna-se importante mencionar que o Estado brasileiro, foi duramente criticado pela impressa ante a postura ineficaz e morosa em atuar na solução do caso, conforme relatado no site da BBC:
O governo brasileiro também foi criticado por não agir rapidamente nas buscas. No dia seguinte ao desaparecimento, o Comando Militar da Amazônia, do Exército brasileiro, emitiu nota afirmando que estava "em condições de cumprir missão humanitária de busca", mas que a ação só seria tomada "mediante acionamento por parte do Escalão Superior" (BBC, 2022).
Nessa toada, menciona-se que o exercício das funções desempenhadas pelos ativistas e comunicadores sociais, “oferecem um meio para que grupos desfavorecidos ou minoritários possam reivindicar mudanças.” (Inter-American Commission on Human Rights., 2021, p. 451)
Por conseguinte, a violação dos direitos dessas pessoas consubstancia violação a própria liberdade de pensamento e expressão prevista na Convenção Americana de Direitos Humanos:
Artigo 13. Liberdade de pensamento e de expressão
1. Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse direito compreende a liberdade de buscar, receber e difundir informações e idéias de toda natureza, sem consideração de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro processo de sua escolha.
3. Não se pode restringir o direito de expressão por vias ou meios indiretos, tais como o abuso de controles oficiais ou particulares de papel de imprensa, de frequências radioelétricas ou de equipamentos e aparelhos usados na difusão de informação, nem por quaisquer outros meios destinados a obstar a comunicação e a circulação de ideias e opiniões.
De modo que, o compromisso com a integridade dessas pessoas constitui dever positivo do Estado, que tem o dever de garantir a vida e exercício de suas atividades profissionais e políticas, desprovidas do temor da violência ocasionada pelo exercício do seu múnus coletivo, cuja angústia pode ser compreendida nas palavras do ativista ambiental Chico Mendes ao enunciar alguns dias antes do seu assassinato: “Se descesse um enviado dos céus e me garantisse que minha morte iria fortalecer nossa luta, até que valeria a pena. Mas a experiência nos ensina o contrário. Então eu quero viver. Ato público e enterro numeroso não salvarão a Amazônia" (Mendes filho, 1988).
3.Considerações Finais.
O alcance prático das funções desempenhadas pelos ativistas em direitos humanos e comunicadores sociais denotam profunda importância no contexto de uma sociedade dita democrática, posto que permitem a organização e defesa dos interesses de minorias ameaçadas e silenciadas pelo poder político e econômico.
Por essa razão, a omissão estatal na proteção dos ativistas em direitos humanos e comunicadores sociais tornam-se traços reveladores de um duplo fracasso no País: pela terceirização da atividade que deveria ser empenhada de maneira eficaz pelo próprio Estado na consecução dos direitos humanos e pelo risco de morte e violência aos que expressamente se consagram a luta pertencente a uma coletividade.
À vista disso, esta obra permite uma reflexão crítica acerca da ineficiente atuação do Brasil em promover políticas públicas de segurança cidadã aos que exercem um papel coletivo.
Referências
1 ed. Sage Publications, Inc, 2008. Organização dos Estados Americanos, Convenção Americana de Direitos Humanos (“Pacto de San José de Costa Rica”),. (1969).
BBC. (22 de Junho de 2022). Caso Dom Phillips e Bruno Pereira: investigação segue e PF devolverá corpos às famílias. Acesso em 24 de junho de 2022, disponível em https://www.bbc.com/portuguese/brasil-61711783
Inter-American Commission on Human Rights. (2021). Situação dos direitos humanos no Brasil : Aprovado pela Comissão. OEA, Brasil. Fonte: https://www.oas.org/pt/cidh/relatorios/pdfs/Brasil2021-pt.pdf
Mendes filho, F. A. (1988). (M. Edilson, Entrevistador) Jornal do Brasil.
Paulo, A. C. (2000). A EXECUÇÃO DAS RECOMENDAÇÕES DA COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS E EXECUÇÃO DAS SENTENÇAS DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Workshop. A Proteção Internacional dos Direitos Humanos e o Brasil: Superior Tribunal de Justiça, 81-86.
graduanda do curso de Direito pela Faculdade Pio Décimo.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ALMEIDA, RAYNAN PAULO APARECIDO SILVA DE. Caso Dominic Mark Phillips e Bruno da Cunha Araújo Pereira à luz do relatório de país publicado no ano de 2021 pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 30 jun 2022, 04:03. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/58784/caso-dominic-mark-phillips-e-bruno-da-cunha-arajo-pereira-luz-do-relatrio-de-pas-publicado-no-ano-de-2021-pela-comisso-interamericana-de-direitos-humanos. Acesso em: 25 dez 2024.
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