RESUMO: A pesquisa pautada no estudo das licitações verdes se ateve a responder quais as balizas interpretativas desse instituto e se, por meio deste, as compras públicas brasileiras seriam capazes de fomentar efeitos horizontais (ou secundários) em nichos específicos, tais como o econômico, social, ético e ambiental. Por meio do método hipotético-dedutivo foram testadas duas hipóteses, a qual uma delas atestou ser possível a concretização dos efeitos horizontais, considerando o desenvolvimento nacional sustentável como função mediata a ser perseguida, tendo a licitação os meios necessários para garantir esse desenvolvimento. Em que pese a problemática voltada aos perigos da subjetividade administrativa, capaz de ensejar desvirtuamentos que comprometam a lisura dos certames licitatórios, a pesquisa aqui divisada apontou saídas voltadas à transparência e ao controle (interno e externo), que permitem a utilização do critério sustentável em todas as suas dimensões, sem que isso comprometa os demais princípios que norteiam a licitação.
Palavras-chave: Licitações. Meio ambiente. Sustentabilidade. Administração Pública.
ABSTRACT: The research, which was based on the study of green bids, had the purpose of answering which are the interpretative goals of this institute and whether, through this, Brazilian public procurement would be able to foster horizontal (or secondary) effects in specific niches, such as economic, social, ethical and environmental. Using the hypothetical-deductive method, two hypotheses were tested, one of which proved that it was possible to achieve horizontal effects, considering sustainable national development as a mediatum function to be pursued, taking into account that the bidding has the necessary means to ensure this development. Concerning the problems related to the dangers of administrative subjectivity, capable of giving rise to distortions that compromise the fairness of bidding contests, the present research pointed out solutions aimed at transparency and control (internal and external), which allow the use of sustainable criteria in all its dimensions, without compromising other principles that guide the bidding.
Keywords: Bidding. Environment. Sustainability. Public Administration.
SUMÁRIO: INTRODUÇÃO. 1. A TUTELA CONSTITUCIONAL DO MEIO AMBIENTE. 1.1 MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO COMO DIREITO FUNDAMENTAL DA PESSOA HUMANA. 1.2 ESCOLAS DE PENSAMENTO AMBIENTAL. 1.3 O MEIO AMBIENTE NO PLANO INTERNACIONAL. 2. O ESTADO E AS POLÍTICAS PÚBLICAS DE CARÁTER AMBIENTAL. 2.1 DEVERES GENÉRICOS E ESPECÍFICOS DO ESTADO. 2.2 O PAPEL DO ESTADO NA PROMOÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS. 2.3 POLÍTICAS PÚBLICAS SUSTENTÁVEIS. 3. LICITAÇÕES SUSTENTÁVEIS. 3.1 O CONCEITO DE LICITAÇÃO SOB NOVOS CONTORNOS. 3.2 FUNÇÃO SOCIAL DA LICITAÇÃO. 3.2.1. Finalidade legal do procedimento licitatório. 3.2.2. Finalidade material do procedimento licitatório. 3.3 DIMENSÕES DA SUSTENTABILIDADE. 3.4 TRANSPARÊNCIA E CONTROLE COMO MEDIDAS DE SUPLANTAÇÃO DOS DESAFIOS. CONSIDERAÇÕES FINAIS. REFERÊNCIAS.
INTRODUÇÃO
As compras governamentais movimentam cerca de 10 a 15% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional. Avalia-se, nesse contexto, que as decisões de compras públicas envolvem variados nichos cujas dimensões abrangem o social, o econômico, o ambiental, o ético, entre outros.
Toda essa hegemonia do poder aquisitivo estatal, se bem utilizada, serve de força propulsora à concretização de uma gama de objetivos constitucionais, com vistas a garantir a promoção de políticas ambientais, sociais, éticas e econômicas, que seriam os efeitos mediatos, ou horizontais, dessas constatações.
Desse modo, em 2010 a Lei 12.349 inseriu o desenvolvimento nacional sustentável na Lei Geral de Licitações (8.666/93) como uma finalidade mediata obrigatória ser alcançada, inovação legislativa que fez surgir a figura das Licitações Verdes, que têm o intuito precípuo de se valer desse poder de compra estatal com o objetivo de propiciar uma postura sustentável das empresas, que, consubstanciadas nesse critério, deverão adotar medidas que propiciem uma adequação aos fins pretendidos pelo setor público, adequando-se aos requisitos exigidos (BARCESSAT, 2015).
À vista disso, diante das inclinações e desafios que circundam a aplicação do desenvolvimento sustentável como função cardeal da licitação, bem como a realidade das compras públicas nacionais o presente trabalho visa analisar quais seriam as balizas interpretativas para a correta aplicação do instituto e qual o alcance dos seus efeitos horizontais, ou mediatos.
Objetivando tal mister, optou-se pela utilização de preceitos que permitissem a observação e experimentação, corolários do método hipotético-dedutivo, visando fixar hipóteses explicativas que foram testadas a fim de identificar as dificuldades do problema, falseando uma delas de modo que a partir daí o raciocínio fosse organizado de forma dedutiva.
O primeiro capítulo se ateve a delimitar o panorama histórico e jurídico da crise ambiental no Brasil, perpassando por todo o histórico institucional de importantes atores na luta pelo meio ambiente, preocupando-se com a busca das bases históricas que levaram à adoção do desenvolvimento nacional sustentável como função precípua da licitação.
O segundo capítulo buscou caracterizar a hegemonia das compras públicas como veículo propulsor da concreção de objetivos constitucionalmente estabelecidos (efeitos mediatos). Para tanto, discorreu-se acerca da figura do Estado enquanto promotor de políticas públicas, delineadas sob a conceituação dos seus deveres genéricos e específicos.
O terceiro e último capítulo, por fim, estabeleceu os limites interpretativos da promoção ao desenvolvimento nacional sustentável, os mecanismos necessários à sua implementação e os impactos sobre a lei de licitações. Oportunamente, restaram delimitados quais seriam os efeitos horizontais advindos da Licitação Verde dentro de contextos éticos, sociais, ambientais e econômicos.
Em termos práticos, a proposta se ateve a uma análise da inovação legislativa que inseriu a figura do desenvolvimento nacional sustentável como um objetivo a ser perseguido pelas compras públicas, objetivando a compreensão deste fenômeno, bem como a sua aplicação como um mecanismo autônomo, mas interdependente em relação aos princípios constitucionalmente estabelecidos.
À vista disso, consubstanciada em uma pesquisa bibliográfica, a abordagem hipotético-dedutiva permitiu aferir a obrigação de licitar e seus princípios originalmente estabelecidos, sob um enfoque analítico acerca da inovação legislativa que conferiu base legal ao princípio da sustentabilidade, atrelando-o ao dever de licitar, suas dificuldades e quais paradigmas o orientam, momento em que se definiu qual das hipóteses preestabelecidas é válida e aplicável, dentro das reflexões tecidas.
1. A TUTELA CONSTITUCIONAL DO MEIO AMBIENTE
1.1 MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO COMO DIREITO FUNDAMENTAL DA PESSOA HUMANA
À medida que a humanidade foi se estabelecendo e gradualmente aumentando seu nível de intervenção na natureza, como objetivo de satisfazer suas crescentes demandas, algumas questões pragmáticas evidenciaram o conflito existente entre a lógica pautada na vinculação da qualidade de vida ao consumo, diante da finitude dos recursos naturais.
Diante disso, fosse em torno de questões locais, ou consequências de âmbito global, aos poucos a questão foi sendo sobrepujada pelos países desenvolvidos ou em ascensão, o que conferiu visibilidade à temática ambiental.
O aprofundamento de questões interligadas à instabilidade ecológica muito se deve aos anos em que o meio no qual vivemos era visto sob uma ótica estritamente antropocêntrica, na qual a ideia de bem-estar social não era capaz de coexistir com a preservação da natureza, sendo vista como uma espécie de óbice ao progresso socioeconômico.
Esse olhar voltado para o homem e ao seu bem-estar, indiferente à realidade da limitação dos recursos naturais, vincou de forma contundente o equilíbrio ambiental e perpetuou uma visão simplória que acarretou décadas de consumo irracional, comprometendo o bem-estar das gerações futuras, tratando-se, portanto, de uma “degradação intergeracional” (BENJAMIN, 1998, p. 94).
Ao inaugurar os estudos acerca das gerações dos direitos fundamentais da pessoa humana, Karel Vasak (1979) dividiu-os em direitos de liberdade, abrangendo as faculdades sociais e políticas (primeira geração), em direitos de igualdade, que estariam atrelados a aspectos sociais, culturais e econômicos (segunda geração), e em direitos de fraternidade, os quais ainda estariam em pleno desenvolvimento, e dizem respeito, sobretudo, à paz e ao meio ambiente (terceira geração).
Acerca da terminologia, há quem critique a ideia de gerações de direitos, posto que pode transmitir uma ideia de mútua exclusão, o que aparenta equívoco. Os direitos fundamentais conquistados não foram sendo suplantados à medida que novos direitos foram surgindo. Pensar dessa maneira, evidencia um criticismo simplório que vai de encontro com a importância da tessitura dos direitos fundamentais ao longo dos anos. (LIQUIDATO, 2018).
“The first wave, which accompanied the French revolution, gave rise to the generation of civil and political rights. With the second wave, after the Russian revolution of 1917, economic, social and cultural rights gained universal recognition. The third wave accompanied ‘the emancipation of colonised and dominated peoples’ in the middle of the 20th century.”(VASAK apud MACKLEM, 2015, p. 02)[1]
Trata-se, portanto, de uma construção gradativa de direitos que foram sendo conquistados, mas que não se anulam. Estes são, em sua maioria, considerados uma construção histórica, foram sendo gradualmente conquistados por meio de legítimas reivindicações e incorporados pelos cidadãos (BOBBIO, 1992).
Se, outrora, era requerido que o Estado mantivesse postura absenteísta, a fim de que as liberdades individuais fossem resguardadas, num segundo momento, buscava-se uma postura proativa, inaugurando um novo cenário de atuação estatal. Estaria, aqui, sendo estabelecidas dimensões de direitos com abrangências distintas, mas não sucessivas.
Em contrapartida, ao colocar a ideia de dimensões dos direitos fundamentais em termos analíticos, Macklem (2015) os destacam como uma sequência conceitual e gradativa que não foi alcançada de forma absoluta em todos os lugares e por todos os povos. Embora enquanto reconhecidos não deixem de coexistir em razão dos avanços em alguns segmentos do reconhecimento da dignidade da pessoa humana.
Para o autor, a noção de dimensões uniformes é uma utopia, posto que, em que pese os consideráveis avanços no decorrer da história, ainda não se tratam de direitos plenos.
“Civil and political rights can be thought of as conceptually prior to, and therefore belonging to a generation ‘older than’, social and economic rights. This is because civil and political rights establish the legal and political standing of those entitled to exercise and enjoy social and economic rights. And the protection of both sets of rights is necessary to the effective enjoyment of a third generation of human rights, such as the right of self-determination. If one is not vested with civil, political, social and economic rights, then one cannot be said to be capable of freely determining one’s political status and freely pursuing one’s economic, social and cultural development.” (MACKLEM, 2015, p. 14).[2]
Embora consubstancie uma tarefa constante, a ampliação da luta por novos direitos não deve ser vista como um intimidador dos ganhos já somados. Não se trata, na verdade, de direitos sobrepostos de uma maneira sucessiva, mas do alargamento e consolidação de direitos humanos já conquistados, evidenciando uma “natureza complementar” de todos os direitos humanos (PIOVESAN, 2006, p. 31).
Os direitos de terceira dimensão (direitos da fraternidade ou da solidariedade) emergem a partir de reflexões sobre temas referentes ao desenvolvimento, à paz, ao meio ambiente, à comunicação e ao patrimônio comum da humanidade, cristalizando-se no fim do século XX. Não se destinam especificamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de um grupo ou de um determinado Estado, tendo por destinatário o próprio gênero humano (AMOY, s/d, 4553-4554).
Nesse sentido, à vista do reconhecimento do meio ambiente como um direito de terceira dimensão, Fensterseifer (2008) utiliza a terminologia “Estado Socioambiental de Direitos” como sendo a que melhor se adequa a esse novo posicionamento estatal – que continua sendo também democrático e constitucional – mas que, ao adentrar na seara dos direitos transindividuais, encontra na proteção ambiental a sua maior representação.
No caso do Brasil, antes da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, nenhuma outra havia se preocupado em positivar a tutela ao meio ambiente, ficando a matéria relegada até a movimentação institucional que ensejou o debate realizado pela primeira conferência da Organização das Nações Unidas na década de 70, cujos resultados despertaram os atores estatais para a preservação dos recursos naturais.
A primeira Constituição a trabalhar de forma mais minuciosa a questão ambiental foi a de 1988, e, indo além, indiretamente assentiu a indissociabilidade entre a preservação de um meio ecologicamente equilibrado e a preservação da espécie humana (SILVA, 2007, p.46).
Para a doutrina, esse posicionamento se deve ao esclarecimento alcançado de que “[…] o direito à vida, como matriz de todos os demais direitos fundamentais do homem, é que há de orientar todas as formas de atuação no campo da tutela do meio ambiente” (SILVA, 2007, p.70).
No que se refere à topologia do direito a um meio ecologicamente equilibrado, trazido como uma inovação do poder constituinte, frente aos direitos fundamentais previstos no artigo 5º, a Constituição de 1988, ao adotar compreensão material, sedimentou a noção de que a fundamentalidade de um direito não se esgota no texto constitucional, desde que este esteja assentado dentro dos seus limites materiais.
Trata-se da chamada cláusula aberta aos direitos fundamentais, que se depreende da leitura do §2º do aludido artigo, que pressupõe a possibilidade de expressão de outros direitos e garantias previstos, além daqueles previstos na Constituição: “[…] decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte” (BRASIL, 1988).
Essa abertura de cláusulas constitucionais não foi uma total novidade na constituição de 1988, porquanto já estava presente nas constituições de 1891 (Art. 78), de 1934 (Art. 114), sofreu considerável limitação na constituição de 1937[3], posteriormente foi suprimida e a cláusula voltou a ser prevista na Constituição de 1946 (Art. 144) e na Constituição de 1967 (Art. 150, §35).
Em razão disto, Sarlet (2011b, p.80), ao abordar a questão, prioriza o caráter material desses direitos em detrimento do caráter formal, corroborando a ideia de que existem direitos que em razão do seu comando principal fazem parte do “corpo fundamental da Constituição”. Podendo, portanto, existir direitos cuja fundamentalidade seja latente, embora se encontrem fora do corpo da constitucional (MELO; BONATO, 2017, p. 282).
Portanto, embora, para alguns, o direito ao meio ecologicamente equilibrado esteja topologicamente fora do título que trata dos direitos fundamentais, sua essência decorre dos princípios adotados pela Constituição da República de 1988 que, em razão da cláusula aberta dos direitos fundamentais, comporta tratados internacionais[4] dos quais o Brasil é signatário. Afirmação no sentido de corroborar esse entendimento encontra, portanto, guarida no próprio texto constitucional e fora dele.
Há quem sustente, também, que a mera previsão do direito de ação popular em face de lesão ao meio ambiente no artigo 5º, inciso LXXIII, ensejaria a sua inserção no rol de direitos previstos no Título II – que trata especificamente dos direitos e garantias fundamentais.
Ora, se é uma garantia fundamental do cidadão a existência de uma ação constitucional com a finalidade de defesa do meio ambiente, tal fato ocorre em razão de que o direito ao desfrute das condições saudáveis do meio ambiente é, efetivamente, um direito fundamental do ser humano. (ANTUNES apud AMOY, s/d, p. 4556).
Influenciado por estas questões, o Supremo Tribunal Federal passou a reconhecer a transindividualidade do direito ao meio ecologicamente equilibrado. Em outubro de 1995, no julgamento do Mandado de Segurança 22.164, o Ministro Relator Celso de Mello, de forma inaugural, prolatou voto que reconheceu o meio ambiente como um direito social de terceira dimensão.
O direito à integridade do meio ambiente – típico direito de terceira geração – constitui prerrogativa jurídica de titularidade coletiva, refletindo, dentro do processo de afirmação dos direitos humanos, a expressão significativa de um poder atribuído, não ao indivíduo identificado em sua singularidade, mas, num sentido verdadeiramente mais abrangente, à própria coletividade social. Enquanto os direitos de primeira geração (direitos civis e políticos) – que compreendem as liberdades clássicas, negativas ou formais – realçam o princípio da liberdade e os direitos de segunda geração (direitos econômicos, sociais e culturais) – que se identificam com as liberdades positivas, reais ou concretas – acentuam o princípio da igualdade, os direitos de terceira geração, que materializam poderes de titularidade coletiva atribuídos genericamente a todas as formações sociais, consagram o princípio da solidariedade e constituem um momento importante no processo de desenvolvimento, expansão e reconhecimento dos direitos humanos, caracterizados, enquanto valores fundamentais indisponíveis, pela nota de uma essencial inexauribilidade. [MS 22.164, rel. min. Celso de Mello, j. 30-10-1995, P, DJ de17-11-1995.] (Grifo Nosso)
Nesse sentido, leciona Silva (2007, p.178):
No qualificativo fundamentais acha-se a indicação de que se trata de situações jurídicas sem as quais a pessoa humana não se realiza, não convive e, às vezes, nem mesmo sobrevive; fundamentais do homem no sentido de que a todos, por igual, devem ser, não apenas formalmente reconhecidos, mas concreta e materialmente efetivados.
Desta feita, a conceituação do meio ambiente da forma que vem sendo construída no decorrer dos anos, preceitua que este, por si só, abrange a totalidade dos requisitos necessários para que o seja enquadrado como direito fundamental, porquanto indispensável, não apenas para a vida com qualidade, mas indispensável à consecução da vida por sua própria natureza.
1.2 ESCOLAS DE PENSAMENTO AMBIENTAL
Didaticamente falando, a legislação ambiental brasileira passou por três modelos distintos de tutela que, embora não totalmente delimitados e mutuamente excludentes, possuíam características próprias que estavam diretamente atreladas aos interesses econômicos, sociais e filosóficos de cada época, e muitos vigoram até hoje.
São estilos legislativos que encontram na interpenetração sua marca, desenhando modelos legais que convivem, lado a lado – o que não quer dizer harmonicamente –, não obstante suas diversas filiações históricas ou filosóficas, o que, em certa medida, amplia a complexidade da interpretação e implementação dos textos normativos em vigor. (BENJAMIN, 1998, p. 97)
Ultrapassado o primeiro modelo de completa omissão normativa, marcado pela exploração desregrada, as atenções conservadoristas se voltaram para nichos econômicos específicos – o que ainda estava longe de caracterizar uma proteção ao meio ambiente como um todo – mas visava conservar determinadas fontes de matérias a fim de retroalimentar segmentos econômicos que começaram a apresentar deficiências em razão da limitação de recursos.
Essa visão utilitarista do meio ambiente foi reafirmada quando as primeiras legislações se inauguraram aqui no Brasil, a exemplo do Código de Caça (Lei n. 5.197/67), Código de Pesca (Decreto-Lei n. 221/67), Código de Mineração (Decreto-Lei n. 227/67), Lei da Responsabilidade por Danos Nucleares (Lei n. 6.453/77) e Lei de Agrotóxicos (Lei n. 7.802/89).
O que se viu, foi uma espécie de “fatiamento do meio ambiente”, porquanto este ainda carecia de identidade jurídica própria, que o estabelecesse como um sujeito de direito uno e indivisível (BENJAMIN, 1998, p. 98), passível de uma tutela que ultrapassasse a noção de proteção do todo por intermédio das partes, mas, de forma inversa, que a proteção das partes fosse alcançada por intermédio da proteção do todo.
Logo, a visão antropocêntrica, na qual o homem seria a principal fonte de valor e significado no mundo, e que a natureza não humana aí está com o único propósito de servir aos homens, cedeu, timidamente, espaço às discussões acerca da proteção dos recursos naturais existentes, mas ainda demonstrava todos os desafios iniciais que impediam uma concepção holística do meio ambiente (BENJAMIN, 2007).
Foi nesse cenário que emergiu a figura do antropocentrismo alargado – ou mitigado – que, mesmo centrando as discussões no bem ambiental, de modo que a preservação ambiental passasse a ser uma garantia do próprio ser humano, e não uma visão estritamente econômica (LEITE, 2010).
À vista disso, superada essa fase fragmentária das legislações ambientais, foi inaugurada a fase holística. Nesta, o meio ambiente termina por ser protegido de forma ampla e visto como um todo inteiriço, não podendo ser destinatário de uma tutela fracionada (BENJAMIN, 1998).
Ao contrário do Pachamama, que trata a natureza e seus atributos como sujeitos de direito, no Brasil, o protecionismo do meio ambiente emergiu de forma estritamente atrelada ao utilitarismo. De modo que a concessão de proteção ao meio ambiente se dava na medida em que o ente ou atributo protegido fosse útil ao homem e à sociedade.
Na cultura andina, a Pachamama representa a deusa feminina que produz e que cria; algo que transcende o conceito simplista de meio ambiente, mas uma entidade dotada de espiritualidade por meio da qual tudo é criado. Pacha é entendido como universo, e mama traduzido como mãe. O que evidencia, portanto, uma representação divina da natureza que, sob a ótica legal, goza o status de sujeito de direitos, e não apenas um conjunto de fatores químicos, biológicos, espaciais e temporais protegidos por ser útil ao homem. (TOLENTINO; OLIVEIRA, 2015).
Foi nesse contexto que a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei n. 6.938/81) inaugurou a proteção ao meio ambiente propriamente dita e, consequentemente, houve a sua constitucionalização como bem jurídico passível de tutela. Este despertar para uma lucidez ambiental, passou a simbolizar uma nova perspectiva e inaugurou a busca incessante de alguns setores por alternativas que amenizassem o desequilíbrio ambiental recém constatado.
Embora, num primeiro momento, as políticas voltadas à tutela ambiental tenham sido desenvolvidas sob uma égide utilitarista, com um forte caráter comercial, o direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado foi sendo paulatinamente construído e sendo internalizado nos ordenamentos jurídicos, atenuando o caráter puramente antropocêntrico em voga.
A ampliação desse viés antropocêntrico com a inauguração dessa fase holística, afirmou a percepção de autonomia do meio ambiente com o pressuposto para a própria sobrevivência humana. O meio ambiente não seria, aqui, mero aparato para a consecução de riquezas, mas elemento indispensável à vida digna e ao equilíbrio dos recursos necessários a esse fim.
1.3 O MEIO AMBIENTE NO PLANO INTERNACIONAL
No panorama mundial, ainda no início da década de 1970, um grupo de pesquisadores do Massachusetts Institute of Thecnology (MIT), em conjunto com o Grupo de Roma, formado por influentes personalidades de grupos econômicos, importantes cientistas e diplomatas, sob a liderança de Dennis L. Meadows, desenvolveram um estudo acerca dos limites da exploração dos recursos naturais, intitulado Limites do Crescimento. Os resultados dessa pesquisa causaram grande repercussão durante a Conferência de Estocolmo, realizada em 1972 na Suécia (MOURA, 2016).
Considerada o primeiro evento da Organização das Nações Unidas (ONU) para tratar da proteção ambiental, a Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento e Meio Ambiente Humano em Estocolmo, ocorrida entre os dias 5 a 16 de junho de 1972, reuniu representantes de mais de 100 países.
Como resultado dos debates ali desenvolvidos, ao final do evento foi publicada a Declaração de Estocolmo[5], na qual foram firmados 26 princípios que representaram o ponto de partida da mobilização em prol do meio ambiente, bem simbolizados na transcrição do primeiro princípio.
“Princípio 1 O homem tem o direito fundamental à liberdade, à igualdade e ao desfrute de condições de vida adequadas em um meio ambiente de qualidade tal que lhe permita levar uma vida digna e gozar de bem estar, tendo a solene obrigação de proteger e melhorar o meio ambiente para as gerações presentes e futuras. A este respeito, as políticas que promovem ou perpetuam o apartheid, a segregação racial, a discriminação, a opressão colonial e outras formas de opressão e de dominação estrangeira são condenadas e devem ser eliminadas.” (Conferência de Estocolmo, 1972, p. 03).
Na década seguinte, retomados os debates ambientais, a ONU subsidiou a criação de uma Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD), chefiada pela então primeira-ministra da Noruega, Gro Harlem Brundtland. Como produto dos estudos desenvolvidos pela comissão, formulou-se o documento intitulado Our Common Future[6] ou Relatório de Brundtland.
Este ficou mundialmente conhecido por cunhar o conceito inicial de desenvolvimento sustentável, sendo definido como aquele no qual as necessidades atuais são supridas, sem, contudo, aniquilar a perspectiva das gerações vindouras de “atenderem a suas próprias necessidades” (CMMAD, 1991, p.46).
Concomitantemente, no Brasil, uma Frente Verde impulsionava ainda mais a consolidação de uma consciência ambiental (MOURA, 2016), desta vez, por parte do poder constituinte, que culminou na inclusão de um capítulo especificamente destinado ao meio ambiente na Constituição da República de 1988, já explanado em momento anterior. Noção posteriormente estendida às legislações infraconstitucionais, como, por exemplo, a Lei 8.666/1993, que normatiza as contratações públicas.
Tratava-se, então, da nítida inserção do antropocentrismo mitigado no ordenamento jurídico pátrio, que se firmou na figura do direito a um meio ecologicamente equilibrado previsto no artigo 225, da Constituição da República.
No entanto, para Freitas (2019), a sustentabilidade conforme prevista no Relatório Brundtland e discutida até então, é limitada e precisa ser considerada de maneira mais ampla, vinculada, também, ao “bem-estar físico e psíquico”, e não apenas a necessidades exclusivamente materiais, conceitos que serão mais bem trabalhados em capítulo específico.
Acrescente-se: sustentável é o desenvolvimento que insere todos seres vivos, de algum modo, no futuro comum, evitando o apego excessivo a determinado padrão material de vida. Quer dizer, considerar a satisfação das necessidades das gerações atuais e futuras foi e é relevante, contudo diz pouco sobre o caráter multidimensional da sustentabilidade (FREITAS, 2019, p. 52).
Nessa conjuntura, em 1992 foi realizada no Rio de Janeiro a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD) - Rio-92. Na ocasião, foram firmados quatro importantes acordos, cujos reflexos foram fundamentais à persecução de políticas voltadas à proteção do meio ambiente: a) Convenções do Clima e da Biodiversidade; b) Agenda 21; c) Declaração do Rio para o Meio Ambiente e Desenvolvimento; e d) Declaração de Princípios para as Florestas.
Embora a Agenda 21 Global tenha feito parte dos acordos firmados em 1992 durante a Conferência, o lançamento da Agenda 21 Brasileira se deu somente no ano de 2002, resultado de uma consulta realizada junto à população a fim de alcançar um planejamento participativo para o desenvolvimento sustentável (BRASIL, 2019)[7].
De acordo com Moura (2016), para o desenvolvimento da Agenda 21 no âmbito nacional, foram realizados estudos voltados para a gestão de cidades sustentáveis, redução das desigualdades sociais, agricultura sustentável, gerenciamento de recursos naturais, ciência e tecnologia para o desenvolvimento sustentável e infraestrutura e integração regional. Cada uma dessas áreas consideradas de fundamental importância ao desenvolvimento nacional de maneira sustentável.
No ano de 2002, com o intuito de aferir se os acordos firmados em 1992 estavam sendo implementados, foi realizada a Rio+10 (Conferência sobre Desenvolvimento Sustentável), sediada em Joanesburgo na Alemanha.
De acordo com o relatório especial elaborado pela Câmara dos Deputados (O Plano de Ação de Joanesburgo), a Conferência tinha por objetivo “fortalecer o compromisso de todas as partes com os acordos aprovados anteriormente (especialmente em relação à Agenda 21, assinada em 1992 na Conferência do Rio) ” e analisar as novas prioridades surgidas desde então (BRASIL, 2002).
Em 2012, novamente no Rio de Janeiro, foi realizada a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (CNUDS), comumente chamada de Rio+20.
Na ocasião, foram relembrados os princípios basilares estabelecidos na Conferência de Estocolmo, considerados como o marco inicial da causa ambiental, e afirmados novos objetivos, como o de assegurar a renovação do compromisso político-governamental para o desenvolvimento sustentável, mensurar as lacunas e os avanços encontrados nos processos de implementação das principais decisões quanto ao desenvolvimento sustentável, além de identificar desafios novos e emergentes (MOURA, 2016).
Embora a Rio+20 tenha ficado aquém dos resultados esperados, muito em razão da conjuntura política mundial da época, ela foi próspera no sentido de assegurar relevantes orientações que deram abertura para a reivindicação de transformações atreladas à promoção da economia verde.
Ao analisar o documento base aprovado na Conferência, intitulado The Future We Want, Dowbor (2012) afirma que o único consenso ou “mínimo denominador comum” que pôde ser alcançado entre os países signatários do acordo, encontra respaldo “na busca da economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável e erradicação da pobreza”.
Na ocasião, foi apresentado o Documento de Contribuição Brasileira à Conferência Rio+20, que, em cinco capítulos, expôs os desafios novos e emergentes enfrentados pelo desenvolvimento sustentável, a economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável e da erradicação da pobreza, a estrutura institucional do desenvolvimento sustentável, e, por último, apresentou as propostas brasileiras para a Rio+20, que incluíram, dentre outros, as compras públicas sustentáveis como um dos objetivos do pacto global para produção e consumo sustentáveis.
Desta feita, embora o cenário de crise econômica e restrições fiscais constituam uma realidade, é de extrema importância que o Estado assuma seu protagonismo como “indutor e regulador do desenvolvimento”, e, para tanto, barreiras deveriam ser removidas e incentivos positivos criados, tudo por intermédio de instrumentos econômicos e políticas públicas “que facilitem a adesão do setor produtivo a padrões mais sustentáveis sob as óticas econômica, ambiental e social” (CNUDS, 2011, p. 12).
A Rio-92, que havia se pautado no indissociável tripé (ambiental, social e econômico), conseguiu consolidar objetivos contundentes que, teoricamente, seriam trabalhados no decorrer dos anos que se seguiriam. Isso demonstrou que os Governos ao redor do mundo sabem, sim, para onde devem ir. No entanto, vinte anos depois, o desafio apresentado pela Rio+20 era mais amplo em alguns aspectos. (DOWBOR, 2012, on-line).
Embora o caminho a seguir já fosse conhecido e bem delineado, diante dos empecilhos encontrados na concretização das políticas desenhadas, um quarto elemento precisou ser considerado: a governança[8].
O governo geralmente é um ator crucial na governança (embora em alguns casos seja secundário e até mesmo ausente). Para que haja uma governança envolvendo as diversas forças de uma sociedade, é imperativo que haja condições políticas para a expressão dos diversos interesses envolvidos, dentro de um quadro em que não prevaleçam os interesses de uns em detrimento dos de outros, de forma injusta e não pactuada. Tais condições, em que os governos democráticos têm papel determinante, representam a governabilidade (BURSZTYN; BURSZTYN, 2012, p. 160).
Esta se materializa na razoabilidade do consenso acerca da necessidade de “uma sociedade viável, socialmente justa e ambientalmente sustentável” não opera de forma independente e dissociada da política, embutida no quarto pilar apresentado, porquanto somente a criação de uma estrutura política-institucional bem posicionada, poderá preencher as lacunas sobre como e quando serão tomadas as decisões, de onde virão os subsídios, como serão manejados, e de qual forma se dará o controle (DOWBOR, 2012, on-line).
E nesse novo cenário, mecanismos de concreção ainda precisariam ser mais bem trabalhados para que os objetivos traçados no decorrer dos últimos 20 fossem alcançados de forma concreta e linear.
Em 2015, uma Cúpula do Desenvolvimento Sustentável reuniu líderes dos 193 Estados-membros da ONU em Nova York, a fim de discutirem a nova agenda mundial para os próximos anos, haja vista a dinamicidade das necessidades atuais e emergentes que requerem medidas conjuntas.
Na ocasião, temas como a erradicação irreversível da extrema pobreza voltaram à pauta, além do bem-estar coletivo e proteção ao meio ambiente foram debatidos e consubstanciaram a criação da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável.
A Agenda 2030 engloba segmentos variados que, em conjunto, na forma de objetivos, formam a base para o Desenvolvimento Sustentável, cuja abordagem se dará em momento seguinte.
De todo percurso histórico e legislativo, nota-se que as alternativas buscadas foram se ampliando conforme os paradigmas, embora de maneira desproporcional em muitos aspectos.
As políticas protecionistas voltadas para nichos específicos, com fins prioritariamente econômicos, foram forçosamente cedendo espaço para debates cada vez mais amplos, no entanto, estes últimos amparados pela inarredável necessidade de sobrevivência.
Do ponto de vista prático, toda a movimentação institucional realizada até o presente, a tessitura dos relatórios objetos do presente e estudo, bem como a conjuntura mundial evidenciam que não mais se legitima que o progresso político-econômico esteja desassociado das necessidades globais e carecem de políticas sustentáveis, com toda a amplitude que a expressão alberga.
2. O ESTADO E AS POLÍTICAS PÚBLICAS DE CARÁTER AMBIENTAL
2.1 DEVERES GENÉRICOS E ESPECÍFICOS DO ESTADO
Uma vez reconhecidas prestações as quais a sociedade faz jus, o Estado se incumbe de deveres que podem ser classificados, dentre outras terminologias, em deveres genéricos ou específicos.
Ao serem analisados os deveres gerais do Estado, está-se a observar comandos de ordem predominantemente genérica. É o que ocorre quando os correlacionamos, por exemplo, com alguns dos direitos fundamentais, como o direito à vida, à dignidade humana, ao devido processo legal, direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, entre outros.
Percebe-se que são todos comandos abertos, visando um fim específico, mas não satisfatórios em si mesmos, quando se trata de meios adequados e efetivamente hábeis à concreção de tais objetivos.
É aí que exsurge a figura dos deveres específicos que, numa rápida análise, fazem alusão a esses mecanismos indispensáveis à persecução de um objetivo maior.
Quando se fala do status constitucional conferido à proteção do meio ambiente, entende-se que o dever geral de defendê-lo e preservá-lo acaba fragmentado em diversos outros deveres específicos, como uma espécie de instrumentalização do direito fundamental ao meio ambiente. (MILARÉ, 2007)
Para Canotilho (2002) essa constitucionalização do direito fundamental ao meio ambiente suscita a existência de um dever conexo fundamental, ensejando uma espécie de direito-dever cuja responsabilidade é inerente ao Estado. Entendimento este corroborado por Sarlet:
Nesse ponto, é oportuno traçar a distinção entre deveres conexos ou correlatos (aos direitos) e os deveres autônomos. Tal diferença reside justamente no fato de que os últimos não estão relacionados (ao menos diretamente) à conformação de nenhum direito subjetivo, ao passo que os primeiros tomam forma a partir do direito fundamental a que estão atrelados materialmente. O direito fundamental ao ambiente e o direito fundamental à saúde são exemplos típicos de direitos-deveres, o que significa, posto de outra maneira, que os deveres fundamentais de proteção do ambiente e de promoção da saúde estão vinculados de forma direta aos preceitos constitucionais que consagram tais direitos fundamentais, conforme deflui, respectivamente, já do enunciado semântico (literal) dos dispositivos normativos do art. 225, caput, e do art. 196, caput, ambos da CF/1988. (SARLET, 2017, p. 252-253).
Nessa perspectiva, José Afonso da Silva (2007) leciona que o artigo 225, topologicamente posicionado em um capítulo destinado exclusivamente ao meio ambiente, comporta três conjuntos de normas e, explicitaria, dessa forma, os deveres gerais e específicos do Estado.
O primeiro conjunto está acostado ao caput, o qual chamaríamos de norma-princípio ou norma-matriz, e do qual decorre o comando normativo principal. É no caput que se encontra estabelecido o direito ao meio ecologicamente equilibrado propriamente dito (dever geral).
O segundo conjunto de normas pode ser visualizado no §1º e seus incisos e podem ser mencionadas como normas-instrumentos, utilizadas como supedâneo da eficácia do princípio estabelecido.
Não dizem respeito a aspectos formais, mas, assim como estes, constituem meios disponíveis para que o direito previsto no caput se efetive. O emprego de verbos no infinitivo garante aos dispositivos uma conotação de ação, indicando as medidas instrumentais por meio das quais o direito fundamental ao meio ecologicamente equilibrado se garantiria.
I – preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas;
II – preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético;
III – definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;
IV – exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;
V – controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente;
VI – promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente;
VII – proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.
O terceiro e último conjunto, compreendido entre os parágrafos 2º e 6º, comporta os objetos e setores de incidência do princípio estatuído e revelam um aspecto de exigência e urgência, “dado que são elementos sensíveis que requerem imediata proteção e direta regulamentação constitucional, a fim de que sua utilização, necessária talvez ao progresso, se faça sem prejuízo ao meio ambiente” (SILVA, 2007, p. 52).
§ 2º Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei.
§ 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
§ 4º A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.
§ 5º São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por ações discriminatórias, necessárias à proteção dos ecossistemas naturais.
§ 6º As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua localização definida em lei federal, sem o que não poderão ser instaladas.
De forma sistematizada, Milaré (2007) pontua esses deveres específicos extraídos do dispositivo legal como sendo: a) preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais; b) promover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; c) preservar a biodiversidade e controle das entidades de pesquisa e manipulação de material genético; d) definir os espaços territoriais especialmente protegidos; e) realizar estudos prévios de impacto ambiental; f) investir em educação ambiental; e, não menos importante, g) proteger a fauna e a flora.
Outro desdobramento estritamente ligado à perspectiva objetivo-valorativa dos direitos fundamentais é o que se poderia denominar de eficácia dirigente que estes (inclusive os que precipuamente exercem a função de direitos subjetivos) desencadeiam em relação aos órgãos estatais.
É nessa perspectiva que afirmam “[...] conterem os direitos fundamentais uma ordem dirigida ao Estado no sentido de que a este incumbe a obrigação permanente de concretização e realização dos direitos fundamentais. ” (SARLET, 2007, p.172) (Grifo nosso).
Segundo o autor, para que direitos fundamentais sejam efetivados, deve-se levar em conta uma “[...] ordem genérica de efetivação inerente a todos os direitos fundamentais” (ibidem). Estas impõem ao legislador a concretização de tarefas, fins ou programas mais ou menos genéricos.
Em contrapartida, ao se considerar o meio ambiente como um direito fundamental de terceira dimensão, intrínseco ao princípio da solidariedade, entende-se que a atuação proativa não deve ser uma exclusividade do ente estatal, mas um dever difuso que implica a solidariedade em todas as suas dimensões.
É o que leciona Foltz (2009):
Sendo um direito-dever erga omnes, existe uma situação de solidariedade jurídica e de solidariedade ética em que os sujeitos encontram-se em pólos difusos. Definitivamente, o direito ao meio ambiente está fundado na solidariedade, pois só será efetivo com a colaboração de todos. A demanda que se faz neste momento não é que se proteja a propriedade do outro, ou sua liberdade, o seu direito de assistência frente ao Estado, mas o respeito ao outro, à pessoa e à vida em geral, que não se circunscreve ao espaço delimitado pelos direitos civis, políticos ou sociais, mas abrange todo o seu relacionamento com o meio ambiente e com o futuro, uma vez que o outro não é mais apenas aquele que se conhece agora, mas também aquele que está por vir, ou seja, são também as futuras gerações. (FOLTZ, 2009, p. 34)
De qualquer sorte, ao Estado é incumbida a maior parcela de responsabilidade, seja por possuir meios mais eficazes de coerção e maior abrangência e impacto de suas decisões, seja por titularizar o poder emanado do Povo para que conduza a máquina estatal em prol do bem comum.
É nesse cenário que despontam as chamadas políticas públicas como meios de instrumentalizar os fins estatais, a fim de que direitos e garantias fundamentais constitucionalmente previstos sejam efetivamente tutelados.
2.2 O PAPEL DO ESTADO NA PROMOÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS
Reconhecido que a consolidação dos direitos fundamentais desencadeia deveres – gerais ou específicos – a serem cumpridos pelo Estado, é salutar que se estabeleça mecanismos que viabilizem a persecução desses direitos, de modo que saiam do campo abstrato e possam ser efetivamente experimentados pela sociedade.
Nesse sentido é que se afiguram as políticas públicas como sendo um “[...] conjunto de medidas articuladas (coordenadas), cujo escopo é dar impulso, isto é, movimentar a máquina do governo, no sentido de realizar algum objetivo de ordem pública ou, na ótica dos juristas, concretizar um direito” (BUCCI, 2006, p. 14).
Para que as políticas públicas sejam compreendidas, deve ser considerado que, em sua origem, a atuação do Estado não estava voltada para o bem-estar social, tratando-se somente de um Estado atento a promover desenvolvimento econômico, descompromissado com a transformação das relações sociais.
Nesse sentido, ao analisar o reconhecimento de direitos atrelados à necessária atuação do Estado, Nelson (1949 apud BONAVIDES, 2007) esclarece que os fins deste estão sempre sujeitos a alterações, pois se encontram subordinados às concepções vigentes em determinada época ou história e caberia, portanto, ao Direito, ater-se acerca dos fins que “[…] nesta ou naquela época, neste ou naquele Estado” estão, efetivamente, sendo buscados.
Desta maneira, a dinamicidade estatal estaria, por via de regra, sempre a serviço da concreção de objetivos ansiados pelo bem comum, cujos liames podem ser estabelecidos e restabelecidos sempre que necessários, dada a conjuntura política, social e econômica.
Ao explicar Dallari (1994), Streck (2014) preceitua que a transição pela qual passou o Estado Liberal, ainda no século XIX, momento em que lhe fora suprimido o caráter absenteísta, dando lugar a políticas de viés interventivo, contribui para a demonstração de poderes de império decorrentes da atividade estatal, cujas implicações declaram a existência de dois aspectos relevantes, quais sejam:
[…] a) Melhoria das condições sociais, uma vez que o poder público, se assume como garantidor de condições mínimas de existência para os indivíduos e; b) garantia regulatória para o próprio mercado, já eu o mesmo público passa a funcionar como agente financiador, consumidor, sócio, produtor, etc., em relação à economia (STRECK, 2014, p.56).
Para Araújo (2000, p. 263), as políticas governamentais há muito permaneceram consubstanciadas em um Estado “fazedor”, que se pautava pura e simplesmente no desenvolvimento desenfreado, mantendo-se inerte quanto a questões regulatórias e a diálogos que negociassem com a sociedade e com os espaços políticos.
Essa visão desenvolvimentista desassociada dos reconhecimentos que, concomitantemente, estavam sendo conquistados na seara ambiental, implicou décadas de prejuízos no que tange à elaboração de políticas públicas nesse sentido.
Foi, então, a partir da década de 70 que ao se posicionar como signatário de acordos mundiais em prol do Meio Ambiente, o Brasil passou a pautar suas decisões políticas com base naquilo que era discutido, avaliado e solidificado por meio de diretrizes institucionais.
Um exemplo claro dessa mudança de paradigmas e de postura política no que se refere aos recursos naturais foi a elaboração da Lei nº 6.938/81, que inaugurou o princípio do desenvolvimento nacional sustentável e crivou as diretrizes indispensáveis ao fomento de políticas públicas benéficas ao meio ambiente.
Entretanto, embora tenham sido concentrados alguns esforços em prol da efetivação desse diálogo, os resultados ficaram muito aquém das perspectivas delineadas a partir do novo instrumento, o que evidenciou a dificuldade de implementação de políticas públicas quando estas se destinam à proteção do bem ambiental.
Na visão de Milaré (2007, p.285), as políticas públicas voltadas para o meio ambiente “não podem ser desconexas ou descoordenadas”. O comprometimento com essas medidas precisa ser proporcional à importância do bem que se pretende tutelar.
Nessa seara, outro exemplo da instrumentalização das faculdades estatais em prol da concreção de um direito fundamental, dessa vez de forma mais ordenada, é a Agenda 21 brasileira – que será trabalhada em tópico específico –, considerada como um instrumento fundamental à propulsão da democracia, da ação coletiva da sociedade e da movimentação da máquina estatal como um meio de efetivar o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, na forma de um direito fundamental (BRASIL, 2019).
Em 2010, a nova redação dada pela Lei 12.349/2010 ao art. 3° da Lei 8.666/93 (Lei de Licitações e Contratos) marcou um importante passo na consolidação das licitações verdes como uma política pública a serviço do desenvolvimento nacional sustentável e reafirmação do meio ambiente ecologicamente equilibrado como um direito fundamental.
Ao inserir o desenvolvimento nacional sustentável na Lei de Licitações e Contratos como uma finalidade obrigatória a ser alcançada pelas licitações, estabeleceu-se o intuito precípuo de se valer do poderio de compra estatal com o objetivo de propiciar uma postura sustentável das empresas que queiram contratar com o Estado. (BARCESSAT, 2015).
As políticas públicas até então desenvolvidas são, sobretudo, alternativas buscadas com o objetivo de tutela inadiável do meio ambiente, considerado um direito de terceira dimensão que se enquadra na conceituação de bens “essencialmente difusos, de interesse comum, que transcende títulos de propriedade e, até mesmo, limites geopolíticos” (idem, p.287).
Diante disso, deve ser levado em conta que estes possuem destinação comum e exigência comum.
“A destinação comum é o atendimento das necessidades da população, ou das populações, que compõem a sociedade humana (sem que, com isso, consagremos a visão eminentemente antropocêntrica dos bens ambientais). A exigência comum é a observância daquilo que o ecossistema planetário e os grandes ecossistemas ou biomas localizados requerem para a manutenção da quantidade e da qualidade dos recursos naturais de um equilíbrio ecológico essencial”. (MILARÉ, 2007, p. 287)
No ensaio “The Tragedy of the Commons”[9], Garret Hardin (1968) trabalha pela primeira vez esse mesmo conceito de bens, que numa releitura podem ser considerados aquele “conjunto de bens que englobe, principalmente, aqueles ‘bens’ que, ao longo da modernidade, de forma mais ou menos geral, não foram apropriados juridicamente por particulares nem pelo Estado” (CHRISTMANN; VIEIRA, s/a, p.02).
São os chamados commons, apresentados por meio de uma metáfora desenhada na Inglaterra medieval na qual é apresentado um campo aberto onde pastores alimentam seus rebanhos de forma conjunta. Ao se depararem com a necessidade de aumentar seus lucros, optam por incrementar mais um animal ao rebanho e, assim, auferir a totalidade do lucro por sua venda.
A problemática reside na máxima de que cada homem está submetido a um sistema que o obriga a aumentar o seu rebanho ilimitadamente e, isso tudo, em um mundo que é limitado.
Each man is locked into a system that compels him to increase his herd without limit-in a world that is limited. Ruin is the destination toward which all men rush, each pursuing his own best interest in a society that believes in the freedom of the commons. Freedom in a commons brings ruin to all (HARDIN, 1968, p. 1244)[10]
A conclusão do estudo desenvolvido pelo biólogo, portanto, é a de que o acesso puro e irrestrito aos bens comuns, sem que nenhum indivíduo, direta ou indiretamente envolvido, suporte os ônus desse uso desregrado, conduzem à completa extinção destes, sendo necessária a utilização de um parâmetro na determinação de políticas públicas que possam tutelá-los em sua integralidade.
Nesse contexto é que se defende e pleiteia uma postura proativa do Estado no sentido de não apenas reconhecer direitos e prescrever garantias, mas de viabilizar todos os meios disponíveis para sua correta e efetiva consolidação no meio social, de forma justa e solidária.
É diante dessa perspectiva que Sarlet preceitua que:
[...] a qualificação de um Estado como Estado (Socio!) Ambiental traduz-se em – pelo menos – duas dimensões jurídico-políticas relevantes: a) a obrigação do Estado, em cooperação com outros Estados e cidadãos ou grupos da sociedade civil, de promover políticas públicas (econômicas, educativas, de ordenamento) pautada pelas exigências da sustentabilidade ecológica; e b) o dever de adoção de comportamentos públicos e privados amigos do ambiente, dando expressão concreta à assunção da responsabilidade dos poderes públicos perante as gerações futuras, mas sem descurar da necessária partilha de responsabilidades entre o Estado e os atores privados na consecução do objetivo constitucional de tutela do ambiente, consoante, aliás, anunciado expressamente no art. 225, caput, da nossa Lei Fundamental. (SARLET, 2017, p. 130-131) (Grifo Nosso).
O Estado não poderia, aqui, ser considerado apenas um ente fictício dotado de soberania, mas um ator que “age por meio de poderes de império em busca da manutenção do bem comum” (MORAES FILHO, 2018, p. 18).
E, para tanto, as políticas públicas se apresentam para além das faculdades estatais, mas como um imperativo categórico de sua atuação que, antes mesmo de promover o bem comum e consolidar os direitos fundamentais previstos pela via reflexa, encerra em si mesmo uma ação estritamente necessária por sua própria natureza soberana.
POLÍTICAS PÚBLICAS SUSTENTÁVEIS
No cenário ambiental, as políticas públicas atuam como o elo de intersecção entre o conceito de sustentabilidade e o necessário crescimento econômico. Através da mudança de paradigmas vivenciada pelo despertar ecológico, novos meios de gestão estatal precisaram ser delineados, a fim de que se viabilizasse a implementação de práticas sustentáveis nas ações governamentais.
À vista disso, destacado o viés garantidor do Estado, vivenciado após as duas grandes guerras mundiais, a promoção de políticas públicas – antes atreladas a um caráter eminentemente econômico – passou a dialogar de maneira mais satisfatória com os aspectos sociais e ambientais. (MORAES FILHO, 2018, p. 86).
Ao afirmarmos que o Estado é destinatário de uma ordem emanada dos direitos reconhecidamente fundamentais, está-se a dizer que este não pode, aqui, ser considerado apenas um ente fictício dotado de soberania, mas uma força atuante que busca a manutenção do bem comum.
Nesse sentido:
[...] às políticas públicas incumbe a função estratégica de reorientar as condutas governistas, incorporando novas coordenadas de eficiência ambiental, motivando os novos rumos dos investimentos estatais, estimulando os setores da sociedade que adicionam valoração às práticas ecológicas e desestimulando os que agridem excessivamente os bens naturais. (MORAES FILHO, 2018, p. 87).
Ao atingirem seu escopo primário de descortinar de forma prática as metas institucionais traçadas pelos agentes do Estado, em seu viés secundário as políticas públicas terminam por sedimentar a democracia, por meio da consolidação da justiça social e promoção de valores que ressignificam o diálogo entre governantes e governados.
A democracia, aqui, deve atuar como um alicerce sobre o qual as políticas públicas são delineadas, haja vista se tratar um processo decisório intimamente relacionado aos anseios sociais e ao bem comum.
De acordo com Bursztyn e Bursztyn (2012, p.146) “a fisionomia assumida pelas políticas públicas varia segundo a natureza de cada estrutura de decisões públicas. ” Tal afirmação pode ser auferida à vista da presente realidade política do Estado brasileiro.
Os perfis políticos, se mais ou menos comprometidos com a democracia, terminam por influenciar, mesmo que indiretamente, a tomada de decisões no que se refere às políticas públicas, e, consequentemente, às políticas públicas de cunho sustentável, porquanto estas apenas subsistem se amparadas em ideais democráticos.
3. LICITAÇÕES SUSTENTÁVEIS
3.1 O CONCEITO DE LICITAÇÃO SOB NOVOS CONTORNOS
De acordo com o Ministério do Planejamento as compras governamentais movimentam cerca de 10 a 15% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional. Avalia-se, nesse contexto, que as decisões de compras públicas, em razão de sua monta, são capazes de irradiar os seus efeitos a variados nichos, cujas dimensões abrangem o social, o econômico, o ambiental, o ético, entre outros.
Toda essa hegemonia do poder aquisitivo estatal, se bem utilizada, serve de força propulsora à concretização de uma gama de objetivos constitucionais, com vistas a garantir a promoção de políticas ambientais, sociais, éticas e econômicas, que seriam os efeitos mediatos ou horizontais dessas contratações.
Em outras palavras, a dinamicidade das compras estatais estaria, por via de regra, a serviço da concreção de objetivos ansiados pelo bem comum, cujos liames podem ser estabelecidos e restabelecidos sempre que necessário, dada a conjuntura política, social e econômica. (AZAMBUJA, 2002).
Nesse sentido, Nelson (1949 apud BONAVIDES, 2007) esclarece que os fins do Estado estão sempre sujeitos a alterações, pois se encontram subordinados às concepções vigentes em determinada época histórica e caberia, portanto, ao Direito, ater-se acerca dos fins que nesta ou naquela época, neste ou naquele Estado estão, efetivamente, sendo buscados.
Ao salientarmos que o Estado é destinatário de uma ordem emanada dos direitos reconhecidamente fundamentais, está-se a dizer que este não pode, aqui, ser considerado apenas um ente fictício dotado de soberania, mas um ator que “[…] age por meio de poderes de império em busca da manutenção do bem comum”, razão pela qual deve ser visto como um ator no mercado, possuindo três papéis distintos: (i) como empresa; (ii) como consumidor e (iii) como regulador (MORAES FILHO, 2018, p. 18).
Em que pese a sua atuação como consumidor, o artigo 37, inciso XXI (CRFB/88), explicita a obrigatoriedade que os entes públicos possuem de licitar no momento da compra, cuja regulamentação, dada pela Lei 8.666/93, em seu artigo 3º apresenta uma série de princípios que devem ser observados – dentre eles, o da promoção ao desenvolvimento nacional sustentável, que, nesse contexto, configura uma aquisição pautada em critérios de trabalho aceitáveis e que não prejudiquem o meio ambiente.
Semelhantemente a uma empresa, ao contratar, produzir e prestar serviços, o Estado teria, em tese, o dever de se atentar para as consequências ambientais de uma produção, bem como à promoção de um ambiente de trabalho predominantemente sadio, o que, somado aos objetivos da República, pode-se extrair, também, da leitura dos artigos 6º e 225 da Constituição da República.
Por fim, quanto à função reguladora do Estado, esta, de forma mais ampla, pressupõe, na lição de Estigara (2009 apud MORAES FILHO, 2018, p. 25), a finalidade de “[…] estabelecer padrões mínimos legais de respeito às condições de trabalho e ao meio ambiente, equidade de gênero, qualidade dos produtos e serviços, transparência, combate à corrupção, fomento à cidadania participativa, dentre outros”.
Tais funções podem ser extraídas do próprio texto constitucional, cujo artigo 174, caput, ratifica a figura do Estado como agente normativo e regulador da atividade econômica, tendo por intento a fiscalização, o incentivo e planejamento, de modo que as ações estatais figurem personagens determinantes para o setor público e indicativos para o setor privado.
À vista disso, considerando a degradação ambiental e o esgotamento dos recursos naturais disponíveis afetam diretamente o crescimento econômico – bem mais acentuado em países em desenvolvimento, cujo capital econômico se assenta basicamente em recursos naturais, se assenta basicamente em recursos naturais (BURSZTYN; BURSZTYN, 2012) – além do desenvolvimento demográfico e a deterioração da saúde humana, entende-se que cumpre ao Estado, como garantidor do bem-estar social, incumbir-se das atribuições necessárias à estabilização de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, constitucionalmente instituído como um direito difuso (art. 225, da CRFB/88).
Nesse sentido, considera-se que a ordem constitucional vigente alberga dois grandes valores que, não raro, geram conflitos não só no campo fático, mas também no jurídico; quais sejam, o desenvolvimento econômico-social voltado à obtenção de lucro e a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico que, dentre suas variadas significações, destaca a necessidade de sua proteção jurídica. (SILVA, 2007).
O estreitamento entre essas duas vertentes propiciou a concepção do desenvolvimento nacional sustentável e sua inserção no ordenamento jurídico brasileiro para além dos limites meramente doutrinários, cujo conceito, firmado na Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (1991, p. 46), estabelece ser a modalidade de desenvolvimento que “atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem suas próprias necessidades”.
Imerso nessa temática, no ano de 2010 o Congresso aprovou a Lei 12.349/2010 que alterou o artigo 3º da Lei de Licitações (8.666/93) de modo que este passou a incorporar a promoção ao desenvolvimento nacional sustentável como um dos objetivos a serem perseguidos pela licitação, elevando-o ao mesmo patamar de imprescindibilidade no qual já se encontravam princípios como o da isonomia, da economia e da competitividade.
A intenção era se utilizar da licitação como um importante aliado à promoção de um desenvolvimento econômico que respeite o meio ambiente ecologicamente equilibrado como um direito fundamental inerente ao homem e à sua existência. E não somente, mas que também ajudasse a promover o bem-estar coletivo por intermédio de decisões que indiretamente irradiassem seus efeitos secundários sobre a sociedade.
Nesse cenário, ao considerarmos a hegemonia do Estado e o relevante impacto das compras públicas no cenário econômico-social por intermédio das licitações, está-se a estabelecer uma espécie de vetor para que objetivos constitucionais sejam alcançados mediante a promoção da sustentabilidade.
Ao conceituar as licitações Di Pietro (2016) as consideram procedimentos administrativos que compõem o método mais adequado à celebração de contratos com entes públicos, porquanto abrem margem para a participação de todos os interessados – desde que se sujeitem às condições preestabelecidas conforme as necessidades da Administração.
O mesmo é defendido por Mello (2016) que sustenta ser um instrumento justo de contração, vez que balizado em parâmetros estabelecidos e divulgados de forma antecipada, motivados pela contratação da proposta mais conveniente ao ente público.
No campo doutrinário, alguns autores prontamente se incumbiram de conceituar as licitações verdes. Alguns o fizeram de forma mais concisa, enquanto outros buscaram se debruçar nas entrelinhas do tema, a fim de conferir ao instituto das licitações verdes um significado que ultrapassasse a mera conceituação procedimental, mas a expectativa da consolidação de um instituto de ampla eficácia e incidência.
Para Torres (2011, p. 105), a licitação verde:
[…] é aquela em que, além dos critérios normalmente utilizados para a seleção de fornecedores por parte da administração, se agregam a eles critérios que privilegiam produtos ou serviços que geram menos impactos negativos ao meio ambiente, tendo em vista todo o seu ciclo de vida.
Enquanto outros as consideram como “aquelas que possuem menor potencial lesivo ao meio ambiente, mediante a utilização de materiais recicláveis, atóxicos, com maior economia de água e energia elétrica, dentre outros elementos” (GALLINA; AGUIRRE, 2016, p. 73).
Ou, ainda sob um viés estritamente ecológico, um “[…] procedimento administrativo que visa selecionar a proposta mais vantajosa para a administração pública através da inclusão de cláusulas editalícias que prestigiem o consumo menos agressivo ao meio ambiente” (MORAES FILHO, 2018, p. 106-7).
Por outro lado, de forma um pouco mais ampla, Freitas (2016, p. 268-9) atribui às licitações verdes novos liames e nichos de incidência ao preceituar que estas:
[…] visam a seleção de proposta mais vantajosa para a Administração Pública, ponderados, com a máxima objetividade possível, os custos e benefícios, diretos e indiretos, sociais, econômicos e ambientais. Ou, de forma mais completa, são os procedimentos administrativos por meio dos quais um órgão ou entidade da Administração Pública convoca interessados – no seio de certame isonômico, probo e objetivo – com a finalidade de selecionar a melhor proposta, isto é, a mais propícia ao desenvolvimento sustentável, quando almeja efetuar pacto relativo a obras e serviços, compras, alienações, locações, arrendamentos, concessões e permissões, exigindo, na fase de habilitação, as provas indispensáveis para assegurar o cumprimento das obrigações avençadas.
Trata-se, por fim, de um recente e importante instrumento capaz de redesenhar as relações de consumo firmadas com o Estado e o posicionamento desse em face do mercado nacional. Assim, se bem utilizadas, as licitações verdes possuem a aptidão para servirem como vetor de promoção ao desenvolvimento nacional sustentável em todas as suas nuances.
3.2 FUNÇÃO SOCIAL DA LICITAÇÃO
Ao se propor uma análise da função social das licitações é necessário que se distancie do conceito o caráter eminentemente econômico antes predominante, porquanto a função social, propriamente dita, preceitua a socialidade do procedimento administrativo em detrimento de particularidades econômicas antes ovacionadas pela Administração Pública.
Para que seja compreendida em sua totalidade, é necessário esclarecer que antes que seja alcançada a função social da licitação, antes devem ser compreendidas as suas finalidades, que se subdividem em duas vertentes.
3.2.1 Finalidade legal do procedimento licitatório
A finalidade legal da licitação é compreendida como aquela prevista em lei, mais especificamente no artigo 3º, da Lei 8.666/93 o qual preceitua como objetivos cardeais o respeito à isonomia, à seleção da proposta mais vantajosa para o poder público e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável.
A isonomia enquanto princípio licitatório é o que pressupõe a existência dos demais, vez que dele decorrem todas as outras determinações que, juntas, objetivam a lisura e probidade do certame licitatório (MEIRELLES, 2016).
É pacífico tanto na doutrina quanto na jurisprudência que a formulação de requisitos mínimos de participação não transfigura a carga principiológica que traz consigo o instituto. Isso porque, embora preceitue a igualdade de condições aos participantes, a Administração não pode se abster de delimitar de forma objetiva quando, como e o quê visa contratar.
O princípio da isonomia, portanto, em que pese considerar a paridade dos meios de acesso à licitação, não exclui a necessidade de delimitação do objeto ou serviço que tende a ser contratado.
Anteriormente, quando se falava em proposta mais vantajosa para a Administração, logo se pensava naquela que objetivasse o menor dispêndio possível de recursos. Entretanto, com a minimização da vertente econômica, passou-se a considerar a vantajosidade de forma mais ampla.
Ao prolatar seu voto no Acórdão 227/2002-TCU, o Ministro Relator Guilherme Palmeira delineou a contratação mais vantajosa como aquela que “envolve aspectos outros que não somente o quesito preço”. De maneira semelhante, o Ministro Relator Marcos Bemquerer Costa, no Acórdão 1987/2009-TCU:
[…] o conceito da proposta mais vantajosa, inserido no caput do artigo 3º da Lei n. 8.666/93, não se confunde com o de ‘mais barato’, visto que sua compreensão pressuporia o atendimento das exigências constitucionais de economicidade e eficiência; [...] em seguida, ampara o ensinamento de Antônio Carlos Cintra do Amaral, textualmente: ‘É comum considerar-se que a maior vantagem para a Administração está sempre no menor preço. Isso reflete o entendimento, equivocado, de que a lei consagra a tese de que o mais barato é sempre o melhor, sem contemplação com a técnica e a qualidade. Esse entendimento não corresponde ao disposto na Lei 8.666/93 e conflita com os princípios da razoabilidade, eficiência e economicidade, que regem os atos administrativos, inclusive os procedimentos licitatórios. ’ (Grifo Nosso).
Nesse sentido, quando se trata da proposta mais vantajosa, esta deve ser compreendida de forma ampla, a levar em conta que em determinados casos concretos, embora o valor pecuniário de eventual contratação seja imediatamente mais elevado, os custos a longo prazo se mostram mais vantajosos à máquina pública.[11]
Quanto ao desenvolvimento nacional sustentável – conforme já explicitado – este foi inserido posteriormente pela Lei 12.349/2010 e serviu como demonstração das preocupações atuais e como um prelúdio da mudança de paradigma na atuação estatal no que tange às preocupações ambientais.
3.2.2 Finalidade material do procedimento licitatório
As finalidades materiais da licitação estão mais relacionadas ao atendimento das necessidades públicas, consideradas “[…] atos que abstratamente possuem como objetivo viabilizar a satisfação de uma necessidade ou utilidade” (MORAES FILHO, 2018, p. 131), sendo que se aproximam ainda mais daquilo que é desejado pela sociedade.
Embora sua finalidade material não possua, num primeiro momento, o condão de exclusivamente contratar bem ou serviço, o seu alcance mediato termina por concretizar alguns anseios sociais por meio da compra. Podem ser divididas entre finalidades materiais ordinárias e finalidades materiais extraordinárias da licitação.
Nesse cenário, as finalidades materiais visam proporcionar meios adequados para que as necessidades sociais sejam efetivamente tuteladas. Essas, no entanto, não chegam a somar na esfera particular dos indivíduos direta ou indiretamente envolvidos (MORAES FILHO, 2018).
No que se refere às finalidades extraordinárias, estas podem ser conceituadas como o “[…] conjunto de atos que, de maneira indireta e mediata, também apresentam como objetivo viabilizar a satisfação das necessidades ou utilidades públicas, mas incorporando variáveis imprevisíveis na satisfação das necessidades” (MORAES FILHO, 2018, p. 132)
E é nessa perspectiva de fins extraordinários que se sobressaem as funções sociais do procedimento licitatório, consubstanciando um rompimento com práticas administrativas antes priorizadas, pautadas exclusivamente no objetivo imediato da contratação de objeto ou serviço. Nesse novo cenário, busca-se priorizar não apenas o objeto direto, mas também os ganhos secundários que tal aquisição pode proporcionar na esfera de cada indivíduo.
3.3 DIMENSÕES DA SUSTENTABILIDADE
As contratações públicas veiculadas por intermédio das licitações, não possuem o condão de, tão somente, contratar objeto ou serviço pautado na seleção da proposta mais vantajosa para a administração, respeitados os tradicionais princípios da isonomia e competitividade, mas devem ser analisados sob a égide dos eventuais efeitos extraordinários – ou horizontais – das contratações.
A inovação legislativa que concerne à utilização do procedimento licitatório como vetor de promoção de objetivos econômicos, sociais, éticos e ambientais, de modo a se utilizar da hegemonia e volume das compras públicas como força motriz a serviço da concreção de direitos constitucionalmente previstos.
Sob essa epígrafe, o aspecto econômico se relaciona com a alocação consciente dos recursos, de modo que seja estabelecido um crescimento econômico equilibrado, com autonomia na pesquisa e diminuição dos cursos do aparato produtivo, com o objetivo de equacionar o desenvolvimento econômico e a sustentabilidade, sem transgredir o direito fundamental a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, previsto constitucionalmente (SILVA, 2018; FERREIRA, 2016).
A repercussão das compras públicas sob o prisma social consiste no agrupamento de demandas que dignifiquem o indivíduo como sujeito de direito, por intermédio da distribuição de renda, acesso à educação e ao trabalho digno, além da promoção de uma cultura social que seja capaz de gerir recursos escassos, bem como reaproveitar aqueles já utilizados (FERREIRA, 2010).
É dizer: a sustentabilidade internalizada pela Constituição da República de 1988 não é capaz de coexistir com um sistema excludente, que não considere a erradicação da pobreza e das desigualdades sociais. Mesmo porquê são objetivos fundamentais igualmente constantes do texto constitucional, que não podem ser ignorados (Artigo 3º, III, CRFB/88).
Nesse sentido.
Somente o acolhimento governamental de uma atitude realmente sustentável é capaz de promover a igualdade de oportunidade entre os indivíduos, levando a expansão das liberdades substanciais, em detrimento das meramente formais, viabilizando a possibilidade do desenvolvimento de suas aptidões, favorecendo a inserção na dinâmica social no qual estão envolvidas, permitindo que todos possam contribuir direta ou indiretamente nas decisões estatais (MORAES FILHO, 2018, p. 81).
Ao considerar a ética como uma dimensão da sustentabilidade, está se afirmando, acertadamente, que diante da significativa movimentação da máquina estatal no que se refere às compras públicas – as quais possuem a prerrogativa da busca do interesse público e do bem comum.
Vislumbra-se, nesse sentido, ser inadmissível que o manuseio dos recursos públicos esteja desassociado de uma conduta ética e solidária (SILVA, 2018). É nesse aspecto que se torna inarredável a promoção da ética como uma dimensão do desenvolvimento nacional sustentável.
Por último, a dimensão ambiental, evidenciada explicitamente no artigo 225 da Constituição da República de 1988, é vista como um direito intergeracional, porquanto a preservação de um meio ambiente ecologicamente equilibrado com o objetivo de atender os anseios das gerações futuras se trata de uma necessidade inadiável (FERREIRA, 2010).
Deste modo, a sociedade de forma conjunta com a máquina estatal deve se posicionar de forma proativa, elaborando novos conceitos de gestão que guardem consonância os princípios ambientais, de forma que se consiga obstar a já profusa degradação do ecossistema e das fontes naturais.
Ao levarmos em conta todos esses princípios setoriais inclusos no conceito de sustentabilidade, alguns desafios vão sendo evidenciados no que se refere à sua aplicabilidade.
Os critérios econômicos ou ambientais são factualmente mais fáceis de auferir, tanto quanto a forma em que serão preestabelecidos para fins de disputa quanto aos seus resultados práticos quando da finalização do procedimento licitatório.
O mesmo não se pode afirmar das compras pautadas em critérios sociais e éticos, porquanto constituem conceitos mais subjetivos e, automaticamente, mais difíceis de serem auferidos.
No que se refere a essa diferenciação entre a adoção de determinados critérios na hora de licitar, o Guia Carpe de compra responsable[12] apresenta de forma bastante didática.
En el caso de la compra verde, esta relevancia puede demostrarse con relativa facilidad. Los requisitos ambientales sobre métodos de producción y prestación de servicios, suelen repercutir en el producto final o en la calidad del servicio que constituye el objeto del contrato. Además, los análisis del coste del ciclo de vida del producto demuestran las ventajas económicas de comprar verde. Las consideraciones relativas a la compra verde pueden integrarse en cualquier fase del procedimiento; en concreto, las especificaciones técnicas del contrato proporcionan una buena oportunidad para mencionar las cuestiones ambientales.
En el caso de las consideraciones sociales o éticas, por lo general, es más difícil demostrar la conexión. Los criterios sociales o éticos se refieren a cuestiones que afectan a la cadena de producción, pero que normalmente no repercuten en las características o el funcionamiento del producto final. También resulta difícil cuantificar las ventajas económicas a largo plazo y las no económicas de invertir en asuntos sociales. Las estrategias de compra social o ética, portanto, se concentran durante la fase de adjudicación en la ejecución de los contratos, en el cumplimiento de la legislación correspondiente y, en menor medida, en la calidad. (EUROCITIES, 2004, p.22)[13]
Nesse sentido, entende-se que ao inserir o desenvolvimento nacional sustentável na lei de licitações, estava o legislador a considerar aspectos múltiplos, que não apenas o ambiental. E para que estas variadas nuances sejam observadas quando de uma contratação, faz-se necessário um diálogo coerente por parte do administrador entre os princípios já estabelecidos e as novas balizas interpretativas conferidas às licitações por meio da sustentabilidade.
Quando se fala em licitação, são muitas as dificuldades que circundam a implementação de novas políticas. Uma delas seria permitir a relativização de critérios objetivos que, num primeiro momento, teriam por fito a obstaculização de subjetivismos e fraudes.
No entanto, o fato de existirem dificuldades não deve, por si só, ser um obstáculo à perseguição das mudanças necessárias. Pelo contrário, novos diálogos devem ser firmados a fim de que os desvios de gestão sejam suprimidos em proveito de uma mudança de paradigmas.
Os esforços devem ser somados no sentido de se alcançar a efetivação dos objetivos licitatórios previstos em lei em sua totalidade, quais sejam: a isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa e a promoção ao desenvolvimento nacional sustentável em todas as suas nuances e sem prejuízo de nenhum outro.
3.4 TRANSPARÊNCIA E CONTROLE COMO MEDIDA DE SUPLANTAÇÃO DOS DESAFIOS
Como bem demonstrado, a discricionariedade garante aos administradores a liberdade de escolher a proposta mais conveniente aos fins pretendidos pela compra, no entanto, devem ser respeitados os princípios administrativos, por meio de critérios anteriormente estabelecidos, que, numa escala inversamente proporcional, quanto mais delimitados, claros e objetivos, menor a margem de discricionariedade do administrador, evitando, assim, a existência de espaços para irregularidades.
Essa discricionariedade está intimamente relacionada ao princípio da legalidade administrativa, previsto no artigo 37, caput, da CRFB/88, e se difere daquela legalidade previsa no artigo 5º, inciso III, vez que esta preceitua a liberdade individual para agir desde que a conduta não seja proibida pela legislação; por outro lado, no que se refere à legalidade administrativa, ela restringe a ação dos administradores somente ao que a lei dispõe.
Tratam-se de conceitos já bastante debatidos, mas não esgotados. A considerar que a legislação não consegue, sozinha, abranger todas as suas hipóteses de incidência, é necessário que exista um fator que garanta a maleabilidade das decisões, sem, contudo, retirar a essência da lisura que deve pairar sobre os atos administrativos.
À vista dessas colocações, a implantação da sustentabilidade no bojo do artigo 3º da Lei de Licitações, ampliou esse conceito de proposta “mais conveniente” que, agora, já não se trata apenas da mais econômica, competitiva e isonômica dentre as demais, mas, também, daquela que demonstre a vantajosidade à Administração consubstanciada em critérios sustentáveis.
Na medida em que esse posicionamento seja instrumento capaz de promover, por meio da licitação, um desenvolvimento regional (e nacional) consciente do ponto de vista ambiental, este não pode se furtar às questões sociais e econômicas. Assim, um elo de intersecção no qual sejam alocadas as presentes demandas, passíveis de serem atendidas por intermédio do procedimento licitatório, deve ser bem delineado e trabalhado.
Trata-se da utilização de um único condutor (licitação) com o fim de conduzir variados anseios legais. Isso não gera apenas uma potencialidade dos atos administrativos, mas também uma considerável economia de recursos.
Nesse cenário, as licitações representam uma forma de termômetro por meio do qual se permite aferir os índices de discricionariedade da Administração Pública, propiciando escorreita disputa entre os interessados e auxiliando na diminuição de lacunas que possibilitem a ocorrência de atos corruptos e problemas operacionais internos (MOTTA, 2005).
Ocorre que, ao considerar a sustentabilidade como um princípio cardeal da licitação, estaria se permitindo uma ampliação do conceito de proposta mais conveniente e, de forma consectária, a dilatação de permissivas lacunas, vez que a adoção da tese sustentável implicaria maior discricionariedade do contratante e na relativização de outros princípios anteriormente estabelecidos.
Nesse aspecto, Fabre (2014, p. 17) afirma:
É tênue o fio que divisa a utilização da licitação e da contratação administrativa como meio para a implementação legítima de políticas públicas nacionais estabelecidas e seu uso desmedido e despropositado, com grandes impactos sobre o livre comércio, a transparência e a lealdade.
Fazer o uso das licitações como fio condutor de conquistas secundárias em variados nichos de atuação estatal é uma alternativa bastante razoável. Entretanto, deve-se ater se essa ampliação dos objetivos licitatórios e consequente alargamento do seu prisma subjetivo não deturparia a sua integridade.
Em outras palavras, a ampliação da discricionariedade em relação aos atos que envolvam as contratações públicas, num primeiro momento, implicaria em proporcional aumento dos índices de interferências ilegais e corruptas.
De acordo com o Índice de Percepção da Corrupção (IPC) de 2018 o Brasil apresentou a sua pior nota desde 2012, passando da 96ª para a 105ª posição no ranking da Transparência Internacional[14], evidenciando uma maior ocorrência de abusos de personagens públicos e privados objetivando a percepção de benefícios pessoais.
Nessa mesma escala, os Estados Unidos da América ocupam a 22ª posição, com 71 pontos, o que demonstra um cenário significativamente mais favorável aos norte-americanos em detrimento do panorama brasileiro.
Ocorre que, atendo-se exclusivamente aos indicadores de discricionariedade, relegando o debate de fatores outros que também podem influenciar as decisões dos atores sociais envolvidos, o modelo norte-americano de compras públicas prestigia o subjetivismo das decisões administrativas, garantindo ampla discricionariedade aos agentes públicos na hora de contratar (OLIVEIRA, 2015)[15].
Para Fortini e Motta (2016), o ponto crucial que divisa os resultados atinentes aos dois modelos circunda a problemática dos mecanismos de controle. Observa-se que no Brasil esses mecanismos são módicos diante da extensão da máquina estatal, com toda a sua atuação no mercado, bem como pela extensão do território nacional, que faz com que os recursos sejam pulverizados de forma centrípeta.
De acordo com a Crowe Horwath RCS (2010), a média de auditores no Brasil é de um profissional para cada 24.600 habitantes, enquanto nos Estados Unidos a média é de um profissional para cada 2.300 habitantes e na Holanda[16] um profissional para cada 900 habitantes.
Se houvesse um processo sistemático de auditoria nas empresas, a fraude e a corrupção teriam uma redução drástica, uma vez que seriam detectadas no início. Não é à toa que as nações com menor índice de corrupção são as que têm o maior número de auditores formados e treinados. Da mesma forma, se todas as empresas adotassem a auditoria interna como hábito, o índice de retrabalho cairia drasticamente (pois as informações contábeis e fiscais seriam feitas corretamente da primeira vez) e os prejuízos financeiros oriundos de autuações fiscais e/ou pagamento a maior de tributos seriam reduzidos ou eliminados. (FENACON, 2017).
À vista disso, repelir mudanças necessárias com fulcro no receio de que estas constituam portas de entrada para a corrupção, ensejaria uma perversa estagnação das instituições e de seus meios de atuação. Assim como a sociedade está em constante movimento, tendo o Direito como corolário dessas mudanças, assim devem acompanhá-los, também, os seus mecanismos.
A adoção de critérios sustentáveis na hora de licitar, embora amplie a subjetividade da escolha das propostas, deve ser fomentada e incorporada pela Administração, não por se tratar de uma precaução, mas de uma medida reativa urgente ao atual cenário de degradação dos recursos naturais e deterioração massiva de direitos fundamentais constitucionalmente estabelecidos.
É certo que isoladamente as licitações verdes não constituem medida bastante para sanar todas e quaisquer distorções sociais, éticas, econômicas e ambientais. No entanto, ao se considerar a mencionada hegemonia das compras públicas e a amplitude dos impactos que estas causam no mercado, conclui-se que se trata de um válido mecanismo a ser considerado.
Deste modo, em vez de repelir inovações legítimas e terapêuticas em nome da lisura procedimental, ter-se-ia por melhor conduta a implementação de políticas de transparência e controle (interno e externo) a fim de que os objetivos antes estabelecidos – isonomia e escolha da proposta mais vantajosa – possam coexistir com o objetivo acrescido pela Lei 12.349/2010, qual seja, o desenvolvimento nacional sustentável.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por intermédio da pesquisa apresentada, buscou-se evidenciar a relevância do instituto das licitações verdes de uma maneira lógica e concatenada. Para tanto, buscou-se expor as premissas nas quais se consubstanciou a inovação legislativa que deu azo a criação da referida modalidade licitatória.
Nesse viés, sob um estudo bibliográfico acurado, que se utilizou de um método predominantemente exploratório, buscou-se expor mais que conceitos utilitaristas e atrelados à velha administração pública, pautada em critérios eminentemente econômicos; mas trazer um novo diálogo, consubstanciado na intersecção entre as dimensões da sustentabilidade e os objetivos de desenvolvimento do Estado, de modo que estes possam coexistir.
Desta maneira, o trabalho aqui divisado se propôs a esclarecer de que forma o alcance das compras públicas brasileiras, por intermédio das licitações sustentáveis, poderia contribuir para o atingimento de efeitos secundários que fomentassem questões econômicas, sociais, éticas e ambientais.
Ao inserir o desenvolvimento nacional sustentável no artigo 3º da Lei 8.666/1993, o legislador conteve em si uma gama de objetivos mediatos que seriam alcançados por meio deste. Contudo, a lei, ao não conceituar de forma clara o que seria um desenvolvimento nacional pautado em critérios sustentáveis, abriu margem para que esta interpretação se desse sob a ótica doutrinária e jurisprudencial, conforme restou demonstrado.
À vista disso, compulsados os estudos relativos à sua conceituação, entendeu-se que não se trata de um objetivo uno, mas de uma atuação que comporta uma gama de efeitos horizontais (ou mediatos, ou secundários).
Após a inovação legislativa, empresas que tendem contratar com o poder público possuem o dever explícito de estarem em consonância com o desenvolvimento nacional sustentável, e de que forma isso se daria? A resposta se dá de forma implícita, mas suficientemente clara: providenciando uma postura sustentável consubstanciada no respeito a critérios sociais, econômicos, éticos e ambientais, de modo que se adéquem aos requisitos preestabelecidos se assim quiserem contratar com o Estado.
Estabelecidas as suas balizas interpretativas, o trabalho ainda se propôs a delimitar o alcance desses efeitos horizontais que, embora bastante tímidos em alguns nichos e seguimentos, demonstra significativa mudança dos paradigmas até então obedecidos.
Na seara social, a repercussão das compras públicas consiste no agrupamento de demandas que dignificam o indivíduo. A sustentabilidade enquanto princípio internalizado pela CRFB/88 não pode coexistir com práticas excludentes, que não considerem a erradicação da pobreza, das desigualdades sociais e na falta de representatividade.
Desse modo, quando se afirma que as políticas públicas devem estar pautadas em critérios democráticos (Capítulo 02; subitem 2.3), está-se a afirmar, de maneira mais clara, que as concentrações de poder, por exemplo, não estão em consonância com uma atuação sustentável e eventual dissonância não encontra guarida no texto constitucional.
Inexiste sustentabilidade ante a ausência de critérios democráticos, do mesmo modo que inexistem compras sustentáveis que não se atenham à observância da participação popular e aos objetivos de cunho social constitucionalmente previstos.
O desenvolvimento nacional sustentável, como corolário de um meio ambiente ecologicamente equilibrado – disposição alçada ao patamar de direito fundamental – pressupõe a mesma obediência dispensada aos outros objetivos fundamentais igualmente constantes no texto constitucional (Artigo 3º).
Em continuidade, a dimensão ética apontada como uma decorrência lógica da sustentabilidade pressupõe a lisura do manuseio dos recursos públicos. Embora consista em um critério bastante subjetivo e de difícil constatação, ainda mais latente quando se trata de uma ampliação da discricionariedade dos gestores, é possível a adoção de medidas de controle que possam atuar de forma preventiva, repressiva e educativa.
No que se refere às dimensões ambiental e econômica, estas, muitas vezes, são vistas como antagônicas, mas não necessariamente o são. O estudo aqui divisado evidenciou que, anteriormente, a proposta mais vantajosa para a Administração se tratava daquela mais econômica. Ou seja, sempre se optava pelo mais barato.
No entanto, tanto a doutrina quanto a jurisprudência trouxeram uma mudança de paradigmas que passaram a considerar critérios outros que não somente o preço. Os efeitos secundários dos meios de produção, a duração, os impactos a curto, médio e longo prazos também passaram a fazer parte da equação.
Nesse sentido, a releitura feita do princípio da vantajosidade passou a conferir maior importância à dimensão ambiental em detrimento da dimensão econômica. Isso em razão de que produtos e serviços imediatamente mais baratos, não raro, podem custar mais caros à Administração a médio e longo prazo.
Tal máxima restou evidenciada na pesquisa realizada e provou que a utilização de critérios ambientalmente sustentáveis, embora preceitue uma noção subjetivista, não vai de encontro com o princípio da economicidade, de modo que ambos podem coexistir – embora, às vezes, um se sobressaia mais que o outro.
Por fim, acerca da possível necessidade de mitigação desses efeitos secundários em respeito á objetividade do certame, restou comprovado não ser necessária, sendo tal hipótese desconsiderada. Isso porque as estratégias de controle (interno e externo) são suficientemente hábeis a permitir a promoção dos efeitos horizontais das licitações verdes, tendo esta os meios necessários para garantir esse desenvolvimento.
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[1] “A primeira onda, que acompanhou a Revolução Francesa, deu origem a geração de direitos civis e políticos. Com a segunda onda, depois da Revolução Russa de 1917, os direitos econômicos, sociais e culturais ganharam reconhecimento universal. Já a terceira onda acompanhou ‘a emancipação dos povos colonizados e dominados’ no meio do século XX.” (Tradução Nossa)
[2] “Direitos civis e políticos podem ser pensados como conceitualmente anteriores, e, portanto, pertencentes a uma geração ‘mais velha’ do que os direitos sociais e econômicos. Isso porque os direitos civis e políticos estabelecem a posição legal e política daqueles que têm direito a exercer e gozar de benefícios sociais e econômicos. E a proteção de ambos os conjuntos de direitos é necessária para o gozo efetivo de uma terceira geração de direitos humanos, como o direito à autodeterminação. Se um [indivíduo] não é investido de direitos civis, políticos, sociais e econômicos, então não se pode dizer que seja capaz de determinar livremente o seu status político e de exercer livremente o seu desenvolvimento social e cultural.” (Tradução Nossa)
[3] “Art. 123. O uso desses direitos e garantias terá por limite o bem público, as necessidades da defesa, do bem-estar, da paz e da ordem coletiva, bem como as exigências da segurança da nação e do Estado em nome dela constituído e organizado nesta Constituição”.
[4] Essa foi a inovação trazida pela Constituição de 1988 em relação à abertura de cláusula: “A Carta de 1988 inova ao incluir no rol de direitos alcançados pela abertura os direitos enunciados nos tratados internacionais de que o Brasil seja parte, proposta de Antônio Augusto Cançado Trindade, então consultor jurídico do Ministério das Relações Exteriores (MELLO, 2001, p. 2). Foi a primeira vez que uma Constituição brasileira previu abertura para normas de Direito Internacional.” (MELO; BONATO, 2017, p. 282)
[5] No documento original, uma das proclamações acordadas durante o evento, inaugurou o discurso em defesa da necessidade de proteção ambiental, ao passo em que afirmou que “A proteção e o melhoramento do meio ambiente humano é uma questão fundamental que afeta o bem-estar dos povos e o desenvolvimento econômico do mundo inteiro, um desejo urgente dos povos de todo o mundo e um dever de todos os governos./The protection and improvement of the human environment is a major issue which affects the wellbeing of peoples and economic development throughout the world; it is the urgent desire of the peoples of the whole world and the duty of all Governments.(ONU, 1972) (Tradução nossa).”
[6] Nosso Futuro Comum (Tradução Nossa).
[7] De acordo com o portal do Ministério do Meio Ambiente na internet, a Agenda 21 tem provado ser um “guia eficiente para processos de união da sociedade, compreensão dos conceitos de cidadania e de sua aplicação, é hoje um dos grandes instrumentos de formação de políticas públicas no Brasil” (BRASIL, 2019)
[8] Aqui compreendida como a sucessão de decisões que viabilizariam a efetivação das políticas desenhadas; o instrumento necessário para o atingimento de metas.
[9] “A Tragédia dos Comuns” (Tradução Nossa).
[10] “Cada homem está trancado em um sistema que o obriga a aumentar o seu rebanho sem limites – em um mundo que é limitado. Ruína é o destino para o qual todos os homens correm, cada um perseguindo seu próprio interesse, em uma sociedade que acredita na liberdade dos bens comuns. A liberdade dos bens comuns traz a ruína a todos.” (Tradução Nossa)
[11] De acordo com documento da ONU (Public Procurement as a tool for promoting more Sustainable Consumption and Production patterns) alguns produtos e serviços mais ecológicos são menos dispendiosos em termos de uso, manutenção e descarte, apesar dos custos iniciais mais altos de investimento. Para alguns serviços, como nos casos de serviços de ônibus na União Europeia e controle de pragas nos Estados Unidos, o preço da opção sustentável é o mesmo ou até abaixo do convencional. (ONU, 2008)
[12] O Guia CARPE (Ciudades Europeas Por El Consumo Responsable) de compras responsables é um documento elaborado pela EUROCITIES, uma rede de grandes cidades da Europa que juntas buscam o desenvolvimento econômico, político e social das cidades membros (EUROCITIES, 2004).
[13] “No caso da compra verde, esta relevância pode ser demonstrada com relativa facilidade. Os requisitos ambientais como métodos de produção ou prestação de serviços repercutem no produto final e na qualidade do serviço que constitui o objeto do contrato. Ademais, a análise do custo do ciclo de vida do produto demonstra as vantagens econômicas de comprar verde. As considerações relativas a compra verde podem integrar-se em qualquer fase do procedimento; sendo que as especificações técnicas do contrato proporcionam uma boa oportunidade para mencionar as questões ambientais. No caso das considerações sociais ou éticas, em geral é mais difícil demonstrar a conexão. Os critérios sociais ou éticos se referem a questões que afetam a cadeia de produção, mas normalmente não repercutem nas características ou no funcionamento do produto final. Também resulta difícil quantificar as vantagens econômicas de longo prazo e as não econômicas de investir em assuntos sociais. As estratégias de compra social ou ética, portanto, se concentram durante a fase de adjudicação na execução dos contratos, no cumprimento da legislação correspondente e, em menor medida, na qualidade” (Tradução Nossa).
[14] O Índice de Percepção da Corrupção (IPC) é medido desde 1995 e funciona como um instrumento de medição da corrupção ao redor do mundo, numa escala que vai de 0 a 100: o 0 simboliza que o país é corrupto e o 100 simboliza que o país é muito íntegro. Em 2018 o Brasil passou de 43 para 35 pontos na escala, dividindo a 105ª posição do ranking de transparência com a Armênia, Costa do Marfim, Egito, El Salvador, Peru, Timor-Leste e Zâmbia.
[15] A legislação federal norte-americana prevê os seguintes métodos de compras governamentais: a) procedimentos simplificados (simplified procedures); b) propostas fechadas (sealed bidding); c) negociação contratual (negotiated acquisitions); e d) programa negociado de compra (consolidated purchasing programs). Na contratação negociada é garantida maior discricionariedade ao gestor para avaliar critérios pretéritos em relação à empresa com a qual se pretende contratar. Esses critérios, normalmente, são subjetivos e podem valorar mais a experiência pregressa da empresa do que o valor da contratação propriamente dita. (OLIVEIRA, 2015; FORTINI, MOTTA, 2016).
[16] No já mencionado Índice de Percepção da Corrupção – IPC a Holanda ocupa a 8ª posição na escala de transparência, somando um total de 82 pontos, ficando atrás apenas da Noruega, Suíça, Suécia, Singapura, Finlândia, Nova Zelândia e Dinamarca.
advogada, graduada em Direito pela Fundação Universidade Federal de Rondônia (UNIR).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Aline Dias da. Função horizontal das licitações verdes Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 26 abr 2023, 04:18. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/61352/funo-horizontal-das-licitaes-verdes. Acesso em: 26 dez 2024.
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