Prof. Dr. EMERSON BORTOLOZI
(orientador)
RESUMO: O Direito Desportivo Brasileiro trata acerca das leis pertinentes a atletas, clubes, torcedores e vem se adaptando às necessidades trabalhistas dos atletas. A Responsabilidade Civil do Estado, os direitos e deveres dos clubes e dos consumidores, da mesma forma, mantendo uma tendência mundial, a legislação desportiva brasileira tem se adaptado mesmo que de forma lenta às necessidades dos praticantes amadores e profissionalizados. A pesquisa apresentada tem como objetivo geral reconhecer a Responsabilidade Civil dos Clubes nas modalidades olímpicas em ocorrência de lesões, e as implicações da Lei Pelé, nº 9.615/98, no sistema de justiça do Brasil. Os danos decorrentes de referidas lesões, seguidos de mau atendimento para resolução e reparação dos mesmos, que imprime aos atletas e seus familiares a dificuldade de redimir tais problemas. Posteriormente serão apresentados alguns casos reais de atletas que buscaram tal Responsabilidade, para verificar a argumentação da jurisprudência brasileira acerca do tema proposto.
Palavras-chave: Direito Civil, Responsabilidade Civil, Lei Pelé, Esportes Olímpicos e amadores.
ABSTRACT: Brazilian Sports Law deals with the laws relevant to the labor needs of athletes, clubs, fans and has been adapting to the labor needs of athletes. The Civil Liability of the State to the rights and duties of clubs and consumers. Likewise, keeping a worldwide trend, brazilian sports legislation has adapted, slowly to the needs of amateur and professional practitioners. The research presented has the general objective of recognizing the Civil Liability of Clubs in the Olympic sports in the evente of injuries, andthe implications pf the Pelé Law nº 9.615/98 in the brazilian justice system. The damages resulting from said injuries, followed by poor service to solve and repair them, wich gives athletes and their families the difficulty of redeeming such problems. Subsequently some real cases of athletes who sought such responsibility will be presented to verify the arguments of brazilian jurisprudence on the proposed theme.
Keywords: Civil Law, Civil Liability, Pelé Law, Amateur and Olympic Sports.
INTRODUÇÃO
A atividade esportiva teve constante crescimento ao longo da história da humanidade, tendo como maior característica a caçada e as corridas para poderem sobreviver. Com o desenvolvimento da sociedade e também do próprio ser humano, este tipo de atividade deixou de ser uma mera questão de sobrevivência e passou a ser entretenimento, quebrando fronteira de países e aumentando cada vez mais a capacidade de convívio dos cidadãos.
Desde os mais longínquos tempos, o esporte se trata de um fenômeno social, e desenvolveu-se em conjunto com as normas morais e éticas demonstrados por princípios como: solidariedade, cooperação, disciplina e socialização, unindo povos de diferentes nações.
Pode-se notar, ao longo da história desportiva, que as primeiras competições aconteceram na Grécia, por volta de 776 a.C., na cidade de Olímpia. Não é por acaso que o maior palco atual de competições do mundo são as Olimpíadas, que ocorre a cada 4 anos ao redor do mundo, reunindo atletas de todas as nações para representarem seus países em suas respectivas modalidades. O desporto como alto rendimento tomou proporções inimagináveis e hoje é inclusive levado como carreira para os que o praticam.
Diante disso, percebe-se a necessidade da criação de normas regulamentadoras e de proteção jurídica para o esporte em si, pois o mesmo não é só visto apenas como uma diversão e sim como um trabalho e forma de sustento para os seus profissionais.
Atualmente, o cenário nacional contém diversas federações e confederações dos esportes de modalidades olímpicas e elas são regidas pela Lei Pelé, sendo esta peça fundamental dessa pesquisa.
O primeiro capítulo discorrerá sobre os principais tópicos, atinentes à Responsabilidade Civil. No segundo, apresentar-se-á a Lei Pelé e sobre o que ela nos diz. No terceiro capítulo, será demonstrado como funciona na prática o sistema de justiça brasileiro de desporto e, por fim, serão apresentados casos reais acerca da responsabilidade civil em atletas que sofreram lesões no decorrer de suas carreiras e como a responsabilidade civil será aplicada.
1 RESPONSABILIDADE CIVIL
Vanderlei Ramos (2014, p.01), destaca exemplarmente o conceito de responsabilidade civil, ao citar Sergio Cavalieri Filho (2008, p.2):
A responsabilidade civil parte do posicionamento que todo aquele que violar um dever jurídico através de um ato lícito ou ilícito, tem o dever de reparar, pois todos temos um dever jurídico originário, o de não causar danos a outrem e ao violar este dever jurídico originário, passamos a ter um dever jurídico sucessivo, o de reparar o dano que foi causado. O ato jurídico é espécie de fato jurídico.
Nesse sentido, notamos que:
Responsabilidade civil é a obrigação em que o sujeito ativo pode exigir o pagamento de indenização do passivo por ter sofrido prejuízo imputado a este último. Constitui-se o vínculo obrigacional em decorrência do ato do devedor ou de fato jurídico que o envolva. (COELHO, 2004, p.254; apud DURAM, COSTA, SANTOS, ZGARINO, 2017, p.6).
A responsabilidade civil é toda ação ou omissão que gera violação de uma norma jurídica legal ou contratual, nascendo assim uma obrigação de reparar os atos danosos. Ela pode ser classificada como um dever jurídico sucessivo que foi originado através da violação do dever jurídico originário. De acordo com Flávio Tartuce:
O artigo 389 trata do descumprimento da obrigação positiva (dar e fazer). O artigo 390, do descumprimento da obrigação negativa (não fazer). O artigo 391 do atual Código Privado consagra o princípio da responsabilidade patrimonial, prevendo que pelo inadimplemento de uma obrigação respondem todos os bens do devedor.[1]
O objetivo principal da mesma, é, portanto, recuperar o dano causado que tenha levado à diminuição do bem jurídico da vítima. Se não há dano, não haverá reparação, só podendo existir a obrigação de indenizar-se quando houver dano que será de ordem material.
Não obstante, o dever de reparar quando se comete um dano a outra pessoa é estabelecido nos artigos 927 e 932 da mesma Lei supramencionada, abaixo:
Art. 927. Aquele, que por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo Único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:
I- os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia;
II- o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se acharem nas mesmas condições;
III- O empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele;
IV- Os donos de hotéis, hospedarias, casas ou estabelecimentos onde se albergue por dinheiro, mesmo para fins de educação, pelos seus hóspedes, moradores e educandos;
V- Os que gratuitamente houverem participado nos produtos do crime, até a concorrente quantia.
Nesta composição, teremos os fatos jurídicos, que são os acontecimentos da vida que o Direito considera relevantes, são aqueles em que o Direito poderá e deverá intervir. Eles podem ser gerados de forma natural, como os acontecidos pela força da natureza, ou também podem ser voluntários, que são quando causados pela conduta humana, sendo lícitas ou ilícitas.
Os fatos lícitos são aqueles que estão de acordo com a lei (norma jurídica) e que produzem efeitos em conformidade com o ordenamento. Já os fatos ilícitos são aqueles que estão em desacordo com a norma jurídica, produzindo efeitos que causam danos ou prejuízo a alguém, gerando através disso uma obrigação de repara o dano que lhe foi causado. Conforme previsto no Artigo 186, do Código Civil: “Aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar o direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. E, também no artigo 927 do Código Civil
Aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.”
Parágrafo Único “Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Portanto, como pode-se observar, o ato ilícito constitui uma soma entre lesão de direitos e danos causados. Ato ilícito (art. 186 do cc) = Lesão de direitos + danos.
Entretanto, é necessário também contextualizar e entender o significado da palavra “responsabilidade”, que tem origem no latim: “respondere”, que pode ser visto como responder, assumir as consequências do dano. Para Carlos Alberto Bittar a reparação do dano traz, na verdade, um equilíbrio, no qual a parte lesada voltaria ao seu estado anterior, como se nada tivesse acontecido. (Gaglia no Pbalo Stalze)
1.1 PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL
Pressupostos são fenômenos que precisam ter acontecido para que haja responsabilidade civil, e este, portanto, é o nome técnico que o direito dá ao tema das indenizações.
Segundo Arnaldo Rizzardo, a responsabilidade civil subjetiva segue uma trajetória de quatro passos até o resultado da responsabilização de fato. Em primeiro lugar, o agente, através de uma ação ou omissão (1) causa dano a alguém, investindo contra o seu direito ou patrimônio. Essa ação ou omissão deve ser culposa (2) - dolo ou culpa propriamente dita -, sendo necessário também o nexo causal (3) entre a conduta do agente e do dano. O resultado será o dano (4), que atinge a pessoa ou seu patrimônio, ressaltando-se que, para surgir o dever de indenizar, deverá haver o prejuízo.
É necessário explanar sobre as peculiaridades de cada um dos pressupostos da responsabilidade civil, ainda que existem divergências entre os autores mencionados.
Ademais, o Código Civil de 2002, além de versar sobre a responsabilidade civil por ato próprio, também reconhece a responsabilidade civil indireta, ou seja, a responsabilidade por ato de terceiro que esteja sob a guarda do agente ou ainda de danos causados por fato de animal ou de coisas que lhe pertençam.
Vale salientar que alguns autores, como Silvio de Salvo Venosa, acreditam que a ação humana voluntária deve ser revestida de ilicitude. No entanto, outros doutrinadores afirmam que existem casos excepcionais nos quais haverá o dever de indenizar, mesmo quando o sujeito atue licitamente, nas hipóteses previstas em lei.
Conforme tratado anteriormente, para que se haja um ato ilícito, é necessária a conduta humana. Entende-se por conduta o comportamento humano voluntário, através de uma ação ou omissão, produzindo consequências jurídicas.
Sobre isso Maria Helena Diniz explica a conduta (2005, p.43)
A ação, elemento constitutivo da responsabilidade, vem a ser o ato humano, comissivo ou omissivo, ilícito ou lícito, voluntário e objetivamente imputável do próprio agente ou de terceiros, ou o fato de animal ou coisa inanimada, que cause dano a outrem, gerando o dever de satisfazer os direitos do lesado.
É necessário explanar sobre as peculiaridades de cada um dos pressupostos da responsabilidade civil, ainda que existam divergências entre os autores mencionados.
Quanto ao elemento dano, vale ressaltar que é necessário que a vítima sofra prejuízos, podendo estes afetar bens psíquicos, físicos, morais ou materiais. O dano é um requisito, portanto, primordial para a responsabilidade civil. Diante disso Maria Helena Diniz pontua:
O dano pode ser definido como a lesão (diminuição ou destruição) que, devido a um certo evento, sofre uma pessoa, contra a sua vontade, em qualquer bem ou interesse jurídico, patrimonial ou moral. (DINIZ, 2005).[2]
Logo, o nexo de causalidade é considerado por muitos um elemento de maior importância, pois este é a conduta do agente e o dano sofrido pela vítima. O dano deve ter sido causado pela conduta ilícita do agente e deve existir entre ambos uma relação de causa e efeito. Carlos Roberto Gonçalves afirma que:
(...) das várias teorias sobre o nexo causal, o nosso Código adotou, indiscutivelmente, a do dano direto e imediato, como está expresso no art. 403; e das várias escolas que explicam o dano direto e imediato, a mais autorizada é a que se reporta à consequência necessária. (GONÇALVES, 2002, p.524).[3]
Por fim, temos a culpa, como pressuposto da responsabilidade civil, que remete tanto ao dolo quanto à culpa em sentido estrito, e está ligada diretamente com a vontade do agente em chegar ao resultado que causou o dano. O dolo é a intenção do indivíduo em gerar um prejuízo a terceiros. Já na culpa em sentido estrito, o agente não tem a vontade de prejudicar outrem, sendo assim, o resultado não é voluntário.
Portanto, são quatro os pressupostos da responsabilidade civil ordinária e, vale ressaltar, que este último não é exigido na responsabilidade objetiva.
1.1.2 AÇÃO, OMISSÃO E IMPUTABILIDADE
Toda conduta humana que possa causar algum dano é, em sua maioria, cometida por uma ação que se origina de um fazer, ou seja, uma ação voluntária. É a forma mais comum de exteriorização da vontade do homem, que causa determinado tipo de prejuízo, dano ou lesão a pessoa alheia. Diferentemente da omissão, onde temos um não fazer, uma pessoa que não age quando poderia agir e, com isso, permite que alguém fique diante de um risco ou de uma situação de perigo, vindo sofrer danos ao patrimônio ou lesão a si.
O nexo de imputabilidade foi utilizado em substituição ao elemento “culpa” porque esta já não mais se enquadra como elemento imprescindível à configuração da responsabilidade civil e devido a imputabilidade poder ser encontrada tanto na responsabilidade objetiva quanto a subjetiva.
Imputabilidade, conforme mencionado anteriormente, é a atribuição a alguém da responsabilidade por alguma coisa, normalmente uma infração ou delito, refletindo ao conjunto de condições que dão ao agente capacidade para poder responder pelas consequências de uma conduta contrária a um dever originário. Já imputável, será aquele que podia e deveria ter agido de outro modo.
Quando trazida para a responsabilidade subjetiva, a imputabilidade não decorre apenas da prática de uma conduta culpável ou até mesmo reprovável, passível de um juízo de censura, pois culpa em sentido lato é, então, uma falta contrária a um dever, por ação ou omissão, ou pela inobservância da prática de um ato, envolvendo dolo e a culpa em sentido estrito.
Por sua vez, a culpa em sentido estrito é a falta de diligência no cumprimento de uma norma ou conduta, configurando-se no desprezo que o agente apresenta em relação ao esforço necessário para observá-la. De acordo com Anderson Schreiber:
A conduta será lícita, porém, ao desviar de padrões socialmente adequados, torna-se ilícita. Diferentemente do dolo, em que há consciência e objetivação do dano a ser provocado, na culpa, o resultado não será objetivado, contudo, ele é previsível. Quando imprevisíveis, não haverá configuração de culpa, já que a previsibilidade integra sua definição.[i][4][5]
Contudo, a Responsabilidade Civil não poderá ser atribuída a todos, pois para que seja comprovada é necessário verificar-se se o agente causador do dano é imputável, ou então se a pessoa, ao cometer um ato lesivo, possuía determinada condição psíquica ou condição de fato para responder sobre este ato, pois ao atribuir responsabilidade, também estamos atribuindo o dever de responder, e o agente causador pode ser inimputável por seus atos ou, devido as suas condições mentais, ou até devido a sua idade.
Na visão de Savatier,
(...) quem diz culpa diz imputação. E que um dano previsível e evitável para uma pessoa pode não ser para outra, sendo iníquo considerar de maneira idêntica a culpabilidade do menino e do adulto, do leigo ao especialista (...). (Gonçalves, Carlos Roberto, Direito Civil Brasileiro, Ed. Saraiva, 2007, p.18).
1.1.3 DANOS MATERIAIS E IMATERIAIS
Conforme mencionado anteriormente nesta dissertação, para que haja pagamento de indenização, além da prova de culpa ou o dolo na conduta, é necessário comprovar o dano patrimonial ou extrapatrimonial suportado por alguém. Em regra, não há responsabilidade civil sem dano, cabendo o ônus de sua prova ao autor da demanda, conforme aplicado no Art. 373, inc.I, do CPC/2015: “O ônus da prova incube:
I- Ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito”, correspondente ao Art. 333, inc. I, do CPC/1973.
É necessário mencionar que, em alguns casos, também se admite a inversão do ônus da prova do dano ou do prejuízo, como por exemplo nas hipóteses de relação de consumo, sendo presente a hipossuficiência do consumidor ou verossimilhança de suas alegações (Art. 6, Inc. VIII da Lei 8.078/1990). O mesmo será aplicado em relação a danos ambientais, prevendo a súmula 618 do STJ, editada em 2018, que: “a inversão do ônus da prova aplica-se às ações de degradação ambiental.”
Os danos patrimoniais ou materiais são aqueles que constituem prejuízo ou perdas que atingem o patrimônio corpóreo de alguém, podendo ser uma agressão diretamente à vítima e, com isso, gerando despesas médicas. A reparação poderá ser feita pelo conserto ou do próprio valor do bem, como por exemplo um veículo, que é um bem material, que tem valor econômico para quem o possui (seu dono) e aquele que causar dano terá que reparar com outro semelhante ao primeiro, ou indenizar no valor do conserto ou até mesmo no valor do bem.
Temos também outra espécie de dano material, que são os lucros cessantes. Seu propósito está na possibilidade de uma pessoa ter um dano e, com isso, deixar de lucrar com o que deveria, como no exemplo acima, um motorista de táxi, o valor do conserto seria um dano emergente, mas o tempo em que o carro ficaria parado sem gerar novos lucros para o trabalhador causaria o dano. Este lucro será calculado conforme o lucro que ele teve em outros dias em que trabalhou, com base em outros motoristas que realizam as mesmas viagens, multiplicando pelo número de dias em que ficou sem o seu automóvel. Nesse caso, é possível, um valor integral de indenização e pode ser cumulado com danos emergentes, de acordo com o artigo 403 do Código Civil, o qual expressa determinação em que as perdas e danos incluem tanto prejuízos efetivos como os lucros cessantes.
Nos caso dos danos imateriais, não está ligado ao patrimônio da vítima, mas sim aos direitos de personalidade como a honra, a imagem, e a liberdade, conforme disposto no Artigo 5º, Incisos V e X da CF. Trata-se de um dano ou lesão cujo conteúdo não é pecuniário, pois não está relacionado ao patrimônio da vítima, mas sim a sua imagem e reputação, como ela é vista na sociedade e o que as pessoas pensam sobre ela (Gagliano, Pablo Stolze, Novo Curso de Direito Civil, Ed. Saraiva, 2011, p.86) .
De acordo com o Artigo 186 do Código Civil de 2002: “aquele que causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral comete ato ilícito”, não sendo apenas indenizados os danos materiais mas também como sendo possível a sua cumulação, pois o fato de indenizar um dano material não exclui a ofensa sofrida de forma moral, mas apesar de não ter sido exposto no código de 1916, ao longo dos anos, observa-se que os julgados já reconheciam danos à moral, mostrando, mesmo não estando disposto na legislação, que não havia impedimentos para indenizações por danos morais ou psíquicos.
1.1.4 NEXO CAUSAL E SUAS EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE
O nexo causal ou nexo de causalidade pode ser considerado o maior protagonista da responsabilidade civil. É o vínculo lógico entre determinada conduta e o dano decorrente ao agente. Sem a análise deste liame, não se pode identificar a causa do dano e muito menos o seu causador. Não é, entretanto ,apenas um fato isolado que poderá contribuir para a ocorrência de um dano, mas sim a interpretação que deverá ser feita sobre ele.
De acordo com o artigo 13 do CP, o resultado é imputável a quem lhe deu causa, não basta somente a conduta ilícita, é necessário que ela seja a causadora do dano. A correta determinação do nexo de causalidade serve para identificar quem causou o dano e tem também o propósito de identificar o conteúdo da responsabilidade, enquanto ao mesmo tempo delimita até onde o autor poderá responder.
No direito civil a investigação dos critérios do nexo causal ocorre por meio da identificação da teoria explicativa a ser utilizada. O julgador deverá resguardar o princípio da probabilidade, da razoabilidade e da equidade e o nexo deve ser analisado de caso a caso, com base nas provas produzidas.
A conclusão sobre a causa do dano pode ser diversa, conforme a valoração que se faça de cada uma das causas fáticas que compõem o conjunto de causas que se apresentam como possíveis. Além da identificação do fato e de suas teorias explicativas, também será importante a distinção entre causa e condição para fins de verificação do nexo causal e da consequente imputação de responsabilidade.
Condições são eventos antecedentes à causa, são diferentes de causas, mas podem influenciar ou até mesmo possibilitar a sua ocorrência, como por exemplo: uma pessoa é vítima de disparo de arma de fogo, então é socorrida por ambulância, e em seguida outro veículo colide com a mesma, acarretando o falecimento do socorrido.
A excludente devido a culpa exclusiva da vítima passa a ser abordada a partir da jurisprudência. A seguir, entendimento de culpa exclusiva segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
Responsabilidade civil - Acidente ferroviário - Queda de trem - “Surfista ferroviário” - Culpa exclusiva da vítima. I - A pessoa que se arrisca em cima de uma composição ferroviária, praticando o denominado “surf ferroviário”, assume as consequências de seus atos, não se podendo exigir da companhia ferroviária efetiva fiscalização, o que seria até impraticável. II - Concluindo o acórdão tratar o caso de “Surfista ferroviário” não há como rever tal situação na via especial, pois demandaria o revolvimento de matéria fático- probatória, vedado nesta instância superior (Súmula7/STJ). III - Recurso especial não conhecido (STJ, Acórdão: REsp 160.051/RJ (199700923282), 471515, Recurso especial, Data da decisão: 05.12.2002, Órgão julgador: Terceira Turma, Relator: Ministro Antônio de Pádua Ribeiro. [13]
Referente à excludente de culpa exclusiva de terceiro, podemos observar em jurisprudência relacionada a acidente de trânsito, conforme a seguir:
Responsabilidade civil - Acidente de trânsito - Veículo abalroado em estacionamento por coletivo que o invadiu - Ônibus da ré teve seu livre trânsito interceptado por um caminhão, não tendo sido possível ao seu motorista evitar o choque - Culpa exclusiva de terceiro evidenciada - Ação improcedente - Recurso improvido [14].
1.2 ESPÉCIES DE RESPONSABILIDADE CIVIL
A responsabilidade civil pode ser dividida em diferentes espécies, isto em função de uma conduta humana violadora de um dever jurídico, qualificada a depender da origem deste dever jurídico e do elemento subjetivo desta conduta. Quem viola um dever jurídico lato sensu fica obrigado a indenizar, cuja relação jurídica poderá ser oriunda de um contrato (relação jurídica obrigacional preexistente), ou de uma obrigação imposta por lei. De acordo com Sergio Cavalieri:
É com base nesta dicotomia que a doutrina divide a responsabilidade civil em contratual e extracontratual, isto é, de acordo com a qualidade da violação.
Caso preexista um vínculo obrigacional e haja o dever de indenizar, tem-se, portanto, a responsabilidade contratual. Mas se o dever de indenizar decorrer da infração à lei, então teremos a responsabilidade extracontratual. Ainda de acordo com Sergio Cavalieri:
Desta feita, podemos entender que o ilícito extracontratual é a transgressão de um dever jurídico imposto pela lei, enquanto o ilícito contratual é a violação de um dever jurídico criado pelas partes.
Deve ser elencada também a responsabilidade civil subjetiva, que também possui alguns pressupostos, que estão dispostos no art. 186 do Código Civil de 2002. Sem estes, não existe o dever de indenizar por parte do ofensor. Portanto, ela é o dever de indenizar os danos causados por uma ação ou omissão.
Contudo, existem certas situações em que a conduta do agente causa dano a outrem, mas não se configura um ato ilícito, ou seja, embora seja uma conduta danosa. Essas hipóteses são chamadas de causas de exclusão de ilicitude, quando o agente causa um dano a terceiro, mas está amparado pela lei, ou seja, sua conduta foi de acordo com a lei, então, não configura ato ilícito, e sendo assim, não gera o dever de indenizar. As causas de exclusão de ilicitude são:
Art. 188. Não constituem atos ilícitos
I- Os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido;
II- A deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover perigo iminente.
Parágrafo Único. No caso do inciso II, o ato será legítimo somente quando as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os limites do indispensável para a remoção do perigo.
Assim, a responsabilidade civil subjetiva é pautada pelo conceito de culpa, onde podemos afirmar que ninguém pode ser obrigado a indenizar sem que tenha agido com a falta do dever de cuidado. Este tipo de responsabilidade era prevalente no Código Civil de 1916, porém, com a reforma, a responsabilidade objetiva passou a ter maior destaque.
Todavia, a caracterização da responsabilidade objetiva independe de culpa, embora exija presença da atividade ilícita, o dano e o nexo causal, ela também é conhecida por responsabilidade pelo risco. Diferente da responsabilidade subjetiva, não se investiga a culpa, mas apenas a atividade ilícita, o dano e o nexo causal. Na responsabilidade objetiva, mesmo que atue sem culpa, o agente pode ser obrigado a indenizar, desde que haja nexo entre conduta e dano sofrido pela vítima.
2 LEI PELÉ - LEI GERAL DO DESPORTO
A Lei nº 9615/98, promulgada em 1998, denominada Lei Pelé, em referência ao então Ministro Dos Esportes Edson Arantes do Nascimento, veio para substituir a Lei Zico, introduzindo no regulamento esportivo normas que passaram a regular de maneira geral o desporto nacional e dentre os seus objetivos, promovendo segurança jurídica para os atletas e buscando o efetivo aperfeiçoamento e moralização do esporte brasileiro.
De acordo com Melo Filho (1998), a Lei Pelé repete em 58% a antiga Lei Zico, citada, da qual foi um dos mentores, assim como teve participação nos debates e mutações da lei em estudo.
Conforme descreve Aidar (2007), a Lei Pelé trouxe ao ordenamento jurídico-desportivo inovações, como a extinção do vínculo do atleta profissional ao clube, depois de findo ou extinto o contrato de trabalho. Trouxe também: o reconhecimento expresso dos clubes como entidades autônomas e com a liberdade de se estruturar; a criação de um sistema de arbitragem de competições não vinculando às entidades de direção e de uma justiça desportiva independente. Desde a sua promulgação, a lei Pelé sofreu diversas atualizações, sendo as mais importantes: as modificações do contrato de trabalho desportivo e no direito de imagem e, em sua mais nova modificação, a previsão de mudanças no pagamento de salário dos jogadores, inclusão de aposentadoria especial para atletas olímpicos, a retirada do direito de imagem dos jogadores de futebol e destinação de parte da arrecadação de apostas online para o esporte, além de também propor revisão de critérios para eleições de presidentes de confederações e de federações.
O desporto de alto rendimento, sendo aquele praticado segundo as normas gerais da lei Pelé e regras atinentes às práticas desportivas, que apresenta elementos de competição, pode ser praticado pelos cidadãos desde a tenra idade, inclusive menores de quatorze anos, se ausentes as noções de relação de emprego, cabendo ao desporto de concepção propiciar que o indivíduo evolua no esporte pela aquisição inicial de conceitos desportivos em que sejam garantidos efeitos qualitativos e quantitativos da prática do desporto, para aquisição de capacidade técnica, seja na seara recreativa ou até mesmo nos ramos competitivos ou de alto desempenho (SILVA, 2008).
2.1 OS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO ESPORTE
De forma sucinta, a Lei Pelé determina normas e diretrizes para a condução do esporte no território brasileiro. Esta Lei trata de assuntos que vão desde o contrato de trabalho do atleta profissional, até repasses de recursos e controle de dopagens.
‘’Capitulo II
Dos Princípios Fundamentais
Art. 2º. O desporto, como direito individual, tem como base os princípios:
I - da soberania, caracterizado pela supremacia nacional na organização da prática desportiva;
II - da autonomia, definido pela faculdade e liberdade de pessoas físicas e jurídicas organizarem-se para a prática esportiva;
III - da democratização, garantindo em condições de acesso às atividades desportivas sem quaisquer distinções ou formas de discriminação;
IV - da liberdade, expresso pela livre prática do desporto, de acordo com a capacidade e interesse de cada um, associando-se ou não a entidade do setor;
V - do direito social, caracterizando pelo dever do Estado em fomentar as práticas desportivas formas e não-formais;
VI - da diferenciação, consubstanciado no tratamento específico dado ao desporto profissional e não profissional;
VII - da identidade nacional, refletido na proteção e incentivo às manifestações desportivas de criação nacional;
VIII - da educação, voltado para o desenvolvimento integral do homem como ser autônomo e participante, e fomentado por meio da prioridade dos recursos públicos ao desporto educacional;
IX - da qualidade, assegurado pela valorização dos resultados desportivos, educativos e dos relacionados à cidadania e ao desenvolvimento físico e moral;
X - da descentralização, consubstanciado na organização e funcionamento harmônicos de sistemas desportivos diferenciados e autônomos para os níveis federal, estadual, distrital e municipal;
XI - da segurança, propiciado ao praticante de qualquer modalidade desportiva, quanto a sua integridade física, mental ou sensorial;
XII - da eficiência, obtido por meio do estímulo à competência desportiva e administrativa.’’
No capítulo citado, a Lei Pelé repetiu o que já continha a Lei Zico, com pequenas variantes redacionais.
Dentre os princípios fundamentais do desporto, a soberania desejada pela Lei não pode ser tão absoluta quanto aparenta no inciso I, pois a organização da prática desportiva está bastante subordinada a normas internacionais das mais variadas modalidades. Por exemplo, a FINA (Federação Internacional de Natação), estabelece normas que devem ser obedecidas por todas as legislações nacionais. Dentro da prática desportiva formal, não teria sentido a prática de um esporte que se limitasse às suas próprias fronteiras, com impedimentos de participações internacionais. Portanto, esta soberania está adstrita aos princípios do interesse e da moralidade pública de cada povo.
O princípio da autonomia é ínsito a toda e qualquer atividade humana, não se podendo impor comportamentos àqueles que não pertençam a um quadro autônomo, dentro do qual todos são, individualmente, sujeitos e objeto, com direitos e deveres a serem cumpridos.
O princípio da democratização é preceito constitucional. Onde houver discriminação, violada estará a lei maior. Infelizmente temos o maior exemplo clássico de discriminação em partidas de futebol nas quais integrantes fanáticos de torcidas organizadas humilham e ofendem jogadores de torcidas rivais com cunho racista.
Temos também como princípio marcante no capítulo citado o da eficiência, que busca pela competência na prática da modalidade desportiva o resultado positivo. Isso compete ao atleta, porém, há de ser aplicada na administração do desporto e também a seus dirigentes, profissionalizando cada vez mais a área.
2.2.1 CARACTERÍSTICAS DA LEI PELÉ
A Lei Pelé foi sancionada em março de 1998 e institui normas para diversos assuntos referentes à condução do esporte no Brasil. Além de ter um papel importante na proteção e regulamentação das atividades esportivas profissionais, tratando questões como o contrato de trabalho do atleta profissional, direito ou não a férias e também, reproduz a importância da participação do Brasil no mercado esportivo.
Ela foi a responsável por estabelecer, por exemplo, que a participação de um atleta em uma partida de futebol está condicionada a um contrato formal de trabalho com um clube, sendo obrigatório o registro do documento junto a entidade dirigente, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF), no caso de futebol de campo.
Além disso, o atleta também não pode estar com nenhuma pendência na justiça desportiva ou cumprindo qualquer penalidade de suspensão. E, ainda é imprescindível que o mesmo esteja apto física e mentalmente para a realização das suas atividades profissionais.
Antes da criação dessa legislação, não havia dispositivo que assegurasse a proteção dos direitos dos atletas. Assim, ela foi criada para trazer mais segurança jurídica para esses profissionais. Outros objetivos são dar transparência e profissionalismo ao esporte, conceder aos jogadores o direito do seu passe, disciplinar a prestação de contas por dirigentes e profissionalizar as gestões.
A Lei Pelé foi sucessora da chamada Lei Zico, e nesse aspecto começou a gerar diversas polêmicas em torno da nova redação. Muitos juristas e profissionais da área, apontam para a chamada “clonagem” de quase 60% daquela norma, trazendo poucas contribuições práticas, ou seja, apesar da atualização, a mesma precisaria novamente ser reestruturada ao longo dos anos.
Entre os aspectos mais polêmicos está o fim do “passe”, que resultou em um mercado problemático no que concerne à relação entre os jogadores e seus empresários.
Ademais, muitas pessoas acreditam que a lei permitiu uma intervenção do Estado no esporte. Isso poderia trazer mais prejuízos do que benefícios para a prática esportiva enquanto uma atividade essencialmente cultural, muito embora com um viés econômico cada vez mais forte.
Outro aspecto importante a ser destacado, e que vem sendo debatido entre os especialistas, está relacionado à transformação dos clubes em empresas, perdendo a essência da prática desportiva e desvirtuando as práticas desse mercado.
Diversas alterações aconteceram durante os mais de 20 anos de vigência. Desde que foi elaborada, passou por diversas revisões, em grande parte para adequar pontos polêmicos e contraditórios. Um ponto que sofreu grande modificação ao longo dessas duas décadas diz respeito exatamente à polêmica sobre a obrigatoriedade da transformação dos clubes em empresas. Inicialmente, o art. 94 indicava que essa mudança deveria correr em um prazo de 2 (dois) anos após a sua promulgação, porém os clubes pressionaram e esse prazo foi estendido por mais um ano.
Conforme mostrado, existem muitos debates e polêmicas envolvendo a Lei Pelé. Atualmente, está em tramitação no Congresso o Projeto de Lei nº 1476/19, cuja proposta é alterar a legislação para incluir novas exigências, com o objetivo de garantir a educação do atleta em formação. O texto obriga a entidade de prática desportiva a contratar um profissional da educação de ensino superior para fazer parte de sua equipe técnica. Esse profissional, segundo o texto, deverá acompanhar frequência, rendimento escolar e a evolução educacional do atleta em formação, sendo responsável por zelar para que os treinos e competições não prejudiquem o processo educativo. Essa proposta legislativa reforça a importância de se manter atualizado.
3 O FUNCIONAMENTO DO SISTEMA BRASILEIRO DE DESPORTO
De acordo como art. 13 da Lei nº 9615/98:
Parágrafo Único. O Sistema Nacional do Desporto congrega as pessoas físicas e jurídicas de direito privado, com ou sem fins lucrativos, encarregadas da coordenação, administração, normatização, apoio e prática do desporto, bem como as incumbidas da Justiça Desportiva e, especialmente:
I- O Comitê Olímpico Brasileiro - COB;
II- O Comitê Paraolímpico Brasileiro;
III- As entidades nacionais de administração do desporto;
IV- As entidades regionais de administração do desporto;
V- As ligas regionais e nacionais;
VI- As entidades de prática desportiva filiadas ou não àquelas referidas nos incisos anteriores;
VII- A Confederação Brasileira de Clubes.
A Lei Pelé, que institui normas gerais sobre esporte em nosso país, afirma que o desporto tem quatro formas, que são: o desporto educacional, de participação, de rendimento e de formação. A definição de cada uma dessas manifestações é dada tanto pela Lei Pelé, quanto pelo decreto que a regulamenta.
O desporto educacional pode ser praticado em estabelecimentos escolares e não escolares. Seu objetivo é proporcionar o desenvolvimento integral da pessoa, sua formação para o exercício da cidadania e a prática do lazer. Para isso, é evitada a seletividade (distinção entre as pessoas) e a competitividade excessiva entre os que participam.
O desporto educacional é tão importante que a nossa Constituição determina que, em matéria desportiva, ele tenha prioridade na distribuição de recursos públicos. Além disso, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) estabelece que a educação física é categoria obrigatória no currículo da educação básica.
Entretanto, o desporto de participação é aquele praticado livremente pelas pessoas, sem regras oficiais a serem seguidas, como as brincadeiras infantis, por exemplo. Sua finalidade é contribuir para a integração dos praticantes, promover a saúde, a educação e a preservação do meio ambiente.
Já o desporto de rendimento compreende modalidades esportivas praticadas conforme regras nacionais e internacionais, com vistas à obtenção de resultados competitivos. Ademais, possui a finalidade de integrar pessoas e comunidades do nosso país e de outras nações. Pode ser praticado de maneira profissional, quando no caso o atleta recebe salário para sua atividade, ou de forma não profissional. São exemplos dessa manifestação esportiva as modalidades disputadas nos Jogos Olímpicos e Paralímpicos, como a natação, o basquete, o futebol, o atletismo e o tênis de mesa.
Por fim, o desporto de formação se caracteriza pela iniciação esportiva do atleta, quando ele adquire conhecimentos para aperfeiçoar sua capacidade técnica esportiva, não somente para fins competitivos, mas podendo ser também com finalidade recreativa.
3.1 A PRÁTICA DESPORTIVA PROFISSIONAL
De acordo com o artigo 3º, parágrafo 1º, Inciso I da Lei 9.615/98 (Lei Pelé): “A prática desportiva é profissional quando se caracteriza pela remuneração pactuada em contrato formal de trabalho entre o atleta e a entidade de prática desportiva”. Importante frisar que o texto legal contempla dois aspectos diferentes e imprescindíveis para essa caracterização. O primeiro ponto é que o atleta seja remunerado por meio de contrato de trabalho; o segundo, que o empregador do atleta seja uma entidade de prática desportiva.
Portanto, se o atleta de alto rendimento não for remunerado pela prática desportiva, ou se for remunerado com base em qualquer outra relação que não contemple a existência de um contrato de trabalho, será considerado como não profissional. Essa conclusão se extrai do inciso II do mesmo Artigo 3º, parágrafo 1º da Lei Pelé: “[a prática não profissional se caracteriza pela] liberdade de prática e pela inexistência de contrato de trabalho, sendo permitido o recebimento de incentivos materiais e de patrocínio.” Logo, por lei, não são considerados profissionais os atletas que auferem seus rendimentos exclusivamente por meio de patrocínio, bolsa ou quaisquer outros contratos de natureza civil.
Essa explicação é absolutamente relevante. Afinal, na atual realidade, a prática da maioria dos esportes é pautada pela inexistência de contrato de trabalho entre o atleta e uma entidade de prática desportiva. Especificamente no caso do automobilismo, a importância se revela na medida em que são diversos os casos de pilotos remunerados, por exemplo, diretamente pelos patrocinadores, ou seja, não são remunerados pela equipe, nem a partir de um contrato de trabalho. Logo, aqueles que se enquadram nessa condição são considerados, à luz da Lei Pelé, como atletas não profissionais.
Porém, são diversas as repercussões no campo jurídico, e podemos ilustrar por meio de dois pontos importantes para os atletas, que são a Lei de Incentivo ao Esporte e a Justiça Desportiva.
A Lei nº 11.438/2006, que estabelece o mecanismo de incentivo fiscal no âmbito do esporte, veda o uso de recursos captados por meio desse mecanismo para remuneração de atletas profissionais (art. 2º, parágrafo 2º). O Decreto nº 6.180/2007, que regulamenta a referida lei, ratifica essa proibição e veda o uso de recursos incentivados para: “o pagamento de quaisquer despesas relativas à manutenção e organização de equipes desportivas ou paradesportivas profissionais de alto rendimento (...) ou de competições profissionais”. Logo, identificar se a prática desportiva é profissional ou não profissional afigura-se essencial para compreender se o atleta pode, ou não, se beneficiar da lei federal de incentivo ao esporte.
No que tange à Justiça Desportiva (CBDJ): (i) o artigo 170, parágrafo 2º veda a aplicação de penas pecuniárias a atletas de prática não profissional, enquanto (ii) o artigo 182 determina que as penas de outras naturezas previstas no CBDJ (como, por exemplo, suspensão) devem ser reduzidas pela metade quando o infrator for atleta não profissional. Portanto, a forma como se dá a prática desportiva é fundamental para determinar as penas aplicáveis a um atleta com base no CBJD.
Outro ponto a ser destacado é que, atleta cuja prática desportiva é não profissional, não poderá ser sancionado por órgão da Justiça Desportiva e nem ter pena de multa. Por exemplo, no automobilismo, a um piloto que não é remunerado pela sua equipe com base em contrato de trabalho não poderá ser imposta pena de multa pela Justiça Desportiva com fundamento CBJD. Este é o caso dos diversos pilotos remunerados diretamente por patrocinadores, sem vínculo trabalhista com a equipe.
4 CONTROLE DE DOPAGEM OU “DOPING”
A ABCD (Autoridade Brasileira de Controle de Dopagem) foi criada para defender os interesses dos atletas de alto rendimento, e que buscam diariamente resultados expressivos em suas modalidades esportivas.
Normalmente os atletas disputam competições de forma limpa e sem apelar para o uso de substâncias proibidas (“doping”), que são as substâncias capazes de promover alterações físicas ou psíquicas que melhoram, artificialmente, o desempenho esportivo.
As violações às regras do Código Mundial de Antidopagem mais conhecidas são: a presença de uma ou mais substâncias proibidas em metabólitos ou marcadores na amostra de algum atleta; o uso ou a tentativa de uso de substância ou método proibido; a fuga, recusa ou falha ao ser submetido à coleta de amostras; as falhas de localização do atleta; as fraudes, ou tentativas de fraude de qualquer parte do processo de controle de dopagem; posse de substância ou método proibido; cumplicidade; associação proibida, entre diversos outros.
Existe atualmente o Código Mundial Antidopagem. Esse código é o documento fundamental e universal que serve de base ao programa mundial antidopagem nos esportes. O objetivo do código é estimular o esforço antidopagem através da harmonização universal dos princípios antidopagem.
De acordo com o Ministério da Cidadania, no Brasil, o processo de controle de dopagem começa com um planejamento de testes eficaz. A autoridade Brasileira de Controle de Dopagem, tem a autonomia de uma Organização Nacional Antidopagem (ONAD), e deve elaborar um Plano de Distribuição de Testes (PDT), que é um plano de teste inteligente proporcional ao risco de dopagem entre os atletas, sob sua jurisdição.
Em sequência, será seguida uma priorização adequada do(s) esporte(s), ou provas esportivas entre categorias de atletas, entre tipos de teste, que pode ser de sangue ou de urina, entre tipos de amostras coletadas e entre tipos de análise de amostra. Vale ressaltar que o plano é flexível e, como tal, suscetível a modificações necessárias de acordo com a demanda da ONAD. Tanto na coleta de urina quanto na de sangue, é necessário declarar o uso de qualquer medicação, substância e até mesmo suplementos dos últimos sete dias, a informação deve ser anexada no formulário de controle de dopagem, no mesmo, o atleta revisa e assina, declarando que com as informações nele contidas, e além disso, ele também irá receber uma cópia do formulário. Vale lembrar que neste formulário, constará as informações pessoais do atleta, como detalhes de contato.
Sendo assim, o desenvolvimento deste plano de distribuição de testes é feito antes do início de cada ano e tem por base os calendários esportivos anuais e mensais das confederações.
Conforme o Código, organizações antidopagem devem planejar e implementar um número efetivo de testes em competição e fora de competição, e como parte do plano, as organizações antidopagem criam um grupo alvo de testes (GAT), que são atletas selecionados para serem periodicamente testados. Para tanto, é feita uma seleção de atletas, e eles podem ser selecionados para coletas de amostras em qualquer lugar, e a qualquer momento, sem nenhum tipo de notificação prévia. Pelo fato de poderem ser selecionados para testes durante ou fora de competições. Os atletas podem ser notificados em locais de treinos, em casa ou qualquer outro lugar durante todo o ano.
Ressalte-se, para efeito do Controle de Dopagem, o Código Mundial Antidopagem define que o atleta nacional poderá integrar o grupo alvo de testes de uma organização antidopagem, e no Brasil, conforme mencionado, a entidade responsável pelo controle é a ABCD. Porém, o atleta estrangeiro, poderá ser selecionado pela sua federação internacional para também integrar o grupo alvo de testes. Eventualmente, a depender da estratégia adotada pela ABCD, o atleta brasileiro poderá ser testado por uma federação internacional, caso esteja no alvo de testes.
Os fatores que são mais levados em conta na escolha de um atleta são: candidatos a medalhas em competições olímpicas, paraolímpicas ou campeonatos mundiais; atletas cumprindo período de suspensão; atletas aposentados que querem voltar a competir e antes eram alta prioridade de teste; atletas com histórico de melhoras súbitas de desempenho; repetidas falhas em cumprir com os requisitos de localização, dentre outros tantos. Mas além desses motivos ressalte que, quaisquer atletas estão suscetíveis a serem testados.
5 A JUSTIÇA DESPORTIVA
A justiça desportiva é o ramo do direito especializado da jurisdição relacionado ao desporto, que ganhou autonomia por força constitucional. Isso se deu pela determinação do art. 217, parágrafo 1º, que o Poder Judiciário somente será acessível para resolução de conflitos esportivos após esgotadas as instâncias dessa justiça:
Art. 217. É dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não-formais, como direito de cada um, observados:
§ 1º O Poder Judiciário só admitirá ações relativas à disciplina e às competições desportivas após esgotarem-se as instâncias da justiça desportiva, regulada em lei.
Além disso, este ramo constitui um meio alternativo para solucionar conflitos envolvendo atletas, clubes, treinadores e árbitros. A Constituição foi constituída neste quesito para oferecer uma prestação jurisdicional direcionada, considerando os conhecimentos específicos que o tema exige, e para ser mais célere, em face da sobrecarga de demandas da justiça comum.
Após o julgamento em todas as instâncias da justiça desportiva, ou se o caso não for julgado em até 60 dias, pode o interessado acionar a jurisdição comum, conforme previsto no parágrafo 2º do artigo citado anteriormente 217, da Constituição Federal.
Art. 217. É dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não-formais, como direito de cada um, observados:
§ 2º A justiça desportiva terá o prazo máximo de sessenta dias, contados da instauração do processo, para proferir decisão final.
Infraconstitucionalmente, o âmbito desportivo é regulamentado principalmente pela Lei n º 9,615/98, mais conhecida como Lei Pelé. Os seus artigos 50 a 55 são as normas responsáveis por tratar da justiça desportiva, como a sua forma de organização, o seu funcionamento e as suas atribuições. São todos definidos em Códigos de Justiça Desportiva, conforme determinação contida no art. 50 da lei.
Da mesma forma que acontece com outras jurisdições, a justiça desportiva também é regida por princípios, e alguns deles advêm do Direito Processual, como o contraditório, ampla defesa, legalidade, impessoalidade. Porém, outros são específicos, eles servem como fundamento para a normatização, a interpretação e o julgamento dos casos jurídicos que envolvem o desporto.
Além dos princípios presentes, a justiça desportiva também tem sua estrutura própria. Nos termos do art. 52 da Lei Pelé, ela é composta por órgãos autônomos e independentes das entidades de administração do desporto de cada sistema.
O STJD (Superior Tribunal de Justiça Desportiva), trata-se do órgão máximo da justiça desportiva, formado por nove membros e que atua junto às entidades nacionais de administração do desporto, em âmbito nacional e estadual. Porém, acima dele, estão os órgãos internacionais de jurisdição esportiva, aos quais se pode recorrer em hipóteses específicas. Ele é composto por um tribunal pleno de por comissões disciplinares, ou seja, há um SJTD para cada modalidade esportiva.
Já os tribunais de Justiça Desportiva também são compostos por nove membros e têm jurisdição regional e municipal. Em uma analogia ao sistema processual da justiça comum, pode-se dizer que eles se assemelham aos tribunais de segunda instância. Além disso, também são constituídos por um tribunal pleno e comissões disciplinares.
Portanto, as Comissões Disciplinares estão presentes nos órgãos mencionados acima. Processam e julgam casos previstos nos Códigos de Justiça Desportiva, assegurados a ampla defesa e o contraditório, conforme redação do Art. 52 da Lei Pelé. Elas são como a primeira instância da Justiça Comum e analisam questões envolvendo competições interestaduais ou nacionais e regionais ou municipais, a depender de em qual Tribunal estão inseridas.
5.1 PRINCIPAIS IMPACTOS DA LEI PELÉ PARA OS ATLETAS
Além da segurança jurídica em si para os atletas, a Lei Pelé trouxe três importantes impactos para o Direito e para a vida dos atletas. O primeiro deles foi encerrar a prática do “passe”, prática esta, que foi iniciada com a Lei 6.345/76 e mantida pela Lei Zico. Além disso, outro importante impacto foi a constituição do clube-empresa para a prática de atividades relacionadas a competições de atletas profissionais. E finalmente, outro grande impacto foi o direito de transmissão.
5.1.1 O FIM DO “PASSE”
Em 26 de março de 1998 ao ser sancionada a Lei nº 9.515/98, conhecida popularmente como Lei Pelé, o então presidente Fernando Henrique Cardoso concedeu uma carência para a extinção do “passe”, que passou a ser válida em 26 de março de 2001.
O passe, determinava que, mesmo após o fim do vínculo contratual, o atleta ainda estaria ligado ao clube contratante.
Para que o atleta pudesse ser contratado por outro clube, o novo contratante deveria pagar ao anterior uma quantia, que ficou conhecida como o “passe”. Assim, significava a sobrevivência da ligação do atleta com o clube, mesmo após o fim da sua relação contratual. Enquanto não surgisse um clube que aceitasse pagar o valor do passe, o atleta ficava completamente impedido de atuar dentro da sua profissão.
Na Lei Pelé, o passe foi substituído pela inclusão obrigatória de cláusulas penais nos contratos de trabalho. Além disso, a lei também define que, depois de dois anos, o jogador deixa de ser propriedade do clube.
5.1.2 CRIAÇÃO DO CLUBE-EMPRESA
O presidente Jair Bolsonaro sancionou, com vetos, a lei que oferece condições para os clubes de futebol se tornarem empresas, podendo receber recursos financeiros de pessoas físicas, jurídicas e fundos de investimento. O governo, porém, vetou dispositivos sobre renúncia fiscal, que permitiam aos clubes pagar 5% de suas receitas nos cinco primeiros anos de mudança. A norma, Lei 14.193, de 2021, foi publicada no dia 9/08/21, no Diário Oficial da União.
De acordo com o Senado Federal, a lei cria o Sistema do Futebol Brasileiro, mediante tipificação da sociedade anônima do futebol (SAF). É um modelo de sociedade anônima, que permite a emissão de títulos, com a regulação dos clubes pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Atualmente, os clubes de futebol são caracterizados como associações civis sem fins lucrativos. Com a mudança, as sociedades anônimas do futebol poderão pedir recuperação judicial, negociando as dívidas por meio do Poder Judiciário, além de levantar recursos por meio de emissão de debêntures, de ações ou investidores.
Um dos títulos que poderão ser emitidos são as debêntures-fut, com prazo mínimo de dois anos de vencimento e remuneração mínima igual à da poupança, permitindo-se remuneração variável vinculada às atividades da sociedade.
A nova lei prevê regras de parcelamento de dívidas, além de permitir que as obrigações civis sejam separadas das trabalhistas, sem repassá-las a essa nova empresa que será criada com as novas regras.
A Sociedade Anônima do Futebol também pode ser criada a partir da separação do departamento de futebol do clube ou pessoa jurídica original ou ainda por iniciativa de pessoa natural ou jurídica, ou de fundo de investimento.
O clube-empresa terá como objetivo formar atletas profissionais e obter receitas com a negociação dos direitos esportivos dos jogadores, além de permitir a exploração econômica de ativos, inclusive imobiliários.
5.2 ATLETA PROFISSIONAL
A diferença entre os atletas profissionais e os atletas não profissionais, sendo ponto nodal para tal diferenciação, são as modalidades desportivas praticadas, que jamais podem ser equiparadas, visto o envolvimento financeiro diferenciado de cada uma, bem como o retorno de mídia respectivo. Os atletas que não são profissionais são regidos por legislação extravagante, portanto, não estão sujeitos às regras da CLT, ao contrário do atleta profissional que, na ausência de incompatibilidade com a Lei Desportiva, são regidos pela CLT, assim como um trabalhador qualquer. Além disso, deverá ser minuciosamente esclarecido a aplicabilidade ou não do artigo 3º consolidado, devendo o Magistrado ter grande sensibilidade em sua interpretação, para que regras desportivas básicas, peculiares do desporto, não sejam equiparadas a subordinação jurídica empregatícia que, diga-se de passagem, é crucial para determinação de contrato de emprego.
Com a ampliação da competência material da Justiça do Trabalho, que foi introduzida pela Emenda Constitucional 45 de 8/12/2004, alterou-se sensivelmente o artigo 114 da Constituição Federal de 1988, que diz:
Compete a Justiça de Trabalho conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores, abrangidos de entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta dos Municípios, do Distrito Federal, dos Estados e da União, e, na forma da lei, outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, bem como os litígios que tenham origem no cumprimento de suas próprias sentenças, inclusive coletivas.
A diferenciação do atleta profissional para o não profissional se dá a partir da transcrição do Artigo 3º da Lei nº9.615/98, que foi inúmeras vezes modificados, e que trazem o enquadramento quanto ao tema.
Art. 3º O desporto pode ser reconhecido em qualquer das seguintes manifestações:
I- (..........)
II- (........)
Parágrafo Único - o desporto de rendimento pode ser organizado e praticado:
I- De modo profissional, caracterizado pela remuneração pactuada em contrato formal de trabalho entre o atleta e a entidade de prática esportiva;
II- De modo não profissional, identificado pela liberdade de prática e pela inexistência de contrato de trabalho, sendo permitido o recebimento de incentivos materiais e de patrocínio.
A transcrição dos incisos acima demonstra para que seja esclarecido pontos importantes e elementos caracterizadores e também definidores justamente da diferenciação entre o atleta profissional e não profissional. Ressalte-se que são também acrescidos demais fatores que são importantes, contudo, há contrapontos com o Artigo 3º da CLT.
Tanto que o inciso I do parágrafo único do artigo 3 da Lei 9.615/98 traz a definição expressa do atleta profissional, este, anteriormente restrito ao jogador de futebol masculino, contudo, nos dias atuais, já entendemos que foi ampliada essa definição, todavia, ainda não tão abrangente como muitos gostariam.
Com efeito, muitos defenderão que a situação retratada na lei expressa fará com que as entidades desportivas se utilizem da própria torpeza para pactuar verdadeiros contratos de emprego sob o manto de nomes diversos aos instrumentos de pactuação, entretanto, o atleta no momento da contratação sabem das condições de contrato, nunca sendo os mesmos prometidos a um contrato de emprego com anotação na Carteira de Trabalho, e respectivos direitos celetistas, e sim que serão patrocinados pelas entidades desportivas para desenvolverem suas modalidades esportivas.
Desta forma, muitos atletas da atualidade aceitam tais condições propostas, inclusive muitas vezes os mesmo sendo representados por empresários e quando se gera o fim da harmonia na relação pactuada, vão ao Judiciário perseguir vínculo de emprego e demais direitos celetistas, que no fim das contas jamais foram de fato pactuados.
6. RESPONSABILIDADE CIVIL NA JURISPRUDÊNCIA
“APELAÇÃO No 0005221-36.2013.8.26.0445 APELAÇÃO CÍVEL - RESPONSABILIDADE CIVIL MUNICÍPIO DE PINDAMONHANGABA PLEITO DE REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS ACIDENTE SOFRIDO DURANTE AULA DE JUDÔ MINISTRADA NO CENTRO EDUCACIONAL MUNICIPAL ALUNO QUE FICOU TETRAPLÉGICO DEVER DA MUNICIPALIDADE DE INDENIZAR OS PREJUÍZOS SOFRIDOS PELO AUTOR Municipalidade que deve proteger a integridade dos frequentadores dos espaços públicos - Omissão culposa da municipalidade no dever de guarda e vigilância de menor praticante de atividade esportiva dentro de Centro Educacional Municipal Ausência de culpa concorrente ou exclusiva da vítima que, ademais, tinha quatorze anos na época - Nexo de causalidade configurado Responsabilidade estatal Art. 37, § 6o, da CF - Configurada a falta de serviço, que leva ao reconhecimento da responsabilidade subjetiva – Danos materiais e morais devidos Insurgência do autor quanto ao valor fixado a título de danos morais Sentença que os fixou em R$ 100.000,00 Valor que merece ser mantido, eis que razoável e proporcional, sem configurar enriquecimento indevido do requerente. - Recursos de apelação desprovidos. Honorários recursais fixados em desfavor da Municipalidade, em 3% sobre a condenação.”
APELAÇÃO CÍVEL No 1035431-45.2018.8.06.0100 “APELAÇÕES. Ação indenizatória por danos morais e materiais. Atleta amador. Ocorrência de lesão sofrida pelo demandante nas dependências do clube demandado. Sentença de parcial procedência, sendo negado o ressarcimento referente a supostos danos materiais. APELO DO CLUBE DEMANDADO pleiteando a reforma da r. decisão na parte desfavorável. Sem razão. Atuação da parte demandada que não se restringiu a simples cessão de espaços e serviços de treinamento para atletas amadores, haja vista trata-se de clube formador, com foco na futura profissionalização do atleta. Requerido que, ao trazer o menor para São Paulo, além de isentá-lo de pagamentos pelos treinamentos oferecidos, também se responsabilizou por todo o processo de federalização do atleta, oferecendo, inclusive, bolsa integral em colégio particular. Demandante que, após a ocorrência da lesão nas dependências do clube, foi compelido a buscar tratamento na rede pública, contando com a assistência de terceiros para a restabelecimento de sua saúde. Requerido que não nega que oferecia as isenções para os treinamentos e trâmites para federalização e bolsa integral em colégio particular, fato este que é, repita-se, aceitável para a caracterização de seu desempenho como clube formador e da existência de um pré-contrato verbal para futura profissionalização. Nesse contexto, competia à parte ré contratar seguro de acidentes pessoais, nos termos do art. 82-B da “Lei Pelé”, obrigação essa que, ao contrário do alegado pelo réu, impõe-se tanto para atletas profissionais como amadores.
Responsabilidade civil do réu em indenizar os prejuízos morais efetivamente experimentados pelo menor, haja vista a falta de assistência integral e necessária após a ocorrência da lesão. RECURSO DA PARTE AUTORA pleiteando a fixação de indenização por danos materiais e a majoração do valor fixado à título de danos morais. Sem razão. Não obstante a manutenção da indenização por danos morais, não prospera a pretensão de majoração do seu valor. Em que pese a ausência de assistência integral, os primeiros socorros foram devidamente prestados, sendo que, após a cirurgia, foi disponibilizado tratamento fisioterápico gratuito ao autor no próprio clube, conforme afirmado por ambas as partes. Danos materiais. Inocorrência. Documentos colacionados que não trazem sustentáculo suficiente para embasar uma condenação por danos materiais, posto que correspondem somente aos receituários e pesquisas de valores referentes aos medicamentos supostamente utilizados. Sentença que deve ser mantida na íntegra. Honorários recursais não arbitrados. Recursos desprovidos.”
Ambos julgados estão em anexo ao final desta monografia. Ambos retratam apelações acerca de decisões proferidas em acidentes referentes a práticas esportivas de atletas “não profissionais”.
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Gostaria de ter me aprofundado mais nas questões verídicas de atletas que buscam recursos jurídicos para terem seus direitos garantidos, mas os dados apresentados na jurisprudência foram incrivelmente baixos. E abre-se o questionamento de até que ponto a lei de fato deve ser alterada ou até que ponto as entidades devem mudar os seus conceitos.
No início desta monografia, o meu objetivo era dissertar acerca dos principais pontos da responsabilidade civil nos esportes amadores e olímpicos, ou dos esportes profissionais e não profissionais.
Conforme exposto, há a constante necessidade de criação de normas que possam regulamentar melhor, ou até mesmo de forma mais objetiva acerca da diferenciação do esporte amador, para o esporte profissional, sendo que em diversas circunstâncias os esportes amadores são práticas efetivamente profissionais.
A Lei Pelé é de extrema importância para poder viabilizar o direito esportivo aos atletas que, por muitas vezes, em gerações e épocas, foi escasso. A base da legislação esportiva é a Lei Trabalhista, adequando-se a medida à realidade do jogador de futebol e muitas vezes deixando de lado as outras modalidades também existentes. A adaptação dessa Lei se deve à rotina intensa de treinamentos e campeonatos, sendo impossível à Consolidação das Leis do Trabalho regerem de forma total os desportos existentes.
Além disso, ela traz os princípios fundamentais do esporte, o funcionamento do Sistema Brasileiro de Desporto, a disciplina, e até o doping.
Mesmo com legislação própria para o Direito Desportivo, vale destacar que o mesmo acaba sendo subsidiado por um conjunto de diversas áreas do direito, seja direito civil, direito empresarial, direito internacional, direito administrativo, como também recorrer a Constituição Federal, a CLT, como também todos os princípios citados no decorrer da monografia, tendo o Direito Desportivo presente em diversas áreas do Direito.
Desta forma, o registro desportivo, o contrato sem gerar vínculo empregatício do atleta menor de idade, realizado por um clube, pode ocorrer a partir dos 12 anos de idade e muitos atletas não sabem disso, ficando suscetíveis a falhas no quesito de responsabilidade civil das entidades com estes atletas.
Todo atleta, sendo profissional ou não, estará sempre suscetível a lesões e falhas mecânicas do corpo, e cabe à Lei ajustar-se para resguardar os direitos daqueles que o sofrem, conforme os avanços tecnológicos para se evitarem este tipo de situação também vem se desenvolvendo. Efetivamente, trará mais segurança àqueles que fazem do esporte um estilo de vida.
REFERÊNCIAS
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DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, 39ª ed. 2022.
TARTUCE, Flávio. Manual do Direito Civil. 9a Ed. São Paulo. Ed. Método 2019, p. 422.
SHREIBER, Anderson. Novos paradigmas da responsabilidade civil: da erosão dos filtros da reparação à diluição dos danos. 5. Ed. São Paulo: Atlas, 2013.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. 2002, p.524.
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, 1994, vol. 7, p.48[i].
DIREITO DESPORTIVO. Blog Maria Pessoa. Você sabe o que é a Lei Pelé? .2019. Disponível em: < https://blog.advocaciamariapessoa.com.br/voce-sabe-o-que-e-a-lei-pele-entenda/ > Acesso em: 4 setembro 2022.
ESCOLA, Equipe Brasil. “Lei Pelé”; Brasil Escola. Disponível em: <https://brasilescola.uol.com.br/educacao-fisica/lei-pele.htm> Acesso em 7 de setembro de 2022.
DIREITO DESPORTIVO, Blog Maria Pessoa. Os Direitos de um Atleta Lesionado. Disponível em <https://blog.advocaciamariapessoa.com.br/entenda-os-direitos-de-um-atleta-lesionado/> Acesso em 7 de setembro de 2022.
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JUSTIÇA DESPORTIVA, Blog Unyleya, Justiça Desportiva: você sabe como ela funciona? Disponível em: <https://blog.unyleya.edu.br/vox-juridica/justica-desportiva/> Acesso em 8 de setembro de 2022.
SENADO NACIONAL, Senado Notícias, Lei do Clube Empresa. Disponível em: <https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2021/08/09/lei-do-clube-empresa-e-sancionada#:~:text=O%20presidente%20Jair%20Bolsonaro%20sancionou,jur%C3%ADdicas%20e%20fundos%20de%20investimento> Acesso em 11 de setembro de 2022.
CNN/BRASIL, Cnn, Transformação no futebol: entenda como funcionam os clube-empresa no Brasil. Disponível em: <https://www.cnnbrasil.com.br/business/transformacao-no-futebol-entenda-como-funcionam-os-clubes-empresa-no-brasil/> Acesso em 11 de setembro de 2022.
ISTOÉ, Istoé dinheiro, Entenda o que muda no futebol com a nova lei do clube-empresa. Disponível em: <https://www.istoedinheiro.com.br/entenda-o-que-muda-no-futebol-com-a-nova-lei-do-clube-empresa/> Acesso em 12 de setembro de 2022.
RESPONSABILIDADE CIVIL NO DIREITO BRASILEIRO, Aurum, A Responsabilidade Civil no Direito Brasileiro. Disponível em: <https://www.aurum.com.br/blog/responsabilidade-civil/
https://www.emerj.tjrj.jus.br/revistaemerj_online/edicoes/revista24/revista24_31.pdf > Acesso em 12 de setembro de 2022.
RESPONSABILIDADE CIVIL, Direito net, Responsabilidade Civil no Novo Código Civil. Disponível em: <https://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/935/Responsabilidade-Civil-no-Novo-Codigo-Civil > Acesso em 4 de setembro de 2022.
RESPONSABILIDADE CIVIL, Jusbrasil, Resumo doutrinário e principais apontamentos.Disponível em:<https://marcusmariot.jusbrasil.com.br/artigos/405788006/responsabilidade-civil-resumo-doutrinario-e-principais-apontamentos> Acesso em 4 de setembro de 2022.
RESPONSABILIDADE CIVIL, IDP blog, Responsabilidade Civil: o que é e quais os tipos? Disponível em: <https://direito.idp.edu.br/blog/direito-civil/responsabilidade-civil/> Acesso em 4 de setembro de 2022.
DIREITO CIVIL, Conteúdo Jurídico, Responsabilidade Civil. Disponível em: < https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/29679/responsabilidade-civil
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9615consol.htm > Acesso em 7 de setembro de 2022.
DIREITO TRABALHISTA, Guia trabalhista, Atleta profissional - características do contrato de trabalho. Disponível em: <http://www.guiatrabalhista.com.br/guia/atleta.htm> Acesso em 17 de setembro 2022.
DIREITO DESPORTIVO, Migalhas, Diferenças entre atleta profissional e atleta não-profissional. Disponível em: <https://www.migalhas.com.br/depeso/24663/diferencas-entre-atleta-profissional-e-atleta-nao-profissional > Acesso em 17 de setembro de 2022.
NOTAS:
[1] TARTUCE, Flávio. Manual do Direito Civil. 9a Ed. São Paulo. Ed. Método 2019, p. 422
Ramos Vanderlei. Programa de Responsabilidade Civil, ED. Atlas, 2008, p.2
[2] DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, 1994, vol. 7, p.48
[3] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. 2002, p.524
[5] SHREIBER, Anderson. Novos paradigmas da responsabilidade civil: da erosão dos filtros da reparação à diluição dos danos. 5. Ed. São Paulo: Atlas, 2013.
Bacharel em Direito pela Universidade Paulista - UNIP.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: COELHO, Natália Tavares Fernandes. A responsabilidade civil nos esportes amadores ou olímpicos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 jan 2023, 04:23. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/60877/a-responsabilidade-civil-nos-esportes-amadores-ou-olmpicos. Acesso em: 23 dez 2024.
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