Resumo: Este artigo tem como objetivo analisar a evolução histórica do direito ao voto no Brasil, bem como, a eficiência de tal instrumento de participação popular na construção de estado democrático de direito, apontando as falhas do sistema político-eleitoral que inviabilizam a concretização do processo democrático.
Palavras-chaves: Voto. Evolução Histórica. Ineficiência do processo político democrático.
Abstract: This article aims to analyze the historical evolution of voting rights in Brazil, as well as the efficiency of such an instrument of popular participation in building democratic state of law, pointing out the flaws of the political-electoral system that prevent the realization . of the democratic process.
Keywords: Vote. Historical Evolution. Inefficiency of the democratic political process.
Sumário: Introdução. 1. Do voto como instrumento de participação popular. 2. Da politização do eleitorado para a prevalência do voto consciente. 4.Conclusão. Referências Bibliográficas.
1- EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO AO VOTO NO BRASIL.
O direito ao voto direto e ao sufrágio universal no Brasil fora conquistado pelos brasileiros após longo processo de amadurecimento das instituições políticas e do regime democrático brasileiro.
Remonta ao século XIX o denominado voto censitário, mecanismo que viabilizava apenas a participação política àqueles que detinham o poder econômico, influência e status, sistema que perdurou até início do século XX.
Já no despontar do século XX, prevaleceu no país um sistema de participação indireta pelos cidadãos que escolhiam seus governantes por intermédio de seus representantes, tratava-se do voto indireto.
No Governo Vargas, na década de trinta, regulamentou-se o direito das mulheres ao voto[1].
Em 1988, conquistou o povo brasileiro o direito às eleições diretas, com voto secreto e universal. Tal sistema consagrado no texto da Constituição Federal de 1988 inaugurava uma nova etapa no processo político-eleitoral do país, instituindo o voto obrigatório para todos os cidadãos maiores de dezoito anos e menores de setenta, sem quaisquer outras condicionantes, facultando aos maiores de setenta anos, aos analfabetos, bem como aos maiores de dezesseis anos o direito ao voto.
Em período mais recente, uma nova vitória da democracia fora registrada, com o posicionamento do Tribunal Superior Eleitoral, através da Resolução n. 22.610/07, cuja constitucionalidade fora consagrada pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, ao firmar o pressuposto de que a fidelidade partidária seja da essência do regime democrático de direito, proibindo a troca constante de políticos entre agremiações partidárias, sem quaisquer justificativas políticas ou ideológicas para tanto.
Rememore-se, ainda, em capítulo recente de nossa história política eleitoral, a aprovação da Lei n. 135/2010, denominada Lei da Ficha Limpa, projeto de iniciativa popular que possibilitou a vedação de que pessoas condenadas por crimes, cuja matéria já tivesse sido apreciada em dois graus de jurisdição, por órgão colegiado, pudessem concorrer a cargos eleitorais, tornando-os inelegíveis por oito anos.
2- DO VOTO COMO INSTRUMENTO DE PARTICIPAÇÃO POPULAR.
Constata-se na doutrina constitucionalista brasileira, cita-se, por exemplo, Alexandre de Moraes[2] o conceito do voto, como um direito público subjetivo, constituindo uma função política e social de soberania popular.
Trata-se de um direito público, porquanto oponível a qualquer um que intente embaraçá-lo, inclusive o próprio Estado e, subjetivo porque diz respeito ao cidadão e tão somente a ele, pessoa física com capacidade de votar e ser votado, detentora de um título eleitoral.
O voto constitui um pilar do estado democrático de direito, na medida em que o cidadão deve exercê-lo no meio político e social como forma de consagrar a soberania popular, ou seja, fazer prevalecer a vontade da coletividadade sobre interesses meramente secundários ou particulares.
Da obra de Alexandre de Moraes[3] se extrai ainda, as características fundamentais do voto, quais sejam:
“Personalidade: o voto só pode ser exercido pessoalmente. Não há possibilidade de se outorgar procuração para votar. A identidade do eleitor é verificada pela exibição do título de eleitor.
“Obrigatoriedade formal do conhecimento: em regra, existe a obrigatoriedade do voto, salvo aos maiores de 70 anos e aos menores de 16 anos. Consiste em obrigar o cidadão ao comparecimento às eleições, assinando uma folha de presença e depositando seu voto na urna, havendo inclusive uma sanção (multa) para sua ausência. Em virtude, porém de sua característica de secreto, não se pode exigir que o cidadão, efetivamente, vote.”
“Liberdade: manifesta-se não apenas pela preferência a um candidato entre os que se apresentam, mas também pela faculdade até mesmo de depositar uma cédula em branco na urna ou em anular o voto. Essa liberdade deve ser garantida, e por essa razão, a obrigatoriedade já analisada não pode significar senão o comparecimento do eleitor, o depósito da cédula na urna e a assinatura da folha individual de votação.”
Desta pequena explanação sobre o voto e sobre o sufrágio eleitoral se verifica, sem sombra de dúvidas, a magnitude do tema.
Contudo, o voto deve ser analisado não apenas em uma abordagem histórica e teórica, abstrata, conceitual. Necessário se faz confrontar dita abordagem de forma pragmática com o exercício do direito político na atualidade.
Nesse compasso, exsurge, necessariamente, uma severa crítica à forma e ao modo pelo qual nosso eleitorado vem exercitando o direito ao voto.
É de conhecimento comum que um número significativo dos eleitores, porque não dizer a sua maioria, vota apenas pela obrigação legal de comparecer às urnas para cumprir um dever legal, neste sentido deparamo-nos com um exército de eleitores que votam sem saber a quem conferir sua opção, valendo-se de santinhos atirados ao chão, de promessas de favores políticos de candidatos, ou mesmo por sofrerem uma verdadeira “lavagem cerebral”, fruto das insistentes propagandas eleitorais, regadas de cantilenas, frases de efeito, repetições e promessas impossíveis de serem cumpridas, etc.
Ou seja, força concluir que o brasileiro, em regra, não exerce seu direito ao voto na plenitude do termo, posto que este pressuponha uma opção consciente em delegar a alguém confiável o poder para governar ou elaborar leis, que certamente irá influir cotidianamente em sua vida, constituindo, por assim dizer, um exercício pro forma do direito político.
Importante ressaltar que à semelhança do negócio jurídico denominado Mandato, previsto no Código Civil, delega o cidadão ao eleito, poderes para administrar a res publica e legislar em seu nome e em nome da coletividade, donde se conclui, que assuntos pertinentes à segurança, saúde, tributação, previdência, dentre outros de igual magnitude, serão definidos pelos políticos eleitos. Tal conclusão apenas evidencia o nível de responsabilidade que se pode atribuir ao eleitor ao proferir seu voto.
Justificativas se avultam para explicar o comportamento alienado do eleitor, sendo de destaque o argumento de que não existem políticos honestos e que todos que aspiram ocupar um cargo como agente político, em regra, pretende atender a seus próprios interesses ou a interesses de grupos com grande poder econômico, em detrimento do interesse público.
Tal justificativa, com certeza, não se encontra divorciada da realidade política-social brasileira, posto que, cotidianamente, assistimos aos noticiários de televisão, rádio, página eletrônicas, etc. e nos deparamos com diversas denúncias de corrupção, improbidade administrativa, falta de decoro parlamentar, crimes de responsabilidade, benesses angariadas junto ao poder político que desfalcam o erário e escandalizam a nação, etc.
Não obstante tais constatações, tem-se que o voto pressupõe, conforme salientado, vontade livre, convicção política filosófica, que não se amolda no simplório ato de conferir a alguém um favor, com vistas a um pagamento futuro, ou mesmo, ao mero cumprimento do comando da lei que coage seu súdito ao cumprimento de uma obrigação supostamente cívica.
Visto dessa forma, estamos longe de constituir uma sociedade justa, politizada, ao mesmo tempo em que os valores consagrados na carta constitucional e no ordenamento jurídico se mostram como mera retórica, posto que não se concretizam na ação de seus cidadãos.
Esclarece José Afonso da Silva, ao citar Ferdinand Lassale que uma constituição, no sentido sociológico, revela apenas a soma dos reais poderes que regem o país, sendo a constituição escrita mera folha de papel, quando não guarda correspondência com os valores afetos a esses interesses.
Nessa mesma linha de entendimento se pode concluir que o direito ao voto, positivado na Constituição Federal[4] e na legislação esparsa não consagra, na prática, o exercício da democracia.
Nesse sentido, se faz necessário reconhecer que a disciplina dos direitos políticos insculpidos na CF/88, de redação escorreita, não se espelha na realidade dos fatos de uma pretensa democracia, sendo certo concluir que se encontra, amesquinhado.
3 - DA POLITIZAÇÃO DO ELEITORADO PARA A PREVALÊNCIA DO VOTO CONSCIENTE.
Em outro giro, tão importante quanto apontar as causas do problema se revela a necessidade trazer sugestões para a solução do mesmo, tarefa de difícil consecução, mas que a Ciência Política, o Direito e a Sociologia, dentre outros ramos do conhecimento, já sinalizam com respostas.
Nesse sentido, pode-se destacar a necessidade de promover a educação política e cívica de todos os cidadãos, seja por intermédio das ONGs, dos educadores, dos líderes religiosos, sindicatos ou qualquer associação comunitária, bem como, a necessidade de se promover uma ampla reforma política, que intente estabelecer o debate sobre temas sensíveis, tais como, o voto distrital e o financiamento público e/ou privado de campanhas eleitorais, bem como a própria obrigatoriedade do voto.
A educação cívica, sem sombra de dúvidas é um pressuposto inafastável para que um povo atinja um grau satisfatório de consciência política. No Brasil é comum as pesquisas feitas nos meios de comunicação revelarem que a população não possui o menor domínio sobre temas afetos à democracia, soberania, cidadania e sequer conhecem a estrutura do Estado e a dinâmica do poder, sendo certo que, inatingido tal pressuposto, não se pode esperar qualquer mudança qualitativa no processo de desenvolvimento político da nação.
Com efeito, para a boa compreensão e exercício do direito ao voto deve o eleitor ter a mínima consciência da importância de seu ato de escolha, porquanto tal escolha influenciará nos rumos a que serão dados os interesses de toda a coletividade.
Nesse sentido se avulta a responsabilidade do poder público, dos órgãos de comunicação, dos educadores, notadamente, daqueles que lecionam no ensino médio e fundamental em desenvolver tais temas nas suas agendas e grades curriculares.
Por outro lado, o engajamento de ONGs, de lideranças religiosas, sindicatos, associações, no intuito de disseminar tal conhecimento se mostra como fundamental para o desenvolvimento político da nação.
4- CONCLUSÃO.
Para que o direito ao voto seja plenamente exercitado se faz necessário um esforço da sociedade, para que se disseminem idéias que possam dotar toda a população de um mínimo de consciência política, bem como, uma ampla reforma política que contemple o debate sobre temas sensíveis e caros à população, tais como o voto distrital e o fim do financiamento de campanhas eleitorais através de doações de empresas da iniciativa privada, bem como a própria obrigatoriedade do voto.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.
Moraes, Alexandre. Direito Constitucional. Editora Atlas. 2002. São Paulo. 11ª edição. Direitos políticos.
Silva, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. Ed. Malheiros. 20ª Edição.
Constituição Federal de 1988, art. 14.
Lei n. 135/2010.
Resolução n. 22.610/07.
História das Eleições. Página Eletrônica do Tribunal Superior Eleitoral.
[1] História das eleições no Brasil. Página eletrônica do TSE.
[2] Moraes, Alexandre. Direito Constitucional. Editora Atlas. 2002. São Paulo. 11ª edição.Direitos políticos
Moraes, Alexandre. Direito Constitucional. Editora Atlas. 2002. São Paulo. 11ª edição.Direitos políticos. Fls. 236.
[4] Constituição Federal de 1988, art. 14.
Procurador da Fazenda Nacional. Especialista em Direito em Direito Tributário.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CAMELO, Alcyr Lopes. O voto como pilar da democracia Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 12 ago 2013, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/36235/o-voto-como-pilar-da-democracia. Acesso em: 22 nov 2024.
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