I – INTRODUÇÃO.
O presente artigo trata da análise da taxa e do princípio da referibilidade, a fim de confirmar que esta espécie tributária está intimamente relacionada a uma contraprestação estatal prestada direta ou indireta ao contribuinte, como o serviço público específico e divisível, ou o poder de polícia.
II – DESENVOLVIMENTO.
Segundo o art. 145, II, da Constituição Federal, as taxas podem ser instituídas “em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição”.
O art. 77 do Código Tributário Nacional também traçou semelhantes diretrizes para a taxa, vejamos:
Art. 77. As taxas cobradas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição.
Diante disto, Paulo de Barros Carvalho conceitua taxas como sendo tributos que se caracterizam por apresentarem, na hipótese da norma, a descrição de um fato revelador de uma atividade estatal, direta e especificadamente dirigida ao contribuinte.
Hugo de Brito Machado entende taxa como uma espécie de tributo cujo fato gerador é o exercício regular do poder de polícia, ou o serviço público, prestado ou posto à disposição do contribuinte.
Luciano Amaro, por sua vez, afirma que taxas são tributos cujo fato gerador é configurado por uma atuação estatal específica, referível ao contribuinte, que pode consistir: a) no exercício regular do poder de polícia ou b) na prestação ao contribuinte, ou colocação à disposição deste, de serviço público específico e divisível.
Em resumo, as taxas têm como fato gerador o exercício regular do Poder de Polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou colocado a sua disposição.
Desse modo, diverge na doutrina se a taxa tem caráter contraprestacional ou não. Os doutrinadores que defendem este caráter, afirmam que, quem se beneficiar da atuação do Poder Público, deve retribui-lo com o pagamento da taxa. Em outra linha, doutrinadores entendem que a taxa seria apenas um reembolso do custo da atuação estatal, não precisando de o particular ser beneficiado com o serviço público.
Pois bem, Carrazza defende a primeira corrente, afirmando que “a taxa é uma prestação que se inspira no princípio do correspectividade, tomado no sentido de troca de utilidade ou, se preferirmos de comutatividade. É preciso que o Estado faça algo em favor do contribuinte, para dele poder exigir, de modo válido, esta particular espécie tributária”.
Por outro lado, Machado entende que o principal é a referibilidade da atividade estatal ao particular, não sendo necessário que seja vantajosa ou resulta em proveito ao obrigado.
A corrente dominante (a primeira) acredita que é preciso que a Administração Pública faça algo em favor do contribuinte, para dele poder exigir, de modo válido, esta particular espécie tributária. Aqui está a referibilidade da taxa, isto é, o particular recebe um benefício e, em troca, remunera o Estado por isso. Fala-se, ainda, que o fato gerador da taxa é um fato do Estado, em que ele exerce determinada atividade e cobra da pessoa a quem se beneficia da sua atuação.
Por isso, a taxa é classificada como uma espécie tributária vinculada a uma atuação estatal específica (poder de polícia ou serviço público).
O poder de polícia, por sua vez, está conceituado no art. 78 do CTN, da seguinte forma:
Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.
Desse modo, pode-se afirmar que o poder de polícia é o poder estatal de limitar e disciplinar direitos e deveres de particulares com base no interesse público, regulando questões atinentes à segurança, à ordem, aos costumes e etc.
Completa esse entendimento, Ricardo Alexandre, explicando que “a fundamentação (do poder de polícia) é o princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado, que permeia todo o direito público. Assim, o bem comum, o interesse público, o bem-estar geral podem justificar a restrição ou o condicionamento do exercício de direitos individuais”.
Para a legalidade da cobrança da taxa com fundamento neste exercício do poder de polícia, exige-se que haja regularmente um órgão administrativo que exercite o mencionado poder fiscalizatório no ente tributante, conforme orientação do parágrafo único do art. 78 do CTN, vejamos:
Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder.
O outro fato gerador da taxa é a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público efetivo, divisível e compulsório, como ensina o art. 79 do CTN:
Art. 79. Os serviços públicos a que se refere o artigo 77 consideram-se:
I - utilizados pelo contribuinte:
a) efetivamente, quando por ele usufruídos a qualquer título;
b) potencialmente, quando, sendo de utilização compulsória, sejam postos à sua disposição mediante atividade administrativa em efetivo funcionamento;
II - específicos, quando possam ser destacados em unidades autônomas de intervenção, de utilidade, ou de necessidades públicas;
III - divisíveis, quando suscetíveis de utilização, separadamente, por parte de cada um dos seus usuários.
Entende-se que o serviço público foi utilizado efetivamente quando a pessoa usufruir dele a qualquer título; e utilizado potencialmente significa que, sendo o serviço de utilização compulsória, ele foi posto à disposição do particular mediante atividade administrativa em efetivo funcionamento.
Ademais, o aludido serviço público que caracteriza o fato gerador da taxa tem de ser específico e divisível, ou seja, deve ser relativo ao contribuinte desta taxa e não à coletividade em geral, permitindo que se verifique o vínculo entre o sujeito passivo do tributo e os serviços prestados pelo Poder Público.
Este serviço público tem que ser uti singuli, quer dizer, tem que ser prestado à pessoa específica ou a um determinado grupo de pessoas facilmente numerado. Por outro lado, o serviço uti universi, aquele serviço prestado para toda a coletividade, sem saber quem beneficiará do serviço, não pode ser ressarcido por meio de taxa.
O professor Roque Carrazza detalha este assunto, vejamos:
Para melhor compreensão desta ideia, recordamos que os serviços públicos se dividem em gerais e específicos. Os serviços públicos gerais, ditos também universais, são os prestados uti universi, isto é, indistintamente a todos os cidadãos. Eles alcançam a comunidade, como um todo considerada, beneficiando número indeterminado (ou, pelo menos, indeterminável) de pessoas. É o caso dos serviços de iluminação pública, de segurança pública, de diplomacia, de defesa externa do País, etc. Todos eles não podem ser custeados no Brasil, por meio de taxas, mas, sim, das receitas gerais do Estado, representadas, basicamente, pelos impostos.
Diz-se que os serviços são específicos quando podem ser previamente determinados, destacados em unidade autônoma de intervenção, em áreas delimitadas de atuação. Já os serviços são divisíveis quando suscetíveis de utilização separadamente por parte dos seus usuários, ou seja, utilização individual e mensurável.
Neste sentido, também é a jurisprudência do Poder Judiciário, aqui representada pela apelação cível AC 200038010006530, do Tribunal Regional Federal da 1. Região, cujo relator foi o Desembargador Federal Dr. Leomar Barros Amorim de Sousa, com data de julgamento em 27/07/2007, publicada na página 209, in verbis:
CONSTITUCIONAL. TAXA DE MANUTENÇÃO DAS REDES E DOS SERVIÇOS DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA DO MUNICÍPIO DE JUIZ DE FORA - MG. LEI MUNICIPAL N. 9.187, DE 30 DE DEZEMBRO DE 1997. INCONSTITUCIONALIDADE EM FACE DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL RECONHECIDA PELO TJMG. AUSÊNCIA DE DIVISIBILIDADE. BASE DE CÁLCULO PRÓPRIA DE IMPOSTO. SÚMULA 670 DO STF. 1. Os serviços de manutenção das redes e de iluminação de vias e logradouros públicos são prestados à coletividade, portanto, são serviços públicos uti universi, carecendo do requisito da divisibilidade, dado que não são referíveis individualmente a cada contribuinte per si. Por isso, por não existir na fruição de tais serviços vinculação ou referibilidade ao contribuinte, devem ser custeados mediante os impostos em geral. 2. Súmula 670 do STF: "O serviço de iluminação pública não pode ser remunerado mediante taxa". 3. Apelação e remessa oficial improvidas.
Por fim e na sequência da análise da taxa, observou-se no artigo 145, § 2., da CF, e artigo 77, parágrafo único, do CTN, que a taxa não pode ter base de cálculo ou fato gerador idênticos ao dos impostos.
No entanto, o STF – Supremo Tribunal Federal – editou a Súmula Vinculante n. 29 e relativizou tal entendimento, nos seguintes termos: “é constitucional a adoção, no cálculo do valor de taxa, de um ou mais elementos da base de cálculo própria de determinado imposto, desde que não haja integral identidade entre uma base de cálculo e outra”.
Assim, observa-se que as taxas diferem dos impostos por ter fato gerador vinculado ao exercício de uma atividade estatal e ter base de cálculo que quantifica esta mesma atividade estatal referida, prestada, ao contribuinte.
III – CONCLUSÃO.
Diante do que foi exposto acima, observa que no Brasil as taxas só podem ser cobradas se houver uma contraprestação estatal diretamente prestada ao contribuinte por meio do poder de polícia ou do serviço público específico e divisível.
IV – REFERÊNCIAS.
ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário. 6. ed. São Paulo: Método, 2012.
AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 12. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006.
Apostila do Curso de Pós-Graduação na área do Direito, tema: Garantias Constitucionais e Direito Tributário, da AVM Faculdade Integrada, Brasília/DF.
ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária. 6. ed. 4. tir. São Paulo: Malheiros, 2002.
CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 19. ed. São Paulo: Malheiros, 2003.
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2004.
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 19. ed. rev. atual. São Paulo: Malheiros, 2001.
Procuradora Federal lotada na PFE/Anatel, pertencente à Gerência de Contenciosa desta Agência. Sou Especialista em Direito Administrativo e em Direito Constitucional.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MORELO, Ludimila Carvalho Bitar. Taxa e o princípio da referibilidade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 maio 2014, 06:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/39144/taxa-e-o-principio-da-referibilidade. Acesso em: 22 nov 2024.
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