RESUMO: Este trabalho tem como objetivo apresentar os principais aspectos do instituto do foro de eleição, quando de sua aplicabilidade nos contratos internacionais, partindo do pressuposto de sua construção jurídica está apoiado no principio da autonomia contratual, mas sem deixar de lado a discussão sobre os limites de sua aplicação, tanto de vista jurídico quanto do ponto de vista de sua eficácia prática.
PALAVRAS- CHAVES: Foro de eleição; contratos internacionais; autonomia contratual; eficácia.
INTRODUÇÃO
Com o fenômeno da globalização, as economias dos países passaram por uma grande transformação, pois os mercados produtivos e o consumidor expandiram para além das fronteiras geográficas regionais. Assim, países como EUA, Japão e Alemanha passaram a exportar produtos para a América Latina. África e Ásia, aumentando vertiginosamente os seus lucros e criando uma enorme rede de comercialização.
O fato é que, hoje em dia, é possível adquirir uma camisa produzida nos EUA, ou um computador de última geração produzido no Japão, sem sair de casa, através da internet que pode ser considerada a maior rede de telecomunicações do mundo, por meio da qual se realizam a todo o instante todo tipo de negócio jurídico, a exemplo da compra e venda de produtos de uma empresa que tem sua sede no exterior. Eis que num negócio jurídico, o risco sempre existe para as partes envolvidas e, por isso, estas necessitam de meios hábeis para solucionar os conflitos que possam advir dessa relação jurídica.
Porém, não é tão simples assim, quando se trata de um negócio jurídico que envolve partes de diferentes nacionalidades, portanto, um negócio transnacional, ao qual, muitas vezes, não se sabe qual legislação se deve aplicar para solucionar o problema. Nesse sentido, o direito internacional privado tem surgido como área do Direito encarregada de orientar a aplicação da norma ao caso concreto, constituindo num “direito do direito”, a exemplo da lei de introdução do código civil, que no caso brasileiro, é uma norma de extrema importância para a solução de conflito transnacionais.
Há que dizer ainda que a relação contratual decorre de uma manifestação autônoma de vontade das partes, através da qual uma das partes propõe e outra parte aceita ou não o objeto da avença formando-se um contrato. Não há contrato sem vontade. Assim, o contrato decorre da autonomia das partes envolvidas para a consecução do negócio jurídico, desde que respeitada as normas de natureza pública, também chamadas cogentes.
Segundo Arnoldo Wald, a autonomia da vontade se apresenta sob duas formas, uma chamada de liberdade de contratar, a qual se identifica com a liberdade de contratar ou não, e a outra chamada liberdade contratual que se manifesta como liberdade para dispor sobre o conteúdo do contrato, estando ai o foro de eleição.
Assim, pode a parte constituir qualquer contrato não previsto dentro do código civil de 2002, e por isso, será chamado de contrato inominado, mas terá de respeitar o que disposto no art. 104 do cc 2, o qual estabelece como requisitos no negócio jurídico, a forma pre-escrita ou não na defesa em lei, objeto licito, possível e determinado, e ser o agente capaz.
Assim, toda parte no negócio jurídico pode adequar as condições do contrato aos seus interesses, elaborando clausulas sobre valores, objeto avançado, multas contratuais, e até foro para derimir quaisquer litígios que possam surgir no decorrer do negócio. Porem, não se trata lide que possibilita de forma absoluta a aplicação do foro de eleição, a exemplo dos contratos administrativos, nos quais a lei n 8.66693, estabelece que o foro para dirimir quaisquer litígios entre contratados e administração publica é, em geral, local da sede da administração.
Por fim, será um tema desse trabalho a aplicação ou não o foro e eleição nos contratos de trato internacional, analisando-se a possibilidade jurídica deste mecanismo em termo de competência absoluta e concorrente, bem como a sua eficácia prática.
I – DO FORO DE ELEIÇÃO COMO MECANISMO INERENTE À COMPETÊNCIA ESTATAL
Inicialmente, é preciso estabelecer o conceito de competência para identificarmos o porquê de o foro de eleição está no campo da competência e não no campo material. Assim, dispõe Liebman que a competência é a quantidade de jurisdição atribuída a determinado órgão com poder jurisdicional. Para compreender de quem é a competência para aplicar o direito no caso concreto é necessário ter uma adequação entre a lide e o órgão jurisdicional, através de um conjunto de normas legais preexistentes.
O foro de eleição não constitui um mecanismo que resolve o problema da legislação a ser aplicada, mas quem é o Estado competente a julgar determinada lide. Sua previsão legal vem disposta no artigo III do CPC que estabelece que a competência em razão da matéria e da hierarquia é inderrogável por convenção das partes, mas estas podem modificar a competência em razão do valor e do território, elegendo foro onde serão propostas as ações oriundas de direitos e obrigações. Do ponto de vista do direito interno, fora a súmula n 335 do STF que ratificou de vez, o entendimento que já era proferido pela jurisprudência e pela doutrina, ao afirmar ser válida a cláusula de eleição de foro para os processos oriundos do contrato.
Embora tal dispositivo esteja na parte “Da Competência Interna”, aplica-se perfeitamente aos contratos internacionais eis que em relação ao território prevê-se a possibilidade de prorrogação de competência. Aliá, não se pode confundir a clausula de eleição de foro que aqui se está a discutir com a cláusula compromissória, a qual permite a solução de conflito mediante a aplicação de soluções alternativas, ou extrajudiciais. Assim, nesta, as partes escolhem um árbitro, especialista no objeto do contrato, para decidir a questão, que obrigatoriamente deverá ter natureza patrimonial, e disponível, conforme dispõe a lei n 9.307|96, que estabeleceu a Arbitragem no Brasil.
O que irá se discutir aqui é a aplicação da jurisdição estatal monopolizante, eis que na cláusula de eleição, as partes indicam qual jurisdição será a competente para julgar e executar a sentença, o que não ocorre na decisão do árbitro, eis que sua decisão não se reveste de coercitividade. Mesmo assim, o tribunal Arbitral tem crescido muito ao longo dos anos, principalmente nas causas que envolvem grandes empresas transnacionais, que não querem ficar a mercê de um Poder Judiciário burocrático.
Enfim, o que se decide, quando da manifestação das partes em estabelecer o foro de eleição diverso daquele em que pela lei de determinado Estado seria o competente, é matéria inerente à competência processual, e não a natureza material, embora muito das vezes, o estado que detém competência estabelecida pelo foro de eleição possa aplicar o que a sua lei interna dispõe.
II – DA POSSIBILIDADE JURÍDICA DO FORO DE ELEIÇÃO NOS CONTRATOS INTERNACIONAIS
O foro de eleição, embora constitua manifestação do principio da autonomia contratual, sofre limitações e precisa estar de acordo com determinados critérios para ser devidamente aplicado. Nesse sentido, cabe ao Estado soberano ditar os limites internacionais de sua jurisdição em suas normas internas, tendo em vista a aplicação de duas regras de ponderação, quais sejam: a conveniência, na qual se excluem os conflitos irrelevantes para o estado, que se interessa pela pacificação no seio de sua própria convivência social; e a viabilidade, na qual se excluem os casos em que não será possível a imposição coercitiva dos efeitos da sentença.
Dito isso, não pode as partes estabelecer foro de eleição quando a situação se enquadre nos incisos despostos no artigo 89 do CPC. Assim, não caberá foro de eleição quando se conhecer de ações relativas a imóveis situados no Brasil; quando se tratar de proceder a inventário e partilha de bens, situados no Brasil, ainda que o autor da herança seja estrangeiro e tenha residido fora do território nacional.
O fato é que o estatuto processual disciplina que para estes casos a competência da autoridade judiciária brasileira é do tipo absoluta, não cabendo a um Estado Estrangeiro se pronunciar sobre imóvel que se situe no Brasil ou sobre partilha e inventário de bens situados no nosso país. Embora seja esta regra prevista no referido artigo, afirma o STJ que se a partilha for inter vivos, a sentença estrangeira poderá ser homologada. Assim sendo, o Brasil poderia julgar casos de bens no exterior, desde que não haja interesse direito do Estado.
O que impede que um americano e um canadense elejam como foro de eleição a Argentina para julgar uma ação inerente a um bem situado no Brasil, ´de justamente o fato de que compete exclusivamente à autoridade judiciária brasileira a competência para a resolução do conflito, bem como uma sentença estrangeira, para este caso, nenhum efeito prático produziria no Brasil, pois não teria como ser executada. Aliás, é preciso dizer que nos casos de competência exclusiva não se aceita a homologação de sentença estrangeira.
A situação se inverte quando da leitura do artigo 88 do CPC que prevê a chamada competenia relativa ou concorrente, por meio da qual o Brasil, embora se julgue competente para julgar determinada ação, nada impede que outro Estado também se julgue competente. Assim, quando o réu, qualquer que seja a sua nacionalidade, estiver domiciliado no Brasil; no Brasil tiver de ser cumprida a obrigação; ou a ação se originar de fato ocorrido ou de ato praticado no Brasil, será possível a eleição de foro desde que não tenha a eleição fim de fraude e que haja uma relação entre o foro escolhido e o contrato.
Assim, não se trata de quaisquer situações em que poderia uma das partes eleger como foro de eleição o Brasil, por exemplo, na medida em que deveria haver uma relação jurídica preponderante entre o foro e a efetivação do contrato. Não é por que há uma sucursal de uma empresa estrangeira no Brasil que as partes podem estabelecer o Brasil como foro para solucionar um possível conflito, sendo necessário determinar se alguma das relações jurídicas teria se constituído no nosso país ou aqui tivesse que ser concretizada.
Importante também analisar é a situação do Código de Bustamante, o qual, em seu artigo 318 disciplina que a nacionalidade será elemento indicador de qual justiça será a competente para julgar determinada situação, desde que as partes tenham nacionalidades de países ratificadores do Código. Nesse caso, a previsão do artigo 90 do CPC que envolve a litispendência não se constitui, eis que a ação intentada em determinado Estado impede a tramitação em outro signatário.
Por fim, outra discussão que se pode fazer acerca do tema recai sobre se o foro de eleição atinge ou não o principio da soberania, na medida em que dois brasileiros envolvidos num conflito contratual optassem por um foro diverso do brasileiro. Assim sendo, é preciso entender que o estabelecimento do Brasil como foro para o julgamento de conflitos oriundos de um contrato entre partes estrangeiras não significa a aplicação da lei brasileira ao caso, da mesma forma em que o estabelecimento de foro alienígena para julgar um conflito entre brasileiros não significa a aplicação de lei estrangeira. Além disso, dispõe a LICC, em seu artigo 17, que nenhum at, sentença, lei ou qualquer manifestação de vontade terá eficácia no Brasil, quando ofenderem a soberania nacional, a ordem pública e os bons costumes.
Bancário e estudante de Direito.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: LIMA, Ronisberg Rodrigues. Foro e eleição nos contratos internacionais: da possibilidade jurídica à eficácia na jurisdição brasileira Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 01 nov 2013, 06:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/37091/foro-e-eleicao-nos-contratos-internacionais-da-possibilidade-juridica-a-eficacia-na-jurisdicao-brasileira. Acesso em: 22 nov 2024.
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