Resumo: O instituto da prescrição no sistema jurídico possui relevo de destaque tendo em vista a função primordial dar segurança jurídica às relações obrigacionais estabelecidas na seara jurídica. Não podia ser diferente no âmbito do regime de previdência complementar fechado. Desta maneira, o presente artigo abordará especificamente a prescrição das contribuições normais e extraordinárias feitas por patrocinadores e participante/ assistidos. Em virtude da amplitude do tema para um artigo científico, restringir-se-á o tema às contribuições normais e extraordinárias, as contribuições para fins de cobertura de reserva de tempo de serviço anterior, e por fim, as contribuições contratuais decorrentes de retirada de patrocínio.
Palavras-chave: Previdência Complementar Fechada. Contribuições. Prescrição.
Sumário: 1. INTRODUÇÃO; 2. DESENVOLVIMENTO; 2.1 Prescrição das contribuições para formação as reservas garantidoras dos planos de benefícios; 2.2 Contribuições para cobertura de reservas de tempo de serviço anterior - RTSA; 2.3 Obrigações decorrentes da retirada de patrocínio 3. CONCLUSÃO.
INTRODUÇÃO
O instituto da prescrição apresenta extrema relevância para todo o ordenamento jurídico, constituindo um dos modos pelos quais se dá concretude ao princípio da segurança jurídica. Sem a previsão de institutos jurídicos como o da prescrição haveria a perpetuação indefinida dos litígios e lides, causando a instabilidade das relações jurídicas[1].
A prescrição[2][3] no regime de previdência complementar não possui contornos delimitados quanto às principais relações jurídicas travadas no bojo do regime. Por conseguinte, em decorrência do horizonte temporal que abrange os contratos previdenciários privados, necessário se faz uma abordagem ampla perpassando vários diplomas legais que tratam do tema.
Igualmente, há que se destacar ainda que este artigo somente abordará a prescrição da relação obrigacional entre patrocinador e EFPC, não abordando a prescrição no que se refere à relação obrigacional entre participante e entidade (em especial quanto à prescrição incidente sobre parcelas de benefícios não pagos).
DESENVOLVIMENTO
Prescrição das contribuições para formação as reservas garantidoras dos planos de benefícios
Feita a delimitação do tema, inicia-se a incursão sob a égide da Lei nº 6.435, de 15 de julho de 1977. Tal diploma, que outorgou sistematicidade ao então novel regime de previdência complementar[4], somente fazendo menção a prescrição quando de sua suspensão na liquidação extrajudicial de entidade de previdência[5].
De imediato, considerando a representatividade de patrocinadores do plano de benefícios são empresas estatais, na sua maioria sociedades de economia mista, deve-se verificar a plausibilidade jurídica de aplicação do prazo prescricional do Decreto nº 20.910, de 06 de janeiro de 1932, que assim dispõe:
Art. 1º As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem.
Em complemento ao decreto acima foi expedido outro diploma normativo, Decreto-Lei nº 4.597/1942 tratou do tema:
Art. 2º O Decreto nº 20.910, de 6 de janeiro de 1932, que regula a prescrição quinquenal, abrange as dívidas passivas das autarquias, ou entidades e órgãos paraestatais, criados por lei e mantidos mediante impostos, taxas ou quaisquer contribuições, exigidas em virtude de lei federal, estadual ou municipal, bem como a todo e qualquer direito e ação contra os mesmos.
Art. 3º A prescrição das dívidas, direitos e ações a que se refere o Decreto nº 20.910, de 6 de janeiro de 1932, somente pode ser interrompida uma vez, e recomeça a correr, pela metade do prazo, da data do ato que a interrompeu, ou do último do processo para a interromper; consumar-se-á a prescrição no curso da lide sempre que a partir do último ato ou termo da mesma, inclusive da sentença nela proferida, embora passada em julgado, decorrer o prazo de dois anos e meio.
Analisando especificamente a questão da prescrição em favor da Fazenda Pública, bem como a aplicação de tais diplomas, assim dissertou Leonardo José Carneiro da Cunha[6]:
“A prescrição quinquenal prevista no Decreto nº 20.910/1932 3 no decreto-lei nº 4.597/1942 beneficia, como se viu, a Fazenda Pública, conceito que abrange a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas autarquias e fundações públicas. Não estão contempladas pelas regras contidas nos referidos diplomas legais as empresas públicas e sociedades de economia mista.”
O Superior Tribunal de Justiça, em linha com a doutrina acima colacionada, assim vem confirmando tal entendimento conforme julgados paradigmas abaixo colacionados:
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. FUNDAÇÃO DE DIREITO PRIVADO.
PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. NÃO APLICABILIDADE.
- O Superior Tribunal de Justiça entende que o contido no Decreto n. 20.910/1932 e no Decreto-Lei n. 4.597/1942 aplica-se apenas às pessoas jurídicas de direito público (União, Estados, municípios, Distrito Federal, autarquias e fundações públicas), excluindo-se, portanto, as pessoas jurídicas de direito privado da administração pública indireta (sociedades de economia mista, empresas públicas e fundações). Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp 1260881/RS, Rel. Ministro CESAR ASFOR ROCHA, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/09/2011, DJe 04/10/2011)
PROCESSO CIVIL E ADMINISTRATIVO - CADERNETA DE POUPANÇA: BLOQUEIO - PRESCRIÇÃO QÜINQÜENAL.
1. As autarquias, por expressa determinação legal, estão ao abrigo da prescrição quinquenal.
2. Diferentemente das demais entidades paraestatais (empresas públicas e sociedades de economia mista), as autarquias estão sempre favorecidas com a redução do lapso prescricional. Inteligência do art. 2º do DL n. 4.597/42.
3. Além da norma de caráter geral, o BACEN tem o favor legal pelo contido no art. 50 da Lei n. 4.595/64, dispositivo que estende nominalmente ao recorrente os benefícios e privilégios da Fazenda Nacional.
4. Recurso especial provido.
(REsp 247.825/RS, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/12/2000, DJ 12/02/2001, p. 105)
Constatada a impossibilidade jurídica de aplicação do Decreto que regula a prescrição em face da fazenda pública, por decorrência lógica as regras aplicáveis serão as do Código Civil então vigente. Há que se ressaltar que retornamos ao leito jurídico normal da prescrição no caso da previdência complementar fechada. Não se pode olvidar que a natureza contratual[7], que caracteriza as relações obrigacionais das entidades privadas de previdência complementar, atrai ordinariamente a regência do código civil.
Pois bem, novamente lembrando o amplo horizonte temporal, peculiar dos contratos previdenciários, que envolve a prescrição das contribuições atinentes aos patrocinadores dos planos de benefícios, passa-se a verificar a incidência das normas no tempo e os respectivos prazos prescricionais indicados por estas.
Delimitando o lapso temporal dos contratos previdenciários privados, fixamos a data de promulgação da Lei nº 6.435, de 1977. Assim do advento do referido diploma até 11 de janeiro de 2003, data de entrada em vigor do novo código civil (Lei nº 10.406/2002), há que se aplicarem os prazos prescricionais do Código Civil então vigente. Deste modo, dada a característica singular de prestação contratual dos aportes feitos pelo patrocinador para custeio do plano de benefícios, a prescrição destas prestações dar-se-á em vinte anos conforme dispositivo abaixo:
Art. 179. Os casos de prescrição não previstos neste Código serão regulados, quanto ao prazo, pelo art. 177.
Art. 177. As ações pessoais prescrevem, ordinariamente, em vinte anos, as reais em dez, entre presentes e entre ausentes, em quinze, contados da data em que poderiam ter sido propostas. (Redação dada pela Lei nº 2.437, de 1955).
Portanto, o prazo prescricional até o advento do novo código civil, como dito acima, será de vinte anos, conforme prescreve o código civil vigente à época.
Com a entrada em vigor da Lei nº 10.406/2002, o extenso prazo acima foi reduzido haja vista a dinâmica e a celeridade que caracterizam as relações jurídicas nos dias atuais, não mais se justificando tamanhos prazos de prescrição. Deste modo o prazo vintenário acima foi reduzido para dez anos, conforme comando legal:
Art. 205. A prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor.
Entretanto, se no anterior código civil não havia enquadramento especifico para cobranças de contribuições previdenciárias, encaixilhando-se, destarte, no prazo geral, no atual diploma civilista temos um prazo específico para regular a prescrição destas contribuições, senão vejamos:
Art. 206. Prescreve:
(...)
§ 5o Em cinco anos:
I - a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular;
As contribuições previdenciárias vertidas ao plano de benefícios são objeto de contrato (convênio de adesão), bem como são especificadas no regulamento do plano. Logo, com o advento da Lei acima passa-se a considerar como sendo de cinco anos o prazo prescricional para cobrança de contribuições não vertidas ao plano de benefícios previdenciário, seja por patrocinador ou participante.
Todavia, a aplicação imediata dos prazos reduzidos trazidos pela Lei nº 10.406/2002 acarretaria insegurança jurídica nas relações. A fim de evitar celeumas jurídicas houve a necessidade de criação de uma regra de transição, que abarcasse casos como este que ora analisa-se. Assim é que dispôs o legislador:
Art. 2.028. Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada.
Deste modo, quando da aferição concreta da ocorrência ou não da prescrição, há que se verificar a aplicação da regra de transição acima nos casos em que o prazo prescricional tenha começado a fluir ainda sob a égide do antigo código civil.
Conclui-se que em decorrência do prolongado lapso temporal que envolve o pagamento das contribuições a cargo do patrocinador, os prazos prescricionais modificam-se no decurso do tempo, havendo, s.m.j., inicialmente prazo de vinte anos e, após o advento da Lei nº 10.406/2002 (Código Civil), um prazo determinado conforme regras de transição e ao final, ou atualmente, um prazo quinquenal para aferição da prescrição da pretensão.
Contribuições para cobertura de reservas de tempo de serviço anterior - RTSA
O segundo ponto a ser enfrentado diz respeito à prescrição das contribuições extraordinárias vertidas para o custeio de reservas de tempo de serviço anterior – RTSA.
A RTSA nada mais é que o período laboral anterior à adesão ao plano de benefícios, que nos casos de planos na modalidade de benefício definido, necessita de custeio específico para que haja capitalização suficiente para pagamento do benefício nos valores previamente contratados.
Neste ponto, preliminarmente, temos que fixar o entendimento que os valores referentes ao período laboral anterior à adesão ao plano de benefícios podem ser uma obrigação tanto do participante, neste caso denominada “joia[8]”, como do patrocinador, nomeada pelo termo “serviço passado[9]”. Desta maneira, para fins deste artigo, entendo RTSA como gênero, tendo como espécies a joia (participante) e o serviço passado (patrocinador).
De toda sorte, independente da titularidade do responsável pelo aporte destes valores, sejam eles referente à joia ou serviço passado, é certo que tal obrigação deve constar expressamente no contrato previdenciário, seja no convênio de adesão, seja no regulamento do próprio plano de benefícios [principalmente neste], sob pena de inexistência no plano jurídico.
Deste modo, havendo previsão contratual expressa e literal, no tocante a joia pode se afirmar que haverá a obrigação do aporte de valores, pelos participantes, referente a esta fonte de custeio específica. Como obrigação contratual, segue a mesma linha de raciocínio já entabulada neste arrazoado no sentido dos prazos prescricionais aplicáveis.
Durante a vigência da Lei nº 6.435/77 havia normativo que apontava a necessidade não só da contemplação de tal obrigação no regulamento do plano de benefícios, mas também segregação de tais valores para uma maior transparência quando do aporte de recursos para esse fim. Desta forma, previu a Resolução MPAS/CPC nº 1, de 09/10/1978:
“39 – No cálculo das reservas, sempre de acordo com os estatutos da entidade e o regulamento do plano serão separadas, se necessário, as parcelas correspondentes a compromissos especiais, com geração de participantes existentes na data de início da entidade, sem que tenha havido a arrecadação correspondente de contribuições, podendo ser estabelecida uma separação entre o compromisso normal e esse compromisso especial, e previsto um prazo, não superior a 20 (vinte) anos, para a integralização da reserva correspondente”.
Como indica expressamente a norma acima, o compromisso especial, decorrente da assunção da obrigatoriedade de aportar valores referentes ao tempo anterior a implantação do plano de benefícios, deveria necessariamente ser segregado, para possibilitar seu financiamento, como qualquer outra despesa.
Aliás, a evolução do regime de previdência complementar fechada tornou ainda mais clara a questão da excepcionalidade do serviço passado, o que se observa pela previsão do art. 19 da atual lei orgânica da previdência complementar (LC nº 109/2001):
Art. 19. As contribuições destinadas à constituição de reservas terão como finalidade prover o pagamento de benefícios de caráter previdenciário, observadas as especificidades previstas nesta Lei Complementar.
Parágrafo único. As contribuições referidas no caput classificam-se em:
I - normais, aquelas destinadas ao custeio dos benefícios previstos no respectivo plano; e
II - extraordinárias, aquelas destinadas ao custeio de déficits, serviço passado e outras finalidades não incluídas na contribuição normal.
Se anteriormente havia previsão normativa de segregação do compromisso especial referente ao serviço passado, com o advento da LC nº 109/2001, tornou clara tal excepcionalidade ao vincular o custeio de tal compromisso ao estabelecimento de contribuições extraordinárias.
Portanto, mesmo considerando a excepcionalidade da contribuição acima destinada ao custeio da RTSA, os diplomas e prazos prescricionais seguem o mesmo posicionamento já expendido para as contribuições normais de custeio do plano de benefícios.
Obrigações decorrentes da retirada de patrocínio
Por fim, o terceiro assunto a ser tratado neste opinativo diz respeito à prescrição de eventuais valores decorrentes da resilição do contrato previdenciário, encerramento contratual denominado de retirada de patrocínio.
O tema de retirada de patrocínio já foi objeto de análise por esta Procuradoria Federal. No Parecer nº 63/2010/CGEN/PF/PREVIC restou assim ementado o tema:
II - A retirada de patrocinador ou de instituidor de Plano de Benefícios, administrado por entidade fechada de previdência complementar insere-se no âmbito da autonomia de vontade, característica do vínculo contratual existente entre as partes da relação previdenciária privada.
III – A autonomia da vontade não excepciona a necessidade de observância dos vetores de ordem técnica estabelecidos pelo órgão regulador em relação ao instituto da retirada de patrocínio, devendo a resilição contratual guardar observância aos dispositivos constitucionais e da legislação de regência.
IV – Tema que atrai a regência obrigatória do princípio da tutela dos interesses dos participantes, insculpido no art. 3º, inciso VI c/c arts. 17 e 68, todos da LC 109/2001.
Em outra oportunidade[10], o tema tornou a ser tratado por este órgão de assessoramento jurídico:
(...)
II – O princípio da tutela dos participantes e assistidos, em compasso com o respeito ao direito adquirido, determinam a observância pelo patrocinador do cumprimento das obrigações e direitos até sua total retirada da relação contratual.
III – Em face da constitucionalização dos contratos, bem como a intervenção estatal mediante o “dirigismo contratual”, há entendimento que a data-base de retirada de patrocínio somente se efetiva com a prévia e expressa autorização do órgão fiscalizador das entidades fechadas de previdência complementar.
Atualmente, com o advento da resolução CNPC nº 11, de 13 de maio de 2013, a retirada de patrocínio possui robusta normatização, com destaque para devida conceituação da operação em contexto:
Art. 3º Considera-se retirada de patrocínio o encerramento da relação contratual existente entre o patrocinador que se retira e a respectiva entidade fechada, formalizada no termo de retirada de patrocínio e aprovada pela Previc, relativamente a determinado plano de benefícios de natureza previdenciária e aos respectivos participantes e assistidos, seja o plano estabelecido na modalidade de benefício definido, contribuição definida, contribuição variável ou outra que venha a ser regulamentada.
Os apontamentos acima demonstram duas características básicas da retirada de patrocínio: configurar modalidade de resilição contratual e a necessidade de autorização do órgão fiscalizador.
Para a primeira característica entendo não remanescer dúvidas quanto à sua validade. No que concerne à segunda característica, autorização do órgão estatal competente, há que se verificar sua imposição no período que precedeu a LC nº 109/2001.
A primeira lei orgânica da previdência complementar fechada, Lei nº 6.435, de 15 de julho de 1977, já esboçava a necessidade de autorização estatal para retirada de patrocínio:
Art. 35. Para os fins deste Capítulo, compete ao Ministério da Previdência e Assistência Social:
I - através de órgão normativo a ser expressamente designado:
(...)
b) regular a constituição, organização, funcionamento e fiscalização dos que exercem atividades subordinadas a este Capítulo, bem como a aplicação das penalidades cabíveis;
II - através de órgão executivo a ser expressamente designado:
a) processar os pedidos de autorização para constituição, funcionamento, fusão, incorporação, grupamento, transferência de controle e reforma dos Estatutos das entidades fechadas, opinar sobre os mesmos e encaminhá-los ao Ministro da Previdência e Assistência Social;
O dispositivo da lei acima deve ser lido em harmonia com o disposto no art. 1.093 do então vigente Código Civil:
Art. 1.093. O distrato faz-se pela mesma forma que o contrato. Mas a quitação vale, qualquer que seja a sua forma.
Ora, se para constituição das EFPC havia a necessária autorização de órgão estatal competente, do mesmo modo o término da relação contratual também deveria fazer-se de igual forma. Assim é que veio à lume a Resolução CPC nº 06, de 07 de abril de 1988, disciplinando o tema:
Considerando a necessidade de disciplinar os procedimentos para saída de
Patrocinadoras de entidades fechadas de previdência privada, resolve:
1. Expedir normas reguladoras dos procedimentos a serem adotados no âmbito das
entidades fechadas de previdência privada por ocasião da saída de uma de suas patrocinadoras e que, em anexo, a esta acompanham.
Por conseguinte, depreende-se que desde 1988 a retirada de patrocínio necessitava expressamente de autorização do órgão estatal responsável pela fiscalização do regime de previdência complementar.
Como visto nos itens anteriores, desde a Lei nº 6.435, de 1977, a retirada de patrocínio era expressamente admitida pelo ordenamento jurídico, mediante interpretação da legislação específica com disposições da legislação civil.
Pois bem, nesse ambiente legislativo é que foi editada a Resolução nº 06/CPC, de 1988, tendo por finalidade regular as situações de retirada de patrocínio nas entidades fechadas de previdência complementar. A título de melhor compreensão do que se trata uma retirada de patrocínio e seus efeitos, cumpre reproduzir parcialmente os artigos de seu anexo quanto à situação de entidades onde há patrocinadores com solidariedade de obrigações, bem como seus efeitos em relação a participantes e assistidos, após a finalização da operação, verbis:
(...)
3. Para as entidades que têm solidariedade de contribuições, explícitas ou implícitas entre várias patrocinadoras (Contribuições com base na taxa média), o Ativo do Fundo da Patrocinadora que se retira deverá ser determinado usando a metodologia abaixo:
I determinar as reservas matemáticas de todas patrocinadoras da entidade com base nas mesmas hipóteses e métodos adotados na alínea ) do item 2 (Sem considerar crescimento salarial);
II estabelecer a proporção da reserva matemática da Patrocinadora que está saindo em relação ao total da reserva matemática de todas as patrocinadoras da entidade incluindo a reserva da própria patrocinadora) calculadas, conforme o item 3. I;
III multiplicar o valor encontrado em 3. II pelo Ativo do Fundo Total da entidade, determinando assim, o ativo da patrocinadora que está saindo.
4. Se o ativo do Fundo correspondente à Patrocinadora que se retira não for suficiente para cobrir as reservas matemáticas correspondentes aos benefícios referentes aos incisos I, II e III da alínea h do item 2, a Patrocinadora terá que integralizar ou assegurar aos Participantes a integralização do ativo do fundo de modo que o mesmo cubra essas reservas.
5. Se o Ativo do Fundo for suficiente para cobrir as reservas correspondentes aos benefícios referentes aos incisos I, II e III da alínea h do item 2 e não for suficiente para cobrir integralmente a reserva matemática referente aos benefícios correspondentes ao inciso IV da alínea h do item 2, a responsabilidade da entidade e da Patrocinadora, referente aos benefícios, deste último inciso ficará limitada ao valor do Ativo do Fundo restante, correspondente a essa Patrocinadora, que será alocado a cada Participante proporcionalmente ao valor individual das reservas referentes ao benefício do inciso IV da alínea h do item 2.
(...)
7. A Patrocinadora, em comum acordo com a entidade, poderá ter as seguintes opções com relação aos Participantes Assistidos e aos Pensionistas, cujos procedimentos necessários serão feitos pela entidade:
I - manter os Participantes Assistidos e os Pensionistas na entidade;
II - transferir os participantes Assistidos e os Pensionistas para outra entidade fechada ou aberta; ou
III - pagar o valor presente do benefício mensal quando não for possível a manutenção do benefício nas mesmas condições vigentes.
Caso a Patrocinadora faça a opção correspondente aos incisos II e III anteriores, será assegurado aos Participantes Assistidos e/ou Pensionistas permanecer na entidade, desde que o mesmo manifeste sua vontade no prazo de 90 (noventa) dias, a partir da data de comunicação aos Participantes, e concorde com as condições de permanência no plano impostas pela entidade.
8. A Patrocinadora, em comum acordo com a entidade, poderá ter as seguintes opções com relação aos participantes Ativos, cujos procedimentos necessários serão feitos pela entidade:
I - manter os Participantes Ativos na entidade;
II - transferir os Participantes Ativos para outra entidade fechada ou aberta; ou
II - pagamento à vista dos fundos correspondentes, calculados individualmente.
Caso a Patrocinadora faça a opção referente aos incisos I ou II anteriores será assegurado ao Participante, no caso de seu desligamento da entidade, a qualquer tempo, receber o valor presente das contribuições feitas pelo mesmo, para o plano de benefícios, já descontados os riscos decorridos, corrigidos monetariamente até a data do efetivo pagamento, em conformidade com o previsto no regulamento do plano ou, se esse for omisso, pela variação das Obrigações do Tesouro Nacional - OTN acrescidos do correspondente juro atuarial.
Se a Patrocinadora optar por pagamento à vista, o valor correspondente ao inciso III deste item deverá ser corrigido monetariamente pela variação das Obrigações do Tesouro Nacional - OTN, desde a data da Avaliação Atuarial até a data do efetivo pagamento.
(...)
Da simples leitura do Anexo da citada Resolução, tendo em vista a complexidade da operação de retirada de patrocínio, que envolve inúmeras atividades de consolidação das posições de suficiência ou insuficiência dos recursos vertidos e obrigações geradas em relação a participantes e assistidos, é possível depreender que somente estará concluída a retirada de patrocínio após a obtenção das situações e possibilidades financeiras acessíveis aos participantes e assistidos em relação aos recursos vertidos ao Plano de Benefícios, o que se dá com a aprovação do órgão estatal competente, somente a partir daí fluindo prazos prescricionais ligados a prestações de caráter financeiro e obrigacional.
Igualmente, o objeto de apuração no processo de retirada também pode ser considerado causa de suspensão do prazo prescricional, nos casos de patrocínio público, segundo os ditames do Decreto 20.910, de 1932:
Art. 4º Não corre a prescrição durante a demora que, no estudo, ao reconhecimento ou no pagamento da dívida, considerada líquida, tiverem as repartições ou funcionários encarregados de estudar e apurá-la.
Parágrafo único. A suspensão da prescrição, neste caso, verificar-se-á pela entrada do requerimento do titular do direito ou do credor nos livros ou protocolos das repartições públicas, com designação do dia, mês e ano.
Logo, concluindo-se que a retirada de patrocínio não se conclui tão somente com a formulação do distrato, e sim com a expressa autorização do órgão estatal competente[11], forçoso reconhecer que qualquer prazo prescricional somente terá início com a autorização pelo órgão estatal competente
CONCLUSÃO
O presente artigo teve como objetivo basilar tecer algumas considerações sobre a prescrição das contribuições no regime de previdência complementar operado por entidades fechadas, bem como as diversas nuances jurídicas decorrentes do patrocínio público, bem como a aplicação no tempo de diversos diplomas durante a execução do contrato previdenciário.
Longe de esgotarmos o tema, bem como considerando ainda a escassez de doutrina especializada no que diz respeito à previdência complementar, resta destacarmos a necessidade da reflexão do aqui exposto, buscando assim concretizar em tais relações, principalmente no que diz respeito à aplicação da prescrição nas relações jurídicas entabuladas no ambiente da previdência complementar.
BIBLIOGRAFIA
CAZETTA, Luis Carlos. Previdência Privada – O regime jurídico das entidades fechadas, Porto Alegre, Sergio Antonio Fabris Editor, 2006;
CUNHA, Leonardo José Carneiro da. A Fazenda Pública em Juízo, São Paulo, Dialética, 2010;
ROSA, Igor Dainton Travassos da Rosa. Da Prescrição Total ou “Do Fundo de Direito” em Ações Judiciais Envolvendo Previdência Complementar, Rio de Janeiro, Revista de Previdência, ISSN 1807-43X – 2012/11, n. 11;
TÁCITO, Caio. Previdência privada e direito adquirido. Revista de direito administrativo, nº 186. out./dez. 1991. p.101.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil – Parte Geral, São Paulo, Editora Atlas, 2004;
[1] “O instituto da prescrição tem uma função muito importante no sentido de dar estabilidade às relações jurídicas, criada pela necessidade social da existência de impedir a perpetuação de litígios.” ROSA, Igor Dainton Travassos da Rosa. Da Prescrição Total ou “Do Fundo de Direito” em Ações Judiciais Envolvendo Previdência Complementar, Rio de Janeiro, Revista de Previdência, ISSN 1807-43X – 2012/11, n. 11. p. 35-61.
[2] Art. 189. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206. (Código Civil de 2002)
[3] “Se a possibilidade de exercício dos direitos fosse indefinida no tempo, haveria instabilidade social. O devedor, passado muito tempo da constituição do seu débito, nunca saberia se o credor poderia, a qualquer momento, voltar-se contra ele. O decurso de tempo, em lapso maior ou menor, deve colocar uma pedra sobre a relação jurídica cujo direito não foi exercido. É com fundamento na paz social, na tranquilidade da ordem jurídica que devemos buscar o fundamento do fenômeno da prescrição e da decadência.” VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil – Parte Geral, São Paulo, Editora Atlas, 2004, p.629.
[4] “Embora tenha configurado adaptação reconhecidamente imperfeita de modelo estrangeiro ( o sistema norte-americano, que se estrutura em universo jurídico bastante distinto do que corresponde ao direito brasileiro), a Lei nº 6.435, de 1977, teve o mérito de estabelecer regime que serviu de base para a introdução, no ordenamento nacional, das regras mínimas aplicáveis às relações jurídicas relativas ao processo de formação de poupança privada destinada ao custeio e à atribuição de benefícios previdenciários econômica e juridicamente apartados do regime geral de previdência social.” CAZETTA, Luis Carlos. Previdência Privada – O regime jurídico das entidades fechadas, Porto Alegre, Sergio Antonio Fabris Editor, 2006, p.20.
[5] Art. 66. A decretação da liquidação extrajudicial produzirá, de imediato, os seguintes efeitos:
(...)
V - interrupção da prescrição em relação às obrigações da entidade em liquidação; (Lei nº 6.435/77)
[6] CUNHA, Leonardo José Carneiro da. A Fazenda Pública em Juízo, São Paulo, Dialética, 2010, p.76.
[7] “As entidades fechadas de previdência privada e os participantes que a elas se associam firmam uma relação contratual, constituído mediante a adesão desses últimos aos planos de benefício oferecidos por aquelas, nos termos de seus estatutos e regulamentos internos”. TÁCITO, Caio. Previdência privada e direito adquirido. Revista de direito administrativo, nº 186. out./dez. 1991. p.101.
[8] Joia – É o custo que pode ser cobrado na adesão de novo participante quando esta incorrer em idade superior à média relativa aos parâmetros da massa atuarial. – glossário – Fundos de Pensão - Coletânea de Normas 2012.
[9] No plano de benefícios oferecido por patrocinador, o critério de custeio poderá prever a separação dos encargos correspondentes ao período anterior à implantação do plano, denominado serviço passado, e ao período posterior à implantação do plano, denominado serviço futuro. (Item 7, Anexo da Resolução CGPC nº 18/2006).
[10] Parecer nº 51/2011/CGEN/PF/PREVIC.
[11] Art. 33. Dependerão de prévia e expressa autorização do órgão regulador e fiscalizador:
(...)
III - as retiradas de patrocinadores; e (LC nº 109/2001)
Procurador Federal, Coordenador-Geral de Estudos e Normas da Procuradoria Federal junto à PREVIC, Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade do Sul de Santa Catarina - UNISUL, Membro da Câmara de Recursos da Previdência Complementar - CRPC.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: HENRIQUE, Adriano Cardoso. Prescrição das contribuições normais e extraordinárias na Previdência Complementar Fechada Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 14 out 2013, 06:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/36938/prescricao-das-contribuicoes-normais-e-extraordinarias-na-previdencia-complementar-fechada. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Maurício Sousa da Silva
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Por: DESIREE EVANGELISTA DA SILVA
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