Introdução
A violência é um problema que sempre atormentou a vida em sociedade. Com o proclamado objetivo de resolver ou reduzir tal problema, o Estado reiteradamente recorre ao direito penal, criando novos tipos penais e recrudescendo penas.
Essa atitude, contudo, cria para o direito penal uma função ilegítima, que, apesar de cada vez mais explorada pelo Estado, possui efeitos prejudiciais à sociedade.
Função simbólica do Direito Penal
A função simbólica do Direito Penal “consiste no uso do Direito penal para acalmar a ira da população em momentos de alta demanda por mais penas, mais cadeias, etc..” (GOMES, 2006, p. 24)
Nesse aspecto, o Direito penal é utilizado para criar na sociedade uma falsa sensação de que o problema da violência está sendo adequadamente enfrentado pelas autoridades.
Assim, muito embora os estudos da criminologia já tenham demonstrado a inaptidão do Direito Penal para resolver o problema da criminalidade, incute-se no senso comum a idéia de que penas mais severas e a criação de novos crimes constituem posturas que irão resolver ou ao menos minorar o problema.
Desse modo, em momentos de grande comoção social (insuflados com grande contribuição da mídia), novas leis penais são editadas como uma resposta imediata do Estado a uma conduta violenta que tomou grandes proporções.
Ressalte-se que a função simbólica do Direito Penal, embora não seja, em si, danosa, gera, quando supervalorizada, efeitos prejudiciais à sociedade.
Primeiro, essa falsa sensação de tranquilidade transmitida à população com a edição de leis mais severas “acalma” a sociedade, fazendo com que esta deixe de exigir do Estado posturas que realmente combatam a criminalidade.
Outro efeito negativo da supervalorização da função simbólica do Direito Penal é a perda da confiança nele depositada, já que, a longo prazo, fica evidenciada a sua incapacidade de resolver a criminalidade. Isso impossibilita ao Direito Penal o cumprimento de sua finalidade de proteção de bens jurídicos.
Apesar de referidos efeitos danosos, percebe-se que, para o Estado, é muito mais fácil, rápido e barato criar novas leis e recrudescer penas do que fazer vultosos investimentos em programas estruturais de política social, que só produzirão seus resultados após muitos anos.
Ademais, esses investimentos, por não gerarem muita visibilidade perante a sociedade, não possuem força eleitoral. Como para a grande massa populacional a edição de uma lei mais severa parece ser medida mais eficaz contra a violência, atender a essa expectativa gera um benefício eleitoral maior.
Assim, não obstante vários estudos no âmbito da criminologia e da política criminal já terem demonstrado a inadequação do Direito Penal para a solução do problema da violência, cada vez mais leis penais são promulgadas e apresentadas à população como uma medida adequada ao combate à criminalidade.
Por fim, vale citar o precioso ensinamento do saudoso Francisco de Assis Toledo a respeito do tema:
O crime é um fenômeno social complexo que não se deixa vencer totalmente por armas exclusivamente jurídico-penais. Em grave equívoco incorrem, frequentemente, a opinião pública, os responsáveis pela Administração e o próprio legislador, quando supõem que, com a edição de novas leis penais, mais abrangentes ou mais severas, será possível resolver-se o problema da criminalidade crescente. Essa concepção do direito penal é falsa porque o toma como uma espécie de panacéia que logo se revela inútil diante do incremento desconcertante das cifras da estatísticas criminal, apesar do delírio legiferante de nossos dias. (TOLEDO, 1994, p. 5)
CONCLUSÃO
O aspecto simbólico do Direito Penal é constantemente utilizado para criar na população uma falsa sensação de segurança, uma percepção errônea de que o agravamento de penas e a criação de novos crimes é um modo eficaz de combater a violência.
A política criminal, utilizando como fundamento os estudos da Criminologia, já concluiu que a edição de novas leis penais, criando um Direito penal mais rigoroso, não contribui para a redução da criminalidade, sendo necessário pesado investimento em políticas sociais.
Para o Estado, entretanto, é muito mais prático, econômico e rápido editar novas leis ou recrudescer as existentes, transmitindo à população a idéia equivocada de que no Direito Penal reside a solução para a violência.
Destarte, não obstante suas conseqüências danosas, a função simbólica do Direito Penal vem sendo cada vez mais explorada pelas instâncias oficiais de controle, o que acaba gerando uma estagnação na adoção de políticas eficazes para o enfrentamento real da violência.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARATTA, Alessandro. Criminologia Crítica e Crítica do Direito Penal. Ed. Revan. 3ª edição, Rio de Janeiro, 2002.
BIANCHINI, Alice. Política Criminal, Direito de punir do Estado e finalidades do Direito Penal. Material da 1ª aula da Disciplina Política Criminal, ministrada no Curso de Pós- Graduação Lato Sensu TeleVirtual em Ciências Penais - Universidade Anhanguera-Uniderp - REDE LFG.
GOMES, Luiz Flávio. Direito Penal: parte geral, volume 1: introdução. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006.
TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios básicos de direito penal. São Paulo: Saraiva, 1994.
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