Resumo: Este artigo se propõe a analisar a aplicabilidade do princípio do não retrocesso como forma de garantir o mínimo aceitável em relação ao direito à segurança pública. Além da inegável relevância social do tema, que oferece um instrumento de conscientização dos deveres e responsabilidades que devemos ter enquanto cidadãos, criando assim uma visão crítica acerca da real situação do sistema de segurança pública, assim como a forma de prestação da educação no país. Desta forma, após análise de alguns dados, consegue-se vislumbrar que apesar de estatísticas afirmativas, esses institutos são tratados de forma política, sem seriedade e com consequências cancerígenas a médio e longo prazo.
1.Introdução
A aplicabilidade do princípio do não retrocesso como forma de garantir o mínimo aceitável em relação ao direito à segurança pública sempre foi tema que levantou discussão na doutrina e jurisprudência pátria.
Nesse sentido, a importância é reconhecida, pois, as prestações sociais para a sobrevivência digna dos constitucionalizados refletem diretamente na dignidade da pessoa humana, e por esse motivo a proibição do retrocesso social faz com que os direitos sociais estejam garantidos como um núcleo efetivado no nosso ordenamento.
Além da inegável relevância social do tema, que oferece um instrumento de conscientização dos deveres e responsabilidades que devemos ter enquanto cidadãos, criando assim uma visão crítica acerca da real situação do sistema de segurança pública, assim como a forma de prestação da educação no país. Desta forma, após análise de alguns dados, consegue-se vislumbrar que apesar de estatísticas afirmativas, esses institutos são tratados de forma política, sem seriedade e com consequências cancerígenas a médio e longo prazo.
Almeja-se então, trazer através desta discussão uma simbólica contribuição no tocante ao tema proposto, e por consequente poder colaborar com a sociedade como um todo, enfatizando as deformidades, e sugerindo formas de preveni-las através de políticas públicas sérias, com ações sistemáticas que concretizem o elo indissociável entre o direito fundamental à educação e a segurança pública.
2.Desenvolvimento
Antes de iniciarmos uma análise mais prática e objetiva sobre a situação do direito à segurança pública no país, e como políticas públicas educacionais poderiam influenciar na prestação deste direto, é interessante abordar, mesmo que superficialmente, a questão do princípio do não retrocesso, verificando sua aplicação na garantia do direito à segurança pública.
O princípio ora em comento, de origem alemã, traduz a prerrogativa que possui o Estado, em efetivar alguns direitos através de políticas públicas, de forma progressiva com garantia do mínimo já alcançado, visando assim, uma busca ao bem comum e uma vida justa para coletividade.
Ora, basilar deste pensamento é que a os direitos sociais são essenciais a vida digna de toda sociedade, refletindo assim diretamente no princípio da dignidade da pessoa humana. Assim, os serviços sociais, tais como saúde, educação e segurança pública, são sim essenciais materialmente a vida digna de qualquer cidadão. Nas palavras de Ingo Sarlet: “o princípio do mínimo existencial tem a função de atribuir ao indivíduo um direito subjetivo pelo poder público em caso de diminuição da prestação dos serviços sociais básicos que garantem sua existência digna[1]”.
Perfilhamos ainda a consolidação sobre o tema do ilustre CANOTILHO:
“Com isto quer dizer-se que os direitos sociais e econômicos (ex: direito dos trabalhadores, direito à assistência, direito à educação), uma vez obtido um determinado grau de realização, passam a constituir, simultaneamente, uma garantia institucional e um direito subjetivo. (...) O princípio da proibição do retrocesso social pode formular-se assim: o núcleo essencial dos direitos sociais já realizado e efetivado através de medidas legislativas (...) deve considerar-se constitucionalmente garantido sendo inconstitucionais quaisquer medidas estaduais que, sem a criação de outros esquemas alternativos ou compensatórios, se traduzam na prática numa anulação pura e simples desse núcleo essencial.[2]”
Assim, as prestações sociais para a sobrevivência digna dos constitucionalizados refletem diretamente na dignidade da pessoa humana, e por esse motivo a proibição do retrocesso social faz com que os direitos sociais estejam garantidos como um núcleo efetivado no nosso ordenamento.
No Brasil, várias são as justificativas para não se cumprir as prestações sociais mínimas e de forma progressiva, tais como, a falta de recurso tanto humano quanto material e quando se trata de segurança pública aponta-se o baixo investimento no setor como forma de justificar a não prestação do serviço e a não redução significativa dos índices de criminalidade.
Com relação à falta de investimento, nos últimos anos, e importante ressaltar que o país vem observando – com exceções de alguns Estados – a crescimento progressivo de investimento de recursos na área de segurança pública. O total de gastos realizados pelos governos estaduais em segurança pública subiu de R$ 24 bilhões para R$ 33,5 bilhões, de 2005 para 2008, e com exceção dos Estados de Santa Catarina e do Piauí, todos os outros aumentaram os recursos significativamente[3]. Mas apesar do aumento desse investimento, é notória a crise na segurança pública que o país tem vivenciado nos últimos anos.
Alguns doutrinadores entendem ser o princípio do não retrocesso, parâmetro concreto para exigência da efetivação dos direitos sociais – no caso a segurança pública – frente ao Estado. LUIZ ROBERTO BARROSO entende, neste sentido, que como os direitos sociais são direitos fundamentais, podem e devem ser cobrados, através do judiciário, o cumprimento deste “mínimo existencial”. Desta forma, o poder judiciário deve – considerando o caráter temporal e a deficiência sistemática – atender os anseios sociais e viabilizar a efetiva garantia desses direitos, que nas palavras do autor trataria o procedimento em comento o “mandado de otimização” [4]. Em síntese, o cidadão por intermédio do Ministério Público iniciaria uma Ação Civil Pública, onde segundo o autor em comento, o “mandado de otimização” seria o prazo dado pelo judiciário para que fosse efetivamente tomada alguma providência adequada à realidade social.
Dessa forma, vislumbra-se um meio através de que o poder judiciário, atuando como defensor dos direitos da população, quando da omissão da máquina administrativa, poderia viabilizar o cumprimento da previsão constitucional do direito à segurança pública, caso esse direito não estivesse sendo prestado nos mínimos padrões aceitáveis. Assim, nasceria mais um instrumento de democracia para otimizar a forma com que esses recursos públicos investidos na área de segurança pública, e por consequente garantir direitos mínimos essenciais a dignidade da pessoa humana.
Toda essa inovação trazida por parte da doutrina, apesar de servir como ideal, de fato, não transcende o plano da teoria, tendo em vista que os aplicadores do direito em nosso país, ainda se apresentam demais formalista, e rejeitarem toda essa inovação apresentada, por entender que haveria ferimento a autonomia dos poderes.
Importante salientar, que o princípio do não retrocesso como garantidor de padrões mínimos prestados pelo poder público não pode ser observado isoladamente referente a determinado direito social. Assim, falar no direito à segurança pública de forma singular e perquirir sua efetivação sem visualizar toda sistemática que envolve a prestação deste direito, é de fato insatisfatório. Não há, por exemplo, uma relação efetiva entre o aumento de investimento em segurança pública com a redução de homicídios e a diminuição da população carcerária. Falar em segurança pública sugere políticas públicas sistematizadas.
Assim, para garantir padrões aceitáveis com relação à segurança é preciso – com base no princípio do não retrocesso – garantir também toda uma gama de direitos sociais que se relacionam.
3.Conclusão
O Direito à Segurança Pública deve ser garantido não apenas com medidas imediatas ligadas ao combate e controle a criminalidade. Vimos que, devido ao crescimento da violência e o crescente sentimento de insegurança, ouve um aumento considerável no tocante a investimentos em segurança pública. Entretanto, não houve uma redução da violência vinculada a esses investimentos, o que corrobora com a ineficácia em tratar a criminalidade com medidas paliativas, em vez de buscar uma forma efetiva de médio e longo prazo para combater esse câncer.
A aplicabilidade do princípio do não retrocesso como forma de garantir o mínimo aceitável em relação ao direito à segurança pública sempre foi tema que levantou discussão na doutrina e jurisprudência pátria.
Diante de todo exposto, ressalta-se que a segurança pública se tornou um problema de grandes proporções, pelo não tratamento no tocante à gênese de todos os problemas sociais. A educação é um dos instrumentos que buscar reduzir desigualdades, erradicar pobreza, prevenir a criminalidade. Assim, ao falar-se de segurança pública, não há como não tratar também de educação. Logo, a garantia do direito fundamental à educação se apresenta como pressuposto à efetivação de todos os direitos sociais, dentre os quais, o direito à segurança pública.
Assim, o princípio do não retrocesso como garantidor de padrões mínimos prestados pelo poder público não pode ser observado isoladamente referente a determinado direito social. Para garantir padrões aceitáveis com relação à segurança é preciso – com base no princípio do não retrocesso – garantir também toda uma gama de direitos sociais que se relacionam.
4. Referências
AGRA, Walber de Moura. Manual de Direito Constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.
BARCELLOS, Ana Paula de. A eficácia jurídica dos princípios constitucionais: o princípio da dignidade da pessoa humana. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.
BARROSO, Luiz Roberto. O Direito Constitucional e a efetividade dês duas normas. São Paulo: Atlas, 1996.
BULLOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007.
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 3ªed. Coimbra: Almedina, 1998.
SULOCKI, Vitória Amélia de B. C. G.. Segurança pública e democracia: aspectos constitucionais das políticas públicas de segurança. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007.
ISRAEL, Jean-Jacques. Direito das Liberdades Fundamentais. Barueri: Manole, 2005.
KRELL, Andreas. Realização dos direitos fundamentais sociais mediante controle judicial da prestação dos serviços públicos básicos. Disponível em:
LIBÂNEO, José Carlos; OLIVEIRA, João Ferreira de; TOSCHI, Mirza Seabra. Educação escolar: políticas, estrutura e organização. São Paulo: Cortez, 2003.
MAEYER, Marc de. Organização das Nações Unidas para a Educação. Disponível em:<http://agenciabrasil.ebc.com.br/noticias/2006/07/13/materia.2006-0713.1416371003/view>. Acesso em 12 de julho de 2010.
MARTÍNEZ, Gregório Peces-Barba. Curso de Derechos Fundamentales: Teoría General. Universidad Carlos III de Mardid. Madrid: Boletín Oficial del Estado, 1999.
MORAIS. Alexandre. Direitos Humanos Fundamentais. 6ªed. São Paulo: Atlas, 2005.
OLIVEIRA, Silvio Luiz de. Tratado de metodologia científica: projeto de pesquisa, TGI, TCC, monografia, dissertações e teses. 2ª ed. São Paulo: Pioneira, 1999.
[1] SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais, 2 ed. São Paulo: Livraria do Advogado. 2001, p.47.
[2] CANOTILHO, Joaquim José Gomes. Constitucional e teoria da constituição. 3. ed. Coimbra: Almeidina ,1998, p. 340.
[3] Relatório elaborado pela Coordenação Geral de Pesquisa / SENASP. Recursos Gastos pelos Governos Estaduais em Segurança Pública (2005/2008). Disponível em: <http://portal.mj.gov.br/data/Pages/MJCF2BAE97ITEMID6CB4BC7A517B4668A5F12EFC98FFCEFEPTBRNN.htm>. Acesso em 06 de Outubro de 2010.
[4] BARROSO, Luiz Roberto. O Direito Constitucional e a efetividade dês duas normas. São Paulo:Atlas, 1996, p. 111.
Pós-graduado em Direito Constitucional, Direito Penal e Direito Processual Penal pela FACULDADE ÚNICA. Pós-Graduado em Segurança Pública e Cidadania pela ASCES. Servidor Público do Tribunal Regional do Trabalho .
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: NASCIMENTO, DIMAIKON DELLON SILVA DO. Aplicabilidade do princípio do não retrocesso social frente à garantia do direito à segurança pública Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 16 nov 2023, 04:50. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/63816/aplicabilidade-do-princpio-do-no-retrocesso-social-frente-garantia-do-direito-segurana-pblica. Acesso em: 23 dez 2024.
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