RESUMO: O presente trabalho visa analisar, inicialmente, os impactos da reforma da previdência ocorrida em novembro de 2019 em relação às alíquotas dos servidores públicos, mais especificamente dos servidores públicos estaduais e municipais, levando em consideração a sua vinculação com as alíquotas dos servidores públicos federais. Busca-se com isso uma compatibilidade entre a exigência do texto constitucional e uma hipotética ausência de legislação por parte dos entes federados, para tal, foi feita uma análise entre a hierarquia entre as normas jurídicas presentes no ordenamento pátrio, passando pelos do direito constitucional, administrativo, tributário e previdenciário.
PALAVRAS-CHAVES: Alíquota previdenciária. Reforma da Previdência. Legalidade.
ABSTRACT: The present work aims to initially analyze the impacts of the social security reform that took place in November 2019 in relation to the rates of public servants, more specifically of state and municipal public servants, taking into account their link with the rates of federal public servants. With that, a compatibility between the requirement of the constitutional text and a hypothetical absence of legislation by the federal entities is sought, for this, an analysis was made between the hierarchy between the legal norms present in the national order, passing through those of constitutional law, administrative, tax and social security.
KEYWORDS: Pension rate. Social Security Reform. Legality.
SUMÁRIO: 1. Introdução; 2. Alíquota da contribuição previdenciária: conceito, requisitos e limitações; Considerações finais; Referências.
1. INTRODUÇÃO
Inicialmente iremos tratar da contribuição previdenciária enquanto tributo, passando pelos princípios e regras que regem tal exação até chegarmos no elemento que compõe sua matriz objeto do presente trabalho que é a alíquota.
Em seguida vamos analisar a regra constitucional que, em certo ponto, vincula as alíquotas previdenciárias da União com os demais entes federativos, abordando sua (in)constitucionalidade, bem como apresentar interpretações compatíveis com o texto constitucional de 1988, uma que ao proceder tal vinculação, o constituinte reformador, a pretexto de uniformizar o tratamento sobre o assunto, pode ter retirado parcela de autônima dos demais entes. introdução é a parte inicial, onde se expõe os argumentos e os objetivos do trabalho, a apresentação do problema investigado, a revisão de literatura, o material e método utilizado, bem como os antecedentes que justificam a pesquisa, abordando as hipóteses formuladas, a delimitação do assunto e os objetivos propostos.
2. ALÍQUOTA DA CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA: CONCEITO, REQUISITOS E LIMITAÇÕES
Antes de adentrarmos ao assunto principal do presente trabalho, devemos fazer uma análise sobre o pano de fundo do referido tema, que são os tributos.
Conforme conceito trazido pelo art. 3º do Código Tributário Nacional, tributo é toda prestação pecuniária, paga em moeda ou valor que nela se possa exprimir, que não constitua sanção por ato ilícito e cobrada por atividade administrativa plenamente vinculada.
Nesse ponto, verifica-se que alíquota é fator determinante a fim de se descobrir o valor do tributo, uma vez que se trata do percentual que será aplicado à base cálculo.
Assim, nota-se que a cobrança de tributo é a mais pura manifestação do poder de império do Estado, ao obrigar o cidadão, seja por uma ação do Estado ou ação do próprio contribuinte, a reverter recursos para os cofres públicos a fim de sejam materializados em serviços públicos.
Contudo, em que pese ser uma manifestação do poder de império do Estado, este não é ilimitado (e nem poderia, sob o risco de tornar-se arbítrio), devendo obedecer a certos ditames trazidos, pela Constituição, entre eles, o mais basilar de todos, que é o princípio da Legalidade.
Pelo princípio da Legalidade tributária, previsto no Art. 150, I, da CF/88, é vedado aos entes federativos cobrar ou aumentar tributos sem lei que o estabeleça, sendo a regra da criação de tributos, uma das raras em que não se admite exceção. Sendo assim, verifica-se que, como o aumento de alíquota significa aumentar o tributo, esta deve ser feita, em regra, por meio de lei.
Até o supracitado parágrafo, não qualquer dúvida quando à sua aplicação às contribuições previdenciárias, haja vista que são tributos e não há, no texto constitucional, dispensa do uso de Lei para o seu aumento.
Contudo, quando o princípio acima citado é analisado em conjunto com a regra prevista no art. 9º, § 4º da Emenda Constitucional 103 de 12 novembro de 2019, verifica-se uma possível inconsistência entre as duas normas, conforme se verifica da redação a seguir exposta:
Art. 9º Até que entre em vigor lei complementar que discipline o § 22 do art. 40 da Constituição Federal, aplicam-se aos regimes próprios de previdência social o disposto na Lei nº 9.717, de 27 de novembro de 1998, e o disposto neste artigo.
(...)
§ 4º Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não poderão estabelecer alíquota inferior à da contribuição dos servidores da União, exceto se demonstrado que o respectivo regime próprio de previdência social não possui deficit atuarial a ser equacionado, hipótese em que a alíquota não poderá ser inferior às alíquotas aplicáveis ao Regime Geral de Previdência Social.
(...)
Logo, como por expressa disposição constitucional os demais entes distintos da União, ficam vinculados à alíquota estabelecida pelo ente nacional, tornando-os verdadeiros reféns do ente federal, tendo o constituinte derivado retirado parcela da autonomia dos entes, principalmente em relação a capacidade de auto-organização, uma vez que esta, enquanto a prerrogativa de editar Constituições Estaduais, Leis Orgânicas e demais leis para regarem o respectivos entes, é afetada, na medida em que lhes é retirado o poder de definir o percentual da alíquota que melhor se adequa a realidade de cada ente político.
Ademais, cumpre ressaltar que, conjugando os artigos, 24, XII e 30, I da Constituição da República, bem como pela capacidade de autoadministração inerente a todos os entes federativos, os estados e municípios detêm competência para legislarem sobre previdência social, cabendo a União, como ente central da federação, editar norma geral, mas sem invadir o espaço que os demais entes possuem para tratar suas respectivas peculiaridades.
Outro ponto de destaque, e que é o questionamento principal do presente trabalho, é se aumento da alíquota dos estados e municípios pode ser aplicado de forma automática toda vez que houver elevação do percentual federal, ou se tal providência demandaria a edição de ato legislativo por partes dos entes infranacionais,
Para isso, parte-se do seguinte raciocínio: Uma vez existente norma constitucional que impõe aos estados e municípios alíquotas, em regra, não inferiores à da União, e este edita lei aumentando sua alíquota, a referida lei teria aptidão de alterar as alíquotas estaduais e municipais?
Analisando o referido questionamento, pode-se concluir de forma negativa, haja vista que caso assim aceito, estaríamos diante de verdadeira invasão de competência dos demais, ainda mais se pensarmos que entre Leis federais, estaduais e municipais, não há hierarquia, e sim predominância de interesses, logo, inviável imaginarmos uma lei federal revogando lei estadual quando se tratar de competência concorrente, outrossim, ainda nos casos em que os estados legislam de forma plena em razão da inercia do ente federal, legislação posterior do ente nacional não tem o condão de revogar, mas apenas de suspender no que lhe é contraria a legislação federal.
Contudo, um outro questionamento necessita ser feito, este, inclusive, baseado em um fato acontecido após a entrada em vigor da EC nº 103/2019: em que pese uma lei federal não ter o condão de alterar a legislação estadual e municipal, teria uma emenda à constituição competência para tal?
Antes de respondermos à referida pergunta, devemos lembrar que uma emenda constitucional é fruto do poder constituinte originário, e, desde que obedecidas os limites formais, circunstanciais e matérias (explícitos e implícitos), tem o condão de retirar do mundo jurídico, através do instituto da não recepção, leis com ela incompatíveis.
Outro ponto de destaque é fato de que a Constituição não exigiu forma legislativa específica para alteração das alíquotas previdenciárias, bem com o as emendas constitucionais compõem o rol de espécies oriundas processo legislativo previsto no art. 59 da CF/88, aliado ao que foi dito anteriormente, temos que a EC 103/2019, trouxe a seguinte disposição em seu art. 11:
Art. 11. Até que entre em vigor lei que altere a alíquota da contribuição previdenciária de que tratam os arts. 4º, 5º e 6º da Lei nº 10.887, de 18 de junho de 2004, esta será de 14 (quatorze por cento).
Ora, se a referida norma traz disposição no sentido que os entes estaduais e municipais não podem ter alíquotas inferiores ao ente federal, e em seguida, inclusive em ordem topograficamente superior, apresente outra norma aumentando a alíquota do ente federal, verifica-se que houve, de fato, uma elevação de todos as alíquotas de todos entes federativos, principalmente se levarmos em consideração o princípio da unidade da constituição, que demanda uma análise global de todo o texto.
Sendo assim, a fim de se defender a constitucionalidade das normas supracitadas, deve-se interpretar que a competência que os entes estaduais e municipais possuem, no que diz respeito à alíquota previdenciárias de seus servidores, está adstrita à elação acima do piso, este estabelecido pela união, quando da fixação do percentual aplicável aos seus servidores.
3. CONCLUSÃO
Por todo o exposto, foi feita uma análise geral, pautada no fenômeno da irradiação dos normas constitucionais, bem como pela constitucionalização do Direito, das mudanças promovidos pela Emenda Constitucional 103, de 12 de novembro de 2019, principalmente acerca do estabelecimento, por partes dos entes federativos, das alíquotas das contribuições previdenciárias.
Foram analisadas as competências legislativas dos entes, assim como os instrumentos normativos necessários para se aumentar ou criar tributos, passando ainda pelas limitações tributárias aplicáveis ao caso, haja vista que a contribuição previdenciária consiste em tributo, sendo a alíquota um componente da sua matriz tributária.
Por fim, forma feitos questionamentos acerca da possibilidade de aumento automático das alíquotas das contribuições previdenciárias dos entes estaduais e municipais quando elevados os percentuais da união, tendo-se chegado à conclusão de que, a depender do tipo de norma legislativa usada, mostra-se o viável o aumento automático, em razão de uma interpretação sistemática das normas aplicáveis ao tema.
4. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
ALEXANDRE, Ricardo. Direito tributário. 13. Ed. Salvador: JusPodivm
AMADO, Frederico. Curso de direito e processo previdenciário. 12. Ed. Salvador: JusPodivm
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 1988.
FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 14. Ed. São Paulo: Editora JusPodivm, 2022.
SANTOS, Eduardo dos. Manual de Direito Constitucional. 2. Ed. São Paulo: JusPodivm, 2022.
Advogado, formado na Faculdade Martha Falcão de Manaus.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CHAVES, Felipe Carneiro. Vinculação das alíquotas das contribuições previdenciárias dos servidores públicos da União, Estados, Distrito Federal e Municípios Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 22 nov 2022, 04:14. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/60151/vinculao-das-alquotas-das-contribuies-previdencirias-dos-servidores-pblicos-da-unio-estados-distrito-federal-e-municpios. Acesso em: 25 dez 2024.
Por: Maurício Sousa da Silva
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