A percepção de benefício assistencial a pessoa portadora de deficiência exige, cumulativamente, a incapacidade para o trabalho e para a vida independente e o cumprimento referente à renda per capital inferior a ¼ do salário mínimo.
Nesse ínterim, é possível afirmar que o menor impúbere portador de deficiência reconhecidamente incapacitante tem direito ao benefício assistencial de prestação continuada previsto na LOAS (Lei nº 8.742/93)?
A resposta ao questionamento não é tão simples quanto possa parecer no primeiro momento.
O dispositivo constitucional insculpido no art. 7º, inciso XXXIII, veda qualquer trabalho a menor de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz. Entretanto, mesmo na condição de menor aprendiz, o início do trabalho somente pode se dar a partir dos quatorze anos (art. 403, CLT).
Enquanto impúberes, são absolutamente incapazes para os atos da vida civil (art. 3º, CC). Os pais, a quem compete o exercício do poder familiar, devem prover-lhes o sustento. De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (art. 4º), “é dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária”.
Vê-se que a lei toma a figura do menor impúbere como naturalmente incapacitado para o trabalho, afinal, não se pode exigir dos infantes que sejam capazes de prover sua própria subsistência por meio do trabalho.
Com isso não se quer excluir de plano a possibilidade do menor impúbere ser titular de benefício assistencial à pessoa portadora de deficiência.
Em caso semelhante, a 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Federais do Paraná[1], apesar negado, à unanimidade, o direito ao benefício assistencial, fixou alguns requisitos importantes:
“Da criança portadora de deficiência não se exige incapacidade para o trabalho ou mesmo uma projeção de que no futuro não poderá trabalhar. O conceito de incapacidade para a vida independente tem maior aplicação nesses casos, sendo devido o benefício quando as restrições impostas pela deficiência impliquem elevação no grau de dependência da criança. A exigência de tratamento particularizado, o maior cuidado dos pais em relação aos afazeres diários da criança, e a necessidade de deslocamento para tratamento ou para frequência a escolas especiais caracterizam a perda da independência da criança, fazendo possível a atuação da Assistência Social, uma vez se tratar de grupo familiar carente.
No caso em tela, o autor na exige cuidados permanentes ou exclusivos da genitora, podendo ela participar ativamente de atividade para a subsistência do lar, descaracterizando assim, redução de renda mensal em virtude da deficiência do menor (fls. 40/42).”
No mesmo sentido também já se manifestou a Turma Recursal dos Juizados Especiais Federais do Espírito Santo[2]:
RECURSO INOMINADO – PREVIDENCIARIO – ASSISTENCIA SOCIAL – BENEFICIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA – ART. 20 DA LEI 8.742/93 – INCAPACIDADE LABORATIVA PARCIAL E DEFINITIVA – INEXISTENCIA DE INCAPACIDADE PARA AS ATIVIDADE COTIDIANAS – RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO – SENTENÇA MANTIDA.
[...]
6. Em que pese o fato de o recorrente ser menor de idade e, assim, naturalmente incapacitado ao trabalho, há que se considerar, como salientado pelo juiz a quo, que o grau de deficiência física que o acomete não o impede de praticar os atos da vida independente, dentro do contexto da sua faixa etária. Inexistindo nos autos elementos probatórios que demonstrem entendimento contrário ao supra-exposto, há que se reconhecer a ausência de deficiência física incapacitante para os atos de sua vida cotidiana, motivo pelo qual não faz jus, o recorrente, ao benefício almejado.
A conclusão a que se chega é que, a priori, o menor impúbere portador de deficiência inserido em família que se enquadre no conceito legal de miserável (renda mensal de até 1/4 do salário mínimo por pessoa) não tem direito ao benefício assistencial previsto na LOAS (Lei nº 8.742/93).
Entretanto, em condições extraordinárias, é possível a concessão, devendo-se avaliar se a deficiência tem o condão de aumentar o grau de dependência da criança em relação aos seus provedores, a ponto de anular ou mesmo reduzir a capacidade de trabalho de um de seus provedores. Em outras palavras, a limitação da criança deve exigir cuidados permanentes dos provedores, chegando ao ponto de retira-los (ambos ou um deles) do mercado de trabalho, a fim de cuidar exclusivamente do menor.
Nesses casos, considerando a carência financeira da família, é necessário a atuação do Poder Público, através da concessão do benefício assistencial, a fim de garantir minimamente os direito previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente (vida, saúde, alimentação, educação, esporte, lazer, cultura, dignidade e respeito).
Precisa estar logado para fazer comentários.