A Lei nº 11.105/2005 estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam Organismos Geneticamente Modificados e seus derivados.
Em todo o corpo da lei, o art. 5º1 é destinado à regulamentação da utilização, para fins de pesquisa, de células-tronco embrionárias obtidas de embriões produzidos por fertilização em vitro.
Não se pode questionar que a lei foi cuidadosa na regulamentação de alguns pontos, como quando exigiu que as pesquisas fossem realizadas apenas com embriões humanos considerados inviáveis e, mesmo assim, sempre com o consentimento do genitores e com a aprovação dos comitês de ética, proibindo, ainda, a comercialização do material biológico utilizado.
O que causa estranhamento, por outro lado, é o fato de que no Brasil a regulamentação de um tema tão complexo e sério, que envolve aspectos éticos nas pesquisas científicas, seja realizada por apenas um artigo.
Uma análise comparativa do art. 5º da Lei de Biossegurança com a legislação de outros países sobre o mesmo assunto que, de fato, não se trata apenas de uma impressão inicial, mas que realmente a lei brasileira é deficiente na legislação que versa sobre as pesquisas com células-tronco embrionárias.
Na justificativa de seu voto, na ADI 3510, o Ministro Gilmar Mendes ilustrou a normatização do tema em alguns países que já regulamentaram a matéria.2
Na Alemanha, editou-se lei específica, denominada Stanmzellgeset, sobre a importação e a utilização das células-tronco embrionárias em pesquisas científicas. Destaca-se que a legislação alemã permite apenas as pesquisas com linhas de células-tronco consolidadas do exterior, sendo expressamente proibida a produção de células-tronco na própria Alemanha.
Mais importante, a lei alemã exige que as pesquisas com células-tronco embrionárias sejam motivadas por elevados objetivos ou sejam destinadas ao desenvolvimento de procedimentos terapêuticos, de diagnósticos ou de prevenção aplicados a seres humanos. Importante dizer que as pesquisas com células-tronco só podem ser realizadas quando todas as hipóteses forem exaustivamente testadas com células animais ou em experiências com animais.
Merece igual destaque o fato de que a legislação alemã institui não só um órgão administrativo competente para conceder licenças prévias, cria também uma Comissão de ética Central para Pesquisa com células-tronco, formada por especialistas em medicina, biologia, ética e teologia.
Ainda nas palavras do Ministro Gilmar Mendes na ADI 3510, na Austrália a questão é regulada pelo Research Involving Human Embryios Act 2002.
Segundo a regulamentação australiana, permite-se apenas a utilização de células-tronco embrionárias inviáveis. Define-se expressamente que a viabilidade do embrião seja determinada com base na sua aptidão biológica para implantação. Além disso, há preocupação específica com as pesquisas que podem danificar ou destruir embriões, nas quais somente podem ser utilizados embriões criados até 05/04/2002.
Na França as pesquisas com células embrionárias humanas é permitida, tendo em vista razões de progresso terapêutico, sendo, porém, objeto de ampla e rigorosa regulamentação. As pesquisas com células embrionárias são permitidas apenas com vistas ao tratamento de doenças particularmente graves ou incuráveis, e apenas são autorizadas por período máximo de 5 anos. Ademais, as pesquisas somente são autorizadas após o consentimento prévio do casal ou de membro sobrevivente do casal doador dos embriões.
A Espanha proíbe expressamente a constituição de pré-embriões e embriões humanos exclusivamente com a finalidade de experimentação. Estabelece que os embriões humanos que tenham perdido sua capacidade de desenvolvimento biológico, bem como os embriões ou fetos humanos mortos poderão ser doados para fins de pesquisa biomédica ou outros fins terapêuticos, farmacológicos, clínicos ou cirúrgicos.
Ademais, a pesquisa com seres humanos somente poderá realizar-se quando inexistente outra alternativa comparável não podendo implicar para o ser humano riscos e moléstias desproporcionais aos potenciais benefícios que poderão ser obtidos.
Como se pode notar, os países que permitem a pesquisa em células-tronco embrionárias editaram legislação ampla e específica sobre este tema, restando poucas lacunas a serem preenchidas por legislação complementar, ao contrário do Brasil que editou uma lei geral de Biossegurança, na qual apenas um artigo trata da pesquisa em células embrionárias.
É justamente a escassa regulamentação para um tema tão complexo que gerou a arguição de inconstitucionalidade do artigo 5º da Lei 11.105/2005, a Lei de Biossegurança, que trouxe a tona um conflito de princípios constitucionais sobre os quais o Supremo Tribunal Federal teve que se debruçar para decidir sobre a ADI 3510.
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