1. INTRODUÇÃO
Calorosos e recentes debates acerca do jovem instituto constitucional, o Conselho Nacional de Justiça, tem ampliado à população o desejo de conhecimento do Poder Judiciário e seus órgãos.
Desde 2011, com a propositura de uma ação pela Associação da Magistratura Brasileira – AMB, na qual se atacava a competência e autonomia do CNJ para investigação e aplicação de pena independentemente de prévia análise pela corregedoria do Tribunal ao qual o magistrado estivesse submetido, toda a sociedade tem voltado a atenção para o discernimento das funções desse órgão - até então velado.
Com efeito, a referida ação proposta pela AMB trouxe à baila a necessidade de revisitar os institutos basilares do CNJ, convidando-se o Supremo Tribunal Federal a analisar os termos da Resolução nº 135 do mesmo órgão, mormente ao que concerne à autonomia do órgão insculpida no art. 12 de tal Resolução.
Acerca de tal dispositivo a Suprema Corte dividiu-se: os ministros Marco Aurélio Mello, Ricardo Lewandowski, Luiz Fux, Cezar Peluso e Celso de Mello foram a favor da limitação dos poderes do CNJ, propondo a invalidação do referido artigo. Já os Mins. Gilmar Mendes, Ayres Britto, Joaquim Barbosa, Cármen Lúcia, Rosa Maria Weber e José Antonio Dias Toffoli, votaram favoravelmente à autonomia do CNJ para investigação e punição independente da atuação da Corregedoria dos Tribunais de origem.
A discussão denota insofismável importância, haja vista promover a retomada da análise acerca da constitucionalidade do CNJ, bem como o seu posicionamento em face do pacto federativo e da separação de poderes.
2. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA
Instituído através da Emenda Constitucional nº 45 de 2004, o Conselho Nacional de Justiça – CNJ - despontou com a função precípua de controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário, visando à efetiva prestação jurisdicional.
Em breves linhas, há que trazer à baila os termos do art. 103-B, §4º, o qual elenca as atribuições que o CNJ desempenha: zelo da autonomia do Poder Judiciário, bem como o cumprimento do Estatuto da Magistratura; observância do cumprimento do disposto no art. 37, CFR/88, apreciando os atos administrativos do Poder Judiciário; receber e conhecer das reclamações contra membros ou órgãos do Poder Judiciário, podendo, ainda, avocar processos disciplinares em curso; representar ao Ministério Público os casos de crime contra a Administração Pública e abuso de autoridade; elaborar relatórios semestrais acerca dos processos e sentenças prolatadas; propor providências necessárias ao Poder Judiciário.
2.1 CONSTITUCIONALIDADE: ENTRE O PACTO FEDERATIVO E A SEPARAÇÃO DE PODERES
Logo em seguida à sua criação, a AMB propôs a ADI 3.367/DF, questionando a constitucionalidade do CNJ, sustentando a violação ao princípio do pacto federativo e da separação de poderes, notadamente no que tange aos arts. 2º e 18 da CF/88. Nada obstante, o STF não deu guarida aos argumentos trazidos pela AMB, sendo julgada improcedente a referida ADI.
Com efeito, contrapondo-se à tese levantada pela AMB de que o CNJ configuraria um órgão de controle externo do Poder Judiciário – o que ofenderia a separação de poderes e o pacto federativo -, entendeu-se pela clara intelecção do art. 92, I-A da CF/88, o qual elenca os órgãos do Poder Judiciário, alocando o CNJ no mesmo patamar dos demais órgãos (não havendo que se falar hierarquia superior).
Ademais, ficou assente que a presença de não magistrados no CNJ não é elemento capaz de violar o princípio da separação de poderes, infringindo o art. 60, §4º, III, CF/88. Ao contrário, a Suprema Corte compreendeu que a presença de não magistrados é mínima (apenas 6 integrantes entre 15) e vantajosa, pois evita os efeitos maléficos do corporativismo. Nessa trilha, insta ainda sopesar as palavras do Min. Gilmar Mendes:
O Tribunal afastou a tese de afronta ao princípio da separação de Poderes, enfatizando que, tal como concebido, o Conselho Nacional de Justiça configurará órgão administrativo interno do Poder Judiciário e não instrumento de controle externo, e que, em sua maioria, os membros que o compõem são integrantes do Poder Judiciário. Da mesma forma, não se acolheu a impugnação quanto à afronta ao princípio federativo, tendo em vista o perfil nacional do Poder Judiciário, fortemente enraizado na versão original do texto constitucional de 1988. [1]
Por fim, não há que olvidar o fato de que o CNJ não realiza função jurisdicional, apenas administra a efetiva prestação jurisdicional. Neste mister, há, ainda a possibilidade de revisão – relativamente à legalidade e razoabilidade - das decisões do CNJ pelo STF. Nesse sentido, podem ser colacionadas os seguintes termos da ementa da ADI 3.367/DF:
Ação direta. EC 45/2004. Poder Judiciário. CNJ. Instituição e disciplina. Natureza meramente administrativa. Órgão interno de controle administrativo, financeiro e disciplinar da magistratura. Constitucionalidade reconhecida. Separação e independência dos Poderes. História, significado e alcance concreto do princípio. Ofensa a cláusula constitucional imutável (cláusula pétrea). Inexistência. Subsistência do núcleo político do princípio, mediante preservação da função jurisdicional, típica do Judiciário, e das condições materiais do seu exercício imparcial e independente. Precedentes e Súmula 649. Inaplicabilidade ao caso. Interpretação dos arts. 2º e 60, § 4º, III, da CF. Ação julgada improcedente. Votos vencidos. São constitucionais as normas que, introduzidas pela EC 45, de 8-12-2004, instituem e disciplinam o CNJ, como órgão administrativo do Poder Judiciário nacional. Poder Judiciário. Caráter nacional. Regime orgânico unitário. Controle administrativo, financeiro e disciplinar. Órgão interno ou externo. Conselho de Justiça. Criação por Estado-membro. Inadmissibilidade. Falta de competência constitucional. Os Estados-membros carecem de competência constitucional para instituir, como órgão interno ou externo do Judiciário, conselho destinado ao controle da atividade administrativa, financeira ou disciplinar da respectiva Justiça. Poder Judiciário. CNJ. Órgão de natureza exclusivamente administrativa. Atribuições de controle da atividade administrativa, financeira e disciplinar da magistratura. Competência relativa apenas aos órgãos e juízes situados, hierarquicamente, abaixo do STF. Preeminência deste, como órgão máximo do Poder Judiciário, sobre o Conselho, cujos atos e decisões estão sujeitos a seu controle jurisdicional. Inteligência dos arts. 102, caput, I, letra r, e 103-B, § 4º, da CF. O CNJ não tem nenhuma competência sobre o STF e seus ministros, sendo esse o órgão máximo do Poder Judiciário nacional, a que aquele está sujeito.
(ADI 3.367, Rel. Min. Cezar Peluso, julgamento em 13-4-2005, Plenário, DJ de 22-9-2006.)
Finalmente, há apenas que obtemperar a negativa do STF no sentido de conceder ao poder derivado decorrente (poder dos Estados-membros de confeccionar suas próprias constituições) a aptidão de instituir controle externo do Poder Judiciário estadual. Tal entendimento ficou assente no leading case proposto na ADI 135/PB, o qual, por sua vez, deu ensejo ao enunciado nº 649 da Súmula do STF: “É inconstitucional a criação, por constituição estadual, de órgão de controle administrativo do Poder Judiciário do qual participem outros poderes ou entidades.”
3. CONCLUSÃO
A criação do CNJ veio dar o tom da reforma do Poder Judiciário promovida na EC 45/2004: o referido órgão interno do Poder Judiciário nasceu do desejo de administrar a efetividade da prestação jurisdicional.
Nesse sentido, a análise de seu campo de atribuições permite vislumbrar a ausência de qualquer inconstitucionalidade em sua essência. Ao contrário, foi visando à intelecção do âmago da CF/88 que despontou a necessidade de criação de órgão capaz e controlar e uniformizar a atividade administrativa e financeira do Poder Judiciário.
Não cabe, portanto, falar em usurpação de competências jurisdicionais, nem violação aos princípios do pacto federativo ou da separação de Poderes. O CNJ não tem o condão de infringir qualquer norma da CF/88, o contrário, concede efetividade ao seu texto.
BULOS, Uadi Lammego. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva. 6ª Ed. 2011
DALLARI, Dalmo de Abreu. O Poder dos Juízes. São Paulo: Saraiva. 1996.
DINO, Flávio, MELO FILHO; Hugo, BARBOSA, Leonardo; DINO, Nicolao. Reforma do Poder Judiciário: comentários à emenda n° 45/2004. Niterói: Impetus, 2005.
[1] BRANCO, Paulo Gustavo Gonet; COELHO, Inocêncio Mártires; MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional. SARAIVA: São Paulo. 6ª Ed. 2011.
Advogada, Professora de Direito Tributário e Gestão da Regulação na UFRPE, Mestranda em Direito do Estado, Regulação e Tributação Indutora pela UFPE, Pós-Grduação em Direito Tributário pelo IBET e Constituicional pela Universidade Anhagura, Bacharela em Direito pela UFPE.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PEREIRA, Fabiana Augusta de Araújo. CNJ: fonte de efetividade à CF/88 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 fev 2012, 05:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/27934/cnj-fonte-de-efetividade-a-cf-88. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: JAQUELINA LEITE DA SILVA MITRE
Por: Elisa Maria Ferreira da Silva
Por: Hannah Sayuri Kamogari Baldan
Por: Arlan Marcos Lima Sousa
Precisa estar logado para fazer comentários.