1. INTRODUÇÃO
O Preâmbulo de nossa Constituição Federal estabelece que o Estado Democrático Brasileiro destina-se a “assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça”.
Não há sequer um objetivo previsto no Preâmbulo de nossa Constituição que não seja beneficiado pelo desenvolvimento da tecnologia. É notório e sabido que a tecnologia tem alcançado um espaço cada vez maior na sociedade, tornando-se cada vez mais indispensável.
A importância do fator tecnologia despertou o interesse do mercado em obter tais conhecimentos de produção mediante pagamento ou qualquer outra forma de contraprestação, porque se sabe que há a possibilidade de se tirar vantagem (e, ao final, maior lucro) frente aos concorrentes quando se detém certos conhecimentos.
Neste sentido, houve um impulso nas relações comerciais estabelecidas entre países, com diferentes níveis de desenvolvimento econômico e tecnológico, aumentando substancialmente e relevância do chamado know-how.
Enquanto a patente define-se como uma exclusividade de direito, o know-how traduz uma situação de fato, na qual o possuidor de conhecimentos técnicos se coloca em posição vantajosa perante as demais do mercado, alcançando, assim, melhores resultados.
Por muito tempo o know-how não foi objeto de qualquer regulamentação. Isso se deu até a adoção do Agreement on Trade-Related Aspects of Intellectual Property, mais conhecido como TRIPs, no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC). O TRIPs passou a tratar da proteção internacional do know-how, bem como de normas de disseminação de conhecimentos tecnológicos. Atualmente, porém, existem outros dispositivos que regulam o know-how, em âmbito nacional e internacional.
2. A TUTELA JURÍDICA DO KNOW-HOW
Uma das primeiras tentativas de definição do termo se deu com Tullio Ascarelli[1], que se referia à know-how como sendo invenções advindas das atividades industriais mantidas em segredo, sejam artifícios não suscetíveis de tutela, sejam invenções consideradas originais, sem esclarecer ao certo quais seriam as características destes artifícios. Diversas organizações internacionais envidaram esforços para conceituar o termo. Dentre elas, destaca-se a Câmara de Comércio Internacional, que, através da sua comissão para proteção da propriedade industrial, em sessão de 17 de fevereiro de 1961, adotou a seguinte definição para know-how (tradução livre):
“Conhecimentos e experiências técnicas ou conjunto de conhecimentos e experiências técnicas de caráter secreto, necessários para realizar ou colocar em prática certas técnicas que, individualmente ou em associação, servem a objetivos industriais”
Vale observar que há quem defenda o fato de que a não conceituação legal de know-how é proposital. Denis Barbosa cita que Gomez Segade “chega a dizer que 'não deve intentar-se uma definição de Know How válida universalmente (já que tal coisa) poderá prejudicar os países fundamentalmente recebedores de Know-How'”
Em vista da disparidade de conceitos existentes na doutrina, interessante destacar a opinião de alguns especialistas brasileiros no assunto, de forma a estabelecer um entendimento que compreenda todos os aspectos abordados por tais autores.
No Brasil, Denis Borges Barbosa adotou a seguinte definição de know-how[3]:
“O know-how, é assim, o conjunto de conhecimentos disponíveis a respeito do modelo de produção específico de uma empresa, que lhe permite ter acesso a um mercado, manter-se nele, ou nele desfrutar vantagens em relação aos seus competidores.”
Fran Martins[4] explica que know-how pode ser entendido como “certos conhecimentos ou processos, secretos e originais, que uma pessoa tem e que, devidamente aplicados, dão como resultado um benefício a favor daquele que os emprega”.
Ao abordar o tema, Newton Silveira[5] trata da noção de know-how como sendo acessório à patente, ao afirmar que consiste em “um conjunto de regras, procedimentos e práticas que permitem a rápida e vantajosa exploração de uma invenção”.
Maria Helena Diniz[6] entende que o know-how “consiste em certos conhecimentos, técnicas ou processos de fabricação de um produto, secretos e originais, que alguém tem, idôneos para melhorar um produto, tornando-o mais rentável para o seu possuidor.”.
Segundo Luiz Alfredo R. da S. Paulin[7], em sua tese de doutorado Contribuição ao estudo dos contratos internacionais de know-how:
“O know-how é definido como o conhecimento técnico não protegido por patente ou por qualquer outro direito de propriedade industrial, de acesso extremamente restrito, passível de ser transmitido, e que, quando aplicado ao processo produtivo industrial, implica vantagem para seu titular”
Portanto, para fins de conclusão, deve-se estabelecer que o know-how possui, no mínimo, os seguintes elementos: (i) conhecimento técnico; (ii) originalidade e confidencialidade relativas; e (iii) aplicação na indústria ou no comércio.
Pelo exposto, pode-se concluir que o know-how é um conhecimento técnico, aplicável na indústria e no comércio, passível de valoração econômica, que varia conforme o nível de confidencialidade envolvida, transmissível e que, por reunir tais características, traga vantagem competitiva para seu detentor.
3. CONCLUSÃO
Está claro que a importância do fator tecnologia despertou o interesse do mercado em obter tais conhecimentos de produção mediante pagamento ou qualquer outra forma de contraprestação, porque se sabe que há a possibilidade de se tirar vantagem (e, ao final, maior lucro) frente aos concorrentes quando se detém certos conhecimentos.
Em muitos setores industriais como nos casos das indústrias química, aeronáutica e eletrônica, o know-how é considerado elemento fundamental para o crescimento econômico e para o progresso tecnológico.
A primeira conclusão a que se chega após análise dos pontos propostos no presente trabalho é que falar em know-how, em âmbito nacional ou internacional, é falar de um instituto sobremaneira nebuloso.
Vimos o conceito e o regime jurídico do know-how, tanto em âmbito nacional quanto internacional, estabelecendo as diferenças entre este instituto e os demais que envolvem proteção de conhecimento.
Ademais, analisamos os contratos de transferência de know-how, abordando suas principais características, sua natureza jurídica, bem como seus elementos formadores.
Por tudo o que vimos, temos, de um lado, que a evolução das formas de relacionamento em âmbito empresarial e até mesmo das formas de se buscar lucro, nos força a delinear mais o instituto em questão sob pena de frearmos tal evolução e dificultarmos o desenvolvimento econômico; de outro lado, nos deparamos com as dificuldades próprias que o instituto nos trás, tornando sua classificação dentro do ordenamento jurídico um pouco mais complexa.
No entanto, talvez tenha sido este o processo por qual passaram institutos jurídicos considerados corriqueiros hoje em dia. E o que se pretendeu com este trabalho foi dar um passo nesta longa e truncada estrada de configuração de um instituto jurídico.
BIBLIOGRAFIA
1 ASCARELLI, Tullio. Teoria della concorrenza e dei beni immateriali. - p. 567 - Milano: Giuffré, 1960.
BARBOSA, Denis Borges. Da Tecnologia à Cultura – Ensaios e Estudos de Propriedade Intelectual – p. 860 - Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.
3 BARBOSA, Denis Borges. Uma introdução à propriedade intelectual - 2ª edição - p. 650 - Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2003.
4 MARTINS, Fran. Contratos e obrigações comerciais - 14ª edição – p. 499 - Rio de Janeiro: Forense, 1998.
5 SILVEIRA, Newton. Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro - XVI, nova série, n. 26, 1977. p. 90. São Paulo.
6 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direitos Civil Brasileiro - 17ª edição - p. 647 - São Paulo: Saraiva, 2002.
7 PAULIN, Luiz Alfredo R. da S. Contribuição ao estudo dos contratos internacionais de know-how - Tese de doutorado - p. 27 - São Paulo: Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, 1994.
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