RESUMO: A licitação encontra regramento constitucional e legal e homenageia princípios caros ao ordenamento jurídico, ao conferir igualdade de oportunidades a todos que queiram contratar com o Poder Público. O referido procedimento tenciona, precipuamente e como regra, selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração. No entanto, o alcance do interesse público deve levar em consideração alguns parâmetros. O presente artigo busca estudar justamente quais os principais postulados que norteiam a atuação da Administração Pública na sua contratação, enumerados na Lei de Licitações. Não há dúvida, hoje, da importância dos princípios na interpretação jurídica e, consequentemente, para o estudo das licitações.
SUMÁRIO: Introdução. 1. Licitação. Conceito. 2. O art. da Lei nº 8.666/1993. Objetivos e Princípios Básicos da Licitação. 3. Conclusão. Referências Bibliográficas.
PALAVRAS-CHAVE: Licitação; Princípios; Legalidade; Impessoalidade; Moralidade; Igualdade; Publicidade; Moralidade; Probidade; Vinculação ao Edital; Julgamento Objetivo.
Introdução
Conforme o art. 1o, parágrafo único, da Lei nº 8.666/1993, a licitação é um dever ao qual, além dos órgãos da administração direta, também os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios se submetem. Sendo um dever, devem ser observadas as regras legais e constitucionais quanto ao tema. No entanto, não há dúvidas de que alguns princípios são orientadores do instituto. É sobre ele que nos debruçaremos no presente trabalho.
1. Licitação. Conceito.
A licitação, inicialmente, pode ser definido como um procedimento administrativo estabelecido pela Administração Pública para regular suas contratações. Assim, José dos Santos Carvalho Filho (2014, p. 238) a conceitua como “o procedimento administrativo vinculado por meio do qual os entes da Administração Pública e aqueles por ela controlados selecionam a melhor proposta entre as oferecidas pelos vários interessados, com dois objetivos – a celebração de contrato, ou a obtenção do melhor trabalho técnico, artístico ou científico”. Por isso, concorda o autor que a licitação teria a natureza jurídica de verdadeiro procedimento administrativo seletivo.
Em outros termos, a licitação é “o procedimento administrativo formal em que a Administrac?a?o Pu?blica convoca, mediante condic?o?es estabelecidas em ato pro?prio (edital ou convite), empresas interessadas na apresentac?a?o de propostas para o oferecimento de bens e servic?os”. [1]
A Constituição Federal de 1988, em seu art. 37, inciso XXI, estabelece a realização de licitação como regra. Assevera o preceito em tela:
Art. 37. Omissis.
(...)
XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações; (...)
2. O art. da Lei nº 8.666/1993. Objetivos e Princípios Básicos da Licitação.
O art. 3o da Lei de Licitações preceitua que “a licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos”.
Antes da Lei nº 12.349/2010, a licitação tinha como objetivo homenagear o princípio da isonomia e a seleção da proposta mais vantajosa para a Administração. Com a referida lei, foi incluido mais um objetivo para o instituto, qual seja, a promocão do desenvolvimento nacional sustentável.
De se ver que o art. 3o da Lei nº 8.666/1993 enumera, como princípios básicos da licitação, os seguintes: legalidade, impessoalidade, moralidade, igualdade, publicidade, probidade administrativa, vinculação ao instrumento convocatório e demais princípios correlatos a esses. Com efeito, numa sociedade altamente plural e complexa, já se sabe da impossibilidade de as regras conseguirem prever todas as situações possíveis. Por isso, dúvida não há da importância dos principios para a análise dos procedimentos licitatórios levados a cabo pela Administração Pública, direta ou indireta.
Pelo princípio da legalidade, temos que o administrador, diferentemente dos particulares, apenas pode fazer aquilo que está autorizado por lei. Pensado historicamente para o fim de evitar os abusos absolutistas, inserindo a vontade popular na formação da vontade geral por meio da manifestação do Parlamento, o princípio da legalidade deve ser observado pela Administração Pública no exercício de suas funções.
José dos Santos Carvalho Filho (2014, p. 246) assevera que, “no campo das licitações, o princípio da legalidade impõe, principalmente, que o administrador observe as regras que a lei traçou para o procedimento”, ou seja:
É a aplicação do devido processo legal, segundo o qual se exige que a Administração scolha a modalidade certa; que seja bm clara quanto aos critérios seletivos; que só deixe de realizar a licitação nos casos permitidos na lei; que verifique, com cuidado, os requisitos de habilitação dos candidatos, e, enfim, que se disponha a alcançar os objetivos colimados, seguindo os passos dos mandamentos legais. (CARVALHO FILHO, 2014, p. 246)
O princípio da moralidade, a seu turno, está ligada à ideia de ética, de probidade, de retidão. A sua aplicação à Administração Pública está expressamente prevista na Constituição Federal de 1988, mas não podemos duvidar de sua aplicação às relações privadas, principalmente se observarmos que, hoje, o princípio da boa-fé objetiva é a principal regra na interpretação dos contratos. Aliás, como aduzem Farias e Rosenvald (2013, p. 53), o Código Civil traz a eticidade como paradigma. Para os autores, “se a ética é a ciência do fim para o qual a conduta dos homens deve ser orientada, temos que, no Direito, o ideial para o qual uma sociedade orientará seus fins e ações será justamente na afirmação livre e racional do valor justiça”.
Além disso, complementam os civilistas (2013, p. 93):
(...) não se pode olvidar a boa-fe objetiva como princípio fundamental das relações civis, obrigacionais e contratuais. Não prevista na estrutura codificada de 1916, a boa-fé objetiva materializa uma necessária compreensão ética das relações privadas.
Ocorre que a ideia de probidade não se se aplica apenas às relações privadas. Com efeito, finalizando o princípio da moralidade, preceituam Novelino e Cunha Júnior (2010, p. 292) que “a inclusão do princípio da moralidade administrativa em seu texto formal, reflete, sem dúvida, a preocupação do constituinte e do povo brasileiro com a probidade, a ética e a honestidade na Administração Pública”.
Já o princípio da impessoalidade indica que a Administração Pública deve tratar a todos indistintamente, sem privilégios. Carvalho Filho (2014, p. 246) asevera que, para esse princípio, “a Administração deve dispensar o mesmo tratamento a todos os administrados que estejam na mesma situação jurídica”.
Carvalho Filho (2014, p. 246) ainda interliga os princípios impessoalidade e da moralidade, afirmando que:
Sem dúvida, tais princípios guardam íntima relação entre si. No tema relativo aos princípios da Administração Pública, dissemos que se pessoas com idêntica situação são tratadas de modo diferente e, portanto, não impessoal, a conduta administativa estará sendo ao mesmo tempo imoral. Sendo assim, tanto estará violado um quanto outro princípio.
O princípio da igualdade também tem sede constitucional, constando, em seu art. 5o, caput, que todos são iguais em direitos e obrigações. Especificamente no âmbito das licitações, deve a Administração Pública se preocupar para que todos tenham igualdade de possibilidades na contratação com o Poder Público. Isso não significa que a Administração Pública não possa estabelecer requisitos editalícios para a contratação e, por isso, excluir alguns possíveis participantes do certame.
Nesse sentido, Carvalho Filho (2014, p. 247) leciona que “a lei admite que o administrador, ao enunciar as regras do procedimento, defina alguns requisitos para a competição”. Para o autor, falamos, aqui, em igualdade de expectativas em contratar com a Administação.
O princípio da publicidade também deve ser observado na realização de certames licitatórios, até para que seu pressuposto lógico (a competição) se realize. É com o conhecimento prévio acerca de sua realização que os eventuais competidores, cientes das condições da licitação, decidem se dele participarão ou não. Para Carvalho Filho (2014, p. 247), “esse princípio informa que a licitação deve ser amplamente divulgada, de modo a possibilitar o conhecimento de suas regras a um maior número possível de pessoas”.
Publicidade não deve ser confundida com publicação oficial. Hodiernamente, com espeque na ideia de democracia participativa, não há dúvidas de que a publicidade é noção mais ampla e também se realiza pela internet, pela televisão e outras mídias. No entanto, não devemos duvidar da importância da publicação oficial como mecanismo destinado a assegurar a eficácia dos atos administrativos.
O princípio da probidade administrativa, também previsto na Lei de Licitações, exige do administrador retidão de conduta e lealdade. Trata-se de ideia correlata à de moralidade. Carvalho Filho (2014, p. 247-248) assevera que esse princípio exige que “o administrador atue com honestidade para com os licitantes, sobretudo para com a própria Administração, e, evidentemente, concorra para que sua atividade esteja de fato voltada para o interesse administrativo, que é o de promover a seleção mais acertada possível”.
Em suma, pelo princípio da probidade e da moralidade administrativa, “a conduta dos licitantes e dos agentes pu?blicos tem de ser, ale?m de li?cita, compati?vel com a moral, a e?tica, os bons costumes e as regras da boa administrac?a?o”.[2]
O princípio da vinculação ao instrumento convocatório é de extrema importância e visa assegurar a segurança jurídica da licitação, evitando que o licitante seja surpreendido com exigência infundadas. Por isso a importância do instrumento convocatório. Fala-se em instrumento convocatório, e não em edital, por se tratar de expressão mais ampla. Para Maria Sylvia Zanela Di Pietro (2001, p. 299):
Trata-se de principio essencial cuja inobservância enseja nulidade do procedimento. Além de mencionado no art. 3º da Lei nº 8.666/93, ainda tem seu sentido explicitado, segundo o qual “a Administração não pode descumprir as normas e condições do edital, ao qual se acha estritamente vinculada”. E o artigo 43, inciso V, ainda exige que o julgamento e classificação das propostas se façam de acordo com os critérios de avaliação constantes do edital. O princípio dirige-se tanto à Administração, como se verifica pelos artigos citados, como aos licitantes, pois estes não podem deixar de atender aos requisitos do instrumento convocatório (edital ou carta-convite); se deixarem de apresentar a documentação exigida, serão considerados inabilitados e receberão de volta, fechado, o envelope-proposta (art. 43, inciso II); se deixarem de atender as exigências concernentes a proposta, serão desclassificados (artigo 48, inciso I).
Em outras palavras, temos que o referido princípio “obriga a Administrac?a?o e o licitante a observarem as normas e condic?o?es estabelecidas no ato convocato?rio. Nada podera? ser criado ou feito sem que haja previsa?o no ato convocato?rio”.[3]
Por fim, temos ainda o princípio do julgamento objetivo. Assim, os parâmetros de julgamento previstos no instrumento convocatório devem ser observados no julgamento das propostas. Mais uma vez, evita-se a surpresa dos participantes, homenageando a ideia de segurança jurídica:
Esse princi?pio significa que o administrador deve observar crite?rios objetivos definidos no ato convocato?rio para o julgamento das propostas. Afasta a possibilidade de o julgador utilizar-se de fatores subjetivos ou de crite?rios na?o previstos no ato convocato?rio, mesmo que em benefi?cio da pro?pria Administrac?a?o.[4]
Carvalho Filho (2014, p. 248) atenta para o fato de que este princípio não deve ser observado apenas na fase de julgamento final das propostas, mas em todas as fases em que exista algum tipo de julgamento.
Para a licitação na modalidade pregão, temos, ainda, o princípio da celeridade:
O princi?pio da celeridade, consagrado pela Lei no 10.520, de 2002, como um dos norteadores de licitac?o?es na modalidade prega?o, busca simplificar procedimentos, de rigorismos excessivos e de formalidades desnecessa?rias. As deciso?es, sempre que possi?vel, devem ser tomadas no momento da sessa?o.[5]
Trata-se de princípio que busca dar maior eficiência na atividade administrativa e maior rapidez na finalização de seus procedimentos. Trazido como norte para toda a Administração Pública com a Reforma Administrativa de 1998, o princípio da celeridade deve ser observado, ainda, no âmbito do Poder Judiciário, considerando que, com a Emenda Constitucional 45/2004, falamos, agora, em “razoável duração do processo”.
4. Conclusão.
A licitação é dever inafastável dos órgãos da administração direta, também os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios. A Constituição Federal de 1988 preconiza o dever de licitar como regra. Excepcionais, portanto, são as hipóteses de sua não realização. Assim é que o referido procedimento administrativo deve observar os regramentos decorrentes dos princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos.
Referências Bibliográficas.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 27a edição. São Paulo: Editora Atlas, 2014.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 13a edição. São Paulo: Atlas, 2001.
FARIAS, Cristiano Chaves de e ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil – Volume I. Salvador: Editora Juspodivm, 2013.
CUNHA JÚNIOR, Dirley da e NOVELINO, Marcelo. Constituição Federal. Salvador: Editora JusPodivm, 2010.
[1] In http://portal2.tcu.gov.br/portal/page/portal/TCU/comunidades/licitacoes_contratos/2%20Licitações-Conceitos%20e%20Princ%C3%ADpios.pdf
[2] In http://portal2.tcu.gov.br/portal/page/portal/TCU/comunidades/licitacoes_contratos/2%20Licitações-Conceitos%20e%20Princ%C3%ADpios.pdf
[3] In http://portal2.tcu.gov.br/portal/page/portal/TCU/comunidades/licitacoes_contratos/2%20Licitações-Conceitos%20e%20Princ%C3%ADpios.pdf
[4] In http://portal2.tcu.gov.br/portal/page/portal/TCU/comunidades/licitacoes_contratos/2%20Licitações-Conceitos%20e%20Princ%C3%ADpios.pdf
[5] In http://portal2.tcu.gov.br/portal/page/portal/TCU/comunidades/licitacoes_contratos/2%20Licitações-Conceitos%20e%20Princ%C3%ADpios.pdf.
Procuradora Federal em Brasília (DF).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: NASCIMENTO, Marina Georgia de Oliveira e. Os Princípios Básicos da Licitação Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 13 jun 2014, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/39753/os-principios-basicos-da-licitacao. Acesso em: 22 nov 2024.
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