RESUMO
O objetivo do presente trabalho é realizar apontamentos sobre o Pregão na modalidade Internacional, ou seja, sobre a possibilidade legal da adoção desta novel modalidade de licitação no âmbito federativo, sem a pretensão de esgotar o assunto. Para tanto, inicia-se o estudo com a discussão sobre a natureza da Lei Geral de Licitações e sua extensão aos entes federativos. A seguir, o mesmo exame quanto à extensão e natureza é aplicado à Lei do Pregão, dando ênfase a suas formas comum e eletrônica. Segue-se o estudo com a análise do pregão em licitações internacionais e seu cabimento no âmbito federativo, tanto em sua forma comum como na eletrônica, e as distinções entre os Decretos 3.555/2000 e 5.450/2005. Posteriormente, estuda-se a igualdade entre licitantes nacionais e internacionais, com especial ênfase sobre a LC 123/2006 e Lei 12.349/2010, esta última que alterou a Lei Geral e provocou, aparentemente, uma quebra de isonomia quanto à participação de empresas estrangeiras em licitações no Brasil. Por fim, apresentam-se as conclusões, com o ponto de vista sobre o tema e críticas ao aspecto formal da legislação de licitações.
Palavras-chave: Adoção. Pregão. Âmbito. Federativo. Competência. Concorrente.
ABSTRACT
The aim of this paper is to make notes on the International Auction modality, ie on the legal possibility of adopting this novel form of bidding under federal, without claiming to exhaust the subject. To this end, the study begins with a discussion about the nature of the General Bidding Law and its extension to federal entities. Then the same study as the extent and nature of the law is applied to the proclamation, emphasizing their common and electronic forms. Following is the study with the analysis of auction in international bidding and its place within federal, both in your common as electronics form, and the distinctions between the Decrees 3.555/2000 and 5.450/2005. Subsequently, to analyze oneself the equality between national and international bidders, with special emphasis on the LC 123/2006 and Law 12.349/2010, the latter which amended the General Law and caused an apparent break of equality in participation of foreign companies in bidding in Brazil. Finally, we present the conclusions to the point of view on the issue and critical to the formal aspect of the legislation in bidding.
Keywords: Adoption. Auction. Scope. Federalism. Competence. Competitor.
1 INTRODUÇÃO
Os apontamentos no decorrer deste artigo científico têm a pretensão de apresentar uma análise da viabilidade do Pregão Internacional com vistas, primeiramente, à sua distinção como modalidade licitatória e seu cabimento a nível federativo. O debate central do presente trabalho esbarra na controvérsia doutrinária a respeito das normas gerais, especificamente a de Licitações e Contratos, e sua abrangência no âmbito Federativo. A mesma discussão também se aplica ao Pregão, uma vez que esta modalidade de licitação é a que vem sendo preferencialmente adotada pela Administração Pública em detrimento às modalidades elencadas na Lei Geral de Licitações quando se trata de bens e serviços comuns. Para tanto, efetuou-se estudos com base em pesquisas realizadas, em obras de autores especializados no assunto, preliminarmente sobre a licitação na Constituição Federal, passando a seguir para a Lei Geral de Licitações e, por fim, a Lei do Pregão.
Dispensou-se maior atenção a Lei do Pregão por se tratar do foco central do presente trabalho. Não deixando de fora, ainda, a análise da incidência complementar na Lei 10.520/2002 dos Decretos 3.555/2001 e 5.450/2005, por tratar-se de institutos distintos do mesmo objeto que é o pregão. Quanto ao aspecto internacional do tema, relevância foi dada a questão da isonomia entre licitantes internacionais e nacionais, especialmente quanto à observância da Lei Complementar 123/2006 e Lei 12.349/2010 nos certames licitatórios.
A metodologia aplicada à presente pesquisa incluiu a tradicional, ou seja, a pesquisa bibliográfica com suas respectivas regras de citações direta e indireta, além dos métodos hipotético-dedutivo e comparativo, objetivando, na medida do possível, elucidar os fatos que levam a Administração Publica dos entes federativos a optar pela adoção do pregão como principal meio para suas contratações.
Desta forma, dada a grande controvérsia sobre o tema, inicialmente é discutida a competência estabelecida na Constituição Federal sobre licitações, seguindo no debate sobre a natureza da Lei 8.666/93 e sua extensão, o mesmo se aplicando a Lei 10.520/2005, sendo para esta última, ainda, examinada a questão sobre a sua obrigatoriedade. Por fim, o ponto central do presente trabalho, a análise da hipótese da utilização do pregão na modalidade internacional e sua viabilidade legal.
2 LEI GERAL DE LICITAÇÕES
A Licitação configura-se como procedimento administrativo preparatório que não garante direito ao contrato, apenas expectativa de direito. No entanto, apesar de ser apenas um procedimento administrativo, reveste-se de caráter de extrema importância, uma vez que está diretamente relacionada aos processos de aquisição de bens e serviços pela Administração Pública. Nas palavras de Hely Lopes Meirelles:
Licitação é o procedimento administrativo mediante o qual a Administração Pública seleciona a proposta mais vantajosa para o contrato de seu interesse. Como procedimento, desenvolve-se através de uma sucessão ordenada de atos vinculantes para a Administração e para os licitantes, que propicia igual oportunidade a todos os interessados e atua como fator de eficiência e moralidade nos negócios administrativos. Tem como pressuposto a competição.[1]
Tal é a importância desse instituto administrativo que o legislador entendeu por bem incluir, em nossa Carta Magna, respectivamente no Capítulo II, artigo 22, inciso XXVII, a competência, inclusive em caráter privativo, à União para legislar sobre os procedimentos licitatórios aplicáveis à Administração direta, indireta e fundacional da União, Estados e Municípios, estabelecendo no artigo 37, inciso XXI os princípios norteadores que regem as licitações, cujo qual dispõe:
Art. 37 – A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:[...]
XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômicas indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações;[...]
No entanto, essa competência não é exclusiva da União cabendo aos outros entes federativos, quando se tratar de necessidades específicas da administração local, legislar concorrentemente. Sobre esse tema nos ensina Alexandre de Moraes:
A Constituição brasileira adotou a competência concorrente não cumulativa ou vertical, de forma que a competência da União está adstrita ao estabelecimento de normas gerais, devendo os Estados e o Distrito Federal especificá-las, através de suas respectivas leis. É a chamada competência suplementar dos Estados-membros e Distrito Federal (CF, art. 24, § 2.º).[2]
E ainda sob a ótica de Paulo Gustavo Gonet Branco:
A Constituição Federal prevê, além de competências privativas, um condomínio legislativo, de que resultarão normas gerais a serem editadas pela União e normas específicas, a serem editadas pelos Estados-membros.[3]
E por fim conclui Uadi Lammêgo Bulos:
Assim, compete a União fixar normas gerais, cabendo aos Estados e ao Distrito Federal especificá-las a luz de suas peculiaridades.
Quer dizer, enquanto a União, no âmbito de sua competência concorrente, limita-se a estabelecer normas gerais (CF, art. 24, § 1.º), os Estados e Distrito Federal elaboram leis específicas, voltadas para satisfazer os seus interesses regionais.[4]
Dadas as características acima elencadas, é possível, segundo Alexandre de Moraes, estabelecer algumas regras definidoras de competência concorrente, dentre as quais, destacam-se para o presente debate:
- A competência da União é direcionada somente às normas gerais, sendo de flagrante inconstitucionalidade aquilo que delas extrapolar;
- A competência do Estado-membro ou Distrito Federal refere-se às normas específicas, detalhes, minúcias (competência suplementar). Assim, uma vez editadas as normas gerais pela União, as normas estaduais deverão ser particularizantes, no sentido de adaptação de princípios, bases, diretrizes a peculiaridades regionais (competência complementar);[...]
- A competência plena adquirida pelos Estados ou Distrito Federal é temporária, uma vez que, a qualquer tempo, poderá a União exercer sua competência editando lei federal sobre as normas gerais;
- A superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário.[5]
Com referência ao artigo 22 da Constituição, nos ensina, ainda, Alexandre de Moraes:
A Constituição Federal faculta à União, no art. 22, parágrafo único, a delegação de assuntos de sua competência privativa aos Estados, desde que satisfeitos três requisitos:
Requisito formal: a delegação deve ser objeto de lei complementar devidamente aprovada pelo Congresso Nacional, por maioria absoluta dos membros da Câmara dos Deputados e do Senado Federal;
Requisito material: somente poderá ser delegado um ponto específico dentro de uma das matérias descritas nos vinte e nove incisos do art. 22 da Constituição Federal, pois a delegação não se reveste de generalidade, mas de particularização de questões específicas, do elenco das matérias incluídas na privacidade legislativa da União. Assim, nunca se poderá delegar toda a matéria existente em um dos citados incisos;
Requisito implícito: o art. 19 da Constituição Federal veda a criação por parte de qualquer dos entes federativos de preferências entre si. Dessa forma, a Lei Complementar editada pela União deverá delegar um ponto específico de sua competência a todos os Estados, sob pena de ferimento do princípio da igualdade federativa.[6]
O artigo 22, inciso XXVII da Constituição Federal, no tocante a distribuição de competência discutida acima, deixa claro e evidente que a Licitação deve ser exercida com base na norma federativa de caráter geral tendo os demais entes federativos competência concorrente no que se refere às especificidades de suas necessidades administrativas locais.
Conclui-se, portanto, segundo nos ensina Marçal Justen Filho, que “Segundo previsto no artigo 37, inc. XXI, da CF/88, todo contrato administrativo deve ser precedido, como regra, de uma licitação.”[7]
2.1 NATUREZA DA LEI 8.666/93
A fim de regulamentar o artigo 37, inciso XXI da CF/88 veio a ser editada a Lei 8.666/93 que estabeleceu concretamente e de forma distinta as normas gerais sobre as licitações e contratos previstas no artigo 22, inciso XXVII da mesma Constituição Federal. É uma lei federal, no entanto sua natureza, apesar de estar inserida no contexto da competência da União, “traduz o exercício de duas competências legislativas diversas”[8], uma vez que trata de normas gerais e não gerais (especiais) sobre licitações.
Nesse sentido Marçal Justen Filho é enfático em afirmar que:
O diploma traduz o exercício de duas competências legislativas diversas. Existem normas nacionais, aplicáveis em todas as esferas federativas. E há normas puramente federais, aplicáveis apenas ao âmbito da União.
O grande problema reside em que não existe uma distinção formal explícita no texto da Lei n.º 8.666 entre as normas gerais (nacionais) e aquelas federais (especiais da União). [9]
Neste ponto do presente estudo, necessário se faz o entendimento sobre a distinção entre normas gerais e normas especiais.
2.1.1 DISTINÇÃO ENTRE NORMAS GERAIS E NORMAS ESPECIAIS
Ainda segundo Marçal Justen Filho, “As normas gerais são aquelas que vinculam a todos os entes federativos, enquanto que as normas especiais são aquelas de observância obrigatória apenas na órbita da União.”[10]
No caso da Lei 8.666/93 entende-se que esta é uma lei federal de caráter nacional, portanto geral, que transita da União para a Nação. Não resta dúvida que é uma lei federativa uma vez que seu artigo 1.º refere-se a sua abrangência no âmbito da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, conforme transcrição abaixo:
Art. 1.º - Esta Lei estabelece normas gerais sobre licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.[11]
E novamente é ratificada a sua eficácia em nível federativo no “Parágrafo único” do referido artigo onde se observa a sua abrangência estendida, não só a administração direta, mas, também, à indireta no âmbito dos Poderes elencados em seu caput.
Parágrafo único. Subordinam-se ao regime desta Lei, além dos órgãos da administração direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas de economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.[12]
Mister é destacar que apenas é concedido aos órgãos da Administração dos Estados e Municípios (não aos legislativos estaduais e municipais) competência para expedirem normas relativas aos procedimentos operacionais na execução de processos licitatórios, conforme disposto no caput do artigo 115 do diploma legal em epígrafe:
Art. 115. Os órgãos da Administração poderão expedir normas relativas aos procedimentos operacionais a serem observados na execução das licitações, no âmbito de sua competência, observadas as disposições desta Lei.[13]
Ressalva se faz no sentido de que essa competência não significa inovação na ordem jurídica, mas, tão somente, a padronização de procedimentos administrativos secundários, conforme nos ensina Marçal Justen Filho:
A edição de regras acerca de procedimentos operacionais não significa inovação da ordem jurídica. Não se admite introduzir outros requisitos além dos permitidos na Lei. Não é válido subordinar a habilitação a exigências previstas em atos administrativos. O dispositivo sob exame restringe-se a padronizar procedimentos administrativos secundários.[14]
Desta forma, a Lei 8.666/93, por ser de natureza geral, impõe aos demais entes federativos as regras para os procedimentos licitatórios, restando apenas a estes, legislar, neste caso em especial, sobre matéria administrativa.
2.2 NATUREZA DA LEI 10.520/2002
A partir da edição da Lei n.º 10.520, de 17 de julho de 2002, as licitações sofrem sensíveis inovações no que se refere ao incremento da competitividade e, sobretudo, agilidade nas contratações públicas. A desburocratização dos procedimentos, decorrente de uma sequência diferenciada das etapas do certame licitatório se configura como principal característica para adoção cada vez mais freqüente na administração pública da modalidade licitatória denominada pregão instituída pela lei em epígrafe.
Segundo Marçal Justen Filho:
Pregão é uma modalidade de licitação de tipo menor preço, destinada à seleção da proposta mais vantajosa de contratação de bem ou serviço comum, caracterizada pela existência de uma fase competitiva inicial, em que os licitantes dispõem do ônus de formular propostas sucessivas, e de uma fase posterior de verificação dos requisitos de habilitação e de satisfatoriedade das ofertas.[15]
A pesar das vantagens que a nova Lei aufere à administração pública controversa se mostra a sua aplicabilidade aos entes federados, pois esta, a princípio como na discussão anterior sobre a lei geral de licitações, se configura, conforme a doutrina, de natureza geral, criando uma nova modalidade em contraponto ao artigo 22, § 8.º da Lei 8.666/93, que veda explicitamente esta possibilidade.
Artigo 22 – São modalidades de licitação:
I - concorrência;
II - tomada de preços;
III - convite;
IV - concurso;
V - leilão.
[...]
§ 8.º - É vedada a criação de outras modalidades de licitação ou a combinação das referidas neste artigo (Grifo meu).[16]
Sobre o tema é o entendimento de Hely Lopes Meirelles que “trata-se de norma geral de licitação, porque editada com fundamento no art. 22, XXVII, da Constituição Federal, sendo de aplicabilidade válida para todas as esferas”.[17]
E ainda, com referência ao § 8.º do art. 22 da Lei 8.666/93 se posiciona o referido jurista:
É sabido que, por conta de norma proibitiva do § 8.º do art. 22 da Lei 8.666, de 1993, o administrador não pode criar modalidade nova de licitação, mas o legislador federal pode. E foi no exercício da competência para legislar sobre norma geral de licitação que editou a Medida Provisória 2.026, de 2000, depois convertida na Lei 10.520, de 2002. Esta lei, válida para União, Estados, Distrito Federal e Municípios, estabelece normas gerais de licitação na modalidade de pregão, admitindo-se a edição de normas suplementares nas diversas esferas, desde que não contrariem o quanto lá disposto.[18]
No mesmo sentido é o entendimento do jurista Celso Antônio Bandeira de Melllo:
O pregão, que nascera viciado, (v. n. 6 deste Capítulo e Capítulo IV, ns. 28 e ss.), ulteriormente foi regulado e liberado para toda a esfera Federal, e só para ela, pela Medida Provisória 2.026, de 4.5.2000. Por fim, a citada Lei 10.520 o fez aplicável a todo o País, com o que ficou, a partir daí, sanado o vício original, pois nada se opõe a que dita lei seja também havida como “norma geral” superveniente à Lei 8.666. Contudo, não se reportou ao rol de modalidades licitatórias previstas no art. 22 da Lei 8.666 e à sua proibição de serem estabelecidas modalidades novas. Daí a convivência desta sexta figura com as outras cinco, sem alteração dos dizeres legais anteriores.[19]
Pelo exposto, a despeito da vedação aludida, a União não fica impedida de estabelecer outra modalidade licitatória editando norma de hierarquia igual ou superior à lei ordinária.
No entendimento de Humberto Bayma Augusto:
A Lei de Licitações proíbe a adoção de outras modalidades de licitação ou a combinação das regras procedimentais para produzir novas figuras. Significa que o elenco do art. 22 é exaustivo, ressalvada a possibilidade de lei federal específica dispor sobre o tema. Essa norma geral deverá ser observada pelas demais entidades da Federação. Esta lei federal poderia ser uma medida provisória que, segundo o art. 62 da CF, tem força de lei. O entendimento convergido nesse sentido leva à conclusão de que a medida provisória do Pregão, posteriormente convertida em lei ordinária, acrescentou mais uma modalidade de licitação ao elenco do art. 22 da Lei 8.666/93, sem revogar o seu parágrafo 8.º.
A competência federal para editar normas gerais não se exauriu com o Estatuto das Licitações. Isto sem falar que entre leis ordinárias não existe hierarquia.[20]
Importante ressaltar que, apesar da característica de norma geral da Lei 10.520, esta não revoga ou mesmo não exerce a liberdade ampla em seu campo de atuação, devendo ser interpretada sob os princípios e regras da Lei 8.666/93.
Nesse sentido, Marçal Justen Filho é enfático:
É essencial insistir, no entanto, que a Lei n.º 10.520 não revogou a Lei n.º 8.666. A Lei 8.666 veiculou normas gerais sobre licitação e contratação administrativa, inclusive em relação ao pregão. Isso significa que as normas da Lei n.º 10.520 devem ser interpretadas em termos harmônicos com os princípios e regras albergados na Lei n.º 8.666.
Ou seja, não se admite que o pregão seja reputado como uma modalidade licitatória absolutamente não subordinada ao regime da Lei 8.666.[21]
E conclui:
Logo, a omissão da Lei n.º 10.520 não significa a autonomia da Administração Pública para adotar as regras e os princípios que melhor lhe aprouver. Tais omissões são meramente aparentes e significam, pura e simplesmente, que incidem ao caso as normas da Lei n.º 8.666. Somente não se aplicam ao pregão as regras da Lei n.º 8.666 que sejam incompatíveis com a natureza e com as peculiaridades inerentes à figura.[22]
E ainda, adverte-nos Ivan Barbosa Rigolin quanto à aplicação subsidiária da Lei 8.666 em relação ao pregão:
Fique claro: a lei do pregão não obriga formalmente a utilização da L. 8.666 nos pregões, porém materialmente não se imagina como apenas aquela pequena Lei n.º 10.520/2002 isoladamente poderia subsidiar todos os problemas, impasses e demandas técnicas que sempre se dão tanto na elaboração do edital quanto durante a realização dos pregões, a exigir solução fundada em regras objetivas e previamente estabelecidas, que a sintética lei não contém.[23]
Desta forma não há de se falar em subversão da Lei 8.666 em relação à edição da Lei 10.520 enquanto constituinte de nova modalidade de licitação e podemos concluir sem margem de erro, segundo Marcelo Palavéri, que:
O pregão, como se vê do até aqui exposto, é, então, uma modalidade licitatória, que desde maio de 2000 se soma às outras cinco já existentes, para, enquanto norma geral de licitação, permitir aos entes governamentais, inclusive os municipais, a seleção de interessados para futuros contratos.[24]
O debate doutrinário sobre a aplicabilidade do pregão aos entes federativos tem seu núcleo no veto presidencial ao caput do artigo 2.º da Lei 10.520/2002, cujo qual, continha a seguinte redação:
Art. 2.º. Pregão é modalidade de licitação para aquisição de bens e serviços comuns pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, conforme disposto em regulamento, qualquer que seja o valor estimado da contratação, na qual a disputa pelo fornecimento é feita por meio de propostas e lances em sessão pública, vedada sua utilização na contratação de serviços de transporte de valores e de segurança privada e bancária.[25]
Importante ressaltar que o veto sob análise tinha como escopo proibir a contratação de serviços de vigilância por meio do pregão, mas por imposição de normativa Constitucional, este teve que ser vetado na integra como bem nos ilustra Adriana Maurano:
Como se pode observar, o referido dispositivo continha elementos valiosos para a sistematização do pregão:
a) O pregão seria utilizado pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, em regulamentos próprios;
b) O valor seria sem limites.
Desta forma, com a suspensão do caput do art. 2.º, levantou-se dúvida quanto à incidência da lei em todos os níveis de Governo.
No entanto, além do disposto na ementa do referido diploma legal, que não pode ser desconsiderado pelo intérprete da lei, outros elementos devem ser analisados, que apontam no sentido de que a ausência de expresso dispositivo que autorize a aplicação aos Estados, Distrito Federal e Municípios em nada afeta seu entendimento amplo, pois a lei deve ser interpretada segundo sua finalidade e dentro do contexto, e não restritivamente.
Nesse sentido, as razões do veto presidencial são úteis para que se compreenda a questão. Conforme se observa do citado documento, a intenção do governo era vetar a parte final do art. 2.º, que vedava a utilização do pregão na contratação de serviços de transporte de valores e de segurança privada e bancária, não guardando relação com a extensão da nova modalidade às outras esferas federativas. Ocorre que, por força de que determina o § 2.º do art. 66 da Constituição Federal (“O veto parcial somente abrangerá texto integral de artigo, de parágrafo, de inciso ou de alínea”), ele teve que vetar o “caput” do dispositivo.[26]
No entanto, para Antônio Carlos Cintra do Amaral “a Lei 10.520 é válida, mas juridicamente ineficaz” [27], uma vez que ao vetar o artigo 2.º, este deixa de ter eficácia tanto na União quanto no Distrito Federal, Estados e Municípios.
E justifica o referido autor:
Criou-se uma situação esdrúxula. Não existe na Lei 10.520 dispositivo que estabeleça o âmbito de sua aplicação. O dispositivo que constava do projeto aprovado foi vetado e, portanto, não ingressou no mundo jurídico. Mais ainda: pelo mesmo motivo não existe dispositivo estabelecendo que o Pregão pode ser adotado independentemente do valor estimado da contratação.
Poder-se-á dizer que o âmbito de aplicação da lei está definido na ementa. Mas isso será total desatino, porque qualquer estudante de Direito aprende logo no 1.º ano que a ementa não integra o texto legal. Vale dizer: a ementa de uma lei não é norma jurídica. Além do mais, nem na ementa se diz que o Pregão pode ser adotado qualquer que seja o valor da contratação.
Poder-se-á dizer que essa segunda parte (adoção do Pregão independentemente do valor estimado da contratação) constava da Medida Provisória 2.182-18, de 21/06/2001, de cuja conversão resultou a nova lei. Mas essa MP foi convertida em lei, ou seja, não existe mais.[28]
Como se observa no âmbito doutrinário, a despeito do entendimento em contrário do autor anteriormente referido, a questão é abordada em sua ampla maioria, no sentido de que não há óbice para a utilização do pregão pelos Estados, Distrito Federal e Municípios.
Esse é o entendimento de Hamilton Hobus Hoemke:
[...], a tese nesse artigo defendida considera a criação de nova modalidade de licitação como norma geral leva à conclusão de que pouco importa se a Lei n.º 10.520/2002 não elencou os entes da Federação autorizados a utilizar o Pregão, pois bastaria sua criação para que todos pudessem utilizar-se desta nova modalidade, pois afinal, trata-se de norma geral.
E conclui:
Pode-se concluir que antes da Lei n.º 10.520/2002, os Estados, Distrito Federal e Municípios que desejassem adotar o Pregão em suas respectivas esferas de governo deveriam legislar no sentido de absorver a nova modalidade. Após a mencionada Lei todos os entes da Federação obtiveram a autorização para utilizar o Pregão.[29]
Como exposto anteriormente, apesar das divergências, os pontos de vista se coadunam ao final ensejando o entendimento favorável, em sua maioria, no sentido de que o pregão não afronta as normas gerais evidenciando o âmbito de sua atuação em nível de todos os entes federativos.
3 CARACTERÍSTICAS DO PREGÃO COMUM E DO PREGÃO ELETRÔNICO
Superados os conflitos anteriormente analisados, restam-nos, ainda, alguns pontos obscuros sobre a questão da exigência do pregão em detrimento às modalidades elencadas na Lei 8.666/93. Enquanto aquelas exigem como premissa relação de valores para a escolha, em um primeiro momento, do tipo de Licitação, o pregão, ao contrário, “por constituir-se em uma modalidade de licitação pouco complexa, possibilitando maior celeridade na contratação de bens e serviços comuns”,[30] não se vincula a valores deixando aos participantes a disputa por meio de propostas escritas seguidas de lances verbais em sessão pública que são avaliados por um pregoeiro com sua respectiva equipe de apoio. Ressalte-se que, conforme o decreto 3.555/2000, o pregoeiro somente poderá ser servidor público devidamente capacitado para a função.
Nesse sentido nos ensina Hely Lopes Meirelles:
Diferentemente das outras espécies de licitação, em que a modalidade é estabelecida em função do valor do objeto licitado, o pregão destina-se à aquisição de bens e serviços comuns. Nos termos do citado diploma, consideram-se bens e serviços comuns aqueles cujos padrões de desempenho e qualidade possam ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações usuais no mercado (art. 1.º, § 1.º).[31]
Para Marçal Justen Filho:
O pregão apresenta um procedimento extremamente simples e superficial, o que o torna adequado para contratações que não envolvam complexidades. Isso se aplica tanto ao aspecto subjetivo do licitante quanto ao ângulo objetivo da proposta. Por isso, o pregão é adequado apenas para licitações que versem sobre objeto dito “comum”.[32]
Na prática o que se observa é que bens e serviços comuns constituem a maior parte dos objetos de contratação da Administração Pública. Desta forma, sobre o ponto de vista da celeridade, o Pregão se configura como principal meio para aquisição de bens e serviços comuns pela Administração Pública em detrimento às outras formas elencadas na Lei 8.666/93. Na esteira do exposto, não podemos deixar de mencionar o princípio da eficiência da Administração Pública que tem no pregão a sua manifesta contribuição.
Nesse sentido, sob a ótica de Delano de Souza Tschiedel:
Muito embora parte da doutrina pregue ter sido a inclusão expressa do princípio da eficiência no artigo 37 da Constituição Federal inócua para tornar a Administração Pública mais eficiente, havemos de reconhecer o esforço do legislador e dos gestores da coisa pública para viabilizá-lo na prática. Segue abaixo uma ligeira explicação de como o pregão contribui para a corroboração do princípio da eficiência em cada uma de suas facetas.
Presteza: o pregão permite uma maior agilidade do procedimento licitatório, pois, ao antepor a fase de classificação e julgamento à da habilitação, evita a perda de tempo em se analisarem documentações de empresas que não apresentarão propostas condizentes com os interesses da Administração.
Rendimento funcional: como no pregão não é necessária a presença de uma comissão de licitação, apenas de um pregoeiro (devidamente capacitado) e de uma equipe de apoio (não necessariamente dotada de grande conhecimento técnico), tal modalidade acaba por permitir um melhor aproveitamento dos recursos humanos disponíveis.
Produtividade: como o procedimento do pregão é mais célere do que os demais, é possível que, com a mesma quantidade de recursos humanos disponível se realize um maior número de licitações, com ganhos reais de produtividade.
Economicidade: a oportunidade de oferecer lances verbais sucessivos àquele licitante que emitiu a proposta mais vantajosa e aos três outros que não suplantaram em 10% a proposta do primeiro colocado aumenta, consideravelmente, a competitividade entre eles, que tendem a reduzir, ainda mais, os preços ofertados inicialmente, gerando economia nas contratações.
Redução de desperdícios do dinheiro público: seguindo o mesmo raciocínio do item anterior, as ofertas mais baixas, pelos licitantes, geram grande economia, reduzindo os desperdícios na aplicação dos recursos públicos.[33]
Como se observa das considerações avençadas acima, o Pregão consagra o princípio da eficiência da Administração Pública assim como a Lei 8.666/93, no entanto, se difere desta demonstrando, ao longo de sua utilização nos procedimentos licitatórios, maior coerência com o princípio que as modalidades elencadas na lei em epígrafe.
O Pregão, dada a sua natureza de celeridade, se divide em duas espécies, quais sejam, a comum e a eletrônica, cujas quais, possuem características próprias que as diferem em seus procedimentos quando utilizadas pela Administração Pública, como veremos a seguir.
3.1 PREGÃO COMUM
Trata-se do pregão presencial onde os atos caracterizam-se por não serem virtuais. Segue-se o modelo tradicional, ou seja, “ [...] a sessão pública de pregão ocorre num determinado local, ao qual comparecem fisicamente os agentes administrativos, os licitantes e os eventuais interessados (JUSTEN FILHO, 2009. p.13).” Atualmente, na prática, em virtude da modalidade pregão eletrônico, tem a sua aplicabilidade quando existe a necessidade de analise de características e especificações contidas nos descritivos técnicos, sendo esta última modalidade a preferencialmente aplicada na maioria dos certames licitatórios.
3.2 PREGÃO ELETRÔNICO
Caracteriza-se pela utilização de recursos de Tecnologia da Informação e de Internet. Disponibiliza-se um endereço eletrônico onde todos os envolvidos na licitação se conectam e interagem a fim de dar prosseguimento ao feito. As propostas são feitas por via eletrônica, assim como os lances, na competição do certame. Como bem nos ilustra Marçal Justen Filho:
Com a rápida difusão da Internet por banda larga, o pregão eletrônico tornou-se uma realidade. Houve a sua regulamentação por atos infralegislativos, o que propiciou a sua ampla difusão. Atualmente, vigora o Dec. Fed. n.º 5.450/2005 no âmbito federal.[34]
Desta forma todo e qualquer bem ou serviço comum que não esteja, de alguma forma vinculado a editais onde as características técnicas e especificações necessitem exame mais apurado por parte da equipe técnica, deverão ser contratados, preferencialmente, através de pregão eletrônico.
Sobre a obrigatoriedade do pregão eletrônico, à luz da análise de Paulo Campanha Santana, esta espécie tem sua obrigatoriedade apenas no âmbito da União ficando a administração pública indireta desonerada de utilizá-la ou não, conforme transcrição abaixo:
A obrigatoriedade de sua utilização decorre da entrada em vigor do Decreto n.º 5.450/2005, apesar do Decreto 3.555/2000 prever, preferencialmente, a utilização desta modalidade. Para renomados autores, além do entendimento do Tribunal de Contas da União e do previsto nos decretos federais pertinentes ao assunto, a aquisição de bens e serviços comuns, em tese, realmente deve ser utilizado o pregão, dando-se prioridade à forma eletrônica. Entretanto, em certas circunstâncias, tendo em vista o pequeno valor da contratação, a Administração Pública não está obrigada a promover o pregão, bem como está liberada de realizar procedimento licitatório, devendo justificar tal procedimento. Sobre esta obrigação, cabe destacar que, em razão desta imposição ser decorrente de um decreto federal, apenas a União está obrigada a cumpri-la, podendo a administração pública indireta, utilizá-la ou não.[35]
Na esfera dos demais entes federativos a adoção do pregão vem se mostrando ato contínuo e tem respaldo legal, em Lei estabelecida no próprio campo de eficácia do ente federativo.
4 LICITAÇÃO NA MODALIDADE PREGÃO INTERNACIONAL
Conforme prevê o artigo 9.º da lei 10.520/2002, assim como já discutido anteriormente, aplicam-se subsidiariamente as normas da Lei 8.666/93, no que couber, à Lei do Pregão. Seguindo essa diretriz e com o intuito de promover a isonomia, além de maior disputa entre os concorrentes, adotam-se, na Administração Pública os procedimentos apontados na Lei 8.666/93, em licitações realizadas através do pregão.
Claro está que no caso de licitações internacionais não poderia ser diferente, uma vez que o pregão integra o rol de modalidades licitatórias já exaustivamente descritas na Lei 8.666/93.
No entanto no meio jurídico existem pareceres no sentido de que, por não haver previsão normativa expressa, essa modalidade não é permita para licitações internacionais na Administração Pública.
Esse é o entendimento de Rodrigo Alberto Correia da Silva e Julio Cesar Mollica:
A realização de um pregão internacional esbarra na dificuldade prática da língua, tanto mais se for eletrônico, posto que todos os atos do pregão devem ser praticados no vernáculo. Ademais, não cremos que exista a possibilidade de realização de pregões internacionais no Brasil na medida em que embora a Lei que cria o pregão seja genérica ao determinar que este é viável para aquisição de bens e serviços comuns, sem qualquer restrição, a Lei de licitações (art. 23, § 3.º, da Lei 8.666/93) determina que as licitações internacionais devem se dar nas modalidades de concorrência ou tomada de preços quando houver fornecedor nacional e excepcionalmente convite quando não houver. Considerando que a Lei que criou o pregão não alterou referido artigo da Lei de licitações e que esta é aplicada subsidiariam a esta, acreditamos que o artigo permanece em pleno vigor. Desta forma, uma vez que aos administradores públicos não é permitido fazer nada que a Lei expressamente não permita e não havendo permissão para a realização de pregão internacional no artigo que permite a realização de contratação pública com estrangeiros não é permitida pela legislação brasileira a realização de pregões internacionais.[36]
A observação acima evoca o artigo 23, § 3.º da Lei 8.666/93 alertando para o fato de só poderem ser utilizadas nas licitações internacionais as modalidades de concorrência, tomada de preços ou excepcionalmente convite, como descrito expressamente no referido dispositivo legal. A despeito da norma assim determinar, o sentido lógico, no caso de aquisição de bens e serviços comuns onde a regra é a aquisição independentemente do valor da contratação, é que o pregão como uma das seis modalidades de licitação, apresenta-se de maneira idêntica às modalidades acima elencadas apenas diferindo destas no que se refere a seu aspecto formal.
O mesmo entendimento se reflete na Decisão 243/2009 do Tribunal de Contas do Distrito Federal:
[...] O dispositivo legal citado (art. 23, § 3.º, da Lei n.º 8.666/93) permite a realização de licitação internacional nas diversas modalidades elencadas à época da edição da norma, desde que observados os requisitos legais. A modalidade de licitação denominada pregão, segundo dispõe a Lei n.º 10.520/2002, poderá ser adotada em substituição às estabelecidas na Lei de Licitações desde que para aquisição de bens e serviços comuns. A falta de previsão na Lei instituidora não implica necessariamente sua vedação de utilização em certames internacionais, cuja admissão, em princípio, é possível desde que atendidos os requisitos previstos no citado artigo 23 da Lei de Licitações.[37]
Desta forma, evidente é que o pregão se apresenta como uma nova modalidade licitatória do mesmo nível das avençadas no artigo 23, § 3.º, da lei 8.666/93 não havendo de se falar em proibição quanto a sua utilização nos casos ali postulados.
Não se resume o entendimento apenas no âmbito do pregão comum, como podemos observar na continuidade do referido Relatório do Tribunal de Contas do Distrito Federal acima citado:
Acrescenta, conforme citado pelo pregoeiro à fl. 51 (proc. anexo), esta Casa apreciou situação semelhante no Pregão Eletrônico n.º 495/2007 de interesse da Policia Civil do DF (Processo TCDF nº 35004/2007) sem que se tenha promovido qualquer ressalva quanto à utilização da modalidade questionada pelo presente. (Tribunal de Contas do Distrito Federal. Decisão 243/2009).[38]
Sendo assim, apesar da doutrina silenciar sobre o tema, se pronunciando apenas alguns autores esparsos em sentido contrário, legalmente, a princípio, sob o ponto de vista do Tribunal de Contas do Distrito Federal, não há óbice para a execução do Pregão na modalidade internacional.
4.1 CABIMENTO DO PREGÃO COMUM E ELETRÔNICO NA MODALIDADE INTERNACIONAL NO ÂMBITO FEDERATIVO
Com esteio na decisão do Tribunal de Contas do Distrito Federal anteriormente referenciada sobre a licitação na modalidade pregão Internacional, mister é, dada as circunstâncias, analisar o cabimento do decreto 3.555/2001 e 5.450/20005 no âmbito federativo.
Trata-se aqui do mesmo debate já discutido no presente trabalho sobre a questão da Lei 10.520/2002.
Pacificado o entendimento que o Pregão é uma modalidade de licitação que se integra as outras existentes na Lei Geral de Licitações e, após análise da adoção deste em âmbito Federativo, resta-nos analisar se este mesmo entendimento se aplica na modalidade Internacional.
4.1.1 O DECRETO N.º 3.555/2000 (Pregão Comum)
O pregão comum foi instituído pelo Decreto n.º 3.555/2000, cujo qual, estabelece as normas e exigências para a habilitação dos licitantes nessa modalidade. Com referencia a empresas estrangeiras, objeto desta discussão, estas deverão apresentar documentos equivalentes aos das empresas nacionais, com especial ênfase para o fato de que estes deverão ser autenticados pelo consulado e traduzidos por tradutor juramentado, conforme podemos observar no art. 16.º, abaixo transcrito:
Art. 16. Quando permitida a participação de empresas estrangeiras na licitação, as exigências de habilitação serão atendidas mediante documentos equivalentes, autenticados pelos respectivos consulados e traduzidos por tradutor juramentado.
Parágrafo Único. O licitante deverá ter procurador residente e domiciliado no Pais, com poderes para receber citação, intimação e responder administrativa e judicialmente por seus atos, juntando os instrumentos de mandato com os documentos de habilitação.(VIEIRA, 2011. p. 119).
Observe-se que o artigo em epígrafe não difere do disposto no artigo 32, § 4.º, da Lei 8.666/93, evidenciando que os respectivos dispositivos legais não conflitam quanto à participação de empresas estrangeiras nos certames licitatórios correspondentes.
Art. 32. Os documentos necessários à habilitação poderão ser apresentados em original, por qualquer processo de cópia autenticada por cartório competente ou por servidor da Administração, ou publicação em órgão da Imprensa Oficial.
[...]
§ 4º. As empresas estrangeiras que não funcionem no País, tanto quanto possível, atenderão, nas licitações internacionais, às exigências dos parágrafos anteriores mediante documentos equivalentes, autenticados pelos respectivos consulados e traduzidos por tradutor juramentado, devendo ter representação legal no Brasil com poderes expressos para receber citação e responder administrativa e judicialmente. (VIEIRA, 2011. p. 40).
Atente-se para o fato de que esse dispositivo legal já se harmonizava com a Lei Geral de Licitações antes da edição da Lei 10.520/2002, a qual dispõe, expressamente em seu artigo 9.º, que esta deverá ser aplicada subsidiariamente, no que couber, ao pregão, conforme podemos observar na transcrição abaixo:
Art. 9. Aplicam-se subsidiariamente, para a modalidade de pregão (grifo meu), as normas da Lei 8.666, de 21 de junho de 1993. (VIEIRA, 2011. p. 134.).
Quanto ao tema, se pronuncia a Secretaria de Planejamento de Minas Gerais nos seguintes termos:
Quando a Lei Federal n.º 8.666/93 e a Lei Federal n.º 10.520, de 2002, calam-se acerca de pregão internacional, não devemos entender imediatamente como vedação. Afinal, os princípios da eficiência, da proporcionalidade, da razoabilidade, da impessoalidade e da moralidade são capazes de sustentar a aplicação efetiva do pregão internacional. E, nesse aspecto, o Decreto Estadual n.º 42.408, de 2002, e o Decreto Federal n.º 3.555, de 2000, ao permitirem a participação de empresa estrangeira em pregão, não contrariam o sistema jurídico anterior. E como componentes desse mesmo sistema, se o administrador admitir a utilização do pregão internacional, estará agindo de acordo com a legalidade. (PARECER SEPLAG/AJA N.º 2.061/05, de 09 de novembro de 2005 – Belo Horizonte).[39]
Claro está que estes institutos não conflitam entre si, ao contrário, se complementam e se integram no Pregão evidenciando assim, como concluído no raciocínio anterior sobre a Lei 10.520/2002, que não há pressuposto legal contrário à sua adoção pelos demais entes da Federação.
4.1.2 O DECRETO N.º 5.450/2005 - PREGÃO ELETRÔNICO
Com o advento do Decreto n.º 5.450/2005, que instituiu o pregão eletrônico, volta à baila a discussão sobre sua extensão na modalidade internacional no âmbito federativo.
Aparente controvérsia tem sua origem no art. 15.º do Decreto sobre análise:
Art. 15. Quando permitida a participação de empresas estrangeiras na licitação, as exigências de habilitação serão atendidas mediante documentos equivalentes, autenticados pelos respectivos consulados ou embaixadas e traduzidos por tradutor juramentado no Brasil.(VIEIRA, Jair Lot. 2011. p. 162).
Diferentemente do disposto no Parágrafo único do Decreto 3.555/2000, o legislador, no instituto legal em epígrafe, não se preocupou com a necessidade de procurador residente e domiciliado no País para responder e ser responsabilizado, jurídica e administrativamente, pelos seus atos. Limitou-se apenas à exigência de documentos equivalentes aos nacionais para habilitação de empresas estrangeiras.
Diante deste fato, o Decreto 5.450/2005, apresenta-se a princípio, incerto quanto à segurança jurídica para a participação de empresas estrangeiras no pregão eletrônico, uma vez que não há como determinar a responsabilidade jurídica e administrativa na ausência de um procurador que responda por esses atos. Note-se, também, que o referido dispositivo legal ainda deixa de taxativamente citar a Lei geral de Licitações como de aplicabilidade subsidiária necessária no que couber.
Observa-se que, como discuto anteriormente sobre a competência concorrente para legislar, a fim de preservar a segurança jurídica, tem os entes federativos preenchido essa omissão do legislador inserindo em suas leis locais artigos taxativos quanto a aplicação subsidiária da Lei Geral de Licitações.
Temos como exemplo o Decreto N.º 1527-R de 30 de agosto de 2005, do Estado do Espírito Santo que se resume a repetir, em seu artigo 13, na integra o texto aludido no artigo 15 da Lei 5.450/2005, no entanto, a lacuna acima citada é suprimida no artigo 35, cujo qual remete à Lei Geral de Licitações, conforme podemos observar no referido dispositivo legal: “Art. 35. Aplicam-se subsidiariamente, no que couber, para a modalidade pregão, as normas da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993”.[40]
No entanto, entende-se desnecessária a menção à Lei 8.666/93, uma vez que o pregão trata-se também de uma nova modalidade de Licitação de mesmo nível que norma geral, além do fato de que a Lei 10.520/2002 remete, em seu art. 9.º,[41] àquele dispositivo legal como de aplicação subsidiária.
Desta forma encontramos aqui situação semelhante à do pregão comum e, portanto, legalmente não encontramos óbice também para adoção do pregão eletrônico na modalidade Internacional em âmbito Federativo. Adotam-se as mesmas regras das demais modalidades licitatórias diferindo apenas o aspecto formal na habilitação e nos lances, uma vez que são utilizados recursos de tecnologia de informação para a sua realização como já anteriormente citado no presente trabalho.
4.2 IGUALDADE ENTRE OS LICITANTES NACIONAIS E INTERNACIONAIS
Sob o ponto de vista legislativo, à luz das conclusões anteriores, não há, a princípio, vedação da utilização do pregão na modalidade Internacional. Resta-nos, no entanto, examinar a questão sobre o ponto de vista do princípio da igualdade entre os licitantes nacionais e internacionais, que conforme nos ensina Hely Lopes Meirelles:
[...] é o princípio primordial da licitação – previsto na própria Constituição da República (art. 37, XXI) -, pois não pode haver procedimento seletivo com discriminação entre participantes, ou com cláusulas do instrumento convocatório que impeçam ou afastem eventuais proponentes qualificados ou os desnivelem no julgamento (art. 3.º, § 1.º)[42].
Sobre o aludido princípio, especificamente no que se refere à licitação de maneira geral, nos ensina Celso Antônio Bandeira de Mello que:
O princípio da igualdade (grifo do autor) implica o dever não apenas de tratar isonomicamente todos os que afluírem ao certame, mas também o de ensejar oportunidade de disputá-lo a quaisquer interessados que, desejando dele participar, podem oferecer as indispensáveis condições de garantia.[43]
O art. 3.º, § 1.º da Lei 8.666/93, referenciado acima por Hely Lopes Meirelles, estabelece, em seu inciso II, que nas licitações internacionais, brasileiros e estrangeiros gozam dos mesmos direitos.[44]
No entendimento de Marçal Justen Filho:
O inc. II determina o tratamento uniforme dos licitantes nacionais e não nacionais. Se a administração adotar determinada exigência, deverá aplicá-la de modo genérico. Por igual, deverão ser estabelecidas regras uniformes acerca de moeda, modalidade e local de pagamento, respeitadas as disposições da própria lei.
O dispositivo consagra o chamado “princípio da generalidade” (grifo do autor), que se vincula a isonomia, [...].[45]
No entanto, notória é nesse País a elevada carga tributária em todos os setores de arrecadação, o que não exclui, dentre estes, as empresas brasileiras. Desta forma, a fim de preservar e equiparar a empresa nacional, a lei prevê que “Para fins de julgamento da licitação, as propostas apresentadas por licitantes estrangeiros serão acrescidos dos gravames conseqüentes dos mesmos tributos que oneram exclusivamente os licitantes brasileiros quanto à operação final de venda” (art. 42, § 4.º da Lei 8.666/93). Não se esgota o artigo apenas com essa possibilidade, prevendo ainda, outras disposições de equiparação.
Nos casos em que a lei não expressa taxativamente hipóteses de procedimentos que estejam harmonicamente sintonizados com os ditames da administração, deverá prevalecer o disposto no artigo 3.º da Lei 8.666/93 como regra geral, como bem nos ensina Marçal Justen Filho:
Havendo dúvida sobre o caminho a adotar ou a opção a preferir, o intérprete deverá recorrer a esse dispositivo. Dentre diversas soluções possíveis, deverão ser rejeitadas as incompatíveis com os princípios do art. 3.º. Se existir mais de uma solução compatível com ditos princípios, deverá prevalecer aquela que esteja mais de acordo com eles ou que os concretize de modo mais intenso e amplo.[46]
Ressalte-se que a lei ao mesmo tempo em que tem como pedra fundamental os princípios elencados em seu art. 3.º, especialmente o da isonomia, estabelece no § 2.º do referido artigo, preferências na situação em que ocorra empate entre as propostas dos licitantes, dentre estas, em especial, os bens e serviços produzidos ou prestados por empresas brasileiras de capital nacional.
Não se esgota as preferências no aludido dispositivo legal haja vista que a Lei Complementar 123/2006 também prevê tratamento diferenciado para empresa de pequeno e médio porte como veremos a seguir.
4.2.1 A LEI COMPLEMENTAR 123/2006 - ESTATUTO DA MICROEMPRESA E DA EMPRESA DE PEQUENO PORTE
Com o advento da Lei Complementar 123/2006 amplia-se o rol de preferências citadas anteriormente no art. 3.º, § 2.º da Lei 8.666/93, assegurando em seu art. 44, como critério de desempate em licitações, a preferência de contratação para as microempresas e empresas de pequeno porte. Note-se, no entanto, que o termo empate neste contexto adquire semântica diversa do vocábulo usualmente empregado, conforme se observa na transcrição do referido artigo:
Art. 44. Nas licitações será assegurada, como critério de desempate, preferência de contratação para as microempresas e empresas de pequeno porte.
§ 1.º. Entende-se por empate aquelas situações em que as propostas apresentadas pelas microempresas e empresas de pequeno porte sejam iguais ou até 10% (dez por cento) superiores à proposta mais bem classificada.
§ 2.º. Na modalidade pregão, o intervalo percentual estabelecido no § 1.º deste artigo será de até 5% (cinco por cento) superior ao melhor preço.
Desta forma, conforme o disposto no referido diploma legal, é assegurado à microempresa e empresa de pequeno porte melhor classificada o direito de apresentar proposta de preço inferior ao da vencedora do certame, situação em que ensejará na adjudicação em seu favor do objeto licitado (art. 45, I, da LC 123/2006).
Apesar da aparente disparidade isonômica apresentada, na opinião de Joel de Menezes Niebuhr, “[...] a isonomia não impõe que todos sejam tratados com absoluta igualdade. Ao contrário, as leis nada mais fazem do que discriminar situações em detrimento de outras, classificando grupos e setores.”[47]
Com referencia às microempresas e empresas de pequeno porte, afirma o referido autor:
[...] convém sublinhar que o fato de o legislador ter estabelecido tratamento privilegiado às microempresas e às empresas de pequeno porte não implica, por si só, ofensa ao princípio da isonomia, isto é, ao direito das demais empresas, que não sejam micro ou de pequeno porte, de serem tratadas com igualdade. Isto porque não há igualdade absoluta. Insista-se que os desiguais devem ser tratados com desigualdade.[48]
No entanto, deixa transparecer a sua critica ao referido dispositivo legal concluindo por fim que:
[...] a Lei Complementar n.º 123/2006, sob a escusa de favorecer as microempresas e as empresas de pequeno porte, acaba subvertendo valores fundamentais do capitalismo moderno, adotando medidas excessivas, que instauram quase que reserva de mercado nas licitações públicas e nos contratos administrativos. Mais uma vez o legislador confundiu o incentivo com o protecionismo. O paternalismo estatal, historicamente, não estimula; em sentido oposto, incute a idéia contrária ao crescimento. No Brasil, parece que é melhor ser pequeno, permanecer pequeno ou tornar-se pequeno.[49]
Não obstante a critica acima, oportuno é chamar a atenção para o fato de que a referida lei tem sua extensão em nível de todas as modalidades licitatórias, incluindo o pregão. Sendo assim, a lógica neste caso é que se aplica a mesma regra subsidiariamente nos certames licitatórios de modalidade Internacional.
4.2.2 A LEI N.º 12.349/2010 E SEU IMPACTO SOBRE A LEI 8.666/93
Com o intuito de fomentar o desenvolvimento nacional editou-se a Medida Provisória 495/2010, que posteriormente foi convertida na Lei 12.349/2010, cuja qual alterou o artigo 3.º da Lei 8.666/93, incluindo no texto daqueles preceitos principiológicos “a promoção do desenvolvimento nacional” (grifo meu), conforme se observa no item 6 da exposição de motivos do referido dispositivo legal, abaixo transcrito:
6. A modificação do caput (grifo do autor) do artigo 3.º visa agregar às finalidades das licitações públicas o desenvolvimento econômico nacional. Com efeito, a medida consigna em lei a relevância do poder de compra governamental como instrumento de promoção do mercado interno, considerando-se o potencial de demanda de bens e serviços domésticos do setor público, o correlato efeito multiplicador sobre o nível de atividade, a geração de emprego e renda e, por conseguinte, o desenvolvimento do país. É importante notar que a proposição fundamenta-se nos seguintes dispositivos da Constituição Federal de 1988: (i) inciso II do artigo 3.º, que inclui o desenvolvimento nacional como um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil; (ii) inciso I e VIII do artigo 170, atinentes às organização da ordem econômica nacional, que deve observar, entre outros princípios, a soberania nacional e a busca do pleno emprego; (iii) artigo 174, que dispõe sobre as funções a serem exercidas pelo Estado, como agente normativo regulador da atividade econômica; e (iv) artigo 129, que trata de incentivos ao mercado interno, de forma a viabilizar o desenvolvimento cultural e sócio-econômico, o bem estar da população e a autonomia tecnológica do país.[50]
Cria-se então novo regramento basilar para as licitações que objetiva preferência semelhante à anteriormente exposta sobre a LC 123/2006.
Ressalte-se, no entanto, que diferentemente do estatuto da micro e pequena empresa, preocupou-se o legislador, neste novo ordenamento jurídico, em proteger o desenvolvimento nacional, ampliando as preferências a todas as empresas nacionais. Inclui-se, portanto, no dispositivo legal em tela, outra finalidade da licitação que é a promoção do desenvolvimento nacional.
Outra novidade da Lei 12.349/2010 foi a extensão dessa margem de preferência também aos Estados Partes do Mercado Comum do Sul – Mercosul, demonstrando a importância da integração com novos mercados, desde que exista a reciprocidade (art. 3.º, § 10).
Apesar do objetivo da Lei ser a preservação do desenvolvimento nacional, na opinião de Jonas Lima o que se vislumbra no campo das licitações é o crescimento da insegurança jurídica para os estrangeiros. Conforme suas palavras: “Com a edição da Lei 12.349, no apagar das luzes de 2010, cresceu a insegurança jurídica para os estrangeiros, uma vez que o detalhamento das preferências de até 25% para os produtos nacionais nas licitações públicas ficou para regulamentação via decreto do Poder Executivo. Portanto, não haverá debate aberto.[51]
Com relação ao § 8.º[52] ainda nos adverte o autor sobre a sua inconstitucionalidade:
A Lei n.º 12.349 (decorrente de uma MP) já nasceu inconstitucional, a começar por não atender ao requisito básico da urgência. No mérito das normas de preferências nacionais (de até 25%), o governo trilhou caminho errado, quebrando pressupostos constitucionais, entre outros, o de “igualdade de condições a todos os concorrentes” (grifo do autor). [...][53]
E conclui alertando para o fato de que se: “Na verdade, a pretensão era estimular o desenvolvimento nacional, o governo deveria ter incentivado os estrangeiros a trazerem recursos e investir no Brasil para aqui gerar emprego, renda e tecnologia, inclusive, com incentivos fiscais e outros, para instalação de unidades produtivas.” [54]
Fato é que, com a edição desta Lei, grandes mudanças nos procedimentos licitatórios deverão ocorrer e com elas, em virtude das inovações impostas, surgirão muitos debates a respeito do tema.
Oportuno neste ponto lembrar que a Lei estende as mesmas regras para o pregão, conforme disposto no art. 2.º: “O disposto nesta Lei aplica-se à modalidade licitatória pregão, de que trata a Lei n.º 10.520, de 17 de julho de 2002.”
Feitas estas observações acerca da equiparação das empresas brasileiras com as estrangeiras, o que se extrai de conclusivo é que as recentes mudanças na Lei geral trouxeram a quebra da isonomia em relação às licitações na modalidade internacional de uma maneira geral, e que, em seu aspecto formal, ficou explicito que tais regras deverão incidir também na modalidade pregão.
5 CONCLUSÃO
No que tange à questão do pregão internacional como modalidade licitatória, defronta-se os agentes públicos, legalmente, com uma variedade de incógnitas legislativas, muitas das quais originadas pelo próprio legislador na tentativa de corrigir atos que se mostram ineficientes na prática, como anteriormente apontado no presente trabalho.
Desde a sua inclusão na Constituição Federal até as edições de Leis específicas, e também, às recentes evoluções tecnológicas, tem a forma de contratação imposta a Administração Pública, denominada Licitação, causado grandes embates judiciais. Tal fato se deve a redação da Lei 8.666/93 ter seu alcance, inicialmente interpretado, no âmbito da União por imposição constitucional.
No entanto a mesma redação, apesar da origem legislativa federal da Lei, faz menção de que sua natureza é Geral, principiológica e, em função desta característica normativa, de âmbito federativo. Por esta razão, opiniões se contradizem no meio jurídico ora postulando a abrangência da Lei em âmbito Federativo, ora dizendo-se contrário a esse posicionamento.
O mesmo embate acontece com o pregão, uma vez que neste caso em particular, a discussão começa com o questionamento se é possível a criação de nova modalidade licitatória uma vez que a Lei Geral se restringe a apenas cinco não sendo permitida a criação de outras.
A questão se resolve pelo entendimento que o Legislador não se restringe à criação apenas daquela norma geral tendo a liberdade para criar outras de mesma hierarquia, como é o caso da Lei 10.520 que instituiu o pregão como nova modalidade licitatória, não conflitando com o que dispõe a Lei 8.666/93 sobre o tema. Desta forma, apesar da divergência de opiniões, não resta dúvida que a Lei 8.666/93 é uma lei federativa, portanto, com alcance em âmbito de todos os entes federativos. Pacifica-se o mesmo entendimento ao Pregão por tratar-se de uma modalidade licitatória que se soma as outras elencadas na Lei Geral. Assim, claro está a sua extensão também a todos os entes federativos.
Com referencia ao Pregão na modalidade Internacional, foco central do presente debate, apesar do silêncio da doutrina sobre o tema, do estudo realizado e, também, pelo ponto de vista da jurisprudência, o que se observa de conclusivo é que não existe óbice para sua utilização e aplicação pelos entes federativos, uma vez que legalmente, tanto na Lei Geral, como na Lei do Pregão, taxativamente não existe essa restrição. Observe-se que a esse respeito, com a alteração imposta pela Lei 12.349/2010, sofreu a Lei Geral, profundas alterações que afetam principalmente as Licitações Internacionais, sendo estas sim taxativamente entendidas ao pregão.
Por fim, apesar do legislador não deixar ainda claro a questão do pregão como modalidade de licitação na Lei Geral, mesmo com a alteração sofrida recentemente nesse sentido, o que aguardamos como operadores do Direito, é que no futuro essas controvérsias sejam sanadas com a reforma ou mesmo a edição de uma Lei Geral de Licitações que inclua definitivamente a modalidade Pregão em sua redação, sem margem de dúvidas quanto a sua extensão em âmbito federativo e, principalmente, a sua aplicabilidade em certames com participação de empresas estrangeiras na modalidade Internacional.
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[1] MEIRELLES, Hely Lopes et al. Direito Administrativo Brasileiro. 36. ed. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 281.
[2] MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 27. ed. São Paulo: Atlas, 2011. p. 325.
[3] MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO,Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet.Curso de Direito Constitucional. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 870.
[4] BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 773-774.
[5] MORAES, 2011. p. 326-327.
[6] MORAES, 2011. p. 323
[7] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 14. ed. São Paulo: Dialética, 2010. p. 11.
[8] JUSTEN FILHO, 2010. p. 14.
[9] JUSTEN FILHO, 2010. p. 14.
[10] JUSTEN FILHO, 2010. P. 14.
[11] VIEIRA, Jair Lot. Licitações e Contratos na Administração Pública. 24. ed. São Paulo: Edipro, 2011. p. 13.
[12] VIEIRA, 2011. p. 13.
[13] VIEIRA, 2011. p. 69.
[14] JUSTEN FILHO, 2010. p. 951.
[15] JUSTEN FILHO, Marçal. PREGÂO (Comentários à Legislação do Pregão Comum e Eletrônico). 5. ed. São Paulo: Dialética, 2009. p. 9.
[16] VIEIRA, 2011. p. 30.
[17] MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e Contrato Administrativo. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2010. p. 129.
[18] MEIRELLES, 2010b. p. 129-130.
[19] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 26. Ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 548.
[20] COSTA, Ana Edite Olinda Norões; FILHO, Marco Antonio Praxedes de Moraes et al. Organizadores. Licitações e Contratos Administrativos: Apontamentos. Leme: J. H. Mizumo, 2009. p. 107.
[21] JUSTEN FILHO, 2009. p. 16-17.
[22] Id., 2009, p. 16-17.
[23] RIGOLIN, Ivan Barbosa; BOTTINO, Marco Tullio. Manual Prático das Licitações. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 481.
[24] PALAVÉRI, Marcelo. Pregão nas Licitações Municipais. Belo Horizonte: Del Rey, 2005. p. 4.
[25] BRASIL. Mensagem n.º 638. Presidencia da República, Casa Civil, Subchefia para assuntos Jurídicos. Brasília, DF, 17 de julho de 2002. Planalto. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/Mensagem_veto/Mv638-02.htm>. Acesso em: 13 maio. 2011.
[26] MAURANO, Adriana. O pregão no Município de São Paulo. Jus Navigandi, Terezina, ano 9, n. 537, 26 dez. 2004. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/6072>. Acesso em: 13 maio. 2011.
[27] AMARAL, Antônio Carlos Cintra do. Novas considerações sobre o pregão. Disponível em: <http://www.celc.com.br/comentarios/71.html>. Acesso em: 16 maio. 2011.
[28] Id., 2011, <HTTP://www.celc.com.br/comentarios/71.html>
[29] HOEMKE, Hamilton Hobus. Aplicabilidade nos Estados, Distrito Federal e Municípios da Lei nº 10.520/2002: a lei do pregão. Jus Navegandi. Teresina, ano 8, n. 61, 1 jan. 2003. Disponível em: <www.jus.uol.com.br/revista/texto/3651>. Acesso em: 16 maio. 2011.
[30] ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado. 16. ed. São Paulo: Método, 2008. p. 551.
[31] MEIRELLES, 2010b. p. 338.
[32] JUSTEN FILHO, 2009. p. 11.
[33] TSCHIEDEL, Delano de Sousa. O pregão e o princípio da eficiência da Administração Pública. LFG. São Paulo. Disponível em: <http://www.lfg.com.br.> Acesso em: 12 maio. 2011.
[34] JUSTEN FILHO, Marçal, 2009. p. 13.
[35] SANTANA, Paulo Campanha. A obrigatoriedade do pregão eletrônico. Jus Navegandi. Teresina, ano 16, nº 2863, 4 maio 2011. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/19032>. Acesso em: 13 maio 2011.
[36] SILVA, Rodrigo Alberto Correia da; MOLLICA, Julio Cesar. Pregões Internacionais. Correia da Silva. Disponível em: <http://www.correiadasilva.com.br/pdf/art_adm/art_adm5.pdf>. Acesso em: 19 maio. 2011.
[37]BRASILIA. Tribunal de Contas do Distrito Federal. Decisão 243/2009. Relator: Paulo César de Ávila e Silva. Brasilia, 3 de fevereiro de 2009. Lex: Sessão Ordinária nº 4227 de 03/02/2009, DODF de 12/02/2009, p. 12. Disponivel em: <http://www.tc.df.gov.br/web/site>. Acesso em: 20 maio. 2011.
[38] Id., 2011. Disponível em: <http://www.tc.df.gov.br/web/site>.
[39] Minas Gerais. Secretaria de Planejamento de Minas Gerais. Modalidade de Compras. Planejamento. Disponível em: <www.planejamento.mg.gov.br/governo/choque/gestao_resultados/arquivos/Modalidade_Compras.pdf>. Acesso em: 23 mai. 2011. p. 11.
[40]Espírito Santo. Centrais de Abasteciemnto do Espirito Santo – CEASA/ES. Decreto Nº 1527-R de 30-08-05 – Pregão Eletrônico. CEASA. Disponível em: <http://www.ceasa.es.gov.br/?p=53>. Acesso em: 24 maio. 2011.
[41] Art. 9º. Aplicam-se subsidiariamente, para a modalidade pregão, as normas da Lei nº 8.666 de 21 de junho de 1993.(VIEIRA, Jair Lot, 2011. p. 134.).
[42] MEIRELLES, 2010b. p. 41.
[43] MELLO, 2008. p. 526.
[44] Art. 3º. A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhe são correlatos.
§ 1º. É vedado aos agentes públicos:
[...]
II – estabelecer tratamento diferenciado de natureza comercial, legal, trabalhista, previdenciária ou qualquer outra, entre empresas brasileiras e estrangeiras, inclusive no que se refere a moeda, modalidade e local de pagamentos, mesmo quando envolvidos financiamentos de agências internacionais, ressalvado o disposto no parágrafo seguinte e no art. 3º da Lei nº 8.248, de 23.10.1991. (VIEIRA, 2011. p. 14-15.).
[45] JUSTEN FILHO, 2010. p. 90.
[46] JUSTEN FILHO, 2010. p. 61.
[47] NIEBUHR, Joel de Menezes. Repercussões do estatuto das microempresas e das empresas de pequeno porte em licitação pública. Jus Navegandi. Teresina, ano 12, nº 1529, 8 set. 2007. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/10380>. Acesso em: 29 maio. 2011.
[48] Id. 2011. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/10380>.
[49] Id. 2011. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/10380>.
[50]BRASIL. E.M.I. N.º 104/MP/MF/MEC/MCT. Presidência da República, Casa Civil, Subchefia para Assuntos Jurídicos. Brasilia, DF, 18 de junho de 2010. Planalto. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Exm/EMI-104-MP-MF-MEC-MCT-MPV-495-10.htm> Acesso em: 30 maio. 2011.
[51] LIMA, Jonas. A Lei nº 12.349 e a (in)segurança jurídica. Capital Público. Vitória, n. 23, abr. 2011. Seção Giro Capital. Disponível em: <http://www.capitalpublico.com.br/conteúdo/giro_capital/default.aspx?Id=f3fe28d7-475e-4ec3-a867-740705baf33d>. Acesso em: 30 maio. 2011.
[52] § 8º. As margens de preferência por produto, serviço, grupo de produtos ou grupo de serviços, a que se referem o §§ 5º e 7º, serão definidas pelo Poder Executivo federal, não podendo a soma delas ultrapassar o montante de 25% (vinte e cinco por cento) sobre o preço dos produtos manufaturados e serviços estrangeiros.
[53] LIMA, 2011. Disponível em: <http://www.capitalpublico.com.br/conteúdo/giro_capital/default.aspx?Id=f3fe28d7-475e-4ec3-a867-740705baf33d>. Acesso em: 30 maio. 2011.
[54] LIMA, 2011. Disponível em: <http://www.capitalpublico.com.br/conteúdo/giro_capital/default.aspx?Id=f3fe28d7-475e-4ec3-a867-740705baf33d>. Acesso em: 30 maio. 2011.
Bacharelando do curso de Direito da Universidade Estácio Uniradial São Paulo. Artigo científico entregue em junho de 2011
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FERREIRA, Clodoaldo José. Pregão Internacional como modalidade licitatória Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 04 nov 2011, 06:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/25848/pregao-internacional-como-modalidade-licitatoria. Acesso em: 22 nov 2024.
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