Nos termos da nova Lei do Mandado de Segurança, é admitido provimento cautelar consistente na medida liminar, quando:
"(...) houver fundamento relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida, sendo facultado exigir do impetrante caução, fiança ou depósito, com o objetivo de assegurar o ressarcimento à pessoa jurídica (...)"
Do dispositivo acima citado, extrai-se a existência de dois requisitos obrigatórios para a concessão da medida, quais sejam, a relevância do fundamento e a probabilidade de ineficácia da medida caso concedida somente ao final do processo. Observe-se, por oportuno, que a relevância do fundamento, apesar de ter grande semelhança com o instituto do fumus boni iuris (e muitas vezes serem tais expressões utilizadas como sinônimos), possui carga muito mais forte que este. Ademais, quanto ao segundo requisito, é sabido que o magistrado:
"(...) deve proporcionar ao impetrante toda a segurança necessária para que seu pedido mediato seja examinado pelo Poder Judiciário em toda sua inteireza e protegido da maléfica ação do tempo (...)"
Ressalte-se que a concessão da medida cautelar não constitui antecipação dos efeitos da sentença final, mas é tão somente:
"(...) procedimento acautelador do possível direito do impetrante, justificado pela iminência de dano irreversível da ordem patrimonial, funcional ou moral se mantido o ato coator até a apreciação definitiva da causa. Por isso mesmo, não importa prejulgamento, não afirma direitos, nem nega poderes à Administração. Preserva, apenas, o impetrante de lesão irreparável, sustando provisoriamente os efeitos do ato impugnado."
Mas além desses dois requisitos, percebe-se a existência de mais um, facultativo, que é justamente a possibilidade da exigência, ao impetrante, de uma garantia que assegure o ressarcimento à pessoa jurídica no caso de ser o mandamus julgado improcedente.
A exigência de caução para a concessão da medida liminar é inovação no ordenamento jurídico (em forma de dispositivo legal), em que pese a doutrina e jurisprudência pátrias já haverem se posicionado sobre o tema, uma vez que quando da vigência da Lei 1.533/51, era comum a exigência da garantia, especialmente em matéria tributária, fazendo-se depender a eficácia da liminar ao depósito do valor integral do tributo questionado. Esse procedimento foi vedado pelo STJ em diversas ocasiões.
Com a Lei 12.016/09, a exigência da caução foi legitimada, causando grande alvoroço no meio jurídico, donde surgiram diversas vozes no sentido de que haveria restrição ao direito de ação dos cidadãos. Houve, inclusive, a interposição de Ação Direta de Inconstitucionalidade por parte da OAB, tendo o seu Presidente declarado ser a exigência de caução verdadeiro "apartheid no Judiciário", uma vez que o novo dispositivo prejudicaria a parcela mais pobre da população.
Apesar disso, não vejo a faculdade inserida na parte final do inciso III do referido 7º como empecilho ou prejuízo à prestação da tutela jurisdicional, mas como um benefício a ser concedido pelo magistrado nos casos em que paire dúvida sobre a certeza do direito do impetrante.
É verdade que os litigantes de classes mais baixas poderão não usufruir desse benefício, uma vez que, provavelmente, não poderão arcar com o valor a ser caucionado (quando exigido) e terão suas liminares indeferidas. Mas isso não significa a quebra do princípio da isonomia, pois o espírito da lei é que o julgador somente exija a caução nos casos em que estiver na iminência de indeferir a liminar em decorrência da probabilidade de dano irreparável ou de difícil reparação ao ente impetrado.
Ora, nessa hipótese, em não havendo tal faculdade, o magistrado, de logo, indeferiria a medida liminar. Mas, ante o pagamento de caução que supra eventual prejuízo sofrido pelo impetrado, o magistrado ficará obrigado a conceder a medida. Nesse sentido:
"(...) o permissivo da exigência da caução sobre não embaraçar a concessão da tutela liminar, quando atendidos aos "requisitos condutores", permitirá o deferimento da tutela de urgência, à guisa de tutela cautelar, em casos em que, à luz do regime anterior, a tutela liminar seria simplesmente indeferida por carência dos requisitos legais necessários à sua concessão."
Observe-se a importância de que o magistrado aplique o referido instituto observando atentamente os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, de forma a evitar uma maior lesão ao direito dos litigantes. Isso poderia acontecer no caso de se tornar prática comum no judiciário ser condicionado o deferimento da medida liminar ao pagamento da caução, indiscriminadamente, em qualquer caso submetido à análise jurisdicional.
Mas, esse receio é desnecessário, uma vez que a lei é clara ao definir apenas uma faculdade ao magistrado, que não deve considerá-la como princípio, mas como exceção natural a qualquer regra. Trata-se, portanto de "contracautela em situações excepcionais nas quais a medida liminar possa trazer grande probabilidade de dano à Fazenda Pública".
Além disso, é importante registrar que, tratando-se de medida de urgência, a liminar concedida em mandado de segurança poderá ser revogada, a qualquer tempo, caso os requisitos legais não se façam mais presentes.
Dessa forma, o novel dispositivo não oferece risco ao direito de ação dos cidadãos, mas lhes confere uma nova oportunidade para o deferimento da medida liminar pleiteada, a qual estaria fadada ao insucesso na vigência da legislação anterior.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
GARCETE, Carlos Alberto. A Nova Lei do Mandado de Segurança. Rio de Janeiro: Editora GZ, 2010.
MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de Segurança e Ações Constitucionais. Hely Lopes Meirelles, Arnoldo Wald, Gilmar Ferreira Mendes. 32ª ed. São Paulo: Malheiros, 2009.
LIMA, Márcio Kammer de. A exigência de caução na tutela liminar no regime da nova Lei de Mandado de Segurança (Lei nº 12.016/09). Avanço, não retrocesso!. Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 2266, 14 set. 2009. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/ doutrina/texto.asp?id=13498>. Acesso em: 18.02.2010.
BRASIL. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/_Constitui%C3%A7aoCompilado.htm. Acesso em 10.02.2010.
BRASIL. LEI Nº 12.016, DE 7 DE AGOSTO DE 2009. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L12016.htm. Acesso em 10.02.2010.
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