RODRIGO FRESCHI BERTOLO[1]
(orientador)
RESUMO: De acordo com a Constituição Federal Brasileira de 1988, as funções do Estado são exercidas por três Poderes distintos e independentes: o Executivo, o Legislativo e o Judiciário. O Poder Executivo é responsável pela administração do Estado e pela execução das leis. O Poder Legislativo é responsável pela elaboração e aprovação das leis. O Poder Judiciário é responsável por interpretar e aplicar as leis. Tais poderes devem funcionar sempre em harmonia, de maneira a se complementarem e se limitarem em suas ações. O objetivo desde trabalho é estudar os poderes constituídos, analisar a eficiência e a importância da separação dos poderes para a democracia brasileira, bem como, quais são os possíveis conflitos existentes entre os poderes. Além de descrever a evolução histórica da divisão dos poderes do Estado, o artigo vai analisar o princípio constitucional da Tripartição dos Poderes e, verificar quais os limites de controle que os poderes da União exercem entre si. O estudo foi realizado através de pesquisa descritiva bibliográfica, através da revisão da literatura, cuja análise ocorreu em livros, doutrinas e artigos científicos publicados em revistas com Qualis, impressos ou disponíveis em meio eletrônico.
Palavras-chave: Constituição Federal. Poder Executivo. Poder Legislativo. Poder Judiciário.
ABSTRACT: According to the Brazilian Federal Constitution of 1988, the functions of the State are assigned by three distinct and independent Powers: the Executive, the Legislative and the Judiciary. The executive branch is responsible for the administration of the state and the execution of laws. The Legislature is responsible for drafting and passing laws. The Judiciary is responsible for interpreting and applying the laws. Such powers must always work in harmony, in order to complement and limit each other in their actions. The objective of this work is to study the acquired powers, analyze the efficiency and importance of the separation of powers for Brazilian democracy, as well as what are the possible conflicts between the powers. In addition to describing the historical evolution of the division of State powers, the article will analyze the constitutional principle of the Tripartition of Powers and verify the limits of control that the powers of the Union exercise among themselves. The study was carried out through a descriptive bibliographic research, through a literature review, whose analysis took place in books, doctrines and scientific articles published in magazines with Qualis, printed or available electronically.
Keywords: Federal Constitution. Executive power. Legislative power. Judicial power.
SUMÁRIO: INTRODUÇÃO; 1. A SEPARAÇÃO DOS PODERES; 2 OS PODERES EXECUTIVO, LEGISLATIVO E JUDICIÁRIO NO BRASIL; 2.1 Poder Executivo; 2.2 Poder Legislativo; 2.3 Poder Judiciário; 3 CONFLITOS ENTRE OS PODERES; CONCLUSÃO; REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS.
INTRODUÇÃO
No Brasil, os poderes são divididos em três, sendo eles: o Poder Legislativo, Poder Executivo e Poder Judiciário.
A Constituição Federal de 1988 prevê o princípio da separação dos poderes em seu artigo 2º, estabelecendo que os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário da União são independentes e harmônicos entre si (BRASIL, 1988).
Embora cada poder possua plena autonomia, é necessário que eles atuem conjuntamente para garantir o funcionamento efetivo do Estado. A independência e harmonia entre os poderes conferem legitimidade ao exercício do poder, ao mesmo tempo em que servem como mecanismos de limitação e controle.
De acordo com Maldonado (2003), a técnica da separação dos poderes foi concebida por Montesquieu e Locke como um meio de limitar o poder, tendo sido implementada durante as Revoluções Liberais Burguesas dos séculos XVII e XVIII, em resposta aos abusos e à concentração de poder dos governos Absolutistas na Idade Moderna.
O princípio da separação de poderes estimula certos atritos entre legislativo, judiciário e executivo. Se não fosse assim, não existiria fiscalização recíproca e controle efetivo dos poderes, sempre propício a excessos (OLIVEIRA, 2021).
A principal finalidade dos três poderes é ampliar a participação popular nas decisões governamentais. Essa participação pode ocorrer de maneira direta, por meio de instrumentos como o voto em medidas, referendos, plebiscitos e outras formas de consulta pública previstas na legislação brasileira. Ademais, a separação dos poderes é essencial para assegurar a eficácia dos direitos fundamentais dos cidadãos.
O estudo do tema é de grande valia já que se refere a organizações, funções e competências de poderes constitucionais em Estados Democráticos de Direito. Entender como funcionam os três poderes e quais os conflitos existentes entre eles,
auxilia o cidadão brasileiro a monitorar e participar das decisões políticas, além de garantir a defesa de interesses dos diversos setores da sociedade.
Tendo em vista o tema escolhido a ser tratado neste artigo, a fundamentação teórica se deu através de análises em livros, leis, jurisprudências e debates legislativos, sendo desnecessário a utilização de pesquisa de campo. Assim, a pesquisa foi elaborada a partir de estudos detalhados sobre o tema a partir de recursos bibliográficos disponíveis.
1 A SEPARAÇÃO DOS PODERES
A concepção da separação dos poderes do Estado engloba uma história longa, complexa e descontínua. O contexto político, social e econômico da Europa nos séculos XVII e XVIII foi caracterizado pelas revoluções iluministas e pela queda dos governos absolutistas, o que serviu de referência e estímulo para o desenvolvimento das teorias da tripartição dos poderes (SALOMÃO; REZENDE, 2021).
Segundo Lenza (2016, p. 482):
Acontece que Aristóteles, em decorrência do momento histórico de sua teorização, descrevia a concentração do exercício de tais funções na figura de uma única pessoa, o soberano, que detinha um poder “incontrastável de mando”, uma vez que era ele quem editava o ato geral, aplicava-o ao caso concreto e, unilateralmente, também resolvia os litígios eventualmente decorrentes da aplicação da lei. A célebre frase de Luís XIV reflete tal descrição: “L’État c’est moi”, ou seja, “o Estado sou eu”, o soberano.
No século XVIII, Montesquieu elaborou a "Teoria da Separação dos Poderes" com o intuito de descentralizar o poder que estava concentrado nas mãos de um pequeno grupo (BANDEIRA, 2022). O filósofo consolidou e fundamentou a separação de poderes em sua obra "O Espírito das Leis", publicada em 1748.
Pelo primeiro, o príncipe ou magistrado faz leis por certo tempo ou para sempre e corrige ou ab-roga as que estão feitas. Pelo segundo, faz a paz ou a guerra, envia ou recebe embaixadas, estabelece a segurança, previne as invasões. Pelo terceiro, pune os crimes ou julga as querelas dos indivíduos. Chamaremos este último o poder de julgar e, o outro, simplesmente o poder executivo do Estado. (MONTESQUIEU, 1996, p. 156)
A teoria da separação dos poderes surgiu em um contexto histórico específico, com a intenção de reduzir a atuação do Estado, no entanto, atualmente, as funções do Estado são cada vez mais amplas, exigindo colaboração entre os poderes (OLIVEIRA, 2021).
As teorias que propõem a divisão dos poderes do Estado refletem a preocupação em evitar governos absolutistas e normas tirânicas, sendo essencial a divisão do poder político em diferentes instâncias, estabelecendo a autonomia e os limites de cada um, através da lógica do controle do poder pelo poder (BENDER, 2019).
O objetivo da separação dos poderes era estabelecer um governo limitado, moderado, respeitoso dos direitos fundamentais e apto à realização do interesse geral (FERREIRA FILHO, 2014).
De acordo com o artigo 16 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, a separação dos poderes é inerente à Constituição, sendo, portanto, imprescindível ao constitucionalismo.
O artigo 16 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, estabelece que a separação dos poderes é inerente à Constituição, sendo, portanto, imprescindível ao constitucionalismo.
Artigo 16º Qualquer sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos direitos, nem estabelecida a separação dos poderes não tem Constituição.
Durante toda a história do Brasil, foram promulgadas mais de cinco constituições, refletindo as mudanças ocorridas ao longo dos séculos. Desde a Constituição Federal de 1891, a Tripartição de Poderes tem sido adotada no país, seguindo a tendência da legislação constitucional ocidental (SOUZA, 2008).
Atualmente, o Brasil possui um regime democrático de poderes, conforme estabelecido na Constituição Federal de 1988. Os poderes existentes são independentes, autônomos e interdependentes, sendo todos necessários para atender às necessidades dos cidadãos de forma igualitária (BANDEIRA, 2022).
O Princípio da Separação dos Poderes está previsto no artigo 2º da Constituição Federal, como um dos princípios fundamentais e é considerado uma das cláusulas pétreas do ordenamento jurídico brasileiro.
Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
As cláusulas pétreas são limitações materiais ao poder derivado reformador e têm por finalidade básica preservar a identidade material da Constituição Federal, protegendo institutos e valores essenciais, de forma a permitir a continuidade do processo democrático (CERA, 2012).
As limitações materiais são previstas no artigo 60, § 4º, da Constituição Federal (BRASIL, 1988), conforme abaixo.
Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:
I - de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal;
II - do Presidente da República;
III - de mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros.
§ 1º A Constituição não poderá ser emendada na vigência de intervenção federal, de estado de defesa ou de estado de sítio.
§ 2º A proposta será discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros.
§ 3º A emenda à Constituição será promulgada pelas Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, com o respectivo número de ordem.
§ 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
I - a forma federativa de Estado;
II - o voto direto, secreto, universal e periódico;
III - a separação dos Poderes;
IV - os direitos e garantias individuais.
§ 5º A matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa.
O princípio da separação dos poderes busca garantir a independência e a harmonia entre os três poderes, de modo que cada um deles possua uma esfera de atuação preponderante, sem invadir a esfera de atuação dos demais (HARADA, 2020).
Além disso, esse princípio está intrinsecamente relacionado com o princípio democrático e a forma republicana de governo, uma vez que assegura a alternância no exercício do poder e impede ações autoritárias de governantes que busquem atender apenas aos seus interesses pessoais. Dessa forma, a separação dos poderes também é essencial para preservar a forma e o sistema de governo, bem como garantir a estabilidade política do país.
2 OS PODERES EXECUTIVO, LEGISLATIVO E JUDICIÁRIO NO BRASIL
Desde a promulgação da Constituição Federal de 1988, o presidencialismo foi adotado como regime de governo no Brasil. Neste sistema, o chefe de estado e de governo é o presidente, que é eleito democraticamente através do voto popular, possui um mandato fixo e não depende da confiança parlamentar para governar.
De acordo com a Constituição Federal (BRASIL, 1988), as funções do Estado são exercidas por três Poderes distintos e independentes: o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, que devem funcionar em harmonia, de maneira a se complementarem e se limitarem em suas ações.
Na organização do Estado, cada um dos três Poderes tem competências e prerrogativas definidas na Constituição.
De acordo com Moraes (2002, p. 13):
A Constituição Federal, visando, principalmente, evitar o arbítrio e o desrespeito aos direitos fundamentais do homem, previu a existência dos Poderes do Estado, independentes e harmônicos entre si, repartindo entre eles as funções estatais e prevendo prerrogativas e imunidades para que bem pudessem exercê-las, bem como criando mecanismos de controles recíprocos, sempre como garantia da perpetuidade do Estado democrático de Direito.
A separação dos poderes estabelece que cada um dos poderes deve atuar em um campo específico e não deve haver interferência entre eles. Os poderes são complementares e trabalham juntos para garantir a justiça de forma igualitária.
De forma simplificada, o Poder Executivo é responsável por implementar as leis criadas pelo Poder Legislativo. O Poder Legislativo, por sua vez, cria leis e fiscaliza as ações do Poder Executivo. Já o Poder Judiciário tem como função proteger os direitos individuais, coletivos e sociais, além de resolver conflitos entre cidadãos, entidades e o Estado (SALOMÃO; REZENDE, 2021).
De acordo com Motesquieu (1996, p.168):
Estaria tudo perdido se em um mesmo homem, ou um mesmo corpo de principais ou nobres, ou do Povo, exercesse esses três poderes: o de fazer as leis; o de executar as resoluções públicas; e o de julgar os crimes ou as demandas dos particulares.
Cada poder e sua função será abordado de forma mais detalhada nos subcapítulos abaixo.
É dever do Poder Executivo a administração do Estado, observando as normas vigentes no país, além de governar a população, executar as leis, propor planos de ação, e administrar os interesses públicos (SANTANA, 2016). É o poder destinado a executar, fiscalizar e gerir as leis de um país.
O artigo 76 da Constituição Federal de 1988 determina que:
Art. 76. O Poder Executivo é exercido pelo Presidente da República, auxiliado pelos Ministros de Estado.
No âmbito federal, o poder executivo é exercido não apenas pelo Presidente da República, mas também pelos Ministros indicados por ele, pelos Secretários, Conselhos de Políticas Públicas e órgãos da Administração Pública. Além disso, governadores, prefeitos e outros órgãos que compõem cada esfera federal, estadual, distrital e municipal também desempenham um papel importante.
O chefe do Poder Executivo é eleito por voto público e tem um mandato de quatro anos. O Presidente interage diretamente com o Legislativo, com o poder de sancionar ou vetar uma lei aprovada pelo Congresso Nacional.
O Poder Executivo representa a soberania do Estado no cenário internacional em sua posição de chefe de Estado. Já em relação aos atos de chefia de Governo, o poder Executivo atua na vida política interna, operacionalizando as políticas públicas estabelecidas no ordenamento jurídico brasileiro. Em relação à chefia da Administração, o Executivo é responsável pela prestação de serviços públicos à população, incluindo áreas como saúde, educação, cultura, infraestrutura e outros (FARACO, 2014).
O Poder Legislativo é o responsavél por legislar, ou seja, criar e aprovar as leis brasileiras, além e fiscalizar o Executivo. No âmbito federal é exercido pelos Deputados Federais e Senadores, no âmbito estadual pelos Deputados Estaduais, e, no âmbito municipal pelos Vereadores, conforme previsto no artigo 44 da Contituição Federal de 1988.
Art. 44. O Poder Legislativo é exercido pelo Congresso Nacional, que se compõe da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.
Parágrafo único. Cada legislatura terá a duração de quatro anos.
A função típica do poder legislativo é elaborar leis, normas gerais e abstratas que devem ser seguidas por todos (GUIMARÃES, 2020).
No âmbito federal, o Congresso Nacional é responsável por elaborar emendas à Constituição Federal, leis complementares, ordinárias e delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos e resoluções. O Senado e a Câmara dos Deputados têm funções distintas, mas compatíveis no sistema bicameral. Cada casa tem trabalhos específicos e orçamentos distintos, mas se unem quando se trata de aprovar propostas de lei (SILVA; FIGUEIREDO, 2022).
Nos estados, os projetos de lei tramitam na Assembleia Legislativa, onde os deputados estaduais elaboram emendas à Constituição estadual, leis complementares, ordinárias e delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos e resoluções. A proposta é recebida pela mesa composta pelo presidente da assembleia e secretários, exposta e lida para conhecimento de todos os deputados, e é incluída na pauta para receber emendas. Se aprovada pela comissão, é incluída na ordem do dia para votação e, finalmente, aprovada ou vetada pelo governador (SILVA; FIGUEIREDO, 2022).
No âmbito municipal, os projetos são elaborados como emendas à Lei Orgânica, projetos de lei, decretos legislativos e resoluções. Há uma mesa composta pelo presidente da câmara e secretários, onde os projetos tramitam pelas comissões para possíveis emendas. Antes de ser votada, a proposta precisa ser publicada no Diário Oficial. A matéria é discutida e votada duas vezes pelos vereadores, e só então passa para o prefeito (SILVA; FIGUEIREDO, 2022).
Apesar de ser a principal função do Legislativo, as propostas de lei não são restritas a esse poder. Qualquer cidadão pode propor leis federais, estaduais e municipais, por meio da Iniciativa Popular e da ideia legislativa. As propostas seguem o mesmo caminho apresentado acima para serem aprovadas (SILVA; FIGUEIREDO, 2022).
A função do Poder Judiciário é interpretar as leis e julgar os casos de acordo com as leis brasileiras existentes, isto é, julgar, de acordo com a lei, os conflitos que surgirem na sociedade.
O Judiciário é representado pelos juízes, ministros, desembargadores, conforme previsto no artigo 92 da Constituição Federal (BRASIL, 1988).
Art. 92. São órgãos do Poder Judiciário:
I - o Supremo Tribunal Federal;
I-A o Conselho Nacional de Justiça;
II - o Superior Tribunal de Justiça;
II-A - o Tribunal Superior do Trabalho;
III - os Tribunais Regionais Federais e Juízes Federais;
IV - os Tribunais e Juízes do Trabalho;
V - os Tribunais e Juízes Eleitorais;
VI - os Tribunais e Juízes Militares;
VII - os Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios.
§ 1º O Supremo Tribunal Federal, o Conselho Nacional de Justiça e os Tribunais Superiores têm sede na Capital Federal.
§ 2º O Supremo Tribunal Federal e os Tribunais Superiores têm jurisdição em todo o território nacional.
O Poder Judiciário tem como função mediar a resolução de conflitos entre cidadãos e entre estes e o Estado. A decisão judicial é a medida adotada para garantir o fim do conflito (SILVA, 2023).
Além disso, o Judiciário é responsável por julgar e punir crimes de acordo com a legislação brasileira, e deve agir sempre que houver violação dos direitos da população ou da Constituição Federal (SILVA, 2023).
Conforme previsto no artigo 99 da Constituição Federal de 1988, o Judiciário é um poder independente e possui total autonomia administrativa e financeira para exercer suas funções.
Embora na atualidade o modelo da tripartição de poderes é aquela idealizada por Montesquieu, com o passar do tempo essa ideia remodelou-se na atual estrutura de governo.
Assim corrobora Silva (2014, p. 109):
A independência e a harmonia a que alude a Constituição é característica dos novos contornos da teoria da separação dos poderes no presidencialismo, que não possui mais a austeridade enunciada por Montesquieu.
Lenza (2016, p. 485) completa:
Nesse sentido, as atribuições asseguradas não poderão ser delegadas de um Poder (órgão) a outro. Trata-se do princípio da indelegabilidade de atribuições. Um órgão só poderá exercer atribuições de outro, ou da natureza típica de outro, quando houver expressa previsão (e aí surgem as funções atípicas) e, diretamente, quando houver delegação por parte do poder constituinte originário, como, por exemplo, ocorre com as leis delegadas do art. 68, cuja atribuição é delegada pelo Legislativo ao Executivo.
Silva (2014, p. 109) expõe que:
A harmonia entre os poderes verifica-se primeiramente pelas normas de cortesia no trato recíproco e no respeito às prerrogativas e faculdades a que mutuamente todos têm direito. De outro lado, cabe assinalar que nem a divisão de funções entre os órgãos do poder nem a sua independência são absolutas.
Atualmente, há muitos relatos sobre conflitos entre os três poderes no Brasil, um poder estaria exercendo atividades que são de competência de outro poder. Por exemplo, o Legislativo tem julgado o Presidente da República e administrado infrações cometidas por seus servidores, enquanto o Executivo tem administrado processos tributários e disciplinares e editado decretos autônomos. O Judiciário tem nomeado seus próprios servidores e promovido licitações.
Durante a pandemia, os Estados e Municípios estavam legislando por decretos e portarias que não respeitavam a Lei nº 13.979/20, que rege as atividades de combate ao coronavírus. No entanto, os Governadores e prefeitos impuseram restrições que ultrapassavam as autorizadas pela lei de regência. Os Ministros da Justiça estão concedendo medidas liminares para interromper os atos de competência privativa do Executivo, interferindo nas políticas públicas.
É inaceitável que um poder interfira na área de competência privativa de outro poder. Cada poder tem sua esfera de competência exclusiva ou privativa claramente delimitada pela Constituição Federal, a qual deve ser respeitada.
É importante lembrar que durante o período eleitoral, o artigo 142 da Constituição Federal de 1988 foi mal interpretado e usado para solicitar a intervenção das Forças Armadas no país. No entanto, essa interpretação sem fundamentação jurídica constitui uma grave ameaça à ordem constitucional e democrática (COELHO, 2021). A Constituição não confere às Forças Armadas a atribuição de intervir nos conflitos entre os poderes em suposta defesa dos valores constitucionais.
A Constituição não estabeleceu um quarto poder com a competência de moderar conflitos entre o Judiciário, o Executivo e o Legislativo. No entanto, ela estabeleceu mecanismos de freios e contrapesos que estabelecem controles recíprocos entre os poderes, capazes de equilibrar e impor limites a eventuais abusos por qualquer um deles (COELHO, 2021).
Em casos de ameaças mais graves à estabilidade institucional, a própria Constituição prevê a utilização de instrumentos excepcionais, como o estado de sítio e a intervenção federal, por meio de procedimentos e regras de competência também estabelecidas no texto constitucional (COELHO, 2021).
A harmonia entre os poderes é essencial, e cada um deve respeitar a competência dos demais, conforme estabelecido na Constituição Federal.
A Constituição também estabelece mecanismos de freios e contrapesos para equilibrar e impor limites a eventuais abusos. Em casos graves, a Constituição prevê o uso de instrumentos excepcionais, como o estado de sítio e a intervenção federal.
O Judiciário deve resolver conflitos entre cidadãos, entre os cidadãos e o Estado ou entre os poderes do Estado. Os poderes devem se complementar e se limitar em suas ações.
Portanto, os poderes devem funcionar em harmonia, complementando-se e limitando-se em suas ações, pois quando os poderes constituídos entram em conflito entre si, os reflexos atingem toda a sociedade, seja por meio da ausência de serviços ou pela prestação precária dos mesmos.
CONCLUSÃO
Conforme apresentado neste artigo, os poderes da República são divididos em três esferas independentes e harmônicas entre si.
De forma resumida, o Poder Legislativo é responsável por elaborar as leis do país. O Poder Executivo é responsável pela administração pública e pela execução das políticas públicas, sendo liderado pelo presidente da República. O Poder Judiciário é o poder responsável pela interpretação das leis e pela aplicação da justiça.
A separação e independência dos poderes são fundamentais para a democracia e a proteção dos direitos individuais, pois evita o acúmulo de poder em uma única esfera e possibilita o controle e fiscalização do Estado.
É possível ocorrerem conflitos entre os poderes da República em um sistema de governo com divisão de poderes, como é o caso do Brasil. Isso acontece porque cada poder tem suas próprias funções, responsabilidades e limites, mas essas esferas podem se sobrepor em alguns casos, como ocorreu na época da pandemia do Covid 19 que assolou o país no ano de 2020 e seguintes.
Em geral, os conflitos entre os poderes são resolvidos por meio de negociação, diálogo e respeito às funções de cada um. Importante ressaltar que a separação dos poderes é uma característica fundamental da democracia, pois garante a proteção dos direitos individuais e a fiscalização do Estado.
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[1] graduação em Direito pelo Centro Universitário de Votuporanga (2004). Especialista em Direito Constitucional pela Unisul/IDP (2007). Especialista em Direito Processual pela Unama (2008). Especialista em Direito do Trabalho e Seguridade Social pelo Centro Universitário Toledo (2012). Especialista em Direito Previdenciário pela Universidade Anhanguera-Uniderp (2013). Especialista em Direito Notarial e Registral pela Universidade Anhanguera-Uniderp (2015). Mestrado em Ciências Ambientais pela Universidade Brasil. Atualmente é sócio-proprietário de Escritório de Advocacia e Professor Universitário.
graduando no curso de Direito da Universidade Brasil - Campus Fernandópolis
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: GARCIA, KLERIO RICARDO DA SILVA. Conflitos entre os Poderes da República Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 31 maio 2023, 04:19. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/61546/conflitos-entre-os-poderes-da-repblica. Acesso em: 27 dez 2024.
Por: Filipe Luiz Mendanha Silva
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