Muito se tem discutido sobre a responsabilidade dos coobrigados diante do processamento de pedido de recuperação judicial e de falência. Questiona-se, sobretudo, se o credor pode ou não continuar sua demanda de execução para receber valores em espécie dos coobrigados em processo de recuperação judicial. Existem posicionamentos nos dois sentidos, ora admitindo a continuidade da demanda de execução, ora que ela tenha que ser suspensa.
Aqueles que defender a suspensão da demanda de execução invocam o artigo 6º da lei de recuperação de empresas e falência, que estabelece:
"Art. 6o A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário".
Assim, ao ser analisado referido artigo, parece não haver dúvida de que as ações de execução dos credores particulares do sócio solidário do devedor que está em processo de recuperação judicial devem ser suspensas.
Porém, referido artigo merece uma interpretação sistemática e finalista, ou seja, é preciso ser analisada a legislação de recuperação de empresas como um todo e o que ela visa para chegarmos ao entendimento do mencionado artigo. A nova lei de recuperação de empresas e falências é aplicada aos empresários em dificuldades.
O empresário não deve ser confundido com seus sócios, nem com a empresa e muito menos com os coobrigados. O empresário é sujeito de direito, tendo como objeto para o exercício de suas atividades a empresa.
O sócio é aquele que se liga a outras pessoas por meio de um contrato plurilateral visando exercer uma atividade empresarial ou não empresarial por meio de uma pessoa jurídica. Sócio é uma "coisa", empresa é outra e empresário ainda outra. Por fim, coobrigados são avalistas, fiadores e intervenientes garantidores.
Nenhum destes é empresário em recuperação judicial ou falência normalmente, salvo raríssimas exceções onde o coobrigado também estivesse em processo de recuperação judicial ou falência.
Também seria uma exceção o sócio garantidor ser uma pessoa jurídica em processo de recuperação judicial fora da sociedade em que é sócio. Vamos tratar do geral, deixando de lado as exceções.
É importante ser feita esta distinção porque a nova lei de recuperação de empresas não se aplica aos sócios e coobrigados, como demonstramos anteriormente, logo, quem está em recuperação judicial ou teve sua falência declarada foi o empresário e não seus sócios e/ou coobrigados.
Como os sócios e/ou coobrigados não estão em recuperação judicial e não têm sua falência declarada, as ações de execução movidas contra eles não são suspensas.
Este entendimento vai ao encontro do que estabelecem os artigos 49, parágrafo 1.º, 50, parágrafo primeiro e 59 da lei de recuperação de empresas e falências, in verbis
"Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos. § 1.º Os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso.
Art. 59. O plano de recuperação judicial implica novação dos créditos anteriores ao pedido, e obriga o devedor e todos os credores a ele sujeitos, sem prejuízo das garantias, observado o disposto no § 1.º do art. 50 desta Lei".
Neste sentido decidiu a Câmara Especial de Falências e Recuperações Judiciais do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) no julgamento do Agravo de Instrumento n.º 581.616.4/4-00 ao permitir a continuidade da ação de execução contra o devedor solidário em caso de recuperação judicial.
Ainda merece ser destacado que, por hipótese, seriam suspensas as execuções dos credores particulares do sócio solidário, como estabelece o final do artigo 6º. Veja que a lei fala em credor particular do sócio solidário e não credor do empresário.
Feita a distinção acima, como o crédito é contra o empresário, possuindo um garantidor, verifica-se que não se trata de um crédito particular contra o sócio solidário, logo, não existe motivo para não ser suspensa a ação visando o recebimento em espécie do garantidor da dívida empresarial.
Parece que a interpretação que merece ser dada ao artigo 6.º se refere a casos onde exista um credor particular de um sócio. O que se dá por exemplo no caso do sócio contrair uma dívida particular, não pagá-la e vir a ter suas quotas sociais penhoradas. Aqui sim a ação de execução seria suspensa porque poderia afetar a recuperação do empresário.
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