A preservação da empresa é um dos princípios mais modernos do processo falimentar; pois a empresa é constituída não só por seus sócios, mas também por seus empregados, fornecedores, fisco e consumidores, dentre vários outros.
Esse princípio (preservação da empresa) não foi criado para proteger ou acolher empresa nenhuma, mas, sim, para resguardar os interesses dos envolvidos, pois a empresa tem uma função social muito importante: gera empregos, gira a economia etc.
Dispõe o artigo 47 da Lei 11.101/2005 (Lei de Falência e Recuperação de Empresas):
“Art. 47, Lei 11.101/2005. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.” (GRIFO NOSSO)
Temos ciência de que um dos objetivos fundamentais do processo falimentar é conferir aos credores um rigoroso tratamento igualitário (par conditio creditorum), o que significa que os credores estão em igual situação, ou seja, devem ter tratamento igual.
A Lei de Falências, no artigo 83, disciplinou a ordem de preferência de pagamentos da seguinte maneira:
1º lugar = créditos derivados da legislação trabalhista, limitados a 150 (cento e cinqüenta) salários-mínimos por credor, e os decorrentes de acidentes de trabalho;
2º lugar = créditos preferenciais, com garantia real, até o limite do bem gravado;
3º lugar = créditos fiscais è créditos tributários, independentemente da sua natureza e tempo de constituição, excetuadas as multas tributárias;
4º lugar = créditos quirografários (privilégio especial e privilégio geral). Esses créditos são aqueles que não se encontram nas classes anteriormente descritas (do 1º ao 3º lugar). É nele que os pecuaristas estão.
Os meios legais de recuperação judicial são, sucessivamente:
· Concessão de prazos e condições especiais para pagamento das obrigações vencidas ou vincendas;
· Cisão, incorporação, fusão ou transformação de sociedade, constituição de subsidiária integral, ou cessão de quotas ou ações, respeitados os direitos dos sócios, nos termos da legislação vigente;
· Alteração do controle societário;
· Substituição total ou parcial dos administradores do devedor ou modificação de seus órgãos administrativos;
· Concessão aos credores de direito de eleição separadamente de administradores e de poder de veto em relação às matérias que o plano especificar;
· Aumento de capital social;
· Trespasse ou arrendamento de estabelecimento, inclusive à sociedade constituída pelos próprios empregados;
· Redução salarial, compensação de horários e redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva;
· Dação em pagamento ou novação de dívidas do passivo, com ou sem constituição de garantia própria ou de terceiro;
· Constituição de sociedade de credores;
· Venda parcial dos bens;
· Equalização de encargos financeiros relativos a débitos de qualquer natureza, tendo como termo inicial a data da distribuição do pedido de recuperação judicial, aplicando-se inclusive aos contratos de crédito rural, sem prejuízo do disposto em legislação específica;
· Usufruto da empresa;
· Administração compartilhada;
· Emissão de valores mobiliários; e
· Constituição de sociedade de propósito específico para adjudicar, em pagamento dos créditos, os ativos do devedor.
O mais comum dos meios utilizados é o pedido de concessão de prazos e condições especiais para a solução dos débitos vencidos.
O credor tem o prazo fatal de sessenta (60) dias para apresentar em juízo o plano de recuperação judicial; sendo que a sanção para o descumprimento desse dever é a convolação da recuperação judicial em falência.
O plano de recuperação deverá conter, obrigatoriamente, o detalhamento dos meios de recuperação e seu resumo; a demonstração da viabilidade econômica; e o laudo econômico-financeiro e de avaliação do ativo do devedor. Tal plano deverá ser publicado por edital, com fixação de trinta (30) dias para eventuais impugnações.
As ações que são processadas em sede de recuperação judicial, reguladas pela Lei 11.101/2005, são: 1) habilitação de crédito (art. 9º); 2) impugnação de crédito (art. 8º), que consiste na resposta contrária ao pedido, uma vez que para referendá-lo basta que o credor se quede omisso; 3) ação para apurar a responsabilidade pessoal dos sócios de responsabilidade limitada, dos controladores e dos administradores da sociedade falida, estabelecida nas respectivas leis (art. 82); 4) pedido de restituição (art. 85); 5) embargos de terceiro (art. 93); 6) ação revocatória (parágrafo único do art. 129 e art. 130); 7) ação de prestação de contas do administrador (art. 154); e 8) ação declaratória de extinção das obrigações do falido.
Importante frisar que a decisão final caberá ao órgão judiciário, que poderá, conforme o caso, rejeitar ou deferir o plano.
Outro ponto importante é que a recuperação judicial tem prazo máximo de duração de até dois (2) anos, após sua concessão. O devedor ficará em recuperação judicial até que se cumpram todas as obrigações previstas no plano com vencimento nesse biênio.
Em relação ao administrador judicial, este terá o encargo de estar fiscalizando os negócios da empresa recuperanda, sendo que estará constantemente sob a supervisão do juiz. É, portanto, uma administração fiscalizada.
O Comitê de Credores, por sua vez, tem sua constituição de modo facultativo, dependente de livre deliberação de qualquer das classes de credores, na assembléia geral de credores, a qual é convocada pelo Juiz. Tal constituição deve ser fundamentada na necessidade, ditada pela complexidade do procedimento e/ou pelo porte econômico-financeiro da empresa; sendo ele composto por três (3) membros, cada um com dois (2) suplentes, a saber: 1) representante dos empregados; 2) representante dos credores com direitos reais de garantia ou privilégios especiais; e 3) representante dos credores quirografários e com privilégios gerais.
Os membros do Comitê de Credores, após a assinatura dos respectivos termos de compromisso, terão as seguintes atribuições: a) – fiscalizar a administração do plano de recuperação judicial; b) – apurar as reclamações de interessados; c) – emitir parecer sobre alienação ou oneração de bens e direitos; d) – representar ao Juiz em caso de violação de direitos dos credores; e) – requerer ao Juiz a convocação da assembléia geral.
Concluindo, a recuperação judicial tem caráter preventivo da falência. No entanto, visa evitar a falência. Porém, nem sempre é possível evitar-se a falência, uma vez que a recuperação judicial poderá resultar inexitosa, tanto na fase do processamento, quanto na executiva; de modo que poderá vir a ser feita a convolação da recuperação em falência (dispositivo contido no artigo 73 e incisos da Lei 11.101/2005).
Porém, caso a recuperanda satisfaça todas as obrigações que assumiu no plano de recuperação judicial, tem a mesma a autorização para requerer ao Poder Judiciário a sentença de encerramento da recuperação judicial, a qual declarará que o plano foi cumprida, tendo sido resolvidas as obrigações assumidas pelo devedor durante a execução do plano.
Tomara que as empresas que estão se utilizando desse expediente judicial, ou que venham a utilizar-se, tenham a consciência de fazê-lo dentro dos parâmetros legais, sem artifícios maliciosos e sem o dolo em prejudicar seus credores; pautando pela preservação da função social, tanto quanto o Judiciário tem se pautado. Tomara!
Precisa estar logado para fazer comentários.