Resumo: O texto aborda a legalidade de se manter bloqueio à circularização na ANTAQ no caso de se basear em embarcação ainda em construção no exterior.
Palavras-chave: Afretamento. Bloqueio. Circularização. Embarcação em construção.
Abstract: The text discusses the legality of keeping the blocking circularization ANTAQ in the case of relying on vessel still under construction abroad.
Key-words: Charter. Block. Circularization. Vessel under construction.
Sumário: 1) Introdução. 2) Do arcabouço normativo: Lei n.º 9.432/1997 e Resolução n.º 192-ANTAQ. 3) Conclusão.
1. Introdução
Como é de conhecimento, para que uma Empresa Brasileira de Navegação (EBN) afrete uma embarcação estrangeira é necessário que a mesma circularize o transporte que pretende realizar com a embarcação estrangeira, consultando o mercado para verificar se há embarcação brasileira (que tem preferência sobre a estrangeira) apta a realizar o transporte pretendido.
Em existindo alguma embarcação brasileira apta a realizar o serviço, a EBN irá bloquear a circularização, se disponibilizando a realizar o transporte pretendido.
A temática a ser estudada neste excerto é a da possibilidade de uma EBN bloquear circularização com base em embarcação que está sendo construída no exterior, mas que, segundo o cronograma de construção, no momento da realização do transporte, estará apta a realizar o transporte desejado pela empresa circularizante.
2. Do arcabouço normativo: Lei n.º 9.432/1997 e Resolução n.º 192-ANTAQ.
No que tange ao mérito, é importante trazer à baila que a Lei 9.432/1997, que ordena o transporte aquaviário no Brasil, assinala, em seu art. 9º, os casos em que se poderá afretar embarcações estrangeiras. Senão, vejamos:
Art. 9º O afretamento de embarcação estrangeira por viagem ou por tempo, para operar na navegação interior de percurso nacional ou no transporte de mercadorias na navegação de cabotagem ou nas navegações de apoio portuário e marítimo, bem como a casco nu na navegação de apoio portuário, depende de autorização do órgão competente e só poderá ocorrer nos seguintes casos:
I - quando verificada inexistência ou indisponibilidade de embarcação de bandeira brasileira do tipo e porte adequados para o transporte ou apoio pretendido;
II - quando verificado interesse público, devidamente justificado;
III - quando em substituição a embarcações em construção no País, em estaleiro brasileiro, com contrato em eficácia, enquanto durar a construção, por período máximo de trinta e seis meses, até o limite:
a) da tonelagem de porte bruto contratada, para embarcações de carga;
b) da arqueação bruta contratada, para embarcações destinadas ao apoio.
Parágrafo único. A autorização de que trata este artigo também se aplica ao caso de afretamento de embarcação estrangeira para a navegação de longo curso ou interior de percurso internacional, quando o mesmo se realizar em virtude da aplicação do art. 5º, § 3º.
Pela leitura do dispositivo legal, constata-se que a própria lei determinou que as EBN´s só poderiam afretar embarcações estrangeiras quando verificada inexistência ou indisponibilidade de embarcação de bandeira brasileira do tipo e porte adequados para o transporte ou apoio pretendido, em clara proteção às embarcações de bandeira brasileira, tudo com o escopo de fomentar o desenvolvimento do transporte aquaviário nacional e a indústria da construção naval.
A Agência Nacional de Transportes Aquaviários, no exercício legal do seu poder normativo, regulamentando as situações de necessidade de afretamento de embarcações estrangeiras na atividade de apoio marítimo, como in casu, editou a Resolução 192-ANTAQ, de 16 de fevereiro de 2004.
Referida Resolução, densificando o dispositivo legal supramencionado, criou o instituto da circularização e a possibilidade de uma EBN bloquear a circularização ofertada, na forma dos artigos colacionados adiante:
Art. 3º Para os fins desta Norma, considera-se:
VII – circularização: procedimento para consulta formulada por empresa de navegação de apoio marítimo que pretenda a autorização de afretamento de embarcação estrangeira para o apoio pretendido.
Art. 5º A empresa de navegação de apoio marítimo postulante de autorização de afretamento, deverá circularizar consulta a todas as empresas brasileiras de navegação de apoio marítimo.
Art. 7º A empresa de navegação interessada em fretar a embarcação, que atenda ao objeto da consulta, poderá opor bloqueio ao pedido de afretamento mediante manifestação junto à consulente, com cópia à ANTAQ, dentro do prazo de sete dias corridos.
Art. 8º O bloqueio do pedido de afretamento será aceito pela ANTAQ quando reconhecida a existência de oferta de embarcação brasileira disponível que atenda aos requisitos aplicáveis aos serviços descritos na consulta formulada pela empresa brasileira de navegação postulante.
Do arcabouço normativo trazido, tem-se duas premissas básicas para a tomada de decisão acerca de bloqueio ofertado com base em embarcação ainda em construção e em outro país:
1-) deve existir embarcação de bandeira brasileira do tipo e porte adequados para o transporte ou apoio pretendido, ou estrangeira afretada em substituição a embarcações em construção no País, em estaleiro brasileiro;
2-) a ANTAQ analisará se realmente existe embarcação de bandeira brasileira disponível que atenda os requisitos aplicáveis aos serviços descritos na consulta formulada.
Se a embarcação que a empresa pretende utilizar para fazer o serviço e bloquear a circularização ainda está em construção, e ainda mais em estaleiro fora do Brasil, a mesma não pode ser considerada embarcação de bandeira brasileira.
Há, neste caso, mera expectativa de direito da empresa que deseja bloquear a circularização, sem qualquer garantia de que o fato por ela apontado (término da construção e nacionalização da embarcação) vá efetivamente se concretizar, não sendo bastante para limitar direito de um concorrente em um mercado regulado pela competição.
Ora, a intenção da EBN que bloqueia a circularização com base em tal circunstância, se garantindo em fato que é considerado duvidoso, já que haverá a necessidade de suspender a bandeira de origem e inscrever a embarcação construída no REB (evento futuro e incerto), não dá o lastro de segurança jurídica suficiente para que a ANTAQ se baseie em eventos dessa natureza para restringir o direito da empresa que pretende afretar a embarcação estrangeira, sob pena de trazer uma insegurança prejudicial à regulação e ao mercado.
3. Conclusão
Destarte, à luz de todo exposto, a manutenção, pela ANTAQ, de bloqueio de circularização com base em uma embarcação que ainda está sendo construída no exterior, me parece violar os preceitos regulamentares e legais sobre a matéria, mormente pelo não preenchimento dos requisitos do art. 9º da Lei 9.432/1997 c/c o art. 8º da Resolução n.º 192-ANTAQ.
Bibliografia
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