I – INTRODUÇÃO.
Trata de artigo para analisar qual será o procedimento adequado no que se refere aos períodos de gozoda licença por motivo de doença em pessoa da família concedidos aos servidores públicos, com ou sem prejuízo da remuneração, em face das alterações constantes do art. 83 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990.
II – DESENVOLVIMENTO.
Inicialmente, para facilitar a compreensão do que se quer mostrar no presente texto, faz-se necessário transcrever todas as redações que o art. 83, parágrafos e incisos, da Lei nº 8.112/90 teve para depois adentrar no tema em si, in verbis:
Texto Original
Art. 83. Poderá ser concedida licença ao servidor por motivo de doença do cônjuge ou companheiro, padrasto ou madrasta, ascendente, descendente, enteado e colateral consangüíneo ou afim até o segundo grau civil, mediante comprovação por junta médica oficial.
§ 1° A licença somente será deferida se a assistência direta do servidor for indispensável e não puder ser prestada simultaneamente com o exercício do cargo.
§ 2° A licença será concedida sem prejuízo da remuneração do cargo efetivo, até 90 (noventa) dias, podendo ser prorrogada por até 90 (noventa) dias, mediante parecer de junta médica, e, excedendo estes prazos, sem remuneração.
Lei nº 9.527/97
Art. 83. Poderá ser concedida licença ao servidor por motivo de doença do cônjuge ou companheiro, dos pais, dos filhos, do padrasto ou madrasta e enteado, ou dependente que viva às suas expensas e conste do seu assentamento funcional, mediante comprovação por junta médica oficial.(Redação dada pela Lei nº 9.527, de 10.12.97)
§ 2º A licença será concedida sem prejuízo da remuneração do cargo efetivo, até trinta dias, podendo ser prorrogada por até trinta dias, mediante parecer de junta médica oficial e, excedendo estes prazos, sem remuneração, por até noventa dias. (Redação dada pela Lei nº 9.527, de 10.12.97)
Medida Provisória nº 441/2008
Art. 83. Poderá ser concedida licença ao servidor por motivo de doença do cônjuge ou companheiro, dos pais, dos filhos, do padrasto ou madrasta e enteado, ou dependente que viva às suas expensas e conste do seu assentamento funcional, mediante comprovação por perícia médica oficial. (Redação dada pela Medida Provisória nº 441, de 2008)
§ 2º A licença será concedida, sem prejuízo da remuneração do cargo efetivo, por até trinta dias, podendo ser prorrogada por até trinta dias e, excedendo estes prazos, sem remuneração, por até noventa dias. (Redação dada pela Medida Provisória nº 441, de 2008)
§ 3º Não será concedida nova licença em período inferior a doze meses do término da última licença concedida. (Incluído pela Medida Provisória nº 441, de 2008)
Lei nº 11.907/2009
§ 2º A licença será concedida, sem prejuízo da remuneração do cargo efetivo, por até 30 (trinta) dias, podendo ser prorrogada por até 30 (trinta) dias e, excedendo estes prazos, sem remuneração, por até 90 (noventa) dias. (Redação dada pela Lei nº 11.907, de 2009)
§ 3º Não será concedida nova licença em período inferior a 12 (doze) meses do término da última licença concedida. (Incluído pela Lei nº 11.907, de 2009)
Medida Provisória nº 479/2009
§ 2º A licença de que trata o caput, incluídas as prorrogações, poderá ser concedida a cada período de doze meses nas seguintes condições: (Redação dada pela Medida Provisória nº 479, de 2009)
I - por até sessenta dias, consecutivos ou não, mantida a remuneração do servidor; e (Incluído pela Medida Provisória nº 479, de 2009)
II - por até noventa dias, consecutivos ou não, sem remuneração. (Incluído pela Medida Provisória nº 479, de 2009)
§ 3º O início do interstício de doze meses será contado a partir da data do deferimento da primeira licença concedida. (Redação dada pela Medida Provisória nº 479, de 2009)
§ 4º A soma das licenças remuneradas e das licenças não remuneradas, incluídas as respectivas prorrogações, concedidas em um mesmo período de doze meses, observado o disposto no § 3º, não poderá ultrapassar os limites estabelecidos nos incisos I e II do § 2º. (Incluído pela Medida Provisória nº 479, de 2009)
E a redação atual do mencionado dispositivo legal, alterada pela Medida Provisória nº 479, de 2009, convertida na Lei nº 12.269/2010, é a seguinte:
Art. 83. Poderá ser concedida licença ao servidor por motivo de doença do cônjuge ou companheiro, dos pais, dos filhos, do padrasto ou madrasta e enteado, ou dependente que viva a suas expensas e conste do seu assentamento funcional, mediante comprovação por perícia médica oficial. (Redação dada pela Lei nº 11.907, de 2009)
§ 1o A licença somente será deferida se a assistência direta do servidor for indispensável e não puder ser prestada simultaneamente com o exercício do cargo ou mediante compensação de horário, na forma do disposto no inciso II do art. 44.(Redação dada pela Lei nº 9.527, de 10.12.97)
§ 2o A licença de que trata o caput, incluídas as prorrogações, poderá ser concedida a cada período de doze meses nas seguintes condições: (Redação dada pela Lei nº 12.269, de 2010)
I - por até 60 (sessenta) dias, consecutivos ou não, mantida a remuneração do servidor; e (Incluído pela Lei nº 12.269, de 2010)
II - por até 90 (noventa) dias, consecutivos ou não, sem remuneração. (Incluído pela Lei nº 12.269, de 2010)
§ 3o O início do interstício de 12 (doze) meses será contado a partir da data do deferimento da primeira licença concedida. (Incluído pela Lei nº 12.269, de 2010)
§ 4o A soma das licenças remuneradas e das licenças não remuneradas, incluídas as respectivas prorrogações, concedidas em um mesmo período de 12 (doze) meses, observado o disposto no § 3o, não poderá ultrapassar os limites estabelecidos nos incisos I e II do § 2o. (Incluído pela Lei nº 12.269, de 2010)
Pois bem, diante dessas sucessivas alterações legais no tocante aos prazos de licenças, com ou sem remuneração do servidor público, para tratamento de saúde de pessoa da família deve se originar com a análise da vigência das leis.
Nesse sentido, o Decreto-lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942, conhecido como Lei de Introdução ao Código Civil, é aplicado a todos os ramos da ciência jurídica, eis que é uma lei autônoma e independente cujo conteúdo é a elaboração, a vigência e a eficácia das leis, bem como as regras e os princípios de aplicação, interpretação e integração do Direito.
Dessa forma, o aludido decreto ensina que uma lei tem seu período de vigência estabelecido pelo próprio processo legislativo, ou seja, uma lei vigora até que outra, de mesmo conteúdo, entra em vigência e, portanto, revoga a primeira. Assim a Lei nº 12.269/2010 só começa a viger a partir de sua publicação.
Contudo, como ela é fruto de conversão da Medida Provisória nº 479/2009, a Constituição Federal (CF) dispõe, no art. 62, § 3º, que as medidas provisórias perderão eficácia, desde a edição, se não forem convertidas em lei no prazo de 60 dias, com algumas exceções. Interpretando a contrário sensu, as medias provisórias terão eficácia, desde sua edição, se forem convertidas em lei no prazo constitucionalmente estabelecido.
Conclui-se, então, que as disposições da Lei nº 12.269/2010 devem ser observadas desde 29/12/2009, data da publicação da Medida Provisória referida.
Portanto:
a) Do período de 11/12/90 (Lei nº 8.112/90) até 09/12/1997 (Lei nº 9.527/97) os servidores públicos tem direito a licença para tratamento de saúde de pessoa da família de 90 dias, prorrogáveis por mais até 90 dias, sem prejuízo da remuneração por todo o período;
b) Do período de 10/12/1997 (Lei nº 9.527/97) até 30/12/2009 (MP nº 479/2009), os servidores públicos tem direito a licença para tratamento de saúde de pessoa da família de 30 dias, prorrogáveis por mais até 30 dias, sem prejuízo da remuneração por todo o período;
c) Do período de 30/12/2009 (MP nº 479/2009) até atualmente, os servidores públicos tem direito a licença para tratamento de saúde de pessoa da família de até 60 dias, consecutivos ou não, dentro do período de 12 meses, sem prejuízo da remuneração; ou até 90 dias de licença, com prejuízo da remuneração;
Ademais, ao retornar a análise do aludido Decreto-lei, verifica-se que o art. 6º dispõe:
A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada. (Redação dada pela Lei nº 3.238, de 1º.8.1957)
§ 1º Reputa-se ato jurídico perfeito o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou. (Parágrafo incluído pela Lei nº 3.238, de 1º.8.1957)
§ 2º Consideram-se adquiridos assim os direitos que o seu titular, ou alguém por ele, possa exercer, como aqueles cujo começo do exercício tenha termo pré-fixo, ou condição pré-estabelecida inalterável, a arbítrio de outrem. (Parágrafo incluído pela Lei nº 3.238, de 1º.8.1957)
§ 3º Chama-se coisa julgada ou caso julgado a decisão judicial de que já não caiba recurso.
O professor Cristiano Chaves de Farias[1] comenta que “a partir da intelecção do preceito legal – agasalhado constitucionalmente – é possível afirmar, seguramente, que as leis não têm retroatividade. Assim sendo, a lei é aplicável aos casos pendentes e futuros. Excepcionalmente, no entanto, admitir-se-á a aplicação da lei nova aos casos passados (a retroatividade) quando: a) houver expressa previsão na lei, determinando sua aplicação a casos pretéritos (ou seja, no silêncio da lei, prevalece a irretroatividade) e b) desde que essa retroatividade não ofenda o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada”.
O mesmo doutrinador ainda cita o Acórdão Ag. 251533-6/SP do Supremo Tribunal Federal (STF):
“No sistema constitucional brasileiro, a eficácia retroativa das leis – (a) que é sempre excepcional, (b) que jamais se presume e (c) que deve necessariamente emanar de disposições legal expressa – não pode gerar lesão ao ato jurídico perfeito, ao direito adquirido e à coisa julgada. A lei nova não pode reger os efeitos futuros gerados por contratos a ela anteriormente celebrados, sob pena de afetar a própria causa – ato ou fato ocorrido no passado – que lhes deu origem. Essa projeção retroativa da lei nova, mesmo tratando-se de retroatividade mínima, incide na vedação constitucional que protege a incolumidade do ato jurídico perfeito. A cláusula de salvaguarda do ato jurídico perfeito, inscrita na Constituição Federal, art. 5º, XXXVI, aplica-se a qualquer lei editada pelo Poder Público, ainda que se trate de lei de ordem pública”.
Por sua vez, a CF prevê, no art. 5º, XXXVI, como direito fundamental ao cidadão que a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.
Nestes termos, caso um ente público tenha praticado inúmeros atos em conformidade com a legislação da época e que tenha se consumado como ato jurídico perfeito, não pode, portanto, sofrer alteração em virtude do ingresso de uma lei no ordenamento jurídico nacional.
Ademais, deve-se aplicar o princípio da segurança jurídica aos casoscomo este, tendo em vista que este princípio está diretamente ligado ao Estado Democrático de Direito, porque é por meio da segurança jurídica que o Estado deve ser garantidor da dignidade da pessoa humana e da necessidade de estabilidade das relações sociais.
O mestre José dos Santos Carvalho Filho[2] explica que:
As teorias jurídicas modernas sempre procuraram realçar a crise conflituosa entre os princípios da legalidade e da estabilidade das relações jurídicas. Se, de um lado, não se pode relegar o postulado de observância dos atos e condutas aos parâmetros estabelecidos na lei, de outro é preciso evitar que situações jurídicas permaneçam por todo o tempo em nível de instabilidade, o que, evidentemente, provoca incertezas e receios entre os indivíduos.
Com isso, afirma-se que o Estado é o responsável por garantir a ordem social, inclusive mantendo os atos jurídicos já consumados, concluídos.
Ademais, as sucessivas alterações legais no art. 83 do Estatuto do Servidor Público, no que tange aos casos pendentes em que o servidor estava de licença por motivo de doença em pessoa da família na época da publicação da mencionada medida provisória.
Nos casos da licença se estender projetando efeitos com o advento da medida provisória, aplica-se a nova legislação eis que o ato de concessão da licença ainda não está consumado e deve ser regido pela nova regra legislativa.
III – CONCLUSÃO.
Pelo exposto, entende que a Lei nº 12.269, de 21 de junho de 2010 deve ser aplicada a partir da publicação da Medida Provisória nº 479, de 29 de dezembro de 2009, sem efeitos retroativos, ou seja, os servidores públicos terão direito a gozar licença para tratamento de saúde de pessoa da família pelo prazo de até 60 dias, consecutivos ou não, dentro do interstício de 12 meses, sem prejuízo da remuneração.
[1]In Direito Civil. Teoria Geral. 3ª Edição, Lúmen Juris – Rio de Janeiro – 2005, p. 66
[2]In Manual de Direito Administrativo. 23ª Edição, Lúmen Júris – Rio de Janeiro – 2010, p;38.
Procuradora Federal lotada na PFE/Anatel, pertencente à Gerência de Contenciosa desta Agência. Sou Especialista em Direito Administrativo e em Direito Constitucional.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MORELO, Ludimila Carvalho Bitar. Sucessivas alterações do art. 83 da Lei nº 8.112/90 no que diz respeito ao tempo de gozo da licença por motivo de doença em pessoa da família Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 22 fev 2013, 06:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/33926/sucessivas-alteracoes-do-art-83-da-lei-no-8-112-90-no-que-diz-respeito-ao-tempo-de-gozo-da-licenca-por-motivo-de-doenca-em-pessoa-da-familia. Acesso em: 22 nov 2024.
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