GLAUCIMARCOS FAKINE MARSOLI
(orientador)
RESUMO: O presente trabalho acadêmico promove a exposição de discussão no campo do direito relacionado ao Direito do Consumidor e sua relação de consumo com empresas ligadas à prestação de serviço de telefonia e internet na temática do dano moral. Serão dispostos conceitos e estruturas do dano moral em primeiro momento e sua aplicabilidade ao consumidor previstos no Código de Direito do Consumidor. Em terceiro momento, o objetivo será analisar casos práticos e identificar o perfil de análise sobre os julgados, sobre o que a Jurisprudência vem identificando como padrão sobre as práticas abusivas das empresas de telefonia e assim sucessivamente considerando-as dano moral em prol do consumidor.
Palavras-chave: Dano Moral. Consumidor. Telefonia.
ABSTRACT: The present academic work promotes the exposition of discussion in the field of law related to Consumer Law and its consumer relationship with companies linked to the provision of telephone and internet services on the theme of moral damage. Concepts and structures of moral damage will be arranged at first and their applicability to the consumer provided for in the Consumer Law Code. Thirdly, the objective will be to analyze practical cases and identify the profile of analysis on the judgments, on what the Jurisprudence has been identifying as a standard on the abusive practices of the telephone companies and so on, successively considering them moral damage in favor of the consumer.
Keywords: Moral Damage. Consumer. Telephony
O dano moral é sem dúvida um tema que a cada dia que passa ganha destaque no direito brasileiro. A enormidade de lesões invisíveis e sem o devido reparo causa espanto pois as vítimas sequer em vezes sabem que possuem direitos e que estão sendo lesados por mero desconhecimento e abuso de outrem.
A necessidade de proteger e educar essas pessoas é também papel do Estado, e mais, cobrar como Estado que é, posturas e ética sobre grandes empresas que pratiquem atos assim, criando órgãos de controle, fiscalização rígida e punição corretiva.
E por isso, o objetivo deste trabalho é fomentar a discussão e apontar algumas dessas práticas, além de debulhar o dano moral no âmbito do direito do consumidor, onde a prática é infelizmente reiterada pelas grandes companhias. A finalidade é identificar quais as práticas e combatê-las, a priori pelo campo do direito, com argumentos e fundamentos jurídicos trazidos pela normativa brasileira, como um todo, seja Legislativo, Judiciário ou até no Executivo.
O Direito brasileiro já possui consolidação em diversas regras consumeristas e as quais precisam não só de respeito, mas de consolidação, de aplicação forte e combatente às más práticas contra o consumo e consumidor.
As fontes do trabalho serão artigos, a legislação consumerista em especial, além de diversas Jurisprudências sobre o tema. Serão buscadas ainda normas sobre a regulação das empresas e pesquisas no campo de discussão.
Em especial, as empresas de telefonia serão objeto de discussão central do tema, haja vista a grande gama de reclamações na relação de consumo entre consumidores de planos e aparelhos de celular e suas respectivas companhias telefônicas.
Por isso, serão trazidos temas e conceitos sobre o dano moral em suas teorias, nuances, conceitos e classificações, além de focar na parte do direito postado ao Código de Defesa do Consumidor, posteriormente.
Ao fim, coletar essas práticas ilegais pelas empresas e apontar os devidos problemas inerentes à lei do consumidor, frisando a necessidade de que embora usuais, devam ser derrubadas, devam ser combatidas veementemente pelo Estado, em seu dever jurisdicional.
O dano moral é o primeiro e principal elemento da relação que origina o problema entre agente causador do dano e o lesado. O dano tem vertentes em que não se reservam apenas ao moral, ao íntimo e por isso precisa ser detalhado e diferenciado.
Derivado do direito civil, o dano e suas vertentes são composição de uma esfera maior, a da Responsabilidade Civil, e que é proposição a seguir sobre o Dano Moral, quando configurado. Humberto Theodoro Junior explica que o dano moral são aqueles ocorridos na esfera da subjetividade, no plano íntimo, na valoração pessoal em que o ofendido se cerca, desferindo algum ato, alguma prática que descompasse esse sentimento, esses valores, atentando-se sobre a personalidade humana, características, sentimentos ou até em casos graves como alteração psíquica, afetiva, social, ou seja, como um todo, o patrimônio moral da vítima, seja em qual grau for necessário para tanto. (THEODORO JUNIOR, 2016)
Flávio Tartuce (2018) faz questão de recordar que o dano moral demorou a ser aceito, ainda sofrendo resistência no Código Civil de 1916, onde pouco se ganhou perante a Doutrina e Jurisprudência à época. Contudo, em tempos modernos, outros autores reforçaram conceitos que, na visão de Tartuce, encontram-se em maioria, podendo assim conceituar unicamente:
Seguindo a visão majoritária, constituindo o dano moral uma lesão aos direitos da personalidade, tratados em rol meramente exemplificativo entre os arts. 11 a 21 do CC/2002, para a sua reparação não se requer a determinação de um preço para a dor ou o sofrimento, mas sim um meio para atenuar, em parte, as consequências do prejuízo imaterial, o que traz o conceito de lenitivo, derivativo ou sucedâneo.
Por isso é que se deve utilizar, com o devido respeito a quem pensa de forma contrária, a expressão reparação e não ressarcimento para os danos morais, conforme outrora foi comentado. (TARTUCE, 2018, p. 292)
O mencionado autor (TARTUCE, 2018) ainda reforça que sobre a diferença entre ressarcimento e reparação, quando comenta que o dano moral não visa finalidade de acréscimo patrimonial, pois há embutido no dano moral a perda emocional e/ou psíquica que precisa ser compensada, reparada, e a única forma de fazê-la que a aproxime da reparação moral é a pecuniária, a indenizatória.
2.1.1. Dano moral, dano material e dano extrapatrimonial
Uma dessas vertentes classificatórias é o dano moral do dano material. Ambos são considerados atos ofensivos à vítima, mas as atingem de forma diversa. Como detalha Theodoro Jr., os danos:
Materiais, em suma, são os prejuízos de natureza econômica, e, morais, os danos de natureza não econômica e que “se traduzem em turbações de ânimo, em reações desagradáveis, desconfortáveis, ou constrangedoras, ou outras desse nível, produzidas na esfera do lesado”.
Assim, há dano moral quando a vítima suporta, por exemplo, a desonra e a dor provocadas por atitudes injuriosas de terceiro, configurando lesões nas esferas interna e valorativa do ser como entidade individualizada (THEODORO JUNIOR.,2016, p. 19)
Portanto, embora indenizáveis por meios parecidos – o pecuniário – a ofensa se difere e por isso, por vezes, mensurar a extensão do dano é mais difícil do que a do patrimonial, onde se avalia meramente o reparo do objeto material.
Conceitualmente falando, ainda há discussões sobre o nome classificatório sobre o dano moral e extrapatrimonial. Quando se diz extrapatrimonial remete-se muito a fora da alçada do material e se encontra ao moral. Todavia, a criação da expressão dano extrapatrimonial é apenas uma criação da Reforma Trabalhista e que em sua natureza não altera em nada a intimidade da expressão. Isto é, dano extrapatrimonial e moral em sua essência, acabam por ser a mesma coisa.
Para Tartuce (2018) a expressão mais desejável é a de ‘dano moral’ por ser consagrada tanto na Constituição Federal, como na legislação inferior, a lembrar do então Código de Defesa do Consumidor, objeto deste estudo, o qual refere-se a este tipo de dano como “moral”. Assim também está habituada a Jurisprudência do tema, a qual por anos anexou Súmulas e Julgados com a primeira nomenclatura. Por isso, por sua predominância, embora sejam a mesma expressão, convém conhece-la como ‘dano moral’.
O Dano Moral pode adentrar a esfera coletiva, ainda que haja contrariedade sobre. Essa discussão perdurou por tempos no contexto de que a personalidade adstrita do dano moral inevitavelmente impedia essa coletividade do dano.
O contraponto que inicia a discussão em favor da referida tese faz menção à aceitação da tutela da honra objetiva da pessoa jurídica, no passo que uma pessoa jurídica pode sofrer dano moral, pois assim lhe é denominado quando ferido a honra sobre seu nome, sua imagem, sua reputação (SANTANA, 2019).
A partir disto, entende-se, portanto, que por se tratar de uma pessoa jurídica, sem personalidade, ou seja, sem o interior e subjetivo definidor do dano, abre-se um caminho para argumentação de dano moral para entes também despersonalizados, assim como fora com as pessoas jurídicas.
Um segundo argumento é a regulamentação em sede de Constituição Federal. “O reconhecimento constitucional de direitos coletivos (metaindividuais) é fruto das transformações operadas nos principais sistemas jurídicos contemporâneos” (SANTANA, 2019, p. 162). Neste passo, outrora abriu-se argumentos para a legalização para situações específicas pelos quais o dano fosse despersonalizado, mas coletivo e que causasse lesão aos chamados direitos de personalidade.
Existem valores próprios da coletividade, tais como a dignidade, honra, bom nome, reputação, tradição, paz, tranquilidade, liberdade, dentre outros aspectos relacionados aos direitos da personalidade.
O reconhecimento legal da coletividade como titular de bens imateriais valiosos conduz à afirmação de que o sistema jurídico tem mecanismos próprios de prevenção e reparação das lesões aos mesmos, admitindo-se, portanto, a busca da reparação dos danos morais coletivos. (SANTANA, 2019, p. 163).
E esses mecanismos foram se afirmando dentro do ordenamento jurídico brasileiro, tal qual no direito ambiental e no direito do consumidor. Em verdade, a Lei 7.347 de 1985 a qual disciplina a ação civil pública elencou em seu artigo 1°, em redação proveniente da Lei 12.529/2011:
Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados:
l - ao meio-ambiente;
III – a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;
IV - a qualquer outro interesse difuso ou coletivo.
V - por infração da ordem econômica;
VI - à ordem urbanística.
VII – à honra e à dignidade de grupos raciais, étnicos ou religiosos.
VIII – ao patrimônio público e social. (BRASIL, 2011)
E é no direito consumerista que o tema se encontra, na medida em que o Código de defesa do consumidor regulou o dano moral coletivo, a saber em seu parágrafo único na conceituação de consumidor, quando equipara a consumidor a coletividade de pessoas, quando posiciona a proteção do direito do consumidor a coletividade, bem como em artigo 81 quando enumera, em seu inciso segundo:
Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo:
II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base;
Em mesmo sentido e frente à discussão legal, a jurisprudência do STJ já sedimenta que o dano moral coletivo está presente no ordenamento jurídico pátrio, em inúmeros jugados tais quais “2ª T., REsp 1.057.274/RS, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 01.12.2009, DJe 26.02.2010. No mesmo sentido: STJ, 2ª T., REsp 1.367.923/RJ, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 27.08.2013, DJe 06.09.2013; STJ, 2ª T., REsp 1.509.923/SP, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 06.10.2015, DJe 22.10.2015; (THEODORO JUNIOR, 2016, p. 286), entre outros, os quais assim definiram-se em um julgado sobre serviços públicos destinados à gratuidade de transporte público a idosos:
1. O dano moral coletivo, assim entendido o que é transindividual e atinge uma classe específica ou não de pessoas, é passível de comprovação pela presença de prejuízo à imagem e à moral coletiva dos indivíduos enquanto síntese das individualidades percebidas como segmento, derivado de uma mesma relação jurídica-base.
2. O dano extrapatrimonial coletivo prescinde da comprovação de dor, de sofrimento e de abalo psicológico, suscetíveis de apreciação na esfera do indivíduo, mas inaplicável aos interesses difusos e coletivos.
3. Na espécie, o dano coletivo apontado foi a submissão dos idosos a procedimento de cadastramento para o gozo do benefício do passe livre, cujo deslocamento foi custeado pelos interessados, quando o Estatuto do Idoso, art. 39, § 1º exige apenas a apresentação de documento de identidade.
4. Conduta da empresa de viação injurídica se considerado o sistema normativo” (THEODORO JUNIOR, 2016, p. 260)
Desta feita, considera-se que o dano moral coletivo hoje, no ordenamento jurídico pátrio, é convicto e concreto perante os inúmeros casos já julgados pelas superiores cortes.
2.2. Panorama Histórico Brasileiro
O dano moral em seu panorama histórico nacional permitiu-se ainda sobre o Século XX, quando da forma mais próxima ao Código Civil de 1916 tomar forma através da Lei de responsabilidade civil das estradas de ferro, Lei nº. 2.681/1912, o qual preocupavam-se com o dano corpóreo ou estético sofrido pelos profissionais da linha de ferro, haviam a garantia de indenização definida pelo juízo. (TRUGILHO, 2015).
Antes, contudo, de terem registros no direito romano, canônico, na escola francesa e em seu Código Civil de 1804, direito italiano também em Código Civil de 1865, direito alemão em 1900 e até no direito português, o qual também em seu Código Civil de 1867 prezava por regras previstas em dois artigos (2.384 e 2.391), o qual ainda que não taxativos, “prevalecia o entendimento de que a proteção do patrimônio imaterial do ser humano era ampla” (SANTANA, 2019, p. 130).
Já em âmbito brasileiro, um próximo passo de convicção do dano moral após a Lei 2.681 de 1912, ainda que singelo e sem doutrinas asseguradoras, o Código Civil de 1916 tratou de trazer um reforço para o dano patrimonial, mas sem mencionar nada sobre em sua literalidade, sem sequer ter algo expresso. Contudo, “Clóvis Bevilaqua entendeu que o art. 76 do CC/1916 encerrou a controvérsia sobre a reparabilidade do dano moral” (SANTANA, 2019, p. 142). Em uma de suas obras, mencionado por Tiago Ribeiro, Bevilaqua detalha:
Em meu sentir, o sistema do Código Civil, nas suas linhas gerais, relativamente ao ponto questionado é o seguinte: a) Todo dano seja patrimonial ou não, deve ser ressarcido, por quem o causou, salvante a escusa da força maior que, aliás, algumas vezes não aproveita, por vir precedida de culpa. É regra geral sujeita a exceção. (...) c) Para a reparação do dano moral, aquele que se sente lesado, dispõe de ação adequada. (...) e) Atendeu, porém, a essas considerações, no caso de ferimentos que produzem aleijões ou deformidades; tomou em consideração o valor de afeição, providenciando, entretanto, para impedir o árbitro, o desvirtuamento; as ofensas à honra, à dignidade e à liberdade são outras formas de dano moral, cuja indenização o Código Civil disciplina. (BEVILAQUA, 1943, p. 319 apud RIBEIRO, 2016, p. 07)
“O referido autor afirma que se o interesse moral justifica a propositura de uma ação para defendê-lo ou restaurá-lo, não há como negar a indenização por dano moral à luz do CC/1916, mesmo que o bem moral não se exprima em dinheiro” (SANTANA, 2019, p. 142).
Frise-se que essa era uma das teorias positivistas à época, a qual ganhava notoriedade frente às teorias negativistas e ecléticas. Outros artigos, como o 159, o 1.538 e o 1.541 do antigo Código Civil são outros casos de passagens que reforçavam essa tese. (SANTANA, 2019).
Todavia, embora outras leis tivessem sutis passagens frente às intenções de indenizar o dano moral, a narrativa em favor desta só arrebatou quando da presença na Constituição Federal de 1988, através do artigo 5° inciso X, quando menciona que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.” (BRASIL, 1988). Ainda assim, mesmo emo norma pátria, o dano moral precisava de sua concretude, e a partir disso,
[...] diversos diplomas legais foram editados e contemplaram a tese da reparabilidade dos danos morais, dentre eles o Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei 8.069/1990; o Código de Defesa do Consumidor – Lei 8.078/1990; Lei dos Desaparecidos Políticos – Lei 9.140/1995; Lei de Direitos Autorais – Lei 9.610/1998; Lei do Direito de Arena e à Imagem do Atleta Profissional – Lei 9.615/1998, Lei Distrital 2.547/2000 – Lei da Fila de Banco, dentre outras. (SANTANA, 2019, p. 145)
Hoje, não só as passagens legais expressas, mas também a jurisprudência do STJ já confirma tranquilamente a presença do dano moral, através de variadas súmulas, tais quais a de número 37, 362, 498, 227, 370, dentre outras. (SANTANA, 2019)
Desta feita, hoje, em sede de seu panorama histórico, as leis infraconstitucionais são as que regem conceitos, valor indenizatório, causídicas específicas, sempre à luz da Constituição Federal, em seu artigo 5°, inciso X.
2.3. A Natureza Jurídica e a reparação do dano moral
Sobre sua natureza jurídica, o dano moral nasce do dever de indenizar proveniente dos mesmos preceitos derivados da responsabilidade civil, tanto no seu modelo subjetivo ou objetivo. Em verdade, o dano moral é elemento da composição no que se entende sobre a teoria clássica da responsabilidade civil: conduta, culpa, dano e o nexo causal.
Neste sentido,
O fundamento da condenação é a repressão do ilícito civil, cuja sede normativa se encontra nos arts. 186 e 927 do Código Civil. Nesses dispositivos não há previsão alguma de pena que o juiz da causa de reparação do dano privado possa adicionar à indenização por prejuízos da vítima. O autor do ilícito civil, ou seja, aquele que “violar direito” ou “causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral”, não recebe outra imposição dos referidos preceitos legais senão a de ficar “obrigado a repará-lo”. (THEODORO JUNIOR, 2016, p. 108)
E essa reparação no dano moral que causa embaraço no que diz respeito ao quantum indenizatório. No Brasil hoje constam correntes sobre a natureza jurídica desse caráter indenizatório justamente definidor de valores. Segundo Flávio Tartuce (2018), se dividem em três correntes doutrinárias: a reparadora e compensatória hoje majoritária, a segunda de natureza punitiva e a terceira com caráter reparatório, mas também pedagógico ou preventivo, ou seja, de caráter misto.
A discussão doutrinária dessas concorrentes vai aquém dos valores, ou seja, de como esse valor pode servir de real função de retrair novos danos nessa alçada? Por isso que se discute dentre as correntes se há funções além da mera reparação.
Há na corrente preventiva, ou educativa, ou mista, a finalidade de que
[...] todos os integrantes da sociedade juridicamente organizada, e não especificamente ao agente causador do dano. Considera-se como aspecto intimidativo e desestimulador de futuras violações de direitos da personalidade, em que se busca evitar condutas semelhantes de outros integrantes da coletividade. “É por meio de imposição de eventual sanção pecuniária que certamente muitos integrantes da sociedade não se sentem estimulados a atingir os valores imateriais de seus semelhantes”. (SANTANA, 2019, p. 196).
É a intimidação aos próximos autores, em suma. É prevenir tendo uma carga financeira aquém de meramente reparatória. Contudo, criticada por alguns autores no sentido de que “constitui-se em desvio dos propósitos do direito privado, sendo que a questão comporta regulamentação no âmbito do direito público, por meio de legislação especial e adequada” (SANTANA, 2019, p. 196), ou seja, não é desta feita jurisdicional definir valores a mais para ter efeito educativo sendo que a prevenção deve vir por meios próprios, por legislação, por políticas públicas, e não por vias jurisdicionais.
“Em reforço, a indenização por danos morais não pode levar o ofensor, pessoa natural ou jurídica, à total ruína, não sendo esse o intuito de responsabilidade civil do sistema jurídico nacional.” (TARTUCE, 2018, p. 317).
O caráter punitivo apesar de também representar alguns adeptos não é majoritária pelo fato de que a punição em si resgata a esfera penal e assim sendo perderia o princípio da unicidade na reparação, ou até cometeria bis in iden pelo fato de atribuir valores aquém da indenização satisfativa para a punitiva (SANTANA, 2019), dentre outros argumentos.
A de caráter compensatória é hoje majoritária porque guarda similaridade com a reparação patrimonial, e porque se delineia junto aos seus mesmos artigos da responsabilidade civil e além disto segue o ditame do artigo 944 que diz “e “a indenização mede-se pela extensão do dano”, e por isso não se deve acrescentar, em esfera civil, compensações maiores ao dano daquele indivíduo. (SANTANA, 2019).
Com efeito, “a finalidade compensatória do dano moral não significa o pagamento da dor, sofrimento, aflição, preocupação, desgosto experimentados pela vítima do ato ilícito. O dinheiro na reparação do dano moral serve como meio de compensar ou proporcionar uma satisfação à vítima”. (SANTANA, 2019, p. 190).
E frise-se que essa posição não é unânime. A Jurisprudência diverge em julgados com as mencionadas teses ao passo que o posicionamento mais frequente e/ou atual vem de encontro com a teoria mista, além da existência de projeto de lei (PL 399/2011) lançado com o intuito de emplacar alterações no artigo 944 do Código Civil, “para introduzir um novo parágrafo nesse comando legal, com a seguinte redação: “a reparação do dano moral deve constituir-se em compensação ao lesado e adequado desestímulo ao ofensor”. (TARTUCE, 2018, p. 318).
Pode-se concluir sobre as teorias, nas palavras de Humberto Theodoro Junior, que “a indenização pelo dano moral não deve ser insignificante, mas também não será exorbitante e sempre será meio de encontrar equitativo equilíbrio entre a situação do ofendido e a do ofensor e, em hipótese alguma, servirá de causa para propiciar o enriquecimento do ofendido, nem para provocar a ruína do ofensor (2018, p. 122).
3. O DIREITO CONSUMERISTA E O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
O início deste capítulo tem foco sobre os direitos relacionados ao direito consumerista, a fim de que se compreenda a esfera pelos quais os serviços de telefonia se estendam, na relação de consumo. E para isso é fundamental explorar o Código de Defesa do Consumidor como principal fonte normativa do tema que baliza o estudo do tema proposto.
Para que haja qualquer relação de consumo necessário identificar os participantes desse negócio jurídico. E neste negócio, o ator principal sem dúvida é o consumidor, pois se trata do utilizador do produto e do serviço como finalidade do negócio, nas palavras do artigo 1° do CDC “toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.” (BRASIL,1990). Ademais, em seu parágrafo único, adiciona-se que “Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo”. (BRASIL, 1990).
Mas nem sempre essa definição foi uníssona. Em verdade, a doutrina separa quatros conceitos e a Jurisprudência teoriza em duas vertentes. As teorias finalista e maximalista se distinguem justamente pelo alcance da conceituação, no sentido que a segunda abrangesse o máximo da relação de consumo possível, inclusive pessoa jurídica profissional que adquire o produto independente da condição.
Contudo, a teoria finalista hoje dominante nos julgados dos tribunais maiores no país, restringe esse conceito a justamente ao final da relação de consumo. Assim sendo,
A Jurisprudência do STJ atualmente se encontra consolidada no sentido de que a determinação da qualidade de consumidor deve, em regra, ser feita mediante aplicação da teoria finalista, que, numa exegese restritiva do art. 2º do CDC, considera destinatário final tão somente o destinatário fático e econômico do bem ou serviço, seja ele pessoa física ou jurídica.
Com isso, fica excluído da proteção do CDC o consumo intermediário, assim entendido como aquele cujo produto retorna para as cadeias de produção e distribuição, compondo o custo (e, portanto, o preço final) de um novo bem ou serviço. Vale dizer, só pode ser considerado consumidor, para fins de tutela pela Lei nº 8.078/90, aquele que exaure a função econômica do bem ou serviço, excluindo-o de forma definitiva do mercado de consumo.
Em suma, o caráter distintivo da teoria finalista reside no fato de o ato de consumo não visar ao lucro tampouco à integração de uma atividade negocial. (THEODORO JUNIOR, 2021, p. 13)
Como visto, a Jurisprudência fornece a essência do conceito e a doutrina clareia a definição em quatro tipos de consumidores distintos, à luz da lei e do que diz o STJ. Segundo Fabrício Bolzan, em sentido estrito, as quatro balizas conceituais de consumidores:
- Consumidores são as pessoas naturais ou jurídicas;
- Consumidor é aquele que adquire produto ou contrata serviço;
- Consumidor é também aquele que utiliza produto ou serviço;
- Consumidor é o destinatário final do produto ou do serviço adquirido/contratado no mercado de consumo. (BOLZAN DE ALMEIDA, 2019, p. 63)
Com efeito, esses elementos conceituais asseguram a possibilidade de pessoas jurídicas e físicas serem consumidores, a necessidade da aquisição e da utilização de produto ou serviço, e que essa aquisição tenha finalidade de consumo como destinatário final, nunca para revenda ou uso profissional.
É o que Lima Marques (apud BOLZAN DE ALMEIDA, 2019) chama de consumo intermediário e não final, sendo que este sempre terá uma finalidade posterior àquela sua finalidade, ou seja, na revenda haverá um posterior consumidor final e assim não estariam tratando do sentido estrito do consumidor. (por isso da aceitação da teoria finalista).
Outro ponto sobre esses elementos é a posição de uso/consumo dessa pessoa jurídica ao passo que para assim ser considerada consumidora, essa não pode estar em posição de uso intermediário bem como de não vulnerabilidade com o fornecedor do produto ou serviço. (BOLZAN DE ALMEIDA, 2019).
Em outras palavras, para que haja também uma consolidação de consumo é fundamental a essência da vulnerabilidade do consumidor para com a empresa, ou seja, em estados negociais diferentes, à medida em que essa possua o negócio e o poder econômico da precificação, de acordo com o artigo 29 do mesmo CDC.
Por isso, para que a pessoa jurídica realmente esteja em posição de consumidor ela deve estar sujeita a essa vulnerabilidade e não em posição igualitária com a outra empresa, que em suma a colocaria em posição de um contrato civil.
Neste sentido, “segundo posicionamento consolidado no Superior Tribunal de Justiça, a comprovação da vulnerabilidade da pessoa jurídica é pressuposto ‘sine qua’ para o enquadramento desta no conceito de consumidor previsto no CDC”. (BOLZAN DE ALMEIDA, 2019, p.71). Com isso, há de se admitir a pessoa jurídica como consumidora, contanto que essa vulnerabilidade seja comprovada e que essa não esteja em posição intermediária na relação de consumo.
Por isso, a conceituação hoje de consumidor é demasiadamente discutida justamente pela relevância na posição da relação de consumo, haja vista o conflito entre a esfera do direito civil com o direito consumerista justamente no que tange a posição da pessoa jurídica, bem como a utilização finalística do produto e serviço, o que acaba desencadeando, por exemplo, em responsabilidades civis distintas.
3.2. Elementos da relação de consumo
Como já expresso, a relação jurídica de consumo “é o vínculo ou liame de direito estabelecido entre duas partes, por meio do qual se viabiliza a transmissão provisória ou permanente de algum bem” (LISBOA, 2012, p. 95). A relação é sempre pautada por meio de um normativo presente no ordenamento jurídico que neste caso se trata do Código de Defesa do Consumidor e da Constituição Federal.
Neste âmbito de CDC, a relação de consumo ocorre entre fornecedor e consumidor por meio de um produto ou serviço. Para entender bem esses elementos, tais se dividem entre conceitos de elementos subjetivos e objetivos.
Os elementos subjetivos consistem nos sujeitos da relação, no caso fornecedor e consumidor. “Já os elementos objetivos são os objetos perante os quais recaem os interesses dos fornecedores em aliená-los e dos consumidores em adquiri-los ou contratá-los” (BOLZAN DE ALMEIDA, 2019, p. 57), que no caso são os produtos e os serviços.
Até complementando os conceitos da relação (já que trazido o do consumidor em tópico próprio), os faltantes listam-se todos no artigo 3 do CDC, a saber:
Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
§ 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.
§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista. (BRASIL, 1990).
“Nas relações de consumo, o vocábulo “fornecedor” é fixado como gênero, do qual são espécies: o produtor, o montador, o criador, o fabricante, o construtor, o transformador, o importador, o exportador, o distribuidor, o comerciante e o prestador de serviços” (LISBOA, 2012, p. 99).
No que se refere ao conceito de produto, Rizatto Nunes dispensa divergências do âmbito cível e frisa:
Esse conceito de produto é universal nos dias atuais e está estreitamente ligado à ideia de bem, resultado da produção no mercado de consumo das sociedades capitalistas contemporâneas. É vantajoso o seu uso, pois o conceito passa a valer no meio jurídico e já era usado por todos os demais agentes do mercado (econômico, financeiro, de comunicações etc.). (2007, p. 113 apud TARTUCE, 2018, p. 114)
Nos serviços, “cumpre esclarecer que, apesar de a lei mencionar expressamente a remuneração, dando um caráter oneroso ao negócio, admite-se que o prestador tenha vantagens indiretas, sem que isso prejudique a qualificação da relação consumerista” (TARTUCE, 2018, p. 118).
Desta feita, considerado os elementos subjetivos e objetivos cada qual em sua composição, cumpre agora observar a composição estrutural do Código de Defesa do Consumidor, em tópico próprio.
3.3. A O código de defesa do consumidor e o ordenamento jurídico brasileiro
Tratando agora do posicionamento do CDC perante o ordenamento jurídico brasileiro cumpre expor que toda e qualquer aspiração perante o tema inicia-se sobre a Constituição Federal (art. 5º, XXXII, e 170, V) e no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (art. 48), a saber:
- CF/88: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
XXXII — o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor”.
- CF/88: “Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos a existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
(...)
V — defesa do consumidor”.
- ADCT: “Art. 48. O Congresso Nacional, dentro de cento e vinte dias da promulgação da Constituição, elaborará código de defesa do consumidor”. (BRASIL, 1988).
Neste passo, apesar de prazo maior à menção do artigo 48, o Código de defesa do Consumidor fora instituído pela Lei 8.078 de 1990, constituindo-se uma norma de ordem pública, de interesse social e geral. Além disso, nas palavras de Fabrício Bolzan de Almeida, “o Código de Defesa do Consumidor é considerado uma lei principiológica, isto é, está constituído de uma série de princípios que possuem como objetivo maior conferir direitos aos consumidores, vulneráveis da relação, e impor deveres aos fornecedores”. (BOLZAN DE ALMEIDA, 2019, p. 44).
E essa posição normativa por ser principiológica, de ordem pública faz com que leis ordinárias respectivas a outros temas, por vezes também a respeito de relações de consumo específicas (bancos, calçados, automóveis, etc.), sejam hierarquicamente inferiores ao CDC. (TARTUCE, 2018).
Passando agora para a organização estrutural do Código Consumerista em si, são divididos em capítulos e títulos. O capítulo primeiro expõe as disposições gerais, tais quais os conceitos já trazidos em tópico anterior. O Capítulo segundo premia os princípios estruturantes do CDC, e o terceiro os direitos básicos do consumidor. (BRASIL, 1990)
Em quarto capítulo a qualidade de produtos e serviços, com observação na proteção e segurança e saúde dos consumidores, nas responsabilidades pelo fato e vício relacionados aos produtos e serviços, decadência e prescrição e despersonalização da pessoa jurídica. (BRASIL, 1990)
No Capítulo 5 as práticas comerciais como normativas sobre meio de oferta, de publicidade, cobrança de dívidas e as práticas abusivas. No Capítulo sexto as tratativas sobre proteção contratual, cláusulas abusivas e dos contratos de adesão. No capítulo 6-A, incluso pela Lei 14.181 de 2021 trata da prevenção e do tratamento do superendividamento, no que concerne o crédito responsável ao consumidor. Em seguinte, as sanções administrativas, incluindo as de cunho penal, previstos em seção própria. (BRASIL, 1990)
E ao final, título próprio que trate da defesa do consumidor em juízo, como seus legitimados, as modalidades de tutela, nas ações de responsabilidade de fornecedores, da coisa julgada, os quais findam o Código com a formação do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor.
3.4. Princípios fundamentais e direitos básicos previstos no Código de defesa do Consumidor
Os princípios fundamentais e os direitos básicos previstos no CDC estão por naturalidade em conjunto maior tratados a partir do artigo 6° do referido código. Por sua literalidade, os direitos básicos estão assim descritos:
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
I - a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;
II - a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações;
III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;
IV - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços;
V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;
VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;
VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados;
VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;
IX - (Vetado);
X - a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral.
XI - a garantia de práticas de crédito responsável, de educação financeira e de prevenção e tratamento de situações de superendividamento, preservado o mínimo existencial, nos termos da regulamentação, por meio da revisão e da repactuação da dívida, entre outras medidas;
XII - a preservação do mínimo existencial, nos termos da regulamentação, na repactuação de dívidas e na concessão de crédito;
XIII - a informação acerca dos preços dos produtos por unidade de medida, tal como por quilo, por litro, por metro ou por outra unidade, conforme o caso. (BRASIL, 1990).
Direitos básicos podem ser definidos como “aqueles interesses mínimos, materiais ou instrumentais, relacionados a direitos fundamentais universalmente consagrados que, diante de sua relevância social e econômica, pretendeu o legislador ver expressamente tutelados” (CAVALIERI FILHO p. 90 apud BOLZAN DE ALMEIDA, 2019, p. 210-211).
Por sua vez, os princípios são sabidamente norteadores do direito e neste caso das regras consumeristas, as quais por vezes fazem alusão a regras também do Código Civil de 2002, como referência sobre regras contratuais, função social, boa-fé objetiva, etc., todos oriundos do referido Código Civil.
Neste passo, cumpre observar que tais princípios ora estão positivados, ora implícitos. “No caso do Código do Consumidor, muitos dos princípios a seguir demonstrados podem ser retirados dos art. 1º, 4º e 6º da Lei 8.078/1990. Todavia, existem princípios que são implícitos ao sistema protetivo” (TARTUCE, 2018, p. 44). Por diversos que são, aqui cumpre observar os mais presentes e impactantes dos princípios consumeristas.
3.3.1. Princípio da Vulnerabilidade
O princípio da vulnerabilidade é aquele que resgata o tema advindo do conceito d consumidor, no momento em que se considere consumidor aquele que possui, ainda que pessoa jurídica, um aspecto de vulnerabilidade.
“Considera-se que o consumidor é a parte vulnerável na relação jurídica com o fornecedor, pois se sujeita às práticas do fornecimento de produtos e serviços no mercado de consumo (art. 4.º, I, da Lei n. 8.078/90)”. (LISBOA, 2012, p. 66).
“A vulnerabilidade do consumidor advém de inúmeros fatores, dentre os quais as práticas abusivas do fornecedor, o oferecimento de produtos e serviços sem a observância dos princípios gerais das relações de consumo e a inserção de cláusulas abusivas nos contratos” (LISBOA, 2012, p. 66).
Essa vulnerabilidade possui várias espécies, vertentes, pois a posição que se encontra a relação de consumo por vezes favorece o fornecedor. Por isso, a vulnerabilidade pode ser técnica – “onde o consumidor é frágil nos conhecimentos técnicos do produto ou serviço” (BOLZAN DE ALMEIDA, 2019, p. 190), pode ser informacional – justamente sobre as informações sobre produto ou serviço – pode ser fática/econômica, quando da situação financeira, econômica abaixo do consumidor para a empresa – e pode ser jurídica/científica, no que tange as regras legais, no conhecimento jurídico do que se tem como direito.
3.3.2. Princípio da boa-fé objetiva
O princípio da boa-fé objetiva – como dito, derivado dos contratos do Código Civil – também são presentes como nortes dos contratos relacionados ao Código de Defesa do Consumidor.
“O princípio da boa-fé objetiva, como dever de conduta que razoavelmente se espera da pessoa em uma relação jurídica, impede a conduta abusiva e é contrário à não observância das normas jurídicas ou da equidade”. (LISBOA, 2012, p. 78).
Neste sentido,
O direito brasileiro contempla expressamente esse princípio nas relações de consumo (art. 4.º, III, da Lei n. 8.078/90), que é aplicável a qualquer vínculo regido pelo Código de Defesa do Consumidor, fundamentando tanto a responsabilidade contratual como a extracontratual e a pré-contratual do fornecedor.
Desse modo, a boa-fé objetiva deixa de ser um conceito meramente ético, transmudando-se em conceito jurídico e econômico, graças à função social do contrato, à livre iniciativa e aos direitos do consumidor, estes como direitos fundamentais e princípios gerais da ordem econômica (arts. 5.º, XXXII, e 170, V, da CF) (LISBOA, 2012, p. 78).
Tartuce explica que a composição da boa-fé objetiva do CDC se coloca em deveres secundários que asseguram essa boa-fé no direito consumerista, quais sejam o dever de informação, o dever de lealdade, de assistência técnica e de cooperação mútua.
3.3.3. Princípio da Função social dos contratos
O princípio da função social dos contratos, seguindo a mesma origem do anterior, é considerado um princípio implícito pautado na ideia do contrato de consumo, assim como a boa-fé objetiva, nos ditames do Código Civil, “conforme consta do art. 2.035, parágrafo único, do CC/2002”. (TARTUCE, 2018, p. 62)
“O objetivo principal da função social dos contratos é tentar equilibrar uma situação que sempre foi díspar, em que o consumidor sempre foi vítima das abusividades da outra parte da relação de consumo” (TARTUCE, 2018, p. 61). Por isso que nos casos relacionados às regras norteadoras dos contratos relacionados aos consumidores pautam-se sobre “a igualdade real, a autonomia delimitada da vontade, o consensualismo responsável, a eficácia relativa sujeita à oponibilidade externa, a obrigatoriedade equilibrada, a intangibilidade e a inalterabilidade relativas e a boa-fé objetiva.” (LISBOA, 2012, p. 78).
3.3.4. Princípio da Reparação integral dos danos
Ao que se promove sobre esse princípio frente ao CDC, deriva da teoria da responsabilidade civil e também do artigo 6°, inciso VI do código consumerista.
É neste princípio que se assegura a reparabilidade dos danos patrimoniais, danos coletivos, danos morais e danos sociais. Em outras palavras, “é necessário que o ofendido tenha a garantia legal de que ocorrerá a reparação do dano, consequência da segurança jurídica que deve existir na relação de consumo.” (LISBOA, 2012, p. 83).
“Para os fins de aplicação do princípio da reparabilidade integral pelo dano causado, torna-se cabível, inclusive, a desconsideração da personalidade jurídica do fornecedor, quando ela constituir óbice para o ressarcimento efetivo dos prejuízos” (art. 28, § 5.º, da Lei n. 8.078/90). (LISBOA, 2012, p. 83).
Além do que, “Não se pode esquecer que a Súmula 37 do STJ admite a cumulação, em uma mesma ação, de pedido de reparação de danos materiais e morais, decorrentes do mesmo fato, o que tem plena aplicação às relações de consumo” (TARTUCE, 2018, p. 71).
Outro ponto sobre o princípio é sobre a solidariedade na responsabilidade empregada a mais de uma empresa, quando da cadeia produtiva, por exemplo. Nestes casos, enuncia o art. 7º, parágrafo único, da Lei 8.078/1990 que, “Tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo” (BRASIL, 1990).
3.3.5. Princípio do Equilíbrio
“O equilíbrio econômico e jurídico é princípio informativo da relação de consumo, que possui por fundamento a justiça distributiva, harmonizando-se os interesses legítimos das partes (art. 4.º, III, parte final)” (LISBOA, 2012, p. 80).
“A relação jurídica de consumo seria representada por uma balança que penderia para um dos lados em razão da superioridade do fornecedor quando comparado com o consumidor. O peso da fragilidade deste o deixaria no posto inferior da balança”. (BOLZAN DE ALMEIDA, 2019, p. 203)
Como já visto a vulnerabilidade em primeiro princípio, é fundamental que busque sempre a compensação desse descompasso jurídico, técnico, social e econômico buscando equiparar as relações, justamente no tratamento desigual aos desiguais, assim como prevê o artigo 5° constitucional.
São questões como o combate à cláusulas abusivas, a ofertas onerosas excessivas, desequilíbrio na relação jurídica na tutela de direitos, etc. “Assim, o princípio do equilíbrio foi uma decorrência natural do contexto histórico de desigualdade em que surgiu a necessidade da defesa do consumidor.” (BOLZAN DE ALMEIDA, 2019, p. 203).
Além desses, diversos outros princípios podem ser lembrados na exegese do Direito Consumerista. São princípios como os da transparência, equivalência negocial, da hipossuficiência do consumidor, do protecionismo, da qualidade e segurança, princípio da intervenção estatal e da continuidade dos serviços públicos, dentre muitos outros.
3.5. A responsabilidade civil nas relações de consumo
Adentrando a este capítulo, a responsabilidade civil nas relações de consumo configura-se como uma responsabilidade civil objetiva e solidária como regra. É sabido sobre a composição da responsabilidade sobre seus elementos conduta, culpa, nexo causal, e dano, pelo qual derivam a responsabilidade civil subjetiva ou objetiva, a depender da comprovação justamente dessa culpa, pela qual derivou a teoria da culpa, hoje presente no Código Civil brasileiro.
Neste interim, a teoria do risco a qual fundamenta a responsabilidade civil objetiva é também que se baseia o CDC. Em verdade, o Código Consumerista é baseado na teoria objetiva e solidária do risco-proveito que, segundo o autor Flávio Tartuce, significa que “aquele que gera a responsabilidade sem culpa justamente por trazer benefícios, ganhos ou vantagens. Em outras palavras, aquele que expõe ao risco outras pessoas, determinadas ou não, por dele tirar um benefício, direto ou não, deve arcar com as consequências da situação de agravamento” (TARTUCE, 2018, p. 441).
É, portanto, considerada regra para o CDC a sua responsabilidade objetiva, tendo como exceção a responsabilidade subjetiva, como é o caso do artigo 14, § 4°, referente aos profissionais liberais.
Repise que a responsabilidade objetiva do referido Código é expressa e se divide por suas modalidades, nestes previstas nos artigos 12 ao 25. Ou seja, a responsabilidade está dividida em modalidades de responsabilidade por fato e por vício, no produto ou serviço. Nestes mencionados artigos, listam-se os conceituais, sobre fato do produto e serviço e vício do produto e serviço, respectivamente:
Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.
[...]
Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
[...]
Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.
[...]
Art. 19. Os fornecedores respondem solidariamente pelos vícios de quantidade do produto sempre que, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, seu conteúdo líquido for inferior às indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou de mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:
I - o abatimento proporcional do preço;
II - complementação do peso ou medida;
III - a substituição do produto por outro da mesma espécie, marca ou modelo, sem os aludidos vícios;
IV - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos.
[...]
Art. 20. O fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:
I - a reexecução dos serviços, sem custo adicional e quando cabível;
II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;
III - o abatimento proporcional do preço. (BRASIL, 1990)
Importante salientar a solidariedade somente em casos de vício, e não em casos de fato, justamente pelo que se define por prejuízos intrínsecos e extrínsecos. A saber,
fato do produto e do serviço ou acidente de consumo pressupõe a existência de um vício, todavia a recíproca não é verdadeira. O primeiro é a anomalia extrínseca de um produto ou serviço, enquanto o vício constitui-se em uma anomalia intrínseca de produto ou serviço. (SANTANA, 2019, p. 103)
“O vício do produto acarreta prejuízo econômico ao consumidor, pois ele acaba adquirindo ou se utilizando de um bem que não lhe concede a adequação que ordinariamente se poderia esperar, causando-lhe um dano patrimonial” (LISBOA, 2012, p. 146). “Pouco importa, contudo, se o vício é aparente (perceptível a olho nu), de fácil constatação (perceptível mediante um simples ato) ou oculto (imperceptível à época da constituição da relação de consumo)”. (LISBOA, 2012, p. 146).
Os vícios podem ser considerados de qualidade, de informação ou de quantidade. Por sua expressão, quantidade é aquele que não condiz com a mesma quantia esperada no produto, qualidade sobre a inadequação para o uso pelo qual tem finalidade ou vício de informação a falta de informações necessárias para o correto uso do produto, como exemplo dos manuais de instalação, de instrução, modo de uso nas embalagens, etc. (LISBOA, 2012).
E a responsabilidade pelo fato do produto “é aquela que advém de um acidente de consumo, ou seja, de um evento que acarreta, ao menos, danos morais ao consumidor” (LISBOA, 2012, p. 177).
“O defeito extrínseco ou exógeno não é uma simples inadequação econômica do produto ou do serviço, porém uma inadequação que gera efeitos sobre a personalidade humana, tanto do consumidor como das pessoas a ele equiparadas”. (LISBOA, 2012, p. 177).
E é nesse aspecto que se chega aos danos extrapatrimoniais. Isto é, são nessas alçadas de fato de produto que ocorrem os danos morais dentro do direito do consumidor. Roberto Lista “direitos extrapatrimoniais ofendidos em virtude dos defeitos, para os fins de apreciação de dano moral decorrente de uma relação de consumo, merecem destaque: a vida, a saúde, a segurança, a liberdade, a intimidade, o segredo, a honra e o respeito” (LISBOA, 2012, p. 170). Frise-se que muitos desses já estão consagrados nos direitos básicos do consumidor ora vistos, e assim são garantias também dos direitos personalíssimos.
Deste modo, entendido o posicionamento do dano moral dentro dos fatos oriundos da relação de consumo e sua responsabilidade civil é necessário agora, a análise crítica sobre os casos descritos dentro da relação de consumo com empresas de telefonia e suas causídicas que gerem dano moral.
4. AS CAUSÍDICAS RELAÇÕES DE CONSUMO PASSÍVEIS DE DANO MORAL COM EMPRESAS DE TELEFONIA
Iniciando o capítulo referente às análises de casos e julgados oriundos ao tema de dano moral e processos de telefonia cumpre algumas observações, no que diz sobre a definição dos temas.
Hoje, segundo pesquisa realizada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em 2011, foi detectado os maiores litigantes no Poder Judiciário brasileiro, onde dos dez maiores litigantes da lista, cinco são instituições financeiras e um é empresa de telefonia. As empresas de telefonia representam 6% dos litígios em esfera nacional permitindo ter ideia da quantidade de ações consumeristas e das discussões que ainda possam ocorrer, principalmente por conta do aumento dos leques em serviços e produtos que hoje as redes de telefonias vêm incorporando, como a as assinaturas de TV e internet, como serviços populares. (TARTUCE, 2018).
Importante elucidar também que segundo o art. 44, caput, da Lei 8.078/1990, “os órgãos públicos de defesa do consumidor manterão cadastros atualizados de reclamações fundamentadas contra fornecedores de produtos e serviços, devendo divulgá-los pública e anualmente”, e que hoje esse controle é realizado pelos PROCONS estaduais, assim legitimados pelo artigo 5° da lei Consumerista.
Neste sentido, em notícia veiculada no site do PROCON do Estado de São Paulo, tem-se:
“Empresas mais reclamadas — Em 2015, o Grupo composto pelas empresas Claro, NET e Embratel (América Móvil) liderou o Ranking Estadual de reclamações fundamentadas dos PROCONs que integram o Sistema Estadual de Defesa do Consumidor, com um total de 5.883 registros. Um aumento expressivo em seus números em comparação a 2014, 57%, passando a representar 9,6% de todas as reclamações registradas no Estado. Em segundo lugar, entre as mais reclamadas figura o Grupo Vivo/Telefônica, com 3.901 queixas e discreta redução no número de reclamações em relação a 2014 (12,9%). A Sky Brasil Serviços Ltda. ocupa, pela primeira vez desde 2013, a terceira posição entre as empresas com maior número de reclamações no Estado. Saltou do 9º lugar em 2014 (1.367 reclamações), para o 3º em 2015 (2.731), aumento de quase 100%. Passando de 8º lugar para 4º lugar no ranking, a empresa Tim Celular S/A, com 2.351 registros, apresentou acréscimo de 68% em relação ao ano anterior. A ascensão negativa não se justifica, uma vez que, dentre as empresas do setor de telecomunicações, é a única que tem como principal atividade, de forma quase que exclusiva, a prestação de serviço de telefonia celular. (apud BOLZAN DE ALMEIDA, 2019, p. 636).
Sobre o ordenamento Jurisprudencial do tema, algumas Súmulas e julgados envolvendo ‘vendas casadas’, tarifas básicas de planos de telefonia já foram discutidas e legitimadas pelo Superior Tribunal de Justiça, a saber a Súmula 356 a qual trata sobre a tarifa básica: “É legítima a cobrança da tarifa básica pelo uso dos serviços de telefonia fixa”, ou de contratos de fidelização ou comodato pelos quais asseguram à empresa telefônica um prazo de recuperação de seus investimentos, diga-se aos julgados REsp 1445560 e REsp 1097582.
Por isso, aqui cumpre identificar causídicas específicas em uma tutela amplamente discutida no Brasil e que englobem o instituto do dano moral. Dos temas mais vistos, propõem-se a garantia e manutenção na prestação de serviços, da negativação em cadastros positivos de crédito, da alteração unilateral de planos e interrupção de serviços.
4.1. Da garantia da boa prestação de serviço de telefonia e internet
Sobre a garantia na prestação de serviços de telefonia e internet alguns dos casos oriundos da discussão judicial versam sobre contratações não efetivadas, rescisões por direitos não informados, entre outros, os quais serão exemplos a seguir.
O primeiro caso em tela remonta sobre a não garantia dos serviços prestados, onde aduz a autora que ao tentar cancelar os serviços as quais embora tenham sido tentados por meio de contatos com a empresa por meio protocolo, o atendimento excedeu as relações cordiais. Neste ponto, o Acórdão assim condenou mediante o dano moral sofrido não pelo cancelamento em si, mas pela truculência no atendimento e pelo desvio produtivo causado no autor, a saber:
“Telefonia. Vício na prestação do serviço. Atendimento desrespeitoso. Expressões injuriosas. Fato não contestado. Protocolos para obtenção da gravação da ligação não atendidos, mesmo diante da formulação de reclamação perante o Procon. Revelia. Reconhecimento dos respectivos efeitos. Veracidade dos fatos. Danos morais caracterizados. Fatos que extrapolam a normalidade de descumprimento contratual. Indenização devida também pelo desvio produtivo do consumidor. Apelação parcialmente provida” (TJSP, Apelação 1001164-40.2016.8.26.0028, Acórdão 10928587, 33.ª Câmara de Direito Privado, Aparecida, Rel. Des. Sá Moreira de Oliveira, j. 30.10.2017, DJESP 08.11.2017, p. 2319). (TARTUCE, 2018, p. 361)
Outrora, casos relacionados à prática abusiva na oferta da contratação ferem a boa prestação de serviço no sentido pelo qual a informação da empresa não fora bem explicada, no contrato de adesão. Neste caso, a prestadora tem o dever de informar corretamente as nuances do contrato a fim de que haja clareza nos direitos e deveres que o consumidor tem para a empresa, e vice-versa. No Acórdão em conseguinte, versa sobre caso envolvendo a Brasil Telecom pelo qual em oferta de plano não esclareceu restrição sobre serviços pelos quais não eram inclusos, como a gratuidade em ligações interurbanas e para celular, estabeleceu-se a seguinte ementa:
RECURSO ESPECIAL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - EMPRESA DE TELEFONIA - PLANO DE ADESÃO - LIG MIX - OMISSÃO DE INFORMAÇÕES RELEVANTES AOS CONSUMIDORES - DANO MORAL COLETIVO - RECONHECIMENTO - ARTIGO 6º, VI, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - PRECEDENTE DA TERCEIRA TURMA DESTA CORTE - OFENSA AOS DIREITOS ECONÔMICOS E MORAIS DOS CONSUMIDORES CONFIGURADA - DETERMINAÇÃO DE CUMPRIMENTO DO JULGADO NO TOCANTE AOS DANOS MATERIAIS E MORAIS INDIVIDUAIS MEDIANTE REPOSIÇÃO DIRETA NAS CONTAS TELEFÔNICAS FUTURAS - DESNECESSÁRIOS PROCESSOS JUDICIAIS DE EXECUÇÃO INDIVIDUAL - CONDENAÇÃO POR DANOS MORAIS DIFUSOS, IGUALMENTE CONFIGURADOS, MEDIANTE DEPÓSITO NO FUNDO ESTADUAL ADEQUADO.
1.- A indenização por danos morais aos consumidores, tanto de ordem individual quanto coletiva e difusa, tem seu fundamento no artigo 6º, inciso VI, do Código de Defesa do Consumidor.
2.-Já realmente firmado que, não é qualquer atentado aos interesses dos consumidores que pode acarretar dano moral difuso. É preciso que o fato transgressor seja de razoável significância e desborde os limites da tolerabilidade. Ele deve ser grave o suficiente para produzir verdadeiros sofrimentos, intranquilidade social e alterações relevantes na ordem extrapatrimonial coletiva. Ocorrência, na espécie. (REsp 1221756/RJ, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 02/02/2012, DJe 10/02/2012).
3.- No presente caso, contudo restou exaustivamente comprovado nos autos que a condenação à composição dos danos morais teve relevância social, de modo que, o julgamento repara a lesão causada pela conduta abusiva da ora Recorrente, ao oferecer plano de telefonia sem, entretanto, alertar os consumidores acerca das limitações ao uso na referida adesão. O Tribunal de origem bem delineou o abalo à integridade psico-física da coletividade na medida em que foram lesados valores fundamentais compartilhados pela sociedade.
4.- Configurada ofensa à dignidade dos consumidores e aos interesses econômicos diante da inexistência de informação acerca do plano com redução de custo da assinatura básica, ao lado da condenação por danos materiais de rigor moral ou levados a condenação à indenização por danos morais coletivos e difusos.
5.- Determinação de cumprimento da sentença da ação civil pública, no tocante à lesão aos participantes do “LIG-MIX”, pelo período de duração dos acréscimos indevidos: a) por danos materiais, individuais por intermédio da devolução dos valores efetivamente cobrados em telefonemas interurbanos e a telefones celulares; b) por danos morais, individuais mediante o desconto de 5% em cada conta, já abatido o valor da devolução dos participantes de aludido plano, por período igual ao da duração da cobrança indevida em cada caso; c) por dano moral difuso mediante prestação ao Fundo de Reconstituição de Bens Lesados do Estado de Santa Catarina; d) realização de levantamento técnico dos consumidores e valores e à operacionalização dos descontos de ambas as naturezas; e) informação dos descontos, a título de indenização por danos materiais e morais, nas contas telefônicas.
6.- Recurso Especial improvido, com determinação (n. 5 supra). STJ, REsp 1.291.213/SC, 3. a T., j. 30.08.2012, v.u., rel. Min. Sidnei Beneti, DJe 25.09.2012
Frise a ação coletiva pela qual determinou, em larga escala, o dano coletivo a todos os consumidores daquele plano, fixando inclusive cumprimentos relacionados à reparação dos prejuízos. Aqui perceba-se o dano social considerado como baliza da aplicabilidade do dano moral, haja vista a posição de superioridade da prestadora sobre o consumidor, se valendo disto para ocultar detalhes do plano.
O caso em seguida mostra um meio-termo na consideração do dano moral, aqui mitigado, porque ainda que houvesse má prestação dos serviços de internet por algum tempo, a autora demorou por acionar seus direitos, o que não auxiliou na configuração integral do dano moral, somente parcial:
Da jurisprudência do Tribunal Gaúcho, com grande aplicação prática, existe julgado que conclui pela existência de venda casada no caso da empresa que presta serviços de TV por assinatura e exige a utilização de tecnologia somente por ela oferecida, sem qualquer outra possibilidade: “Reparação de danos. NET. Serviço de telefone e televisão por assinatura. Defeito na prestação de serviço. Troca de roteador. Falta de adequada informação sobre o aparelho a ser usado pela consumidora. Indução em erro. Ressarcimento pela despesa na aquisição de aparelho exigido pela ré, sob pena de caracterizar venda casada. Desnecessidade de manter a tecnologia não homologada pela empresa. Solução de equidade. Indenização pelo tempo em que o sinal denotava má qualidade. Arbitramento. Quantum mantido, por falta de recurso da postulante. Cancelamento de serviço adicional (assistência de rede), como de entrega de revista, com restituição de valores, observado o art. 290 do CPC. Efetividade da decisão. Transtorno vivido pela autora. Dissabor que poderia ter sido evitado pela ré, se tratasse o caso com a devida atenção. Contribuição da autora, que poderia ter buscado, antes, a proteção judicial. Dano moral mitigado. Valor reduzido. Recurso parcialmente provido” (TJRS – Recurso 46934-74.2010.8.21.9000, Porto Alegre – Terceira Turma Recursal Cível – Rel. Des. Jerson Moacir Gubert – j. 27.01.2011 – DJERS 08.02.2011). (TARTUCE, 2018, p. 445)
Um último caso que remete à desconsideração do dano moral por fatores distintos do ato em si, mas da personalidade da vítima. Explicando melhor o autor Flávio Tartuce detalha o caso:
Vejamos decisão do Tribunal Fluminense que tratou o espólio como consumidor, em caso envolvendo a prestação de serviços de telefonia: “Cessão do direito ao uso de linha telefônica. Morte do titular. Art. 1.572. Código Civil de 1916. Obrigação de fazer. Ação de obrigação de fazer. Uso de linha telefônica. Indevida rescisão do contrato. Com o falecimento do titular do direito de uso de linha telefônica, este se transmite aos herdeiros, na forma do art. 1.572 do Código Civil, integrando o acervo hereditário.
Desta forma, é possível o espólio pleitear em ação de obrigação de fazer a instalação de linha telefônica, desde que esteja em dia com pagamentos. Os serviços interrompidos, com afronta ao disposto na Lei 9.472/1997 e no Código de Defesa do Consumidor, merecem ser restabelecidos.
Afasta-se a possibilidade de indenização por dano moral, uma vez que o espólio é ente despersonalizado, sendo-lhe conferida apenas capacidade processual, como parte formal. Recurso provido em parte” (TJRJ – Acórdão 14.509/2002, Rio de Janeiro – Décima Quarta Câmara Cível – Rel. Des. Walter D’ Agostino – j. 17.12.2002). (TARTUCE, 2018, p. 94-95)
No tocante ao caso, a lesão embora ocorrida, não fora configurada em sede de danos morais justamente pela impossibilidade de se personalizar o dano, haja vista estar falecido. Não houve dor ou sofrimento do titular da linha, onde os requerentes eram seus herdeiros.
4.2. Da alteração contratual unilateral de planos de telefonia pela mantedora
Em alusão ao tema da alteração contratual unilateral de planos de telefonia, se trata de um tema muito recorrente, haja vista o perfil de planos existentes no mercado. Hoje em dia, os planos conhecidos como pós-pago, planos ‘controle’, planos de crédito pré-pago são escolhidos e determinados pelo cliente no que está incluso neste plano, neste pacote.
Nessas causídicas é recorrente que as companhias alterem por conta e por regras próprias comerciais, os planos dos clientes. Todavia, essa sistemática ‘comercial’ vem causando diversas demandas solicitando o cancelamento da alteração contratual.
Neste segmento, a Anatel em Resolução própria (632/2014) determina em suas cláusulas 52 e 65:
Art. 52. As Prestadoras devem comunicar com antecedência mínima de 30 (trinta) dias, preferencialmente por meio de mensagem de texto ou mensagem eletrônica, a alteração ou extinção de Planos de Serviço, Ofertas Conjuntas e promoções aos Consumidores afetados, sem prejuízo das regras específicas aplicáveis ao STFC.
Art. 65. Os reajustes dos valores das tarifas ou preços não podem ser realizados em prazos inferiores a 12 (doze) meses. (BRASIL, 2014).
“Em reforço, da realidade jurisprudencial, é nula a cláusula que muda as regras do plano de telefonia, sem qualquer fundamento (TJBA – Recurso 81957-3/2006-1 – Segunda Turma Recursal – Rel. Juiz Aurelino Otacílio Pereira Neto –DJBA 13.07.2009). (TARTUCE, 2018, p. 349)”.
A discussão que versa sobre o dano moral ainda é muito individualizada para este caso. Isto porque o prejuízo econômico sofrido pelo consumidor ainda é considerado, para a Jurisprudência do STJ, somente ao campo econômico e não na esfera da personalidade. Senão veja o julgado REsp 1817576 em seu trecho sobre o tema:
RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL, CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVL. CPC/2015. TELEFONIA MÓVEL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. MIGRAÇÃO DE PLANO. ATO UNILATERAL DA OPERADORA DE TELEFONIA. ABUSIVIDADE. ART. 51, INCISO XIII, DO CDC. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. CABIMENTO EM TESE. CASO CONCRETO. AUSÊNCIA DE CUSTO ADICIONAL QUANTO A ALGUNS ITENS AGREGADOS AO PLANO. INVERSÃO DO JULGADO. ÓBICE DA SÚMULA 7/STJ. INEXISTÊNCIA DE INDÉBITO A RESTITUIR NESSES CASOS. PRESCRIÇÃO DECENAL DA PRETENSÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO. EXISTÊNCIA DE PRÉVIA RELAÇÃO CONTRATUAL ENTRE AS PARTES. PRECEDENTE DA CORTE ESPECIAL. DANO MORAL. INOCORRÊNCIA. MERO DISSABOR DA RELAÇÃO CONTRATUAL.
1. Controvérsia pertinente à abusividade (ou não) da alteração unilateral de plano de telefonia móvel por parte da operadora, incluindo-se no contrato o fornecimento de aplicativos digitais e serviços de terceiros, todos não pactuados anteriormente com a consumidora.
2. Inocorrência de negativa de prestação jurisdicional, pois o acórdão recorrido se encontra suficientemente fundamentado, com base nos elementos fáticos da demanda e na coerente linha argumentativa desenvolvida pelo Tribunal 'a quo', apta a rechaçar as alegações deduzidas pelas partes. 2. Nos termos do art. 51, inciso XIII, do Código de Defesa do Consumidor: "São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: [...] autorizem o fornecedor a modificar unilateralmente o conteúdo ou a qualidade do contrato, após sua celebração".
3. Caso concreto em que a operadora migrou a consumidora para um plano promocional que previa o fornecimento de aplicativos digitais e serviços de terceiros na modalidade de jogos virtuais.
4. Abusividade da prática comercial da operadora de agregar unilateralmente serviços ao plano de telefonia, ainda que sob a aparência de gratuidade, pois a abusividade prevista no art. 51, inciso XIII, do CDC, prescinde de modificação do preço do serviço ou produto. Doutrina e jurisprudência sobre o tema.
[...]
10. Inocorrência de dano moral na espécie, pois a controvérsia se circunscreveu ao âmbito patrimonial das partes, como um dissabor da relação contratual, não se vislumbrando ofensa a direito da personalidade da consumidora.
11. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO. (RECURSO ESPECIAL Nº 1817576 - RS (2019/0145471-6)
No mencionado Acórdão o juízo aduz que houve somente mero dissabor por justamente o autor ter somente anotado dois protocolos de atendimento, sem dispor de maiores esforços ou constrangimentos para convir os direitos personalíssimos. Ou seja, não há como configurar um dano moral somente ao fato inicial, precisando o consumidor passar por algo aquém desse mero dissabor.
O dano moral nestes casos começa a ficar mais factual, ou seja, não é regra para esse tipo de situação. Carece de situações extremas e realmente que afetem os direitos íntimos do consumidor. A saber, os julgados exemplares a seguir:
A jurisprudência brasileira tem reconhecido, de forma reiterada, a reparabilidade do dano moral coletivo nas relações de consumo, consolidando o respeito e a efetiva proteção dos direitos da personalidade metaindividuais dos consumidores, a exemplo do REsp. 1.203.573/RS, em que empresa de telecomunicações foi proibida de cobrar serviços acessórios inclusos em denominado “pacote inteligente” sem conhecimento prévio dos consumidores, bem como condenada a pagar a importância de R$ 100.000,00 (cem mil reais) a título de dano morais coletivos; STJ, REsp 1.203.573/RS, 2. a T., j. 13.12.2011, v.u., rel. Min. Humberto Martins, DJe 19.12.2011. (SANTANA, 2019, p. 166)
[...]
Consumidor. Telefonia móvel. Ação cominatória cumulada com reparação de danos. Promoções pula-pula e amigos toda hora da Brasil Telecom. Fornecedora dos serviços que, unilateralmente, altera os termos iniciais das promoções, em desfavor ao consumidor. Adendo ao regulamento ditando a não cumulação das vantagens, antes cumuláveis. Em se tratando de relação de consumo, a oferta é vinculativa. Art. 30 do CDC. Necessidade de assegurar ao cliente a continuidade da promoção original. Danos morais configurados, decorrentes da desconsideração com a pessoa do consumidor. Astreintes. Cabimento. Limitação do valor, atendendo a critérios de razoabilidade” (TJRS – Recurso 71000931048 – Segunda Turma Recursal Cível – Juiz Relator Eduardo Kraemer – Comarca de Porto Alegre – j. 17.05.2006). (TARTUCE, 2018, p. 401)
Ou seja, a Jurisprudência ainda não é clara de quanto é esse abuso. Ainda há obscuridade sobre o ponto de virada da configuração desses danos morais, ora considerados, ora não. Contudo, percebe-se que quando fatos além da mera alteração contratual são configurados, os magistrados estão configurando o dano moral, haja vista o direito personalíssimo demonstrado.
4.3. Da interrupção dos serviços
Sobre o tema da interrupção de serviços esse também muito visitado nas demandas judiciais há um entendimento comum de que a interrupção de serviços básicos pode ocasionar prejuízos de caráter personalíssimo, devido suas consequências. É o que Lisboa entende pela tutela do direito à honra e ao respeito como direito personalíssimo quando elenca “o dano moral sofrido pelo consumidor em virtude do descaso da concessionária que procedeu ao desligamento injustificado de linha telefônica (1.º CRJEPEC-SP, Recurso 4151, rel. Juiz Sá Duarte, j. 26-1-1998)”. (LISBOA, 2012, p. 174).
Contudo, segundo Humberto Theodoro Junior, o STJ já decidiu que “a interrupção no serviço de telefonia caracteriza, via de regra, mero dissabor, não ensejando indenização por danos morais”. STJ, 4ª T., AgRg no AI 1.170.293/RS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, ac. 12.04.2011, DJe 28.04.2011 (THEODORO JUNIOR, 2016, p. 176)
Fica claro que a regra é o mero dissabor e por conta disso entra-se na discussão da lesão então personalíssima. Uma mera interrupção, diga-se momentânea, não configura em sua essência dano moral. Contudo, as situações práticas levam a algumas configurações, como é o caso de interrupções reiteradas, ou prejuízos confirmados diante dessas suspensões. Hoje, na seara das empresas de telefonia, os serviços de fornecimento de internet são os grandes casos que despontam sob judice, a exemplo do julgado do Tribunal Mineiro:
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - RESPONSABILIDADE CIVIL - FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DE INTERNET - INDISPONIBILIDADE REITERADA DA CONEXÃO - EMISSÃO DE FATURAS COM INCLUSÃO DE VALORES INDEVIDOS - DESÍDIA NA SOLUÇÃO DOS PROBLEMAS - CONDUTAS ABUSIVAS - REPARAÇÃO POR DANO MORAL - PREJUÍZO CONFIGURADO - VALOR DA INDENIZAÇÃO - CRITÉRIOS DE ARBITRAMENTO. - As pessoas jurídicas prestadoras de serviços respondem, objetivamente, por prejuízos decorrentes de falha na consecução das suas atividades, por se tratar de responsabilidade oriunda do risco do empreendimento. - A indisponibilidade reiterada e não justificada do serviço de dados (internet) contratado, seguida dos lançamentos indevidos dos respectivos valores nas faturas mensais e da desídia da prestadora em solucionar os problemas, além de configurarem o rompimento anormal da execução do Contrato, atentam contra o Sistema de Proteção ao Consumidor e materializam práticas abusivas e deflagradoras de dano moral. - No arbitramento do valor indenizatório devem ser observados os critérios de moderação, proporcionalidade e razoabilidade em sintonia com o ato ilícito e as suas repercussões. - A indenização por dano extrapatrimonial não pode servir como fonte de enriquecimento do indenizado, nem consubstanciar incentivo à reincidência do responsável pelo ilícito. APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0145.15.019505-8/001 - COMARCA DE JUIZ DE FORA - APELANTE(S): RENATO MEDEIROS HERINGER LISBOA - APELADO(A)(S): TELEMAR NORTE S/A
Fica evidente a ultrapassagem do mencionado mero dissabor para uma situação aquém da eventual, quando da insistência dessa interrupção.
4.4. Da negativação indevida de serviços não contratados
No tema da negativação por contratação não realizada é geralmente proveniente também de algum descompasso contratual. Relembre-se dos casos aqui tratados sobre interrupção de serviço, alteração unilateral ou por mera contratação desconhecida, o inadimplemento desconhecido pelo consumidor é caso clássico não só no âmbito telefônico, mas em bancários, crediários, etc.
Neste caso, o dano moral equivale pelo abalo sobre a honra devido a inscrição do consumidor nos cadastros de restrição de crédito que, por sua vez, causam prejuízos não só econômicos, mas sobre a honestidade da pessoa, sobre a probidade, confiança, portanto, sobre a honra. É o que se chama da configuração do dano moral ‘in re ipsa’, pelo qual não se prova o abalo emocional, mas somente a situação já lhe configura.
A saber, um julgado que corrobora sobre tema ligado à telefonia:
“Civil e processual. Cobrança de ligações para ‘telessexo’. Oferecimento de serviço ou produto estranho ao contrato de telefonia sem anuência do usuário. Invalidade. Ônus da prova positiva do fato atribuível à empresa concessionária. Inscrição da titular da linha telefônica no CADIN. Danos morais. Código de Defesa do Consumidor, arts. 6º, VIII e 31, III. I. O ‘produto’ ou ‘serviço’ não inerente ao contrato de prestação de telefonia ou que não seja de utilidade pública, quando posto à disposição do usuário pela concessionária – caso do ‘telessexo’ – carece de prévia autorização, inscrição ou credenciamento do titular da linha, em respeito à restrição prevista no art. 39, III, do CDC. II. Sustentado pela autora não ter dado a aludida anuência, cabe à companhia telefônica o ônus de provar o fato positivo em contrário, nos termos do art. 6º, VIII, da mesma Lei 8.078/1990, o que inocorreu. III. Destarte, se afigura indevida a cobrança de ligações nacionais ou internacionais a tal título, e, de igual modo, ilícita a inscrição da titular da linha como devedora em cadastro negativo de crédito, gerando, em contrapartida, o dever de indenizá-la pelos danos morais causados, que hão de ser fixados com moderação, sob pena de causar enriquecimento sem causa. IV. Recurso especial conhecido e provido em parte” (STJ – REsp 265.121/RJ – Quarta Turma – Rel. Min. Aldir Passarinho Junior – j. 04.04.2002 – DJ 17.06.2002, p. 267).
“Telefone. Serviço ‘900’. ‘Disque prazer’. Código de Defesa do Consumidor. O serviço ‘900’ é oneroso e somente pode ser fornecido mediante prévia solicitação do titular da linha telefônica. Recurso conhecido e provido” (STJ – REsp 258156/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar – j. 21.09.2000 – DJ 11.12.2000, p. 210). (TARTUCE, 2018, p. 450)
Note-se que ao fato derivado à cobrança indevida é justamente uma contratação não anuente pelo consumidor, o que decorre a inscrição ilegal nos órgãos de proteção ao crédito e consequentemente desencadeia ao dano moral.
Por sua vez, o julgado a seguir mostra a não configuração de dano moral mencionado pelo relator haja vista a não negativação, ainda que haja o primeiro fato já aqui mencionado, a alteração unilateral:
“Apelação cível. Responsabilidade civil. Contrato de telefonia. Decadência. Inocorrência. Cobrança indevida de serviço não contratado. Não comprovada a solicitação. Dano moral. Pessoa jurídica. Não demonstrado. Repetição em dobro. Possibilidade. Ônus sucumbencial. 1. Não se aplica ao caso o prazo decadencial do art. 26, II, do CDC, uma vez que reclama a autora a inexigibilidade dos débitos por serviço supostamente não contratado; não se trata de vício de serviço, mas sim de reparação de danos por fato do serviço, que prevê prazo prescricional de cinco anos, nos termos do art. 27 da legislação consumerista. 2. Caracterizada a ilicitude da parte ré, uma vez que inseriu serviços de telefonia na fatura mensal da autora sem que esta tivesse requisitado. Contudo, mesmo sendo possível a caracterização do dano moral para pessoa jurídica, este não restou devidamente comprovado. Sequer demonstrou a autora o cadastro de seu nome nos órgãos de proteção ao crédito, sendo que os aborrecimentos, em razão das dificuldades para solucionar o caso, não configuram, por si só, situação geradora de dano moral. 3. Nos termos do parágrafo único do art. 42 do CDC, é devida a repetição do indébito apenas da quantia efetivamente paga e comprovada. 4. Sucumbência redimensionada. Apelo parcialmente provido. Unânime” 4.3. (TJRS – Apelação Cível 70037229648, Santa Rosa – Nona Câmara Cível – Rel. Des. Íris Helena Medeiros Nogueira – j. 15.09.2010 – DJERS 23.09.2010). (TARTUCE, 2018, p. 207).
Desta feita, perceba a similaridade das causídicas, no que concerne aos danos pleiteados. Uma coisa é a inserção de serviços não contratados na fatura e outro é a inserção no cadastro de devedores, ao passo que este segundo ocorrendo, configura-se o dano moral.
Adentrando aos momentos finais desta discussão, considera-se compreendido boa parte da postura jurisdicional no que tange o tema do dano moral nas relações consumeristas com as empresas de telefonia.
Em primeiro momento foi possível compreender a estrutura corpórea normativa do dano moral dentro do cenário brasileiro, em alusão também ao que fora instituído pelo próprio Direito Consumerista. Em seguida, o próprio Direito Consumerista aplicado ao Código de Defesa do Consumidor em sua composição sobre direitos, princípios e conceitos, ao chegar nas práticas abusivas e na configuração de fato e vício sobre produtos e serviços.
Pois bem, nas situações relacionadas às causídicas foi possível perceber que a Jurisprudência menciona a configuração de práticas abusivas mesmo em reiterados cenários repetidos de alterações contratuais unilaterais, interrupções de planos e boa prestação de serviços, contudo também em sua maioria não os relacionam com a condenação de dano moral.
Fica evidente que as ações individuais se baseiam na reparação material sofrida pelo cliente no desconto do serviço, ou na alteração do plano, reembolsando estes clientes, dependendo de situações aquém à prática abusiva para assim configurar ofensa aos direitos personalíssimos.
Em contrapartida, as ações coletivas, com caráter de também identificar essas mesmas práticas, mas com enfoque em argumentos sobre dano social, dano coletivo, vulnerabilidade do consumidor, desvio produtivo, etc., conseguem emplacar teses sobre o dano moral coletivo. Ou seja, aquele caráter educador do dano moral só está para o lesado quando em esfera coletiva, mas não em esfera individual. Por isso que, embora haja insistência pelas demandas individuais, a tendência do Poder Judiciário é sujeitar ‘sanções sociais’ em caráter educativo só para lesões configuradas em larga escala.
Para tanto, é fundamental que os órgãos de proteção ao consumidor estejam munidos não só de regras fartas protecionistas, mas de fiscalização empenhada, inclusive preventiva. Hoje, o consumidor precisa ir à justiça pleitear uma redução de plano que por vezes não lhe era necessário e por conta da dificuldade que lhe é empregada (advogado, processo e custo), acaba por ceder, ou seja, é o sistema em favor da empresa, por sua superioridade estrutural forçando suas condições ao consumidor.
Com isso, a identificação desse estudo fica a cargo de que as ações de dano moral contra as empresas de telefonia ainda é muito farta de obstáculos, haja vista o padrão do Poder Judiciário em não configurar danos morais in re ipsa, buscando sempre emplacar os direitos personalíssimos, ainda que haja uma anomalia escancarada nos casos contra esse perfil de empresas. Isto é, ou o Judiciário ‘educa’ essas empresas campeã de demandas ou os órgãos competentes do Executivo que façam uma fiscalização preventiva das tutelas do consumidor.
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Graduando em Direito pela Universidade Brasil. Campus Fernandópolis.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: DUTRA, João Vitor. O dano moral na relação de consumo com empresas de telefonia Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 16 jun 2023, 04:13. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/61709/o-dano-moral-na-relao-de-consumo-com-empresas-de-telefonia. Acesso em: 25 dez 2024.
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