Os servidores públicos podem ser classificados, segundo a forma de admissão, como estatutários, trabalhistas e temporários. Os primeiros são regidos por lei específica (o estatuto) e possuem plena estabilidade após três anos de efetivo exercício no cargo. Os temporários, conforme designados, são contratados por prazo determinado para atender a uma necessidade temporária de excepcional interesse público.
Já os servidores trabalhistas, também chamados de empregados públicos ou, ainda, celetistas, possuem tal qualificação uma vez que sua relação de trabalho é disciplinada pelas regras constantes da Consolidação das Leis do Trabalho. “Seu regime básico, portanto, é o mesmo que se aplica à relação de emprego no campo privado, com as exceções, é lógico, pertinentes à posição especial de uma das partes – o Poder Público” [1].
Em vista dessa posição diferenciada do empregado público, a garantia da sua estabilidade é questão importante a ser abordada, uma vez que, tratando-se de servidor público (latu sensu) sujeito à aprovação em concurso público para ingresso no cargo, surgem dúvidas quanto ao seu desligamento do serviço público.
A Lei 9.962/2000[2] estabelece os casos em que a Administração Federal poderá rescindir unilateralmente o contrato de trabalho do empregado público, ou seja, segundo entendimento de Lúcia Valle[3] (abaixo destacado), salvo as hipóteses ali previstas, a dispensa do servidor celetista concursado, deveria ser precedida de contraditório e ampla defesa.
Não se pense, também, que a dispensa de empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (...) possa se dar sem qualquer motivação ou sem que lhes seja dada qualquer possibilidade de contraditar a dispensa.
O concurso é a regra geral para contratação de quaisquer servidores (em sentido lato) ou de empregados. A dispensa não se pode verificar desmotivadamente se tiver havido concurso público. É preciso ter fundamento jurídico, pouco importa que os empregados possam não ser estáveis. Estáveis não são, mas, se prestaram concurso público, têm o direito de não ser despedidos aleatoriamente, portanto, exceto quando haja razão suficiente.
No entanto, conforme anotam Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo[4], em decorrência de decisão liminar do Supremo Tribunal Federal na ADI 2.135/DF[5], atualmente, a Lei 9.962/2000 somente se aplica aos empregados públicos contratados pela administração direta, autárquica e fundacional federal anteriormente à data da referida decisão (02.08.07), tendo em vista que os efeitos do decisum da Corte Suprema são ex nunc.
De qualquer maneira, a referida Lei apenas é aplicável aos empregados da administração direta, autárquica e fundacional federal e, apesar de restringir as hipóteses de rescisão unilateral do contrato, segundo doutrina majoritária ela não confere, efetivamente, estabilidade a tais servidores, os quais podem ser demitidos sem qualquer fundamentação[6].
Isto porque o artigo 41 da Constituição Federal apenas confere a estabilidade aos servidores nomeados para cargo de provimento efetivo em decorrência de concurso público. Vale dizer, é necessário que o servidor, além de ser aprovado em concurso, ocupe um cargo público provido através de uma nomeação, o que não ocorre no caso dos empregados públicos. Estes sujeitam-se ao concurso, porém não são nomeados, mas apenas convocados a firmar contrato de trabalho (regido pela CLT) com o poder público[7].
Ademais, quanto aos empregados de sociedade de economia mista e empresa pública não há controvérsia quanto à sua não aquisição de estabilidade, o que o Supremo Tribunal Federal já deixou claro há uma década:
O disposto no artigo 41 da CF, que disciplina a estabilidade dos servidores públicos civis, não se aplica aos empregados de sociedade de economia mista. (...), afastando, assim, a alegação de que os empregados da administração pública indireta, contratados mediante concurso público, somente poderiam ser dispensados por justo motivo. [AG (AgRg) 245.235-PE, rel. Min. Moreira Alves, 26.10.99.][8]
Já quanto à Empresa Brasileira de Correios e telégrafos, em razão da sua natureza Constitucional anômala (detém o monopólio postal e possuem mesmo tratamento destinado à Fazenda Pública), há entendimento firmado no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho, no sentido de que os seus empregados gozam de estabilidade e, portanto, somente podem ser dispensados após contraditório[9] sendo, portanto, a única categoria de empregado público que detém tal prerrogativa.
Destarte, o empregado público poderá ser demitido sem qualquer fundamentação, mesmo quando tenha ingressado mediante concurso público, já que esta forma de seleção não lhe confere direito à estabilidade. Nos ensinamentos de ALEXANDRINO[10]:
(...) empregados públicos não adquirem direito à estabilidade de que trata o art. 41 da Constituição, estejam na Administração Direta, estejam em qualquer entidade da Administração Indireta de qualquer ente da Federação. Pesamos que a estabilidade de que trata o art. 41 da Constituição é instituto próprio de regime jurídico de direito público, e empregados públicos, seja qual for o órgão ou entidade a que pertençam, têm seu vínculo funcional com a Administração Pública regido predominantemente pelo direito privado.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Administrativo Descomplicado. Marcelo Alexandrino, Vicente Paulo. 17ª ed. rev. atual. ampl. Rio de Janeiro: Forense. São Paulo: Método, 2009.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 22ª ed. rev. ampl. atual. Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2009.
FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de Direito Administrativo. 7ª ed., São Paulo: Malheiros, 2004.
BRASIL. Lei nº 9.962 de 22 de fevereiro de 2000. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9962.htm. Acesso em 28.10.2009.
BRASIL. STF. Informativo nº 168. Brasília, 25 a 29 de outubro de 1999. Disponível em: http://www.stf.jus.br//arquivo/informativo/documento/informativo168.htm. Acesso em 29.10.2009.
BRASIL. TST. Jurisprudência. Disponível em: http://aplicacao.tst.jus.br/ consultaunificada2/. Acesso em 29.10.2009.
[1] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 22ª ed. rev. ampl. atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 567.
[2] Art. 3º O contrato de trabalho por prazo indeterminado somente será rescindido por ato unilateral da Administração pública nas seguintes hipóteses: I – prática de falta grave, dentre as enumeradas no art. 482 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT; II – acumulação ilegal de cargos, empregos ou funções públicas; III – necessidade de redução de quadro de pessoal, por excesso de despesa, nos termos da lei complementar a que se refere o art. 169 da Constituição Federal; IV – insuficiência de desempenho, apurada em procedimento no qual se assegurem pelo menos um recurso hierárquico dotado de efeito suspensivo, que será apreciado em trinta dias, e o prévio conhecimento dos padrões mínimos exigidos para continuidade da relação de emprego, obrigatoriamente estabelecidos de acordo com as peculiaridades das atividades exercidas. (...)
[3] FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de Direito Administrativo. 7ª ed., São Paulo: Malheiros, 2004, p. 590.
[4] ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Administrativo Descomplicado. Marcelo Alexandrino, Vicente Paulo. 17ª ed. rev. atual. ampl. Rio de Janeiro: Forense. São Paulo: Método, 2009, p. 311.
[5] Que suspendeu a eficácia do caput do artigo 39 da Constituição Federal com a redação da EC 19/98.
[6] CARVALHO FILHO. Ob cit., p. 644. “A Súmula 390 do TST admitiu a estabilidade de servidor trabalhista, posição que, data venia, se nos afigura inconstitucional. Não obstante, o mesmo Tribunal, no Proc. 6306/2000-011-09.2, decidiu, em 22.11.2006, não ser aplicável o art. 41 da CF àquele servidor.”
[7] Para CARVALHO FILHO. Ob cit., p. 644: “A nomeação e o cargo, já o consignamos, são figuras somente compatíveis com o regime estatutário, e guardam inteira incompatibilidade com o regime trabalhista. Este regime é contratual e, com tal natureza, não se processa qualquer nomeação nem o servidor ocupa cargo algum. No regime trabalhista ora vigente sequer subsiste o instituto da estabilidade trabalhista, como já houve anteriormente.”
[8] STF. Informativo 168.
[9] AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS - ECT. EMPRESA PÚBLICA. DESPEDIDA SEM MOTIVAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. O Tribunal Regional, ao reconhecer a nulidade da despedida sem motivação do empregado público, admitido pela ECT, mediante concurso público, decidiu em sintonia com o item II da Orientação Jurisprudencial nº 247 da SBDI-1 do TST, o qual preconiza: - A validade do ato de despedida do empregado da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) está condicionada à motivação, por gozar a empresa do mesmo tratamento destinado à Fazenda Pública em relação à imunidade tributária e à execução por precatório, além das prerrogativas de foro, prazos e custas processuais. - Assim sendo, incide, à hipótese, o teor do art. 896, § 4º, da CLT e da Súmula nº 333 desta Corte. Agravo de instrumento a que se nega provimento. (AIRR - 1428/2007-137-15-40.1, Relator Ministro: Walmir Oliveira da Costa. Data de Julgamento: 10/06/2009, 1ª Turma, Data de Publicação: 19/06/2009)
[10] Ob. cit. p. 318.
Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Sergipe; Servidor do Ministério Público Federal em Sergipe. Pós-graduando em Direito Público pela Universidade Anhanguera-UNIDERP.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: DIAS, Aldo Luiz de Menezes. A estabilidade do empregado público Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 jul 2010, 10:27. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/20475/a-estabilidade-do-empregado-publico. Acesso em: 22 nov 2024.
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