Num mundo de tantas transformações, onde profissões desaparecem, tornam-se obsoletas ou simplesmente, revelam-se inadequadas para o tempo presente, os homens ainda permanecem presos; umbilicalmente presos a seus mestres. Vive-se de superar o mestre, equiparar-se a ele ou mesmo negá-lo completamente, só não se vive sem nunca ter tido um mestre. O homem enquanto ser social constrói-se com o outro e pelo outro. Eis a significação mais singela para o mestre – a continuação dele nos seus alunos.
A tarefa de ensinar é antes de tudo um ato de doação de caráter afetivo e cognitivo. Desta tarefa emana o homem. É fato que a educação se processa através de indivíduos munidos de conhecimentos e de um grande desejo de transmiti-lo. A priori, transmite-se o que de antemão se julga necessário.
A educação é uma rede de comunicação cuja eficiência se evidencia no processo. Qualquer pensamento que vislumbre um país melhor irá necessariamente passar por mais investimentos na área educacional, notadamente, investimento no professor.
O porquê desta prelação reside na observação hodierna do tratamento dispensado aos educadores: não constitui novidade falar da péssima remuneração com que se retribui o trabalho do professor, muito menos falar de como sua autoridade diante dos alunos vai sendo mitigada por toda a sociedade.
Sobre o ombro do professor recai, no mais das vezes, a culpa dos desacertos na área educacional; assim se há baixos índices de aprendizagem, julga-se o professor como desinformado, inapto ao uso de novas metodologias, se há uma violência desenfreada na escola, julga-se o professor; se há a presença intensa de bullying nas relações entre alunos, julga-se o professor... enfim só há um responsável por tudo na escola e na vida do aluno – o professor. A escola, a família, a sociedade e o próprio Estado omitem-se da assunção de suas responsabilidades.
Como se tudo isso não bastasse, assiste-se, hoje, a uma crescente fiscalização do trabalho do professor, mil olhos lhe perseguem, retiram-lhe a autonomia, a espontaneidade no trato com os alunos , enfim, sacam do professor o seu animus. O resultado é previsível: um profissional desgastado por controle e exigências excessivas que se efetivam no seu ambiente de trabalho.
Estudos realizados pela OIT vêm reiterando a necessidade de uma reflexão da sociedade sobre a questão do assédio moral nas relações trabalhistas. O fato é : a realidade de constantes práticas de assédio moral no âmbito do trabalho vem obrigando o Estado a se posicionar para garantir os direitos fundamentais do individuo que não podem ser desconsiderados.
Apesar da Constituição do Brasil asseverar no Art. 6º /CF- São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição – muito resta ser a feito para que o exercício do magistério seja, efetivamente, reconhecido como pilar básico de uma nação e valorizado enquanto função que deve ser, condignamente, remunerada.
Mesmo sendo o Estado, constitucionalmente, obrigado a possibilitar o acesso à Educação e ao trabalho, este ainda não se debruçou, com o afinco necessário, sobre o assédio moral nas relações trabalhistas, só, recentemente, através da Emenda 45, colocou-se um ponto final sobre a competência da Justiça do Trabalho para julgar ações trabalhistas eivadas pelo assédio moral. A importância deste fato deve-se a muitos fatores e entre eles a maior facilidade do trabalhador para acessar a Justiça do Trabalho e nela se sentir assistido.
Diante da percepção cada vez maior dos danos psicológicos e morais oriundos de relações trabalhistas que lesionam o tecido social, alguns poderes vêm se mobilizando para frear ações tipificadas como de assédio moral. Sendo a competência para legislar sobre direito do trabalho exclusiva da União. Art. 22, I /CF, as leis, por exemplo, as criadas nas Câmaras de Vereadores ou nas Assembléias Legislativas, não são normas jurídicas trabalhistas, mas sim normas administrativas que objetivam a regulamentação de condutas havidas entre a Administração Pública e seus contratados. Hoje extenso é o rol dessas normas, muitas delas afixadas em órgãos de prestação de serviço público.
Pensar o assédio moral e os danos físicos e morais provocados no trabalhador e, conseqüentemente, na sociedade brasileira leva, necessariamente, a uma leitura de um passado recente de relações trabalhistas que aconteciam sob um regime de escravidão; por isso é tão, culturalmente, difícil para o empregador o estabelecimento de relações fundadas no respeito recíproco. Aqueles que labutam na Justiça do Trabalho se defrontam, diariamente, com Reclamações Trabalhistas eivadas de lesões aos direitos e garantias individuais tuteladas pela Constituição Federal de 1988.
A Constituição Federal, em seu art. 5º, X dá a dimensão do comprometimento do Estado e da sociedade como um todo no estabelecimento de padrões éticos no trato social.
Art. 5º, X/ CF - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.
A questão do assédio vem preocupando, a um certo tempo, as mais diversas instituições democráticas quer nacionais, quer internacionais, tanto é que “A Declaração dos Princípios Básicos de Justiça para Vítimas de Crime e Abuso de Poder,” das Nações Unidas, estabelecida na Assembléia Geral de 29 de novembro de 1985, em seu Artigo 1º, afirma a urgência para que se assegure , nacional e internacionalmente, medidas objetivando garantir o reconhecimento dos direitos das vítimas de crime e abuso de poder.
Art. 18º . Entendem-se por "vítimas" as pessoas que, individual ou coletivamente, tenham sofrido prejuízos, nomeadamente um atentado à sua integridade física ou mental, um sofrimento de ordem moral, uma perda material, ou um grave atentado aos seus direitos fundamentais, como conseqüência de atos ou de omissões que, não constituindo ainda uma violação da legislação penal nacional, representam violações das normas internacionalmente reconhecidas em matéria de direitos do homem.
O INSS publicou, no Decreto no 3.048, de 6 de maio de 1999, um rol de comprometimentos da saúde mental e física decorrente das relações de trabalho. Observando este rol de comprometimentos da saúde e os agentes causadores, verifica-se o quão vulnerável é o profissional professor, diante da realidade que enfrenta, cotidianamente, na escolar. Ao mestre, sem carinho!
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