O modelo tradicional de escritórios de advocacia
É sabido que a grande maioria dos escritórios de advocacia, sobretudo em regiões não metropolitanas, são formados por advogados que exercem “artesanalmente” o ofício autorizado pela Ordem dos Advogados do Brasil, isto é, sem estrutura gerencial, tática e operacional formalizada.
Dessa forma, esses advogados convencionais obtêm os honorários advocatícios como forma de subsistência própria e quitação de despesas básicas com a estrutura de escritório, como fornecimento de água, energia elétrica, serviço de provedor de internet, manutenção de mobiliário, entre outras, além do pagamento de colaboradores como secretárias, estagiários, etc.
Nessa direção, todos os valores excedentes ao pagamento de despesas são embolsados pelos sócios do escritório de advocacia, a depender do valor dos serviços prestados, que poderá resultar na obtenção de valores expressivos pelos sócios, porém, com limitação à capacidade pessoal dos colaboradores, sem a estrutura de apoio própria aos modelos empresariais, restringindo o crescimento e o desenvolvimento de sua estrutura.
Os escritórios empresariais de advocacia
Por outro viés, existem escritórios de advocacia pautados pela gestão empresarial, com a padronização de procedimentos e potencial crescimento da estrutura gerencial e tática, com a destinação dos recursos auferidos ao reinvestimento contínuo, com a ampliação de sua estrutura, a fim de potencializar a capacidade de geração de capital, bem como suportar as obrigações assumidas e as consequências que possam acarretar à oneração do escritório de advocacia.
Apesar deste modelo aderir à proposta empresarial de modernização da estrutura de escritórios de advocacia tornando-o um empreendimento quanto à prestação de serviços advocatícios, não abandona a clássica confiabilidade e o trabalho personalizado dos escritórios de advocacia.
Ademais, frise-se que o principal diferencial entre o modelo tradicional e o modelo de índole empresarial é a atribuição do advogado como empresário, ainda que no exercício da atividade advocatícia, nos moldes estabelecidos pelo Direito Empresarial, especificamente pelo direcionamento dado pelo Código Civil Brasileiro, explicitado a seguir.
Os Elementos de empresa
Conforme o artigo 966 do Código Civil Brasileiro, “Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços.”. Desse modo, a legislação civilista exige para a definição como empresa – que deriva do conceito de empresário – a existência do perfil objetivo (patrimonial), subjetivo, funcional e corporativo pelo empreendimento.
O perfil objetivo diz respeito ao conjunto de bens que integram o estabelecimento empresarial, vislumbrado como a estrutura necessária ao desenvolvimento da atividade econômica organizada para a prestação ou circulação de bens ou serviços.
Quanto ao perfil subjetivo, consubstancia-se na pessoa do empresário, como pessoa física ou jurídica apta a exercer profissionalmente, ou seja, com habitualidade a atividade-fim do empreendimento.
Acerca do perfil funcional, corresponde à atividade exercida, sendo que a expressão “empresa” de maneira técnica, é compreendida pelo direito empresarial como a atividade propriamente dita e não como o todo empresarial, como utilizado atécnica e popularmente.
Por último, o perfil corporativo são os colaboradores que contribuem para o exercício da atividade econômica organizada pelo empresário, remunerados por este, que usufrui do produto do trabalho destes colaboradores. Nesse sentido, Rodrigo Valente Mota argui que o perfil corporativo
“[...] admite que a empresa seria considerada uma instituição, na medida em que reúne pessoas – empresários e seus empregados – com propósitos comuns, formando um núcleo social organizado, em função de um fim econômico comum: a obtenção do melhor resultado econômico na produção.”
No entanto, o parágrafo único do artigo 966 do Código Civil Brasileiro destaca que “não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa.”
Dessa feita, o profissional que exerce atividade intelectual, que inclui os advogados e consultores jurídicos de escritórios de advocacia, desde que tenham incorporado os perfis objetivo, subjetivo, funcional e corporativo, são aptos a serem considerados como empresários, que exercem profissionalmente atividade econômica organizada.
Ressalvas ético-legais e a compatibilização com o Direito de Empresa
O Código de Ética e Disciplina da OAB explicita no artigo 5º que “O exercício da advocacia é incompatível com qualquer procedimento de mercantilização.” Ademais, a lei 8.906/1994 que positivou o Estatuto da Ordem dos Advogado do Brasil, ressalta em seu artigo 16 que as sociedades de advogados “Não são admitidas a registro, nem podem funcionar, as sociedades de advogados que apresentem forma ou características mercantis, que adotem denominação de fantasia, que realizem atividades estranhas à advocacia, que incluam sócio não inscrito como advogado ou totalmente proibido de advogar.”
Nesse compasso, os regramentos estabelecidos pela Ordem dos Advogados do Brasil vedam a mercantilização da atividade jurídica, ou seja, a prática desenfreada de promoções, publicidade imoderada, ou seja, como se a advocacia fosse vista como uma feira, com destaque ao preço e custo-benefício do que propriamente à qualidade profissional inerente ao escritório de advocacia.
Destarte, cumpre salientar que a vedação quanto à mercantilização não se confunde com a transformação do escritório de advocacia em empreendimento adequado às necessidades de incorporação de gestão empresarial no intuito de ampliar suas atividades, dando sustentabilidade ao crescimento da amplitude da aptidão quanto ao exercício da advocacia pelos advogados-sócios do escritório.
Interessante o posicionamento de Marco Antônio P. Gonçalves indicando que
“[...] as empresas-clientes passaram a exigir mais de seus escritórios e, sob certos aspectos, querem se ver refletidas neles. Em outras palavras, elas querem ser atendidas por um escritório que preze a mesma eficiência que elas. Somente com uma mentalidade empresarial é que os escritórios triunfarão nessa nova realidade que, na verdade, já não é tão nova assim.”
Ademais, complementa que
“a questão é que os escritórios são negócios que precisam ser administrados com eficiência para que se desenvolvam da melhor maneira possível, criando relacionamentos duradouros com clientes satisfeitos e faturando o suficiente para cobrir suas operações e remunerar seus funcionários, advogados e sócios.
No entanto, cabe frisar que, apesar de ser compatível a atividade advocatícia como atividade empresarial, apresenta restrições quanto ao marketing jurídico e outras áreas do segmento empresarial que devem ser restritos à sobriedade e à manutenção do prestígio inerente ao exercício da advocacia.
Dessa feita, cumpre ao advogado que exerça a atividade de prestação de serviços jurídicos atrelado a uma estrutura empresarial não extrapole os limites ético-legais da advocacia, impedindo que o exercício da atividade empresarial pelo advogado descambe para a mercantilização da atividade jurídica.
Referências
COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial. 22. Ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
GONÇALVES, Marco Antônio P. Quer goste ou não, escritório de advocacia é uma empresa. Revista Consultor Jurídico. 20 de dezembro de 2006. Disponível em: < http://www.conjur.com.br/2006-dez-20/goste_ou_nao_escritorio_advocacia_empresa>. Acesso em 07 de nov. de 2012.
MOTA, Rodrigo Valente. O Perfil Conceitual da Empresa e do Empresário no Direito Brasileiro. Universo Jurídico, Juiz de Fora, ano XI, 23 de jul. de 2008.
Disponivel em: < http://uj.novaprolink.com.br/doutrina/5568/o_perfil_conceitual_da_empresa_e_do_empresario_no_direito_brasileiro >. Acesso em: 10 de nov. de 2012.
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