1 INTRODUÇÃO
O surgimento do conceito de trabalho como entendemos atualmente tem sido objeto de inúmeras discussões acadêmicas em vários campos do saber, servindo de elemento basilar para debates acirrados em diversas áreas como o Direito, Psicologia, Serviço Social, Sociologia, dentre outras.
Numa análise histórica perfunctória percebe-se que o trabalhador tem conseguido ao longo dos últimos séculos grandes conquistas. Muitas garantias foram adquiridas, muitos direitos preservados e outros incorporados ao patrimônio do empregado, não, é claro, sem muito sacrifício e luta.
Durante a Conferência da Paz, ocorrida após a I Guerra Mundial, restou criada a Organização Internacional do Trabalho – OIT, que mais tarde se incorporou como “órgão” permanente do Tratado de Versalhes, Parte XIII.
O surgimento da OIT, sem dúvida, foi um marco histórico na salvaguarda dos direitos e garantias dos trabalhadores no mundo e influenciou sobremaneira os sistemas jus trabalhistas das “nações amigas”.
No Brasil, com o fortalecimento e criação de órgãos de amparo e proteção ao trabalho, como o Ministério do Trabalho e Emprego e as Delegacias Regionais do Trabalho, o trabalhador tem encontrado maior orientação no que tange a seus direitos e garantias, sem olvidar o viés fiscalizatório destes órgãos.
Com o advento da Emenda Constitucional n.º 45, de 8 de dezembro de 2004, ocorreu um fortalecimento da Justiça do Trabalho no Brasil, bem como uma sensível ampliação em sua competência, fato que tem surtido efeitos positivos reais na sociedade.
Na mesma linha de proteção ao trabalho e ao trabalhador encontramos os representantes do parquet trabalhista, que tem prestado serviço de suma importância à sociedade brasileira, atuando em situações de trabalho escravo, trabalho infantil etc.
A soma de todos estes fatores positivos tem-nos levado a traçar sonhos mais altos no desejo de criar, cada dia que passa, um ambiente mais saudável ao trabalhador, ambiente este que envolve todo o conjunto de circunstâncias a que se conectam o ato de trabalhar, sendo, portanto, o objeto de estudo aqui tratado, muito mais abrangente do que a simples compensação monetária. Trata-se da garantia ao bem mais precioso, a vida.
Assim, é o presente trabalho para expor de maneira modesta os parâmetros iniciais a respeito desta ramificação que surgiu a partir do Direito Ambiental e do Direito do Trabalho, qual seja – Direito Ambiental do Trabalho.
2 DIREITO AMBIENTAL DO TRABALHO
2.1 Origem
O debate acerca da conceituação de meio ambiente e do que deve ser entendido por meio ambiente do trabalho não é novo. Em 1981 o legislador ordinário estabeleceu, no art. 3º, I, da Lei n.º 6.938/81:
Art. 3º Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:
I. meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.
Nesse momento, a questão relevante para nós é: Qual a definição e o que vem a ser o meio ambiente do trabalho?
Segundo o Professor Celso Antônio Pacheco Fiorillo[1], meio ambiente do trabalho é:
O local onde as pessoas desempenham suas atividades laborais, sejam remuneradas ou não, cujo equilíbrio está baseado na salubridade do meio e na ausência de agentes que comprometam a incolumidade físico-psíquica dos trabalhadores, independentemente da condição que ostentem (homens ou mulheres, maiores ou menores de idade, celetistas, servidores públicos, autônomos etc).
Complementando a definição supra temos o ensinamento do Professor Raimundo Simão de Melo que estabelece que o meio ambiente do trabalho é um dos mais importantes e fundamentais direitos do cidadão trabalhador, o qual, se desrespeitado, provoca agressão a toda a sociedade, que, no final das contas responde pelas mazelas decorrentes dos acidentes de trabalhos[2].
Apesar de algumas definições divergentes na doutrina, o ponto pacífico é que o direito ambiental do trabalho é espécie da qual o direito ambiental é o gênero.
O sempre atual professor José Afonso da Silva[3], em seu aclamado livro – Direito Ambiental Constitucional, nos esclarece mais acerca do tema em análise:
(...) o meio ambiente do trabalho como local em que se desenrola boa parte da vida do trabalhador, cuja qualidade de vida está, por isso, em intima dependência daquele ambiente. É um meio ambiente que se insere no artificial, mas digno de tratamento especial, tanto que a Constituição o menciona explicitamente no art. 200, VIII, ao estabelecer que uma das atribuições do sistema único de saúde consiste em colaborar na proteção do ambiente, nele compreendido o do trabalho. O ambiente do trabalho é protegido por uma série de normas constitucionais e legais destinadas a garantir-lhe condições de salubridade e de segurança.
A Constituição inclui entre os direitos dos trabalhadores a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança (art. 7º, XXII), normas que integram o conteúdo da legislação trabalhista. Várias convenções internacionais cuidaram do assunto, sendo de destacar a de n.º 155, de 1981, provendo sobre o ‘desenvolvimento, pelos países de uma política nacional de saúde, segurança e meio ambiente do trabalho, incluindo local de trabalho, ferramentas, máquinas, agentes químicos, biológicos e físicos; ocupa-se da necessidade de fiscalização através de sistema apropriado; trata de determinação dos graus de risco existente nas atividades e processos e operações proibidas, limitados ou sujeitos ao controle, bem como realização de pesquisas de acidentes de trabalho e publicação de informações; dispõe sobre exigências às empresas voltadas para adoção de técnicas de garantia de segurança nos locais de trabalho e controle dos agentes químicos.
A questão é mais complexa do ponto de vista da proteção ambiental, porque o ambiente do trabalho é um complexo de bens imóveis e móveis de uma empresa e de uma sociedade, objeto de direitos subjetivos privados, e de direitos invioláveis de saúde e da integridade física dos trabalhadores, que o frequentam.
2.2 Previsão Constitucional
O Constituinte originário de 1988 estabeleceu a proteção constitucional ao meio ambiente do trabalho, em dois momentos, a saber:
a). Proteção imediata ou específica (art. 200, VIII CF/88)
Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da lei:
(...)
VIII – colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho.
b). Proteção mediata ou geral (art. 225, caput, IV, VI e § 3º CF/88)
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e a coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
(...)
IV – exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade.
(...)
VI – promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente.
(...)
§ 3º. As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
Para compreendermos tal previsão constitucional é pontual a lição de Sebastião Geraldo de Oliveira[4]:
O meio ambiente do trabalho está inserido no meio ambiente geral (art. 200, VIII, da Constituição da República), de modo que é impossível alcançar qualidade de vida sem ter qualidade de trabalho, nem se pode atingir meio ambiente equilibrado e sustentável, ignorando o meio ambiente do trabalho. Dentro desse espírito, a constituição de 1988 estabeleceu expressamente que a ordem econômica deve observar o princípio da defesa do meio ambiente (art. 170, VI). Como assevera José Afonso da Silva, ‘o problema da tutela jurídica do meio ambiente manifesta-se a partir do momento em que sua degradação passa a ameaçar não só o bem-estar, mas a qualidade de vida humana, senão a própria sobrevivência do ser humano.
No mesmo sentido o magistério do professor José Afonso[5]:
Temos dito que o combate aos sistemas de degradação do meio ambiente converta-se numa preocupação de todos. A proteção ambiental, abrangendo a preservação da natureza em todos os seus elementos essenciais à vida humana e a manutenção do equilíbrio ecológico, visa tutelar a qualidade do meio ambiente em função da qualidade de vida, como uma forma de direito fundamental da pessoa humana.
(...)
O que é importante – escrevemos de outra feita – é que se tenha a consciência de que o direito à vida, como matriz de todos os demais direitos fundamentais do homem é que há de orientar todas as formas de atuação no campo da tutela do meio ambiente. Cumpre compreender que ele é um fator preponderante, que há de estar acima de quaisquer outras considerações como as de desenvolvimento, como as de respeito ao direito de propriedade, como as da iniciativa privada. Também estes são garantidos no texto constitucional, mas, a toda evidência, não podem primar sobre o direito fundamental à vida, que está em jogo quando se discute a tutela da qualidade do meio ambiente. É que a tutela da qualidade do meio ambiente é instrumental no sentido de que, através dela, o que se protege é um valor maior: a qualidade de vida.
2.3 Natureza jurídica
Com o advento da Constituição Federal de 1988 o constituinte procurou assegurar uma proteção maior ao meio ambiente do trabalho, conforme verificamos no tópico supra.
Atualmente, é pacífico na doutrina que a natureza jurídica do Direito Ambiental do Trabalho é de um direito fundamental assegurado a todo cidadão, conforme expresso na Constituição Federal. Logo, essa garantia deve ser assegurada a todos, indistintamente, sendo, por tanto, um direito do empregado e um dever do empregador.
Neste sentido, os comentários da advogada Dayse Coelho de Almeida[6], em artigo de sua autoria, publicado recentemente:
Em que pese à topologia constitucional não privilegiar a vertente de pensamento que acolhe os direitos sociais como fundamentais, sua essencialidade reside em sua ligação aos direitos humanos e a dignidade da pessoa humana, valores albergados na principiologia constitucional, consagrados doutrinaria e jurisprudencialmente.
(...)
A leitura restritiva dos direitos fundamentais resulta em notável prejuízo ao cidadão, porque este terá seu patrimônio jurídico reduzido. Isto ocorre de forma numérica, quando reduz o rol dos direitos fundamentais, quanto de forma sofisticada, por meio do enquadramento dos direitos sociais como normas programáticas.
(...)
Os direitos fundamentais sociais em seu cerne possuem um projeto emancipatório fascinante, assim como possuem todos os direitos fundamentais, uma vez que, lutando por esses direitos e a sua efetivação, constrói-se a emancipação real do ser humano. Significam a saída da cidadania do plano jurídico-formal (projeto político) para o campo socioeconômico. E nisto reside à beleza e prestabilidade dos direitos fundamentais.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALMEIDA, Dayse Coelho de. A fundamentabilidade dos Direitos Sociais. Revista IOB – Trabalhista e Previdenciária. Porto Alegre, setembro/2006, pgs. 86/96.
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 5 ed. São Paulo: LTr, 2006.
DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico. 2 ed. rev., atual. e aum. Vol 3. São Paulo: Saraiva, 2005.
ESPÍNOLA, Ruy Samuel. Conceito de princípios constitucionais. 2 ed. rev. atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002.
FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2004.
LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho. 7 ed. São Paulo: LTr, 2009.
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 12. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2008.
MELO, Raimundo Simão. Direito Ambiental do Trabalho e a saúde do trabalhador: responsabilidades legais, dano material, dano moral, dano estético, indenização pela perda de uma chance, prescrição. 2. Ed. São Paulo: LTr, 2006.
MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente: doutrina, jurisprudência, glossário. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004
OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Proteção jurídica à saúde do trabalhador. 3. ed. São Paulo: LTr, 2001.
SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. São Paulo: Malheiros, 1994.
[1] FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 22.
[2] MELO, Raimundo Simão de. Dignidade da pessoa humana e meio ambiente do trabalho. Revista de Direito do Trabalho, São Paulo: v. 31, jan/mar. 2005, p. 205.
[3] SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. São Paulo: Malheiros, 1994, p. 5.
[4] OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Proteção jurídica à saúde do trabalhador. 3. ed. São Paulo: LTr, 2001, p. 127.
[5] SILVA, José Afonso da. op. cit. p. 36;44.
[6] ALMEIDA, Dayse Coelho de. A fundamentabilidade dos Direitos Sociais. Revista IOB – Trabalhista e Previdenciária. Porto Alegre, setembro/2006, pgs. 86/96
Especialista em Direito e Processo do Trabalho. Assessor Jurídico MP/RR<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SOUZA, Alcenir Gomes De. Direito Ambiental do Trabalho - Primeiras linhas Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 26 jan 2010, 08:43. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/19162/direito-ambiental-do-trabalho-primeiras-linhas. Acesso em: 22 nov 2024.
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