Advogados de um distrito indiano local onde uma jovem estudante foi estuprada por vários homens afirmaram em toda imprensa mundial que não representarão os seis detidos, acusados de estupro com resultado morte de uma jovem de apenas 23 anos, de acordo com a CNN e o site de notícias Terra.
Afirmam ainda que os 11 advogados que compõem o conselho executivo da Associação Saket Bar afirmaram não representar os acusados por conta da gravidade do crime, que provocou protestos por todo o país e chamou a atenção mundial. Além disso, a associação apelou para que seus 7 mil membros também se recusem a defender os acusados, de acordo com o seu presidente, Rajpal Kasana. “Nós não estamos pegando esse caso por razões de humanidade”, disse.
Esta notícia me fez pensar sobre o papel do advogado criminalista e de sua entidade de classe. É óbvio que este delito chocou a sociedade indiana, principalmente pela forma como foi realizado. Entretanto, não pode uma entidade de classe orientar seus membros a não defender determinado acusado com base na gravidade do delito.
Inicialmente porque, no Brasil, o art. 133 da Constituição Federal afirma ser o advogado “indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no limite da lei”. Ora, sem advogado não há defesa criminal, sem defesa não há processo e sem processo não há julgamento justo.
Logo, nenhum órgão de classe deve determinar aos seus membros que não exerçam sua profissão em determinados casos, principalmente para que se mantenha a independência funcional do advogado.
Entretanto, alguém haverá de defender estes jovens acusados de tão grave delito, sob pena de não haver processo criminal. Espero que se seja um advogado criminal... E, neste caso, não se pode confundir o criminalista com o criminoso, muito menos, enlear a sagrada missão da defesa criminal com a abominável cumplicidade de colaborar com o crime.
O criminalista é um sacerdote, e, como sempre assevera Luiz Flávio Borges D’Urso, como sacerdote, deve odiar o pecado, mas amar o pecador. Deve repudiar o crime, mas acolher sob o manto da defesa o acusado da conduta criminosa. Isso fica evidente quando alguém comete um delito e, nesta hora, todos se afastam dele. Afastam-se os parentes, os amigos, a mulher, os filhos, esquecendo que dentro daquela figura vilipendiada, desfigurada pelo crime, existe uma alma, um resquício da própria imagem de divina.
Quando todos o abandonam, o criminalista está ao seu lado, quando todos lhe deram as costas, inclusive o próprio órgão de classe, quando todos o incriminam com o dedo em riste, quando todos o acusam, encontrará o ombro, os ouvidos, o coração e a beca do criminalista como uma armadura sempre pronta para a guerra do processo criminal.
Espero que esse criminalista indiano seja um homem corajoso, firme em suas colocações, estudioso, homem de fibra que guerreia com a palavra, honesto, destemido e de coração pulsante, mas com a sensibilidade capaz de entender todos os estados da alma humana. Homem de luta, e a luta deverá ser o sangue que corre nas suas veias, pois desafiará a todos, inclusive sua própria entidade de classe.
Com isso não estará o criminalista protegendo o criminoso, ou fazendo chicana da justiça. Com isso não estará o criminalista colocando lobo em pele de cordeiros, mas sim garantindo ao réu um julgamento pautado na legalidade e na justiça, buscando a pena na sua medida certa quando o acusado for realmente culpado. E, somente dessa forma, poderá se aproximar do Nazareno quando afirmou: “Eu não vim pelos santos nem pelos sábios, eu vim pelos pecadores”.
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