Resumo: O presente artigo apresenta o conceito, a fundamentação legal, os principais benefícios e o procedimento da adoção da consulta pública pela Administração Pública quando da realização de licitações. Destaca-se que a matéria é afeta à discricionariedade administrativa, motivo pelo qual caberá ao gestor publico regulamentá-la, bem como decidir sobre sua necessidade.
Palavras-chave: Licitações. Consulta Pública. Discricionariedade Administrativa.
1.Introdução
A consulta pública é um instrumento de participação popular utilizado pela Administração Pública quando da realização de licitações, como também quando da elaboração de leis e atos normativos.
Trata-se de mecanismo que possibilita a discussão acerca do planejamento da contratação, uma vez que são colhidas opiniões e sugestões dos interessados e, em especial, dos potenciais licitantes, a fim de aprimorar o procedimento licitatório.
Nesse sentido, conforme elucidado na 5ª Edição do Manual de Licitações e Contratos do Tribunal de Contas da União (TCU), por meio da realização de consulta pública é possível discutir diversos aspectos da contratação, como a natureza do objeto, o modelo de execução, o modelo de gestão do contrato, a forma de remuneração, o orçamento estimado, a planilha de custos e formação de preços e as sanções previstas.[1]
2.Fundamento legal
A Lei nº 14.133/21 dispõe sobre normas gerais de licitações e contratos no âmbito da Administração Pública direta, autárquica e fundacional, trazendo a previsão de consulta pública na licitação em seu artigo 21, in litteris:
Art. 21. A Administração poderá convocar, com antecedência mínima de 8 (oito) dias úteis, audiência pública, presencial ou a distância, na forma eletrônica, sobre licitação que pretenda realizar, com disponibilização prévia de informações pertinentes, inclusive de estudo técnico preliminar e elementos do edital de licitação, e com possibilidade de manifestação de todos os interessados.
Parágrafo único. A Administração também poderá submeter a licitação a prévia consulta pública, mediante a disponibilização de seus elementos a todos os interessados, que poderão formular sugestões no prazo fixado.
No entanto, verifica-se que a disposição normativa carece de regulamentação para sua efetivação, atraindo a competência dos gestores para fazê-la.
Ainda, imperioso ressaltar que o referido instrumento também possui amparo legal na Lei nº 9.784/99, como se depreende do artigo 31 do aludido diploma legal:
Art. 31. Quando a matéria do processo envolver assunto de interesse geral, o órgão competente poderá, mediante despacho motivado, abrir período de consulta pública para manifestação de terceiros, antes da decisão do pedido, se não houver prejuízo para a parte interessada.
§ 1o A abertura da consulta pública será objeto de divulgação pelos meios oficiais, a fim de que pessoas físicas ou jurídicas possam examinar os autos, fixando-se prazo para oferecimento de alegações escritas.
§ 2o O comparecimento à consulta pública não confere, por si, a condição de interessado do processo, mas confere o direito de obter da Administração resposta fundamentada, que poderá ser comum a todas as alegações substancialmente iguais.
Assim, não pairam dúvidas quanto à legalidade e, por conseguinte, da possibilidade de realização de consulta pública nos procedimentos licitatórios que, por sua vez, não preveem nenhuma condição de procedibilidade. Ao revés, cuida-se de mecanismo inserido no âmbito da discricionariedade do gestor público.
3.Benefícios da realização da consulta pública
Primordialmente, a consulta pública perfectibiliza o princípio da transparência, da publicidade e da segurança jurídica de modo a permitir que a sociedade possa participar efetivamente da licitação, garantindo a legitimidade do certame e a maior competitividade.
Nesse sentindo, Rafael Oliveira ensina[2]:
“A participação popular no procedimento administrativo. nessa perspectiva do consensualismo, revela-se um importante instrumento de democratização da Administração Pública, pois permite uma melhor ponderação pelas autoridades administrativas dos interesses dos particulares, identificando, com maior precisão, os problemas e as diferentes consequências possíveis da futura decisão. Ademais, a participação aumenta a probabilidade de aceitação dos destinatários das decisões administrativas. constituindo, por isso. Importante fator de legitimidade democrática da atuação da Administração Pública.”
Ademais, ampliar a forma de acesso dos particulares no procedimento licitatório faz com que a assimetria de informações entre o setor público e o setor privado seja reduzido, oportunizando contratações mais eficientes e vantajosas. Não se pode olvidar que o setor privado detém maior expertise em assuntos específicos e, sendo assim, torna-se interessante um canal de comunicação entres esses atores.
4.O procedimento da consulta pública
Conforme já mencionado, não há na lei regulamentação acerca dos requisitos a serem observados quando da realização da consulta pública, cabendo ao gestor defini-los em juízo de conveniência e oportunidade.
Nesse sentido, a doutrina pontua que a sua realização deve preceder a publicação do edital de licitação, ou seja, antes do início da fase externa, de modo a permitir que eventuais vícios apontados pelos participantes possam ser sanados.
Por outro lado, no que diz respeito ao prazo, entende-se que o administrador poderá designá-los de acordo com a complexidade do objeto, assim como com o valor da contratação. Logo, não há um modelo estanque a ser seguido.
Atualmente, o Município de São Paulo já regulamentou o tema na nos artigos 23 a 26, do Decreto nº 62.100/22, in verbis:
Da Realização de Consulta e Audiência Públicas
Art. 23. Deverá ser realizada consulta pública:
I - sempre que os valores estimados da contratação superarem o montante de R$ 100.000.000,00 (cem milhões de reais);
II - independentemente do valor estimado da contratação, sempre que a relevância, a pertinência ou a complexidade do objeto assim o recomendarem; ou
III - para qualquer valor, quando a legislação específica a exigir.
§ 1º A consulta pública poderá ser dispensada a critério da autoridade competente, desde que devidamente justificada no respectivo processo administrativo.
§ 2º Não se aplica o disposto no “caput” deste artigo às licitações na modalidade leilão.
Art. 24. O órgão licitante deverá submeter à consulta pública, no mínimo, o termo de referência, que contenha a identificação e a descrição do objeto do contrato, além da justificativa da contratação.
Parágrafo único. O prazo mínimo para o recebimento de sugestões será de 5 (cinco) dias úteis, podendo ser realizada audiência pública, a critério do órgão licitante, observada, nesse caso, a antecedência de 8 (oito) dias úteis para convocação.
Art. 25. As críticas e as sugestões enviadas deverão, obrigatoriamente, estar devidamente identificadas e acompanhadas da argumentação que as justifique, sobre as quais o órgão licitante fará a respectiva análise.
Art. 26. Todas as etapas da consulta pública, compreendendo a abertura, os esclarecimentos e os subsídios, deverão ser divulgadas no sítio eletrônico oficial do Município até a data da publicação do edital.
Parágrafo único. O processo de licitação será instruído com os documentos que comprovem a consulta pública e, quando couber, a audiência pública, e com a conclusão da análise realizada.
Não obstante a ausência de determinação legal no tocante ao prazo a ser considerado, a 5ª Edição do Manual de Licitações e Contratos do TCU apontou como um possível risco da consulta pública a concessão de prazos exíguos para sua realização, haja vista a possibilidade de mitigar a participação dos interessados, esvaziando o objetivo primordial do instrumento.
Salienta-se que a legitimidade desse mecanismo requer, ainda, ampla divulgação, atendendo ao princípio da publicidade, expressamente elencado no art. 37, caput, da Constituição da República.
5.Conclusão
Ante o exposto, verifica-se que a realização de consulta pública tem por objetivo aprimorar o procedimento licitatório, trazendo a expertise do setor privado para maior eficiência das contratações públicas, além de conferir legitimidade aos atos praticados pelos administradores.
Assim, a utilização desse instrumento é uma faculdade conferida ao gestor público que, por sua vez, pode regulamentá-lo de acordo com as necessidades do órgão licitante, o que não afasta a necessidade de previsão de parâmetros mínimos a serem seguidos.
Por fim, frisa-se que não há óbice para adoção de outros prazos ou requisitos para além dos já adotados em legislações correlatas, uma vez que a previsão normativa no tocante à procedibilidade da consulta pública, conforme restou demonstrado, cuida-se de matéria inserida no campo da discricionariedade administrativa.
Referências Bibliográficas:
Oliveira, Rafael Carvalho Rezende. Curso de direito administrativo / Rafael Carvalho Rezende Oliveira. - 8. ed. - Rio de Janeiro: Método, 2020.
Alexandrino, Marcelo. Paulo, Vicente. Resumo de Direito Administrativo Descomplicado – 16ª Edição 2023
Lenza, Pedro. Esquematizado - Direito Administrativo - 5ª edição 2022
Advogada na área de contencioso cível desde 2016. Graduada em Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro em 2016. Pós-graduado em Direito Público pela Universidade Cândido Mendes em 2018.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: LARA NASCIMENTO MAGALHÃES, . A consulta pública como instrumento de participação popular Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 04 mar 2024, 04:33. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/64800/a-consulta-pblica-como-instrumento-de-participao-popular. Acesso em: 26 dez 2024.
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