RESUMO: A preocupação básica deste estudo é refletir sobre os reflexos dos princípios administrativos presentes em normas constitucionais. Este artigo tem como objetivo analisar a importância dos princípios e suas ramificações. Realizou-se uma pesquisa bibliográfica considerando as contribuições de autos como Ramos (2015), Vasconcellos (2017) e Midigal (2020). Procurou-se enfatizar a importância dos princípios, bem como as consequências práticas e em outras normas do ordenamento jurídico pátrio. Concluiu-se a importância dos supraprincípios e dos princípios expressos pelo poder constituinte, garantindo maior coerência e proporcionalidade às normas jurídicas derivadas.
Palavras-chave: Direito Administrativo. Princípios. Supraprincípios.
Introdução
O presente trabalho tem como tema os princípios administrativos constitucionais, principalmente os supraprincípios e os expressos no artigo 37, caput, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88).
Nesta perspectiva, construiu-se uma questão que norteou este trabalho: quais são as aplicabilidades e entendimentos doutrinários acerca dos princípios princípios administrativos constitucionais?
O Direito é uma uma área do saber humano que se baseia no estudo da norma jurídica. Como forma de trazer tal normal ao mundo, são utilizados diversos artifícios pelo aplicador do Direito. Dentre eles, está o uso dos princípios.
Vasconcellos (2015), ao tratar dos princípios, inicia o estudo diferenciando-os das regras. Aponta que aqueles são dotados de um maior grau de abstração que estas, pois possuem aplicação dos princípios em casos concretos precisam da intermediação das regras. Continua, com os princípios sendo os fundamentos de cada ramo do Direito, enquanto as regras se originam e se subordinam aos princípios. Além disso, nas resoluções de antinomias, o princípios podem continuar a existir e serem compatibilizados, enquanto uma regra deverá ser extinta para que a outra tenha validade. Por fim, os princípios são utilizados para diversas situações, já as regras atuam de forma mais específica.
Por uma perspectiva mais objetiva, Madrigal (2017) estabelece que: “os princípios são linhas gerais aplicadas a determinada área do direito, constituindo as bases e determinando as estruturas em que se assentam institutos e normas jurídicas.” Ao passo que Ramos (2020) utilizasse de Gasparini (2004, p.6) para conceituar princípios: “um conjunto de proposições que alicerçam ou embasam um sistema e lhe garantem a validade.”
Observa-se que os três autores em estudos definem os princípios como sendo os alicerces de cada campo jurídico, com um certo grau de abstração. É a partir dos princípios que se chega às demais normas jurídicas.
Neste contexto, o objetivo primordial deste estudo é, pois, investigar as consequências práticas dos supracitados princípios administrativos.
Para alcançar os objetivos propostos, utilizou-se como recurso metodológico, a pesquisa bibliográfica, realizada a partir da análise pormenorizada de materiais já publicados na literatura e artigos científicos divulgados no meio eletrônico.
O texto final foi fundamentado nas ideais e concepções de, principalmente, três autores: Vasconcellos (2015), Midigal (2017) e Ramos (2020).
Desenvolvimento
No caso do Direito Administrativo, um ramo que não tem codificação própria, utilizando-se da CRFB/88 como ponto de partida, as legislações esparsas para tratar de assuntos específicos e outras codificações como fonte subsidiária. Além, é claro, dos princípios gerais do Direito, os costumes e analogia.
Neste sentido, é importante ressaltar que a CRFB/88 é uma constituição de grande axiologia, alçando diversos princípios ao estados de constitucionais. Quando se trata do Direito Administrativo, a CRFB/88 traz princípios implícitos e expressos. Estes, podem ser identificados com maior facilidade no artigo 37, caput, CRFB/88:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
Foi notável o constituinte ter colocado os princípios em tal posição, pois demonstra a sua importância, realçando. No destaque estão os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Estes princípios são tratados pelos três autores. Com a diferença que apenas dois, Ramos (2020) e Vasconcellos (2015), trabalham os supraprincípios que também são constitucionais, mas implícitos.
Antes de iniciar o estudos dos cinco princípios expressos no artigo 37, caput, CRFB/88, parte-se para os supraprincípios, diante da maior importância.
Os supraprincípios recebem este nome por serem os princípios centrais e dos quais derivam todos os demais princípios e normas do sistema administrativo, como bem sintetiza, Ramos (2020). No entanto, o autor ressalta que não existem princípios absolutos e que os princípios constitucionais, implícitos ou expressos, têm o mesmo grau hierárquico.
São dois os supraprincípios: o princípio da supremacia do interesse público e o princípio da indisponibilidade do interesse público.
Nesse diapasão, Vasconcellos (2015) se utiliza de Mello (2005) para conceituar o princípio da supremacia do interesse público, definindo como a sobreposição do interesse público em relação ao interesse particular. Vai além, o interesse público dever primário, pois é o interesse da sociedade, enquanto que o interesse secundário deve ser o interesse da própria administração.
O autor aponta duas situações importantes. A primeira que o interesse privado não deve superar o interesse da coletividade, sendo missão da Administração Pública promover o interesse público. Como exemplo, não pode ser realizado um casamento (evento privado) em uma praia (bem público de uso comum) se isso for causar dano desproporcional à sociedade.
Segundo, a Administração Pública deve priorizar a satisfação dos cidadãos, sendo assim, o interesse público deve ter caráter primário. Enquanto que o interesse patrimonial, deve ter caráter secundário, o aparelhamento estatal só deve ocorrer se for para atender o interesse público, este o objetivo de toda e qualquer administração.
Ramos (2020), por sua vez, esclarece ainda mais, apontando que o referido princípio privilégios e maior grau de importância aos interesses coletivo em detrimento dos interesses particulares. Inclusive, o interesse primário que detém tais privilégios, uma vez que os interesses secundários não gozam de supremacia e nem prevalece diante do interesse particular.
Nota-se que daí partem as cláusulas exorbitantes presentes na Lei nº 8.666/93, tais como: alteração e rescisão unilateral, fiscalização, retomada do objeto e restrições ao uso do princípio da exceção do contrato não cumprido. Tais medidas são possíveis, pois há a intenção de proteger o interesse público de eventuais circunstâncias que podem ser alteradas ao longo de um contrato administrativo.
Em seguida, Vasconcellos (2015) estabelece que o princípio da indisponbilidade do interesse público preconiza que o interesse público é indisponível, não pode ser negociado ou transacionado. Ao passo que Ramos (2020) pontua que o princípio “enuncia que os interesses públicos não pertencem à Administração e nem aos seus agentes, aos quais toca apenas e tão somente a função de gestão em prol da coletividade.” Observa-se, portanto, que a Administração Público não tem a possibilidade de dispor do interesse público, uma vez que a ela não pertence, mas sim à coletividade, sendo que nunca deve ser deixado de lado, não devendo admitir exceções.
Todavia, Vasconcellos (2015) aponta a conciliação no Juizado Especial Federal (artigo 10, parágrafo único, Lei nº 11.029/01) e arbitragem (artigo 23, Lei nº 8.987/95) como exceções ao princípio da indisponibilidade do interesse público. Algo que o autor da presente obra não concorda, uma vez que os meios de autocomposição servem, justamente, para proteger o interesse da coletividade. Levar um processo até as últimas instâncias, mesmo sabendo que a outra parte detém o direito alegado, contraria outros princípios da administração pública, inclusive o da legalidade e moralidade. Além disso, aumenta o custo, uma vez que terá que arcar com os honorários advocatícios da parte que se saíra vitoriosa ao final e com o custo operacional para defender o ente público judicialmente. A autocomposição serve, justamente para defender o interesse da sociedade, diminuindo o custo de uma possível condenação judicial e fazendo com que os representantes judiciais públicos foquem em trabalhos mais importantes.
Trato os princípios basilares da Administração Público, de onde parte as demais ramificações, trata-se dos princípios expressos no artigo 37, caput, CRFB/88.
Madrigal (2017) e Vasconcellos (2015), ao tratarem do princípio da legalidade, iniciam o diferenciando do princípio da legalidade privada, presente no artigo 5º, II, CRFB/88. A distinção é salutar, pois, de forma resumida, ao particular é garantido que não “será obrigado a fazer ou deixar fazer alguma coisa senão em virtude de lei.” Enquanto que a doutrina estabelece que o princípio da legalidade administrativa determina que a Administração Pública não pode agir contra a lei (contra legem) ou além da lei (praeter legem). Assim sendo, para o particular pode fazer tudo o que a lei não proíbe, enquanto que para o ente público só pode fazer o que a lei permite.
Por seu torno, Ramos (2020) relembra que a origem se dá com o brocardo de que o Estado deve respeitar as próprias leis que edita. Ademais, o princípio da legalidade surgiu para controlar o Estado, pondo final ao Estado Soberano, servindo como garantias do indivíduo frente ao grande poder estatal.
Ramos (2020) avança, salientando que dos princípios da legalidade derivam duas dimensões. A primeira: primazia da lei. Os atos administrativos não podem confrontar a lei, caso isso ocorra a Administração Pública deve sanar o vício ou, caso insanável, declarar nulo o ato, conforme enunciados de nº 346 e 473 da Súmula do Supremo Tribunal Federal (STF). Em segundo: “os atos administrativos só devem ser praticados mediante autorização da lei.” Este, sendo um assunto já trato acima.
Quanto ao princípio da impessoalidade, Ramos (2020) e Madrigal (2017) apontam que se trata de desdobramento do princípio da igualdade. A Administração Pública deve tratar todos de forma igualitária, não podem dar a uns privilégios e a outros descrédito em decorrência de afinidade e inimizades. Todos são cidadãos e todos são iguais.
Em razão de tal princípio que existem as exigências de concurso público e licitações públicas, por exemplo (artigo 37, II e XXI, CRFB/88). Outro dispositivo constitucional que também concretiza o princípio da impessoalidade é o artigo 37, §1º, CRFB/88, pois estabelece que ao dar publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos, deverá ocorrer com caráter educativo, informativo ou de orientação social, não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos. Isto se dá, pelo simples motivo de que quem realiza tal atividade em prol da coletividade é o ente público, não determinada pessoal ou grupo, pois estão exercendo seu poder de função. Não deve ser aceitada a promoção pessoal com verbas públicas.
O terceiro princípio, o princípio da moralidade administrativa, ou apenas princípio da moralidade. Ramos (2020) estabelece que o administrador deve observar padrões éticos, de razoabilidade, de respeito ao próximo, de justiça e de honestidade. Madrigal (2017) alerta que não se trata da moral comum, mas sim de uma moral jurídica: regras de conduta no interior da Administração.
Em prosseguimento, o autor aponta que se trata de pressuposto de validade de todo ato da Administração Pública. Assim sendo, o administrador deve observar o que é e o que não é legal, o conveniente e o inconveniente, o oportuno e o inoportuno, do mesmo modo que o honesto e o desonesto. Nas palavras do STF: “confere substância e dá expressão a uma pauta de valores éticos sobre os quais se funda a ordem positiva do Estado.” (ADI 2.661 MC, rel. Min. Celso de Mello, j. 5-6-2002, P, DJ de 23-8-2002.
Como último exemplo a ser citado para o princípio ora em comento, há o enunciado nº 13 da Súmula Vinculante do STF que veda o nepotismo. Em sua redação, é tratado mais especificamente do nepotismo cruzado. A preocupação reside no fato utilizarem da máquina pública para empregarem familiares em em cargos de livre nomeação, muitas vezes não primando pelo conhecimento técnico.
Já o princípio da publicidade exige da Administração Pública uma atuação transparente e visível, como aponta Ramos (2020). Este autor recorda as finalidades da publicidade: “a) exteriorização da vontade da administração; b) possibilidade de tornar o conteúdo do ato exigível; c) marco inicial da produção de efeitos e d) permissão de controle de legalidade do ato.” (RAMOS, 2020).
Salienta Madrigal (2017) que o princípio é um dos postulados do princípio republicano, uma vez que todo poder emana do povo, este tem o direito de fiscalizar a atuação administrativa. O gestor público é mero delegatório.
Tanto Madrigal (2017) quanto Ramos (2020) expõe que a publicação em órgão oficial é requisito de eficácia dos atos administrativos, de modo que possam produzir efeitos externos ou que onerem o patrimônio público.
Como meios de garantia do direito da população de tomar conhecimento dos atos públicos, Ramos (2020) lista três direitos fundamentais do ser humano: artigo 5º, XXXIII (direito de informação, salvo cujo sigilo seja imprescindível); artigo 5º, XXXIV (direito de petição); e o artigo 5º, LXXII (habeas data), todos da CRFB/88. Mas, como todo direito, há limitações. Vasconcellos (2015) cita como exemplo a Lei Geral de Acesso à Informação (Lei nº 12.527/11) que relativiza o princípio quando se tratar de segurança de Estado, da segurança da sociedade e da intimidade dos envolvidos.
Quinto e último princípio expresso no artigo 37, caput, CRFB/88, o princípio da eficiência. Ramos (2020) afirma que se trata do princípio que exige que a Administração Pública aja rápida e precisamente, produzindo os resultados que satisfaçam as necessidades população. É responsável por trazer a economicidade, redução de desperdício de dinheiro público, qualidade, rapidez, produtividade e rendimento funcional. Ou seja, o ente público deve fazer o máximo, com o menor gasto de tempo e dinheiro possível. No entanto, não se deve primar pela velocidade e esquecer da qualidade, ambos devem andar juntos, havendo uma proporcionalidade.
Vasconcellos (2015) utilza Alexandrino e Paulo (2012) para conceituar a eficiência administrativa que, em resumo, ressalta a administração gerência, com privilégio dos resultados, com ampliação e autonomia dos entes públicos e redução dos controles de atividades-meio. Já, Midigal, por sua vez, apresentando a dupla necessidade:
1. Relativamente à forma de atuação do agente público, espera-se o melhor desempenho possível de suas atribuições, a fim de obter os melhores resultados; 2. Quanto ao modo de organizar, estruturar e disciplinar a Administração Pública, exige-se que este seja o mais racional possível, no intuito de alcançar melhores resultados na prestação dos serviços públicos. (MIDIGAL, 2017).
O serviço público não pode ser deficitário, devendo sempre ter alta qualidade, atendendo as necessidades da demanda pública com eficiência e presteza. Envolve, assim, na eficiência, a celeridade e a economicidade.
Conclusão
Estudou-se com base em três autores de conhecimento na área do Direito Administrativo, Vasconcellos (2015), Midigal (2017) e Ramos (2020. De início houve a apresentação do que são princípios e os diferenciou das regras.
Após, apresentou a importância dos princípios no atual ordenamento jurídico pátrio. Inclusive com a presença de forma implícita e expressa na CRFB/88. Como princípios implícitos, citou-se os denominados supraprincípios da supremacia do interesse público e da indisponibilidade do interesse público.
Quanto aos expressos, recorreu-se aos presentes no artigo 37, caput, CRFB/88: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Além disso, foram dados exemplos de normas constitucionais em que os mesmos estão implícitos.
Por derradeiro, foram demonstradas aplicações práticas de cada princípio e em que situações são concretizados. Constatou-se a importância dos princípios, uma vez que suas ramificações refletem em diversas situações e outras normas jurídicas, dando coerência, proporcionalidade e razoabilidade às exigências legais.
REFERÊNCIAS
ALEXANDRINO, Marcelo & PAULO, Vincente. Direito administrativo descomplicado. São Paulo: Método, 2012.
GASPARINI, Diogenes. Direito administrativo. São Paulo: Saraiva, 2004.
MADRIGAL, Alexis Gabriel. Os princípios constitucionais do Direito Administrativo: A importância dos Princípios Constitucionais do Direito Administrativo. Disponível em: https://alexismadrigal.jusbrasil.com.br/artigos/444137118/os-principios-constitucionais-do-direito-administrativo?ref=serp. Acesso em: 31 de mar. de 2020.
MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de direito administrativo. São Paulo: Saraiva, 2005.
RAMOS, Diego da Silva. A Importância dos Princípios no Direito Administrativo. Disponível em: https://dieramosadv.jusbrasil.com.br/artigos/797881836/a-importancia-dos-principios-no-direito-administrativo?ref=serp. Acesso em 31 de mar. de 2020.
VASCONCELLOS, Flávio. Princípios do Direito Administrativo. Disponível em: https://flavio91vasconcellos.jusbrasil.com.br/artigos/188561958/principios-do-direito-administrativo?ref=serp. Acesso: 31 de mar. de 2020.
Advogado, graduado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Federal de Juiz de Fora, e pós-graduando em Direito Administrativo pela Faculdade Única.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: JEAN VENTURA FLORêNCIO, . Os princípios administrativos constitucionais e seus reflexos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 01 jul 2024, 04:13. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/ArtigOs/65763/os-princpios-administrativos-constitucionais-e-seus-reflexos. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Francisco de Salles Almeida Mafra Filho
Por: BRUNO SERAFIM DE SOUZA
Por: Fábio Gouveia Carneiro
Por: Juliana Melissa Lucas Vilela e Melo
Por: Juliana Melissa Lucas Vilela e Melo
Precisa estar logado para fazer comentários.