RESUMO: O trabalho trata, simplificadamente, do princípio da instrumentalidade.
PALAVRAS-CHAVE: Princípio. Instrumentalidade. Instrumentalismo.
SUMÁRIO: I Introdução; II O instrumentalismo; III Conclusão; IV Bibliografia.
I – Introdução
A instrumentalidade do processo foi eleita à categoria de princípio, como observa o professor Fredie Didier em seu curso de Direito Processual Civil, veja-se:
“O processo não é um fim em si mesmo, mas uma técnica desenvolvida para a tutela do direito material. O processo é a realidade formal – conjunto de formas preestabelecidas. Sucede que a forma só deve prevalecer se o fim para o qual ela foi desenvolvida não lograr ter sido atingido. A separação entre direito e processo – desejo dos autonomistas – não pode implicar um processo neutro em relação ao direito material que está sob tutela. A visão instrumentalista do processo estabelece a ponte entre o direito processual e o direito material”[1].
O doutrinador e professor, como não poderia deixar de ser, não desconhece ou ignora os ensinamentos do grandioso Calmon de Passos, e argumenta:
Não se pode ignorar a lição de Calmon de Passos, que não aceita a existência de um princípio da instrumentalidade do processo. Eis o excerto da sua lição:
‘...separar o direito, enquanto pensado, do processo comunicativo que o estrutura como linguagem, possibilitando sua concreção como ato decisório, será disso-ciar-se o que é indissociável. Em resumo, não há um direito independente do processo de sua enunciação, o que equivale a dizer-se que o direito pensado e o processo do seu enunciar fazem um. Falar-se, pois, em instrumentalidade do processo é incorrer-se, mesmo que inconsciente e involuntariamente, em um equivoco de graves consequências, porque indutor do falso e perigoso entendimento de que é possível dissociar-se o ser do direito do dizer sobre o direito, o ser do direito do processo de sua produção, o direito material do direito processual. Uma e outra coisa fazem um.’
Calmon de passos está certíssimo. O direito só é após ser produzido. E o Direito se produz processualmente. Quando se fala em instrumentalidade do processo, não se quer minimizar o papel do processo na construção do direito, visto que é absolutamente indispensável, porquanto método de controle do exercício do poder. Trata-se, em verdade, de dar-lhe a sua exata função, que é a de co-protagonista. Forçar o operador jurídico a perceber que as regras processuais hão de ser interpretadas e aplicadas de acordo com a sua função, que é a de emprestar efetividade às regras do direito material”[2].
O que se pretende dizer com as transcrições acima, é que a par de não ter existido uma discussão entre os precursores do instrumentalismo e do neoinstitucionalismo, ou seja, entre Candido Rangel Dinamarco e Rosemiro Pereira Leal, os temas por eles introduzidos são relativamente debatidos por outros doutrinadores, na medida de suas singularidades, é evidente.
II – O instrumentalismo
Passando ao instrumentalismo, observa-se que Cândido Rangel Dinamarco construiu sua tese sob as bases doutrinárias de LIEBMAN e de CHIOVENDA, partindo dos conceitos paradigmáticos de Ação e Jurisdição.
Ao capitanear a escola paulista, sustentou Dinamarco que a mola mestra do sistema deveria ser a jurisdição, passando a ação ser um elemento secundário. Em outras palavras, nesta concepção, não seriam as partes os protagonistas, mas sim o Julgador.
Adotou ainda, a concepção de que o processo não possuía um fim em si mesmo, argumentando finalidades sociais, jurídicas e políticas.
É evidente que a posição de Dinamarco não é errada ou viciada, pelo contrário, realmente o processo não possui um fim em si mesmo, e mais, ele possui finalidades outras que a pura e simples entrega da prestação jurisdicional.
Todavia, parece que houve excesso ao supervalorizar a jurisdição, pois sem a devida valorização das partes e de seus representantes, impossível alcançar as finalidades sociais, jurídicas e políticas.
Todavia, é de se mencionar que a disseminação da própria essência do pensamento de Dinamarco é equivocada, amplamente difundida como mero desprezo as regras, quando elas não permitem o alcance de pontos legítimos e justos, pela simples observância da formalidade.
Como dito acima, Dinamarco foi além, mas alguns dos cursos jurídicos espalhados pelo Brasil apenas pregam a perspectiva delineada no parágrafo anterior, e o que é pior, como verdade absoluta em muitos casos.
Em contraste à escola paulista, surgiu à escola mineira, sob o comando, diga-se assim, de Rosemiro Pereira Leal.
Nada melhor que o próprio criador para falar da criatura, abaixo parte de texto de Rosemiro publicado na rede mundial de computadores:
“Não seria mesmo racional que o processo se prestasse, como um condão mágico, a ser algo capaz "de conduzir as pessoas à ordem jurídica justa", pelas mãos do Judiciário. Justo é uma palavra de múltiplas e capciosas conotações, mesmo quando vantajosa aos seus usuários. Nem Calamandrei, com sua prodigiosa autoridade, em obra clássica, quando pateticamente concitou a todos abandonarem a ilusória infalibilidade do processo de conhecimento e abraçarem a convicção inabalável na ética e responsabilidade dos juízes, arriscar-se-ia a anunciar hoje igual apelo numa sociedade em que as leis, por piores que sejam, e muitas vezes por serem cruéis, decorativas, enganosas ou inócuas, ainda são menos prejudiciais e danosas do que os homens que as fazem e as aplicam.
Atualmente o processo é instituição constitucionalizada garantidora de direitos procedimentais pelos princípios do contraditório, isonomia, ampla defesa, anterioridade da lei, dever da jurisdição, direito ao advogado, liberdade incondicionada de requerer, caracterizadores do due process que abrange o direito material do substantive due process modulador dos procedimentos (procedural due process) para assegurar efetividade. Assim, o ser e o proceder do direito processual assumem significados unívocos pelo conceito de lei fundamental (due process of law) nos Estados Democráticos de Direito, não mais se concebendo a existência de procedimento sem PROCESSO, quando se coloca em debate a efetividade de direitos concernentes à vida – liberdade – dignidade – patrimonialidade”[3].
Para o mineiro, o processo é uma instituição, informada por princípios constitucionais, a saber: contraditório, ampla defesa, isonomia, paridade de armas, entre outros.
Não se trata do fenômeno da constitucionalização do processo, e nisto consiste a superação promovida por Rosemiro, pois destoando desta concepção, afastou-se do protagonismo liberal das partes, bem como rejeitou o protagonismo judicial, sem se comprometer com os ensinamentos de CHIOVENDA e LIEBMAN.
E ainda diz Rosemiro:
“O processo, na visão hodierna, é que é, em si, jurisdicional, porque contém e assegura princípios e direitos dos quais a jurisdição (atividade do Estado) não pode apartar-se ou dissuadir, sendo esdrúxulo, portanto, pensar "tutelas jurisdiconais diferenciadas" como quer Donaldo Armelin, fora dos perfis do processo-garantia-constitucional (due process), porque, mesmo quando o direito alegado não existe, a declaração de inexistência pelo provimento judicante há de ser balizada pelo processo e não pelos requisitos ou critérios da atividade estatal da jurisdição. A jurisdição estatal é que meio de obediência ao processo e não o processo um meio de obediência (serventia) à jurisdição. O equívoco de se imaginar a hipótese de vários processos com várias formas de tutelas jurisdicionais decorre do ensino de Pisani que, não querendo distinguir processo e procedimento, supõe, como também conjectura Barbosa Moreira, que modalidades de tutelas jurisdicionais (pluralità de processi ed una pluralità di forme di tutela giurisdizionale) possam dar origem a vários processos (meios, critérios, modos, métodos) engendrados pelos juízes e que seriam bem mais completos, justos e eficientes que o criado em lei constitucional”[4].
O processo, então, não seria subordinado à jurisdição, pois ele é uma instituição constitucional, constituindo o direito de ação um direito fundamental de cidadania.
III – Conclusão
Parece impossível não se falar atualmente no princípio da instrumentalidade do processo, todavia, deve-se reconhecer, como bem aponta Didier, que o processo possui um caráter de cooperação ou de pareceria, dividindo o protagonismo na realização do direito material.
IV – Bibliografia
DIDIER JR. Fredie. Curso de Direito Processual Civil (Teoria geral e processo de conhecimento). 11 ed. Salvador: JUS PODIVM, 2009.
LEAL, Rosemiro Pereira. Verossimilhança e inequivocidade na tutela antecipada em processo civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n. 44, 1 ago.2000. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/874>. Acesso em: 16 dez. 2012.
[1] DIDIER JR. Fredie. Curso de Direito Processual Civil (Teoria geral e processo de conhecimento). 11 ed. Salvador: JUS PODIVM, 2009. p. 64.
[2] DIDIER JR. Fredie. Curso de Direito Processual Civil (Teoria geral e processo de conhecimento). 11 ed. Salvador: JUS PODIVM, 2009. p. 64.
Procurador Federal em exercício na Procuradoria Federal Especializada junto ao CADE.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MORAES, Roberto Inácio de. Breves palavras sobre o instrumentalismo Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 28 mar 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/38822/breves-palavras-sobre-o-instrumentalismo. Acesso em: 22 nov 2024.
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