RESUMO: Com a evolução do Estado e da sociedade, as relações jurídicas existentes entre aquele e os membros desta se intensificaram, se tornaram mais complexas, sendo necessário o surgimento de mecanismos para o controle e disciplina de tais relações. Faz-se necessário, usando do poder coercitivo que o Estado detém a criação de leis que disciplinem as condutas dos indivíduos, quando da existência de relação jurídica com o Poder Público. Surge em uma dessas relações o Fisco, ou seja, o próprio Estado como arrecadador de tributos, e no outro pólo o indivíduo, denominado contribuinte, pagador de referidos tributos, e consequentemente a necessária legislação disciplinar, aplicável aos contribuintes, concernente à falta de arrecadação, traduzida na sonegação, ou fraude fiscal .É justamente com enfoque nesta relação que surge o propósito desse estudo. Busca-se mostrar a aplicação da legislação tributária concernente às práticas de evasão fiscais, ora configuradas pela supressão, ora pela redução dos tributos. Trata-se claramente de questão que envolve o Direito Penal. No entanto, juntam-se áreas distintas, visto que o conteúdo das condutas incriminadoras encontra-se no âmbito do Direito Tributário, sendo seus conhecedores, por conseguinte, os tributaristas. Enfim a vigente legislação que trata dos crimes contra a ordem tributária, qual seja a Lei 8137 de 27 de dezembro de 1990.
PALAVRAS-CHAVE: Tributos, Pessoas Jurídica, Administração.
1- INTRODUÇÃO
A coerção proposta pelo direito tributário abrange não somente o processo administrativo tributário coercitivo, como também o direito tributário coercitivo em âmbito criminal, trabalhando unidos na apuração dos crimes contra a ordem tributária, na dependência um do outro, ou seja, o processo administrativo tributário coercitivo, apurando e quantificando a lesão propriamente dita à ordem tributária, e o direito tributário coercitivo em âmbito criminal como instrumento para a aplicação das penalidades cabíveis ao transgressor. Observamos a estreita comunicação e, muito comum, a confusão entre o direito tributário coercitivo e o direito penal tributário, porém, exigindo-se uma apurada análise madura destes ramos do direito, como são propostos, para se evitar interpretações equivocadas da legislação em vigor, que trata do tema. Com o constante desenvolvimento da sociedade e a exaustiva carga tributária praticada em nosso Pais, necessária tornou-se, ao legislador, elaborar normas coercitivas que integrassem o sistema tributário de forma independente da legislação penal, evitando-se a constante ocorrência dos equívocos ora constatados na interpretação da Lei. E assim o fez, na iminência de propiciar ao operador do direito uma interpretação exata da essência da Lei n.º 8.137, de 27.12.90 ( Define crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo, e dá outras providências). Com a presente legislação aspirando sua real essência, qual seja a regulamentação das condutas ilícitas contrárias ao ordenamento tributário, tornou-se possível observar quais atividades serão consideradas ilícitas e, conseqüentemente, passíveis de sanção pelo Estado.
2- CRIME CONTRA ORDEM TRIBUTÁRIA
Descrita nos artigos 1° e 2° da aludida Lei, demonstrando o elemento subjetivo de cada uma delas, bem como tratar-se de crimes materiais, vale dizer de resultado ou de dano. Ou de crimes formais, onde se consubstanciam com a mera conduta. Em um segundo momento se faz necessário esclarecer se o processo contra o agente do crime descrito na Lei pode ser instaurado tanto na via administrativa como na penal concomitantemente, ou se primeiro exauri-se totalmente uma para somente depois dar prosseguimento em outra.
O artigo 1 ° da referida lei dispõe que:
Art. 1 ° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório.
Passando a enumerar nos incisos as condutas descritivas do tipo.
Quando falamos em supressão do tributo, ou contribuição social e qualquer estão diante de uma conduta maior, mais grave por parte do agente, visto que com a supressão o agente busca o não pagamento da integralidade do que é devido; diferentemente do que ocorre com a redução, onde age unicamente com o propósito de diminuir o valor a ser pago. Independentemente de qual das situações pratique, as duas integram-se para formar a figura delitiva.
O inciso l do artigo em estudo enumera a primeira conduta, qual seja: omitir informação ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias.
“De se notar que o crime se configura quando o sujeito ativo omite declaração que deveria fazer nos livros fiscais obrigatórios, talonários de notas fiscais, documentos de entrada e saída de mercadorias, dentre outros, ou então as declara falsamente" (Sabbag, ob. Cit. p. 68).
Nesta última hipótese, ocorre o crime comissivo, ou seja, o sujeito o pratica fazendo alguma coisa. Existe uma ação por parte do agente. Pode ocorrer também que o agente omita declaração obrigatória, modalidade esta que configura um crime omissivo, onde, há a abstenção na realização de um ato. Aqui não há de se falar em tentativa, visto que a conduta omissiva do agente é o próprio crime. Importante mencionar que tanto numa como noutra conduta o dolo é específico, onde o agente tem um fim específico almejado, ou seja, a vontade de praticar um fato e produzir um fim especial.
A conduta típica do inciso II do artigo 1 ° anotada por José Cassiano Borges e Maria Lúcia Américo dos Reis (1999, p. 124) "consiste em 'fraudar a fiscalização tributária', mediante a inserção de 'elementos inexatos', ou 'omitindo operação de qualquer natureza, em documentos exigidos pela lei fiscal". Da mesma forma como ocorre no inciso anterior, temos também duas condutas. Uma delas ocorre quando o sujeito passivo da obrigação tributária (sujeito ativo do crime em tela) insere em livros ou documentos fiscais (ou seja, aqueles exigidos por lei) elementos inexatos. Há, por conseguinte uma conduta comissiva por parte do agente. Outro lado tem uma conduta omissiva, caracterizadora do crime omissivo. Esta surge na segunda parte do inciso. O agente omite informações acerca de suas operações, ou seja, deixa de registrar as próprias operações nos documentos ou livros fiscais. Há de se levar em consideração nas duas situações a verdadeira intenção do agente, qual seja, a "supressão" ou "redução" do tributo. Nota-se que novamente se faz presente o dolo (vontade) sendo este específico.
Reza o inciso III do artigo 1° do Coctex:
Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas:
III - falsificar ou alterar nota fiscal fatura duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operação tributável.
A vontade livre e consciente do agente mais uma vez se faz presente, especializando o dolo. O sujeito ativo da conduta delituosa, quando da ocorrência da falsificação do documento, comete um "falso ideológico", haja vista que insere dados que não existem em documentos exigidos pelo Fisco. Pode ocorrer uma segunda conduta, que se configura quando o sujeito passivo da obrigação tributária altera um documento. No entanto, o documento não é falso, este existe. O que é falso é os dados inseridos em tal documento, visando única e exclusivamente evadir-se do exigido pelo Fisco.
O inciso IV do artigo 1° enumera várias condutas, quais sejam: "elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento falso ou inexato".
Passaremos a estudar separadamente cada conduta do inciso supra citado: A primeira delas trata da "elaboração" de documentos falsos. O agente manda confeccionar em estabelecimento gráfico notas fiscais às quais não têm autorização para serem fabricadas. Não significa dizer que o sujeito já cometeu o crime ao confeccioná-la, visto que se o documento não for utilizado para fraudar o Fisco, suprimindo ou reduzindo o tributo ou contribuição social e qualquer acessório, não há de se falar em crime contra a ordem tributária, no qual exige a ação final do sonegador, qual seja a "supressão" ou "redução" do tributo.
Uma segunda conduta surge com o ato de "distribuir". Esta se assemelha muito com a anterior. A diferença existente para com aquela é que nesta o emitente dos documentos são empresas idôneas, podendo emitir tais documentos, enquanto que aquelas não têm autorização para a confecção dos documentos fiscais. Importante notar que o colaborador da pessoa que falsifica os documentos "também é autor do delito pouco importando que não se descubra a origem dele e o seu criador"Na modalidade "fornecer" documentos falsos há uma situação mais complexa por parte do autor, visto que para o fornecimento dos falsos documentos o agente constitui empresas fictícias, usando até mesmo de documentos pessoais falsos. Essas empresas geralmente são registradas nos órgãos competentes, obtendo a autorização para fazer documentos (talonários de notas fiscais, por exemplo), os quais são falsos, fornecendo-res pessoas que queiram sonegar.
A quarta conduta delituosa se configura pela "emissão" de documentos fiscais falsos. Ocorre estreita aproximação com a conduta anterior, pois para fornecer documentos falsos ou inexatos, a empresa precisa emiti-los.
A última modalidade se consubstancia pela "utilização". O agente usa de nomes ou documentos que não existem para a criação de uma empresa, sendo esta regularizada nos órgãos competentes As condutas elencadas neste inciso são bilaterais, visto que quem elabora ou confecciona os documentos falsos ou inexatos nem sempre os utilizará, cassando para um outro, que realizará a fraude contra o Fisco.
A conduta existente no inciso V do artigo 1°, diz respeito ao ato de:
Art. 1º[...]
V - negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativa à venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação.
Dessa forma, a conduta delitiva existe quando o sujeito age com a vontade específica (e aqui surge mais uma vez o dolo específico) de "suprimir" ou "reduzir" o tributo devido à Fazenda Pública. O agente pode cometer duas condutas em tal crime: a primeira omissiva, onde o sujeito nega-se a fornecer documentos exigidos pelo Fisco; a segunda, comissiva, ocorre quando o documento é apresentado, no entanto, em desacordo com a legislação específica. Os crimes acima descritos são tidos como crimes materiais ou de dano, onde há o efetivo resultado, caracterizado pela supressão ou redução do tributo, causando efetivo prejuízo para a Fazenda Pública. Resta-nos esclarecer que os crimes do artigo 2º também são praticados por particulares contra a ordem tributária. O legislador, neste caso, usando de técnica equipara os crimes deste artigo aos elencadas no artigo 1°, caput.
Art. 2° [...]
l - fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre renda, bens ou fatos, ou empregar outra fraude, para eximir-se, total ou parcialmente, de pagamento de tributos.
O que ocorre neste delito é a declaração ou omissão de bens que o contribuinte possui. O sujeito neste caso até reconhece a situação de fato que gera o tributo, ou seja, o fato gerador que possibilita o lançamento, por parte do Fisco, do que deve ser recolhido para o Erário. O sujeito chega a recolher o tributo espontaneamente, mas, no entanto, o fato gerador da obrigação tributária está declarado falsamente, ou houve a sua omissão, visto que nem sempre a Fazenda Pública virá conferir se o montante recolhido está correto diante da verdadeira situação de riqueza que o contribuinte possui. Deixando de recolher o valor dos tributos ou contribuição social no prazo legal, o sujeito comete a conduta típica constante no inciso II do artigo em estudo. O fato de o sujeito reter o dinheiro que deveria repassar para os Cofres Públicos fará com que incorra no crime de apropriação indébita por equiparação, pois se apropria indevidamente do que não é seu, e sim do Poder Público.Importante considerar que aqui surge a figura do responsável pelo pagamento da obrigação tributária, ou seja, o sujeito passivo indireto.
No inciso III encontramos três condutas: "exigir, pagar ou receber".
Quando se pune o sujeito peia prática de exigir, pagar, ou receber para si ou para contribuinte beneficiário, qualquer percentagem sobre a parcela dedutível, ou deduzida de imposto ou de contribuição como incentivo fiscal, a lei busca impedir o comércio de incentivos fiscais, pois estes devem ser aplicados na própria empresa, para aumentar seu capital, melhorando sua capacidade de produção.
Segundo José Cassiano Borges e Maria Lúcia Américo dos Reis (apud CORRÊA, 1996.) qual o momento consumativo das três condutas a considerar:
- No primeiro caso, ou seja, na exigência de percentagem sobre a parcela dedutível, o momento ativo do delito só poderá ser aquele em que ocorre não só a solicitação, mas também a efetiva ação de lançamento a favor da empresa beneficiária do valor deduzido, pois, sem essa simultaneidade, seria um delito impossível de ter ocorrido.
- No segundo caso, que importa em pagar para o contribuinte qualquer percentagem sobre a parcela dedutível, o momento consumativo se dará com a transferência de vantagem financeira, decorrente de incentivo, para o contribuinte.
- No terceiro caso, que importa em receber importância sobre a parcela dedutível, o crime pressupõe o encontro de duas vontades, pois se há quem recebe, há também quem paga percentagem sobre a parcela dedutível. Por conseguinte, tanto quem pagou como quem recebeu coloca-se na condição de sujeito ativo do delito. O momento consumativo ocorre com o recebimento para si ou para outrem.
Constitui crime, em consonância ao inciso IV do artigo 2° da aludida Lei:
Art. 2° Constitui crime da mesma natureza:
IV - deixar de aplicar, ou aplicar em desacordo com o estatuído, incentivo fiscal ou parcelas de imposto liberadas por órgão ou entidade de desenvolvimento.
Quando o sujeito deixa de aplicar o incentivo fiscal ou as parcelas de imposto, caracteriza-se o crime omissivo, visto que há uma omissão por parte do agente. Por outro lado, a modalidade passa a ser comissiva, quando o agente, depois de recebido o incentivo, o desvia de sua verdadeira finalidade na qual deveria ser aplicado.
O quinto e último inciso do artigo 2° da lei 8.137/90 dispõe:
Art. 2° Constitui crime da mesma natureza:
V - utilizar ou divulgar programa de processamento de dados que permita ao sujeito passivo da obrigação tributária possuir informação contábil diversa daquela que é, por lei, fornecida à Fazenda Pública.
Com o programa de processamento de dados ficou possível a escrituração de um "caixa dois". O sujeito manipula o programa, fazendo surgir uma contabilidade paralela. A conduta alcança tanto o sujeito passivo da obrigação tributária, como também terceiros que estão a serviço dele praticando tal conduta. A pessoa que divulga o programa, fazendo propaganda, também responde pelo crime, mesmo que não seja o sujeito passivo da obrigação tributária. Trata-se, neste caso de crime de mera conduta, onde somente a propaganda do programa já o consubstancia.
3- EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE
A extinção da punibilidade dos crimes contra a ordem tributária (sonegação fiscal) era disciplinada pelo artigo 14 da Lei n.º 8137/90 que determinava que o pagamento do débito tributário feito antes do recebimento da denúncia criminal era causa excludente da punibilidade, mas foi revogado pelo art. 98 da Lei n.º 8.383/91. O art. 34 da Lei nº 9.249/95, contudo, voltou a admitir a mencionada extinção da punibilidade.
Quanto à extinção da punibilidade do crime de apropriação indébita previdenciária, temos que o § 2o , do artigo 168-A do Código Penal determina que "é extinta a punibilidade se o agente, espontaneamente, declara, confessa e efetua o pagamento das contribuições, importâncias ou valores e presta as informações devidas à previdência social, na forma definida em lei ou regulamento, antes do início da ação fiscal."
Neste diapasão, é importante observar que o autor de um crime contra a ordem tributária (sonegação fiscal) poderia ter extinguido a sua punibilidade, desde que pagasse o débito tributário até o recebimento da denúncia. Quanto ao crime de apropriação indébita, o autor do crime só teria a extinção de sua punibilidade se efetuasse o pagamento do débito fiscal até o início da ação fiscal.
Ocorre que a partir da promulgação da Lei n.º 10.684, de 30 de maio de 2003 a extinção da punibilidade nos crimes de sonegação fiscal e apropriação indébita previdenciária ganhou novo regramento. O dispositivo que trouxe a inovação foi o artigo 9º, in verbis:
Art. 9o É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos nos arts. 1o e 2o da Lei no 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168A e 337A do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, durante o período em que a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no regime de parcelamento.
§ 1o A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da pretensão punitiva.
§ 2o Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos neste artigo quando a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e contribuições sociais, inclusive acessórios.
Frise-se que o dispositivo legal supracitado não faz qualquer menção ao recebimento da denúncia, silenciando, igualmente, quanto ao momento processual em que o pagamento integral do débito pode ser feito, com a conseqüência extinção da punibilidade.
Neste sentido, aquele contribuinte que cometeu qualquer um dos crimes acima mencionados poderá ver sua punibilidade extinta, desde que ultime o pagamento do tributo devido, mesmo que seja após o recebimento da denúncia.
4- RESPONSABILIDADE PENAL
No que respeita à responsabilidade penal, necessário é fazer distinção desta, com a responsabilidade tributária. Com efeito, a natureza civil da segunda permite sejam alcançados patrimonialmente qualquer daqueles que figurem no quadro social da pessoa jurídica, sem que seja necessário cogitar-se de sua participação ou não nos eventos que tenham ensejado a evasão fiscal ilícita. Diferente é o quadro, no que concerne à responsabilidade penal, uma vez vigente, nesta seara, os princípios constitucionais da intranscendência - art. 5º, inc. XLV - e da individualização da pena - art. 5º inc. XLVI - todos da Constituição Federal de 1988.
A responsabilidade pela prática dos delitos contra a ordem tributária é idêntica à do direito penal comum. O legislador, neste caso, apenas deu especial destaque ao crime cometido através da pessoa jurídica, que é a regra tratando-se de delitos fiscais.
Desta forma, “quem, de qualquer modo, inclusive por meio de pessoa jurídica, concorre para os crimes definidos nesta Lei, incide nas penas a estes cominadas, na medida de sua culpabilidade” (art. 11, da Lei nº 8.137/90)
No que concerne à responsabilidade penal, interessante é a questão relativa aos efeitos penais do pagamento do tributo e consectários. O tratamento dado pela lei revela o bem jurídico protegido pela norma. Assim, a se emprestar natureza extintiva da punibilidade ao pagamento se está erigindo como bem jurídico a ser protegido a higidez financeira da Fazenda Pública, vale dizer, protege-se singelamente o Erário, salvaguardando o ingresso dos valores, e reforçando tal ingresso, pelo aceno, ao sujeito passivo, de renúncia, por meio de lei, ao jus puniendi. Por outra banda, em situações nas qual o pagamento não possua tal efeito extintivo, o bem jurídico protegido vem a ser a moralidade no trato com a publica, em sentido lato, tendo como suposto que a conduta sonegatória, a par de patrimonialmente lesiva, vem a ser condenável por ensejar indevida disposição, pelo particular, de bem público, contrariando princípios caros ao ordenamento jurídico, como os da igualdade e da livre concorrência. Neste passo, feridos tais primados, a mera recomposição patrimonial seria insuficiente para a prevenção e repressão, inibidoras de futuras condutas do mesmo teor. A oscilante tratativa emprestada a matéria, ora caminhando em um sentido, ora em outro, bem demonstra o quão mal resolvida é a questão, em nível político. No que respeita à responsabilidade penal, necessário é fazer distinção desta, com a responsabilidade tributária. Com efeito, a natureza civil da segunda permite sejam alcançados patrimonialmente qualquer daqueles que figurem no quadro social da pessoa jurídica, sem que seja necessário cogitar-se de sua participação ou não nos eventos que tenham ensejado a evasão fiscal ilícita. Diferente é o quadro, no que concerne à responsabilidade penal, uma vez vigente, nesta seara, os princípios constitucionais da intranscendência - art. 5º, inc. XLV - e da individualização da pena - art. 5º inc. XLVI - todos da Constituição Federal de 1988.
5- COMPETÊNCIA
É da Justiça Comum Estadual. Quando o interesse da União for afetado (art.109,CF), a competência será da Justiça Federal. Ação penal . É pública incondicionada ( ART. 15, Lei 8137/90).SÚMULA 609 DO STF : é pública incondicionada a ação penal por crime de sonegação fiscal. Não depende de qualquer condição de procedibilidade como se verá adiante.
6- PENA
Pena prevista na Lei 8137/90: para as condutas descritas nos incisos I a V do artigo 1º, a pena é de reclusão de 2(dois) a 5(cinco) anos e multa , enquanto para aquelas estabelecidas no artigo 2º, incisos I a V, a pena é de detenção de 6(seis) meses a 2(dois) anos e multa. A pena de multa está prevista no seu artigo 8º e será fixada entre 10(dez) e 360(trezentos e sessenta) dias-multa. O dia-multa, segundo o parágrafo único do artigo 8º, será fixado pelo juiz em valor não inferior a 14(catorze) nem superior a 200(duzentos) BTN-Bonus do Tesouro Nacional. As penas foram estipuladas pelo legislador para condutas que têm a mesma gravidade. Pelo disposto no artigo 10 as penas pecuniárias poderão ser diminuídas até a décima parte ou elevadas ao décuplo caso o juiz, considerado o ganho ilícito e a situação econômica do réu,verifique a insuficiência ou excessiva onerosidade do quantum previsto no artigo 8º. Substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos: Cabível é a substituição, segundo as regras dos artigos 44 e 45 do Código Penal pátrio, podendo, ainda, fazer-se a reconversão prevista no artigo 45 do mesmo Código. A pena de multa da Lei 8137/90:A Lei 8137/90 estabeleceu a pena de multa em BTN.Ora,o BTN foi extinto pela Lei 8177/91 e nenhum outro referencial o substituiu.RUI STOCO,in LEIS PENAIS ESPECIAIS E SUA INTERPRETAÇÃO JURISPRUDENCIAL, editora RT,entende que o julgador não poderá impor pena de multa, de caráter penal, visto que o BTN, utilizado para estabelecer o valor do dia-multa,foi extinto,não cabendo a incidência de nenhuma outra unidade de valor, ficando, assim, o julgador impedido de impor ao réu pena pecuniária, cumulada com a pena privativa de liberdade.Correta tal interpretação, a nosso ver.Conversão da pena privativa de liberdade em multa: Socorrendo-nos , ainda , do jurista STOCO,op.cit,a respeito do tema, acentua ele que há disposição expressa autorizando a conversão da pena privativa de liberdade em multa, hipótese que beneficiará o réu(art.9º da Lei 8137/90).O complicador para a hipótese aventada diz respeito à extinção do BTN.Se o BTN não mais existe, ficará o julgador impedido de proceder a conversão ? De acordo com STOCO a conversão será benéfica ao réu e, sendo benéfica, deverá o julgador buscar em outro dispositivo de natureza penal o parâmetro econômico para a fixação do valor do dia-multa, isto é, deverá se tomar o valor do dia-multa fixado em “um trigésimo do maior salário-mínimo mensal vigente ao tempo do fato, não superior a cinco vezes esse salário”, nos termos do artigo 49,§ 1º,do Código Penal,por força do artigo 12 do mesmo diploma legal.Ocorre que o artigo 9º da Lei 8137/90 apenas autoriza a conversão nos casos dos crimes previstos nos artigos 4º,5º,6º e 7º,que são os delitos contra a ordem econômica e as relações de consumo
7 - CONCLUSÃO
Ante todo o expendido, podemos concluir que definitivamente o direito tributário coercitivo deve ser interpretado de forma independente do direito penal, nos crimes contra a ordem tributária, o que vem sendo pacificado na doutrina e jurisprudência brasileira.
Embora intimamente ligados, a individualização dos meios coercitivos do direito tributário tem eficácia visível nos tribunais e entre os doutrinadores tributaristas, observamos a independência deste poder coercitivo aplicado na legislação nacional.
Dado o que foi exposto pelo presente estudo, conclui-se que os crimes contra a ordem tributária podem ser praticados ora por particulares, ora por funcionários públicos, e se configuram com a supressão ou com a redução dos tributos. Os crimes contra a ordem tributária elencadas no artigo 1° da Lei 8.137/90, os quais são praticados por particulares, são crimes materiais, vale dizer, de dano ou resultado, que necessitam para sua configuração de efetiva ocorrência de prejuízo (dano) à Fazenda Pública. As condutas descritas no artigo 2° da aludida Lei são equiparadas às do artigo anterior, no entanto, trata-se de crimes formais, em que não há necessidade de resultado para a configuração da conduta típica. O dolo, que se faz presente em todas as condutas, é "específico", sendo elemento essencial do tipo, visto que o agente age única e exclusivamente com a intenção de fraudar a Fazenda Pública, quer suprimindo ou reduzindo o valor do tributo, não sendo possível a modalidade culposa. Para que seja imposta a sanção penal ao agente, necessário se faz o total exaurimento da via administrativa, a fim de que se evite a ocorrência de decisões conflitantes, pois este poderia ser considerado inocente numa das vias (administrativa) e culpado na outra (judicial).
REFERÊNCIA BILBIOGRÁFICA
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BASTOS. Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Celso Bastos, 2002.
BORGES, José Cassiano; REIS, Maria Lúcia Américo dos. Crimes Contra a Ordem Tributária: Pareceres. 1. ed. Rio de Janeiro: Forense. 1998.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988: atualizada até a Emenda Constitucional número 45, de 8 de dezembro de 2004. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.
BRASIL. Lei n° 8.137, de 12 de outubro de 1990. Define crimes contra a ordem tributária, económica e contra as relações de consumo, e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, 28 de dezembro de 1990, p. 25534. Disponível em: <https.7/www.planalto.gov.br/>.
CAPEZ, Fernando. Direito Penal: Parte Geral. 9. ed. São Paulo: Paloma, 2002, vol. 1.
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SABBAG, Eduardo de Moraes. Direito Tributário. São Paulo: Premier, 2002.
Bacharelanda do Curso de Direito da Faculdade AGES.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVEIRA, Ana Claudia Santana Dórea. Ordem Tributaria Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 12 out 2012, 14:20. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/31868/ordem-tributaria. Acesso em: 22 nov 2024.
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