RESUMO: O presente artigo analisa os pressupostos estabelecidos pelo Supremo Tribunal Federal, no Recurso Extraordinário 657.718, para a excepcional concessão judicial de medicamento sem o registro sanitário, na hipótese de desarrazoada mora da ANVISA. Além disso, analisa os requisitos que a Suprema Corte brasileira listou como necessários para a concessão de medicamentos sem registro na ANVISA mas com a sua importação autorizada pela agência reguladora, nos autos do Recurso Extraordinário 1165959.
PALAVRAS-CHAVE: medicamento; registro; importação.
ABSTRACT: This article analyzes the assumptions established by the Federal Supreme Court, in Extraordinary Appeal 657,718, for the exceptional judicial granting of medication without the sanitary registration, in the event of unreasonable delay by ANVISA. In addition, it analyzes the requirements that the Brazilian Supreme Court listed for the granting of medicines without registration with ANVISA but with their importation authorized by the regulatory agency, in the records of Extraordinary Appeal 1165959.
KEYWORDS: medicine; record; import.
INTRODUÇÃO
São cada vez mais comuns as ações judiciais que têm por objeto o pleito de concessão judicial de medicamentos que não possuem registro na ANVISA. Com efeito, diante da elevada gama de patologias e de procedimentos terapêuticos existentes, acaba por ser praticamente inevitável a existência de um hiato entre o pedido de registro da substância medicamentosa junto à agência reguladora e a efetiva conclusão do trâmite administrativo.
Neste contexto, a consequência imediata deste estado de coisas é a insegurança dos pacientes, sobretudo daqueles economicamente hipossuficientes, que veem o Poder Judiciário como a via mais segura e célere para a efetivação do direito à saúde que a Constituição Federal lhes confere (artigos 6º e 196, CRFB/88).
Deste modo, diante de tal cenário de relativa insegurança da população, agravado pelo advento da pandemia, busca-se, no presente trabalho, avaliar os seguintes aspectos: Quais os critérios estabelecidos pelo Supremo Tribunal Federal para a concessão judicial de medicamento sem o registro sanitário, na hipótese de desarrazoada mora da ANVISA? Quais os requisitos que a Suprema Corte brasileira estabeleceu para a concessão de fármacos sem registro na ANVISA mas com a sua importação autorizada pela agência reguladora?
A relevância do tema decorre da própria natureza do direito à saúde, que é revestido de de fundamentalidade e é um pressuposto lógico do direito à vida, também previsto na Constituição Federal, no seu artigo 5º, caput.
Este artigo está prganizado em dois capítulos, quais sejam:
i) o primeiro capítulo analisa a decisão do Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário 657.718, visando listar e compreender os pressupostos estabelecidos pela Corte para a concessão judicial dos medicamentos sem registro na ANVISA;
ii) o segundo capítulo tem por finalidade verificar os requisitos mencionados pela Suprema Corte, nos autos do Recurso Extraordinário 1165959, como necessários para a concessão de fármacos sem registro na ANVISA mas com a sua importação autorizada pela referida agência reguladora.
1 DOS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO JUDICIAL DE MEDICAMENTOS SEM REGISTRO NA ANVISA
A Lei nº 6.360/1976, dentre outras providências, dispõe sobre a vigilância sanitária a que ficam sujeitos os medicamentos, as drogas, os insumos farmacêuticos e correlatos, cosméticos, saneantes, etc.
Em 28 de dezembro de 2016, tal lei foi alterada pela Lei nº 13.411/2016. Neste sentido, o seu artigo 12, §3º, passou a prever expressamente que o registro de medicamentos será concedido no prazo máximo de 90 dias, a contar da data do protocolo do requerimento, salvo nos casos de inobservância, por parte do requerente, à própria lei ou a seus regulamentos.
Como se vê, a legislação brasileira estabelece que a ANVISA terá um prazo máximo de 90 dias para processar e finalizar o pleito de registro de medicamento no ordenamento jurídico pátrio.
Todavia, não são poucos os casos em que o limite temporal legal para registro não é cumprido no procedimento registral.
Independentemente das razões que levam à inobservância do prazo para a finalização do trâmite administrativo para o registro do medicamento, uma vez que não é esta a finalidade deste trabalho, o fato é que a mora desarrazoada da ANVISA inevitavelmente traz prejuízos aos pacientes que dependem dos medicamentos para os seus respectivos tratamentos.
Este cenário acarreta severo impacto nas vidas das pessoas, que necessitam das substâncias medicamentosas mas não as encontram disponíveis na lista estabelecida pelo Sistema Único de Saúde – SUS.
Por conseguinte, a via judicial acaba por ser a alternativa mais segura e relativamente célere para o suprimento da mora administrativa.
São incontáveis as ações judiciais que têm por objeto a concessão judicial de medicamentos sem registro na ANVISA, o que, por evidente, sobrecarrega ainda mais o Poder Judiciário, já deveras assoberbado por processos desta natureza.
Via de regra, as demandas relacionadas à saúde acabam por chegar aos tribunais superiores.
A título de exemplo, de acordo com o site Jota Info, o primeiro grande julgamento da Suprema Corte brasileira envolvendo a temática do direito à saúde concluiu pela obrigatoriedade de a União fornecer tratamento médico para uma pessoa que necessitava de um medicamento denominado Zavesca (miglustato), cujo custo mensal passava de R$ 50.000,00.
No referido julgado, o Ministro Gilmar Mendes ressaltou o seguinte:
“Após ouvir os depoimentos prestados pelos representantes dos diversos setores envolvidos, ficou constatada a necessidade de se redimensionar a questão da judicialização do direito à saúde no Brasil. Isso porque, na maioria dos casos, a intervenção judicial não ocorre em razão de uma omissão absoluta em matéria de políticas públicas voltadas à proteção do direito à saúde, mas tendo em vista uma necessária determinação judicial para o cumprimento de políticas já estabelecidas”
Nesta ambiência, o Supremo Tribunal Federal, nos autos do Recurso Extraordinário 657.718, apreciando o tema 500 de repercussão geral, decidiu o seguinte a respeito desta temática:
Ementa: Direito Constitucional. Recurso Extraordinário com Repercussão Geral. Medicamentos não registrados na Anvisa. Impossibilidade de dispensação por decisão judicial, salvo mora irrazoável na apreciação do pedido de registro. 1. Como regra geral, o Estado não pode ser obrigado a fornecer medicamentos não registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) por decisão judicial. O registro na Anvisa constitui proteção à saúde pública, atestando a eficácia, segurança e qualidade dos fármacos comercializados no país, além de garantir o devido controle de preços. 2. No caso de medicamentos experimentais, i.e., sem comprovação científica de eficácia e segurança, e ainda em fase de pesquisas e testes, não há nenhuma hipótese em que o Poder Judiciário possa obrigar o Estado a fornecê-los. Isso, é claro, não interfere com a dispensação desses fármacos no âmbito de programas de testes clínicos, acesso expandido ou de uso compassivo, sempre nos termos da regulamentação aplicável. 3. No caso de medicamentos com eficácia e segurança comprovadas e testes concluídos, mas ainda sem registro na ANVISA, o seu fornecimento por decisão judicial assume caráter absolutamente excepcional e somente poderá ocorrer em uma hipótese: a de mora irrazoável da Anvisa em apreciar o pedido (prazo superior ao previsto na Lei nº 13.411/2016). Ainda nesse caso, porém, será preciso que haja prova do preenchimento cumulativo de três requisitos. São eles: (i) a existência de pedido de registro do medicamento no Brasil (salvo no caso de medicamentos órfãos para doenças raras e ultrarraras); (ii) a existência de registro do medicamento pleiteado em renomadas agências de regulação no exterior (e.g., EUA, União Europeia e Japão); e (iii) a inexistência de substituto terapêutico registrado na ANVISA. Ademais, tendo em vista que o pressuposto básico da obrigação estatal é a mora da agência, as ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na ANVISA deverão necessariamente ser propostas em face da União. 4. Provimento parcial do recurso extraordinário, apenas para a afirmação, em repercussão geral, da seguinte tese: “1. O Estado não pode ser obrigado a fornecer medicamentos experimentais. 2. A ausência de registro na ANVISA impede, como regra geral, o fornecimento de medicamento por decisão judicial. 3. É possível, excepcionalmente, a concessão judicial de medicamento sem registro sanitário, em caso de mora irrazoável da ANVISA em apreciar o pedido de registro (prazo superior ao previsto na Lei nº 13.411/2016), quando preenchidos três requisitos: (i) a existência de pedido de registro do medicamento no Brasil (salvo no caso de medicamentos órfãos para doenças raras e ultrarraras); (ii) a existência de registro do medicamento em renomadas agências de regulação no exterior; e (iii) a inexistência de substituto terapêutico com registro no Brasil. 4. As ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na Anvisa deverão necessariamente ser propostas em face da União”.
(RE 657718, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 22/05/2019, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-267 DIVULG 06-11-2020 PUBLIC 09-11-2020).
Conforme depreende-se da decisão, a Corte estabeleceu que, em regra, é vedada a concessão judicial de medicamentos não registrados na ANVISA, uma vez que o registro na referida agência reguladora é um fundamental instrumento de proteção e defesa da saúde pública, servindo como atestado de qualidade e de segurança das substâncias medicamentosas a serem comercializadas no Brasil.
O registro serve, ainda, como um importante mecanismo de controle de preços dos fármacos, o que evita abusos no mercado destes produtos.
É possível inferir, também, que o STF veda, em caráter absoluto, que o Poder Judiciário estabeleça a obrigatoriedade de o Estado brasileiro fornecer medicamentos experimentais, dada a inexistência de certeza ou consenso científico quanto à qualidade, à eficácia e à segurança dos fármacos.
Por outro lado, o tribunal estabeleceu que a ausência de registro na ANVISA, em regra, serve como impeditivo para a concessão judicial medicamentos com a segurança e qualidade atestadas.
Com efeito, a obrigatoriedade de o Estado fornecer tai substâncias é revestida de excepcionalidade, atendidos os seguintes pressupostos, a saber:
i) que haja mora irrazoável da ANVISA para o devido registro do medicamento, configurada na hipótese de desrespeito ao prazo estabelecido pela Lei nº 13.411/2016;
ii) a efetiva existência de pedido de registro do fármaco no Brasil (excetuadas as hipóteses de medicamentos órfãos para doenças raras e ultrarraras);
iii) que exista registro do medicamento em renomadas agências reguladoras no exterior;
iv) e a inexistência de substituto terapêutico com registro no Brasil.
Na decisão, a Corte prestigia a segurança jurídica, haja vista que respeita o quanto estabelecido pelo legislador como prazo razoável para que a ANVISA proceda à análise e conclusão dos pleitos de registro de medicamentos.
Este prazo legal funciona, em realidade, como um razoável lapso temporal para que a agência proceda à devida análise do registro dos fármacos, atendendo a todos os complexos requisitos científicos que atestam a segurança e a eficácia das substâncias.
Por outro lado, o STF prestigia o direito fundamental à saúde do cidadão que necessita de tratamento médico.
Nesta senda, a Corte exige, para fins de concessão judicial do medicamento pelo Estado, que haja uma situação de clara mora irrazoável da ANVISA, aliada à evidenciação da segurança e qualidade dos fármacos, atestada pelo registro em renomadas agências reguladoras do exterior.
Já o requisito de inexistência de substituto terapêutico do Brasil evita que haja preferências desarrazoadas entre medicamentos que produzirão, ao fim e ao cabo, os mesmos resultados no tratamento da patologia do paciente, garantindo a segurança orçamentária.
Por fim, o STF ainda decidiu a respeito da legitimidade para figurar no polo passivo das eventuais demandas que possuam como objeto o pleito de concessão judicial de medicamentos sem registro na ANVISA.
No bojo da referida decisão, o tribunal estabeleceu que é da União a legitimidade passiva em tais ações, devendo a parte autora obrigatoriamente ajuizar a demanda em face deste ente, em que pese a natureza solidária entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios para a garantia do direito à saúde ao cidadão, como decorrência lógica do disposto no artigo 23, II, da Constituição Federal.
2 DOS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO JUDICIAL DE MEDICAMENTOS SEM REGISTRO NA ANVISA MAS COM IMPORTAÇÃO AUTORIZADA PELA AGÊNCIA
Em momento posterior, no julgamento do Recurso Extraordinário 1165959, a Suprema Corte brasileira definiu os requisitos para a fixação da obrigação do Estado para a concessão de fármacos sem registro na ANVISA mas com a importação devidamente autorizada pela agência de regulação.
Nos autos supramencionados, a Corte, em tema 1.161 da sistemática da repercussão geral, fixou a seguinte tese:
"Cabe ao Estado fornecer, em termos excepcionais, medicamento que, embora não possua registro na ANVISA, tem a sua importação autorizada pela agência de vigilância sanitária, desde que comprovada a incapacidade econômica do paciente, a imprescindibilidade clínica do tratamento, e a impossibilidade de substituição por outro similar constante das listas oficiais de dispensação de medicamentos e os protocolos de intervenção terapêutica do SUS.”
Adverte-se que a ementa do referido julgado, até o momento da elaboração deste trabalho, ainda não foi publicada.
Cumpre esclarecer que tal entendimento firmado no julgamento do Recurso Extraordinário 1165959 decorreu de processo de autoria do Estado de São Paulo, que chegou ao STF após o Tribunal de Justiça do mesmo Estado confirmar decisão da primeira instância e determinar que o ente fornecesse medicamento à base da substância canabidiol para um paciente que sofre de encefalopatia crônica.
Depreende-se que a Corte levou em consideração a importante circunstância da hipossuficiência econômica do paciente, que funciona como um instrumento limitador do acesso do cidadão ao serviço de saúde, inviabilizando a efetivação de um direito fundamental.
A ausência deste pressuposto de cunho socioeconômico permite a presunção de que o paciente não necessita do Estado para a concessão do medicamento pleiteado, detendo a possibilidade de buscar a aquisição do fármaco pelas vias legais próprias, inclusive por intermédio da operadora do plano de saúde, a depender do caso concreto.
Já o requisito da imprescindibilidade clínica decorre da lógica avaliação da efetiva necessidade do tratamento com a substância medicamentosa pleiteada.
Neste sentido, a própria decisão corrobora a compreensão do caráter excepcional da obrigatoriedade de o Estado brasileiro fornecer medicamentos que, embora não tenham o devido registro na ANVISA, já têm a importação autorizada pela agência.
Outrossim, o STF estabeleceu como um dos requisitos a impossibilidade de substituição por outro fármaco similar já constante das listas oficiais de dispensação de medicamentos pelo SUS.
Com efeito, assim como ocorreu no julgamento do Recurso Extraordinário 657.718, evitou-se, por meio de tal pressuposto, a indevida escolha, pelos pacientes, por medicamentos que não constam de lista de fármacos fornecidos pelo SUS em detrimento daqueles que já fazem parte do rol disponibilizado pelo Estado.
Mostra-se, neste aspecto, que a decisão prestigia a segurança jurídica e compreende a limitação dos recursos orçamentários.
Por outro lado, ao contrário do que firmou no julgamento do Recurso Extraordinário 1165959 já analisado neste trabalho, a Suprema Corte não estabeleceu expressamente a obrigatoriedade de a União figurar no polo passivo de tais ações.
Por tal razão, infere-se que não é obrigatório que a demanda seja ajuizada em face de tal ente, já que a situação fática não evidencia mora irrazoável da ANVISA, elemento caracterizador do dever de a União ser legitimada passiva necessária em demandas com o este objeto.
Outrossim, ainda na discussão a respeito da tese definida, o relator do recurso, o então Ministro Marco Aurélio, e o Ministro Alexandre de Moraes, ressaltaram que a importação do canabidiol é autorizada pela ANVISA e que a Resolução RDC 17/2015 estabelece procedimentos visando à autorização a empresas para a fabricação e importação da substância.
Por fim, importa mencionar recente decisão do Superior Tribunal de Justiça que guarda relação com esta temática.
A Corte Cidadã, por intermédio da sua Sexta Turma, concedeu salvo-conduto para pacientes cultivarem cannabis com fim medicinal.
Por unanimidade, a turma, em julgamento de habeas corpus preventivo, autorizou três pessoas a cultivarem cannabis sativa com a finalidade de extrair óleo medicinal para uso próprio, sem perigo de repressão estatal.
Neste sentido, os três pacientes já utilizam canabidiol e têm autorização da ANVISA para importar a substância. Contudo, eles afirmaram ter dificuldade para continuar o tratamento, em razão do alto custo do procedimento importador do fármaco.
De acordo com os Ministros que compõem a Sexta Turma do STJ, a conduta não é penalmente típica, uma vez que não está imbuída do dolo de preparar substâncias entorpecentes com as plantas cultivadas (nem para consumo pessoal nem para entrega a terceiros), além de não vulnerar os bens jurídicos tutelados pela Lei nº 11.343/20006, de modo que não há adequação típica aos delitos previstos nos artigos 28, § 1º; e 33, §1º, II, da referida Lei, ou mesmo ao tipo penal previsto no artigo 334-A do Código Penal (contrabando).
É importante notar que o fio condutor entre o julgamento do STF e o do STJ é formado pela hipossuficiência econômica dos pacientes e pela autorização concedida pela ANVISA para a importação da substância.
3 CONCLUSÃO
O direito fundamental à saúde é ostensivamente consagrado pela Constituição Federal de 1988.
Neste passo, o artigo 196 da Carta Magna reveste a saúde de caráter fundamental, estabelecendo-a como direito de todos e dever estatal, devendo ser garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos, sendo regido pelo princípio do acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.
Tal dispositivo constitucional prevê a saúde sob a ótica individual e também coletiva, sendo um pressuposto lógico da compreensão do direito a uma vida digna, nos termos do artigo 5º, caput, da Constituição Federal.
Não se trata, pois, de uma mera previsão programática do texto da Lei Maior. Em realidade, as normas que versam sobre o direito à saúde são dotadas de aplicabilidade imediata, conforme disposição expressa no artigo 5º, § 1º, da Constituição Federal.
Demais disso, o direito fundamental à saúde pode ser compreendido como um objeto de um vínculo obrigacional entre o Estado e o cidadão, que deve gozar em plenitude de tal direito, sem limitações decorrentes de escassez financeira ou qualquer outro impeditivo.
Para tanto, constatada a inércia estatal para a efetivação deste direito, seja por mora para proceder ao registro de medicamentos, seja pela inobservância da possibilidade de concessão de medicamentos não registrados na ANVISA mas com autorização permitida pela agência, cumpre ao Poder Judiciário garantir ao cidadão a concretude no gozo de tal direito.
Por esta razão, acertadamente o Supremo Tribunal Federal pacificou a possibilidade de concessão judicial de medicamentos sem registro na ANVISA e, além disso, garantiu a possibilidade de concessão de medicamentos sem registro na ANVISA mas com a sua importação autorizada pela referida agência reguladora.
Com efeito, a mais alta Corte do País honrou o seu histórico progressista, que a caracteriza como intolerante às omissões inconstitucionais do Estado na efetivação de direitos fundamentais.
São incontáveis os casos em que o STF reconhece a obrigatoriedade de o Estado dar concreção ao direito à saúde dos cidadãos, e os recursos estudados no presente artigo são exemplos desta postura proativa da Corte.
Por outro lado, ao mesmo tempo que confere efetividade ao direito à saúde, nos referidos Recursos Extraordinários, o tribunal garante segurança jurídica e razoabilidade a esta temática, estabelecendo requisitos bem definidos para a concessão judicial de medicamentos pleiteados, sob pena de desconfigurar o arcabouço orçamentário brasileiro.
Conclui-se, pois, que o Supremo Tribunal Federal, a nosso sentir, andou acertadamente, tendo prestigiado o seu papel de Corte Constitucional, avaliando os cenários do âmbito do direito à saúde e estabelecendo os pressupostos para a concessão de fármacos nos termos pleiteados nas demandas, com sistemática de repercussão geral.
REFERÊNCIAS
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Graduado em Direito pela Universidade do Estado da Bahia-UNEB;
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Haeckel Rodrigo Bulcão da. Concessão judicial de medicamentos sem registro na Anvisa: uma análise de decisões do Supremo Tribunal Federal em recursos extraordinários Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 05 jul 2022, 04:07. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/58819/concesso-judicial-de-medicamentos-sem-registro-na-anvisa-uma-anlise-de-decises-do-supremo-tribunal-federal-em-recursos-extraordinrios. Acesso em: 23 dez 2024.
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