Muito debatida, persiste a merecer destaque especial a denominada Lei da Ficha Limpa, introduzida no ordenamento jurídico com a Lei Complementar 135/2010, que alterou as causas de inelegibilidade.
O Tribunal Superior Eleitoral, em resposta à consulta formulada em tese, fixou entendimento de que essa norma se aplica, de imediato, a todos os casos em que tenha sido imposta qualquer condenação prevista nessa lei. Resta ainda decisão final, junto ao Supremo Tribunal Federal, quanto à possibilidade de aplicação instantânea dessa e, também, da sua aplicabilidade a fatos passados. Deve-se a isso a ausência de composição plena nesse Tribunal Constitucional, cuja posse do Ministro Luiz Fux foi marcada apenas para 3 de março passado.
Merece aplauso o espírito da LC 135/2010. A preocupação que surge, dentre muitas, no entanto, refere-se à extensão e ao alcance dado ao tema inelegibilidade pelo período de oito anos, previsto na Lei Complementar.
Das muitas inovações, estabelece o artigo 1º, inciso I, letra m, que são inelegíveis para qualquer cargo os que forem excluídos do exercício da profissão, por decisão sancionatória do órgão profissional competente, em decorrência de infração ético-profissional, salvo se o ato tiver sido anulado ou suspenso pelo Poder Judiciário.
Evidentemente que compete ao respectivo órgão de classe fiscalizar a atividade exercida por seus profissionais, punindo os faltosos e excluindo os indignos. Assim, presente a hipótese autorizadora, em face de infração cometida, é plausível a fixação da pena, que pode ser máxima com a exclusão dos quadros, não podendo esse profissional persistir no exercício de sua atividade.
A dúvida que me acorre é se, infelizmente, por imperícia ou negligência, o profissional comete uma infração, sobrevindo processo disciplinar, com severa pena imposta – exclusão - diga-se, proporcional ao fato em análise, afora eventual ação judicial indenizatória de reparação de danos, seria efetivamente plausível que ele venha a ser condenado, politicamente, com a proibição de se candidatar a qualquer cargo pelo prazo de oito anos.
Veja-se o exemplo do profissional médico que, em um procedimento de lipoaspiração, por diversas origens, vem a causar dano estético ou, pior, a morte da respectiva paciente. Ele, decerto, não ser profissionalizou para o fracasso ou, ainda, não buscava o resultado obtido. Entretanto, por esse fato, perfeitamente cabível, venha a sofrer processo administrativo perante o Conselho de Medicina, com as penas respectivas, inclusive de proibição do exercício da medicina, ou seja, nesta hipótese, não mais poderá exercer a atividade para o qual se preparou nos longos e aproximados seis a sete anos de estudos. Poderá, ainda, vir a ser acionado judicialmente pelos prejudicados, sobrevindo, se demonstrado o ato, o dano e o nexo de causalidade, a condenação monetária. Caberia, ainda assim, outra penalização? No caso, não mais sendo profissional médico, será que estaria, também, incapacitado para outras funções administrativas ou legislativas?
Persisto na análise se, nessa e em hipóteses similares, inobstante o teor da Lei Complementar – claro e induvidoso, há plausabilidade, razoabilidade e proporcionalidade em apresentar obstáculo para esse indivíduo exercer seu direito de cidadão, ou seja, de ser elegível.
Lizete Andreis Sebben
Advogada e ex-Juiza do TRE/RS
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