RESUMO: O presente estudo tratará da hipótese de acumulação de duas aposentadorias concedidas no âmbito do serviço público antes da modificação promovida pela Emenda Constitucional nº 20/1998. Tratará, ainda, da decadência, da ineficácia retroativa do artigo 54 da Lei 9.784/99 e do prazo para a Administração Pública rever os atos de concessão de aposentadorias.
PALAVRAS-CHAVE: Acumulação de duas aposentadorias. Situação jurídica consolidada. Emenda Constitucional nº 20/1998. Segurança Jurídica. Decadência.
1. POSSIBILIDADE DE ACUMULAÇÃO DE DUAS APOSENTADORIAS NO CASO DE SITUAÇÕES JURÍDICAS CONSOLIDADAS ANTERIOMENTE À PROMULGAÇÃO DA EMENDA CONSTITUCIONAL N. 20/1998
O direito à aposentadoria constitui direito fundamental do cidadão, ligado à noção de dignidade da pessoa humana.
Aposentadoria é o "direito garantido pela Constituição, ao servidor público, de perceber determinada remuneração na inatividade" (CARVALHO FILHO, 2003, p. 543).
Com efeito, a aposentadoria constitui um direito fundamental do servidor público, previsto no art. 40 da Constituição Federal de 1988, que, após o cumprimento do período e das condições previstas no ordenamento, passa a ter o direito a receber do Estado determinado valor durante a inatividade.
A concessão da aposentadoria é materializada por meio de um ato administrativo vinculado, emanado pelo Estado no exercício de suas funções, tendo por finalidade reconhecer uma situação jurídica subjetiva do servidor. No contexto do Estado Social, é ato que emana do Poder Público em sua função típica, de forma vinculada, reconhecendo o direito do beneficiário.
Com a mestria que lhe é peculiar, a Ministra Carmem Lúcia Antunes Rocha (1999, p. 413) esclarece que o ato de aposentadoria, em verdade, não é uma concessão do Estado, mas um direito que é assegurado ao agente público, formalizado através de um processo de reconhecimento de sua aquisição pelo interessado. Sob esse prisma, a aposentadoria visa garantir os recursos financeiros indispensáveis ao beneficiário, de natureza alimentar, quando este já não tenha condições de obtê-los por conta própria.
Não se trata, contudo, de nenhum privilégio, favor ou condescendência do Estado, mas sim de um direito fundamental do servidor-trabalhador garantido pela Carta Magna como uma das formas de se assegurar a dignidade da pessoa humana.
Desta feita, a concessão da aposentadoria constitui uma prerrogativa constitucional do servidor formalizada através de um ato administrativo emanado pelo Estado, em consequência do preenchimento dos requisitos legais.
Com o advento da Emenda Constitucional nº 20, de 16.12.98, restou consagrado, no § 10, do art. 37 da Carta Magna, o entendimento já defendido pelo Supremo Tribunal Federal, no sentido da impossibilidade de percepção simultânea de proventos e remuneração, ressalvados os cargos acumuláveis na forma da Constituição, os cargos eletivos e os cargos em comissão declarados em lei de livre nomeação e exoneração.
Eis o teor do dispositivo supramencionado:
Art. 37
[...]
§ 10 – É vedada a percepção simultânea de proventos de aposentadoria decorrentes do art. 40 ou dos arts. 42 e 142 com remuneração de cargo, emprego ou função pública, ressalvados os cargos acumuláveis na forma desta Constituição, os cargos eletivos e os cargos em comissão declarados em lei de livre nomeação e exoneração.
A Emenda Constitucional n.º 20/98 cuidou, ainda, de resguardar o direito dos servidores que já vinham acumulando proventos com remuneração de outro cargo, tendo estabelecido em seu art. 11 a seguinte regra de transição:
Art. 11 - A vedação prevista no art. 37, § 10, da Constituição Federal, não se aplica aos membros de poder e aos inativos, servidores e militares, que, até a publicação desta Emenda, tenham ingressado novamente no serviço público por concurso público de provas ou de provas e títulos, e pelas demais formas previstas na Constituição Federal, sendo-lhes proibida a percepção de mais de uma aposentadoria pelo regime de previdência a que se refere o art. 40 da Constituição Federal, aplicando-se-lhes, em qualquer hipótese, o limite de que trata o § 11 deste mesmo artigo.
Desta forma, não obstante os pronunciamentos anteriores do pretório excelso, restaram respeitadas as situações de acumulação já consolidadas antes da Emenda, observadas as regras concernentes ao teto remuneratório constitucional e à vedação da percepção de novos proventos decorrentes do exercício do cargo público.
A existência de duas aposentadorias anteriores à Emenda 20/1998 restou excepcionada pela norma, na medida da expressão contida no artigo 11, da Emenda em análise, exatamente porque se trata de garantia constitucional relacionada ao princípio da dignidade humana.
Acerca do tema, vale trazer ao conhecimento os v. acórdãos abaixo transcritos:
|
RE 597546 PE |
Relator(a): |
Min. MARCO AURÉLIO |
Julgamento: |
17/04/2013 |
Publicação: |
DJe-081 DIVULG 30/04/2013 PUBLIC 02/05/2013 |
Parte(s): |
UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO - UFPE |
Decisão. ACUMULAÇÃO PROVENTOS EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 20/98 SITUAÇÕES CONSTITUÍDAS RESSALVA RECURSO EXTRAORDINÁRIO – NEGATIVA DE SEGUIMENTO. 1. A Turma Recursal consignou (folha 71): Os benefícios previdenciários do segurado falecido foram concedidos entre os anos de 1989 e 1997, antes, portanto, da Emenda Constitucional 20/98 que inseriu a norma proibitiva do art. 40 , § 6º , da Constituição Federal, que veda a acumulação de mais de duas aposentadorias à conta de regime próprio de previdência. A Emenda Constitucional nº 20 /98 ratificou a proteção dos direitos adquiridos já resguardados pela norma do art. 5º, XXXVI , da Constituição, evitando-se qualquer tipo de controvérsia ao estabelecer que os proventos serão calculados de acordo com as regras vigentes à época em que foi completado o requisito necessário para aposentadoria ou pensão (EC º 20 /98, art. 3º, § 2º ). Assim, se havia possibilidade de cumulação dos vencimentos na atividade e, dos proventos quando da aposentadoria do servidor, não deve existir óbice a cumulação das pensões. Ainda, conforme mencionado na sentença recorrida,(...) como o servidor falecido ingressou em todos os cargos que depois geraram as aposentadorias no serviço público antes do advento da Constituição Federal de 1988, não lhe se aplicava a norma do art. 37 , XVI , que veda a acumulação de mais de 2 cargos públicos. Tanto é assim que o servidor manteve os três cargos sem que nunca a Administração Pública tivesse lhe exigido a renúncia de um deles, situação essa que se consolidou no tempo. 2. Na interposição deste agravo, foram observados os pressupostos de recorribilidade. A peça, subscrita por procurador federal, restou protocolada no prazo legal. A Emenda Constitucional nº 20, publicada no Diário Oficial de 16 de dezembro de 1998, deu ao § 10 do artigo 37 da Carta a seguinte redação: § 10. É vedada a percepção simultânea de proventos de aposentaria decorrentes do art. 40 ou dos arts. 42 e 142 com a remuneração de cargo, emprego ou função pública, ressalvados os cargos acumuláveis na forma desta Constituição, os cargos eletivos e os cargos em comissão declarados em lei de livre nomeação e exoneração. Ao dispor sobre a proibição de acumularem-se proventos, o legislador constituinte derivado ressalvou as situações até então constituídas – entendimento que sustentei no precedente -, fazendo inserir, na citada Emenda, o dispositivo abaixo: Art. 11. A vedação prevista no art. 37, § 10, da Constituição Federal não se aplica aos membros de poder e aos inativos, servidores e militares, que, até a publicação desta Emenda, tenham ingressado novamente no serviço público por concurso público de provas ou de provas e títulos, e pelas demais formas previstas na Constituição Federal , sendo-lhes proibida a percepção de mais de uma aposentadoria pelo regime de previdência a que se refere o art. 40 da Constituição Federal, aplicando-se-lhes, em qualquer hipótese, o limite de que trata o § 11 deste mesmo artigo. A situação jurídica regular do instituidor da pensão veio a ser explicitada, sob o ângulo constitucional, mediante o preceito acima, não se podendo cogitar de enquadramento do extraordinário no permissivo que lhe é próprio. 3. Nego seguimento ao extraordinário. 4. Publiquem
ADMINISTRATIVO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. SERVIDOR PÚBLICO INATIVO QUE REINGRESSOU NO SERVIÇO PÚBLICO, MEDIANTE CONCURSO, ANTES DA PUBLICAÇÃO DA EC N. 20/98. ACUMULAÇÃO DE MAIS DE UMA APOSENTADORIA. IMPOSSIBILIDADE. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA E JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA NO RE 584.388. RECURSO EXTRAORDINÁRIO A QUE SE DÁ PROVIMENTO.1. O Plenário desta Corte, no julgamento do RE 584.388, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, DJ de 27.9.11, reconheceu a repercussão geral da controvérsia objeto destes autos e, no mérito, fixou entendimento no sentido de que o servidor inativo que reingressou no serviço público, mediante concurso público de provas e/ou títulos, antes da publicação da Emenda Constitucional n. 20/98 pode acumular os proventos da aposentadoria com a remuneração do novo cargo, sendo-lhe vedado, entretanto, a percepção de mais de uma aposentadoria.2. In casu, o acórdão recorrido assentou que:“MANDADO DE SEGURANÇA – CONSTITUCIONAL – MÉDICO E PROFESSOR QUE PERCEBE DUAS APOSENTADORIAS NO ÂMBITO FEDERAL E INGRESSA NOVAMETNE NO SERVIÇO PÚBLICO, ATRAVÉS DE CONCURSO PÚBLICO, PARA A SECRETARIA DO ESTADO DA SAÚDE, ANTES DA EDIÇAÕ DA EMENDA CONSTITUCIONAL N. 20/98 – POSSIBILIDADE DE CUMULAÇAÕ DE APOSENTADORIA COMO SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL – SEGURANÇA CONCEDIDA. Tendo o servidor público ingressado antes da vigência da Emenda Constitucional nº 20/98, é permitida a acumulação de proventos de duas aposentadorias com o vencimento de cargo público (Art. 11 – A vedação prevista no art. 37, § 10, da Constituição Federal, não se aplica aos membros de poder e aos inativos, servidores e militares que, até a publicação desta Emenda, tenham ingressado novamente no serviço público por concurso público de provas ou de provas e títulos, e pelas demais formas previstas na Constituição Federal, sendo-lhes proibida a percepção de mais de uma aposentadoria pelo regime de previdência a que se refere o art. 40 da Constituição Federal, aplicando-lhes, em qualquer hipótese, o limite a que trata o § 11 deste mesmo artigo.)(grifou-se).”3. Recurso extraordinário a que se dá provimento. Decisão: Cuida-se de recurso extraordinário interposto pelo Estado de Santa Catarina, com fundamento no artigo 102, inciso III, alínea a, da Constituição Federal de 1988, contra acórdão prolatado pelo TJ/SC assim do: “MANDADO DE SEGURANÇA – CONSTITUCIONAL – MÉDICO E PROFESSOR QUE PERCEBE DUAS APOSENTADORIAS NO ÂMBITO FEDERAL E INGRESSA NOVAMETNE NO SERVIÇO PÚBLICO, ATRAVÉS DE CONCURSO PÚBLICO, PARA A SECRETARIA DO ESTADO DA SAÚDE, ANTES DA EDIÇAÕ DA EMENDA CONSTITUCIONAL N. 20/98 – POSSIBILIDADE DE CUMULAÇAÕ DE APOSENTADORIA COMO SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL – SEGURANÇA CONCEDIDA. Tendo o servidor público ingressado antes da vigência da Emenda Constitucional nº 20/98, é permitida a acumulação de proventos de duas aposentadorias com o vencimento de cargo público (Art. 11 – A vedação prevista no art. 37, § 10, da Constituição Federal, não se aplica aos membros de poder e aos inativos, servidores e militares que, até a publicação desta Emenda, tenham ingressado novamente no serviço público por concurso público de provas ou de provas e títulos, e pelas demais formas previstas na Constituição Federal, sendo-lhes proibida a percepção de mais de uma aposentadoria pelo regime de previdência a que se refere o art. 40 da Constituição Federal, aplicando-lhes, em qualquer hipótese, o limite a que trata o § 11 deste mesmo artigo.)(grifou-se).” Foram opostos embargos de declaração, rejeitados. Nas razões do apelo extremo, o recorrente alega que, “de acordo com o artigo 11, da Emenda Constitucional 20/98, se o servidor, já aposentado, retornou à ativa mediante concurso público antes da data de sua promulgação, pode acumular os proventos de sua aposentadoria com a remuneração deste segundo cargo. Entretanto, uma vez aposentado deste segundo cargo, não mais pode acumular proventos de duas aposentadorias. Em outras palavras, a regra transitória do artigo 11 somente admitiu cumulação de proventos e remuneração, jamais cumulação de dois proventos”. É o relatório. DECIDO. O Plenário desta Corte, no julgamento do RE 584.388, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, DJ de 27.9.11, reconheceu a repercussão geral da controvérsia objeto destes autos e, no mérito, fixou entendimento no sentido de que o servidor inativo que reingressou no serviço público, mediante concurso público de provas e/ou títulos, antes da publicação da Emenda Constitucional n. 20/98 pode acumular os proventos da aposentadoria com a remuneração do novo cargo, sendo-lhe vedado, entretanto, a percepção de mais de uma aposentadoria. Eis a emenda da decisão: “Ementa: CONSTITUCIONAL. SERVIDOR PÚBLICO APOSENTADO. REINGRESSO NO SERVIÇO PÚBLICO ANTES DA EDIÇÃO DA EC 20/98 E FALECIMENTO POSTERIOR À EMENDA. DUPLA ACUMULAÇÃO DE PENSÕES POR MORTE. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. RECURSO IMPROVIDO. I - A Carta de 1988 veda a percepção simultânea de proventos de aposentadoria com remuneração de cargo, emprego ou função pública, ressalvadas hipóteses - inocorrentes na espécie - de cargos acumuláveis na forma da Constituição, cargos eletivos e cargos em comissão (art. 37, § 10, da Constituição). II - Mesmo antes da EC 20/1998, a acumulação de proventos e vencimentos somente era admitida quando se tratasse de cargos, funções ou empregos acumuláveis na atividade, na forma permitida pela CF. III - Com o advento da EC 20/98, que preservou a situação daqueles servidores que retornaram ao serviço público antes da sua promulgação, proibiu, em seu art. 11, a percepção de mais de uma aposentadoria pelo regime de previdência a que se refere o art. 40 da Constituição. IV- Se era proibida a percepção de dupla aposentadoria estatutária não há é possível cogitar-se de direito à segunda pensão, uma vez que o art. 40, § 7º, da Constituição subordinava tal benefício ao valor dos proventos a que o servidor faria jus. V –Recurso extraordinário conhecido e improvido” (Sem grifos no original). Ex positis, DOU PROVIMENTO ao recurso extraordinário (art. 557, § 1º-A, do CPC), declarando invertidos, se houver, os ônus da sucumbência. Publique-se. Brasília, 15 de junho de 2012.Ministro Luiz Fux Relator Documento assinado digitalmente
Como se observa do acórdão supra, nada obsta à cumulação de duas aposentadorias com outro cargo público, desde que aquelas se tenham efetivado antes da Emenda Constitucional nº 20 de 1998, porquanto a permissão legal se dava em razão do regime anterior, qual seja, o da Constituição Federal de 1988, sem a alteração posterior a que ela se destinou.
Com efeito:
Processo: |
ARE 708176 RJ |
Relator(a): |
Min. MARCO AURÉLIO |
Julgamento: |
04/12/2012 |
Publicação: |
DJe-243 DIVULG 11/12/2012 PUBLIC 12/12/2012 |
Parte(s): |
ESTADO DO RIO DE JANEIRO |
Decisão. ACUMULAÇÃO – PROVENTOS – EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 20/98 – RESSALVA DE SITUAÇÕES CONSTITUÍDAS – AGRAVO DESPROVIDO. 1. A Emenda Constitucional nº 20 , publicada no Diário Oficial de 16 de dezembro de 1998, deu ao § 10 do artigo 37 da Carta a seguinte redação: § 10. É vedada a percepção simultânea de proventos de aposentaria decorrentes do art. 40 ou dos arts. 42 e 142 com a remuneração de cargo, emprego ou função pública, ressalvados os cargos acumuláveis na forma desta Constituição, os cargos eletivos e os cargos em comissão declarados em lei de livre nomeação e exoneração. Ao dispor sobre a proibição de acumular-se proventos e vencimentos, o legislador constituinte derivado, admitindo o que sustentei no precedente, ressalvou as situações até então constituídas fazendo inserir, na citada Emenda, dispositivo com o seguinte teor: Art. 11. A vedação prevista no art. 37,§10 , da Constituição Federal não se aplica aos membros de poder e aos inativos, servidores e militares, que, até a publicação desta Emenda, tenham ingressado novamente no serviço público por concurso público de provas ou de provas e títulos, e pelas demais formas previstas na Constituição Federal , sendo-lhes proibida a percepção de mais de uma aposentadoria pelo regime de previdência a que se refere o art. 40 da Constituição Federal, aplicando-se-lhes, em qualquer hipótese o limite de que trata o § 11 deste mesmo artigo. A situação jurídica regular dos recorridos veio a ser explicitada, sob o ângulo constitucional, mediante o preceito acima, não se podendo cogitar, de enquadramento deste extraordinário no permissivo que lhe é próprio. 3. Nego provimento a este agravo. 4. Publiquem. Brasília, 4 de dezembro de 2012.Ministro MARÇO AURÉLIO - Relator
Importante trazer à baila acórdão proferido pelo e. Tribunal Regional Federal da Quinta Região, verbis:
Processo AC 200683000082006
AC - Apelação Cível - 446435
Relator(a) Desembargador Federal Francisco Wildo
TRF5
Órgão julgador: Segunda Turma
Fonte: DJE - Data::07/01/2010 - Página::173
Decisão
UNÂNIME
Ementa
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO COM DUAS APOSENTADORIAS ESTATUTÁRIAS CONCEDIDAS EM 1980 E 1990, RESPECTIVAMENTE. CONCESSÃO DE DUAS PENSÕES POR MORTE, A PARTIR DE 2001. POSSIBILIDADE. RESSALVA DO ART. 11 DA EMENDA CONSTITUCIONAL 20/98. ATO JURÍDICO PERFEITO. DIREITO ADQUIRIDO.
1 - Discute-se nos presentes autos a acumulação de duas pensões estatutárias decorrentes de duas aposentadorias recebidas pelo falecido esposo da apelante, em razão de dois cargos efetivos (técnico de planejamento e procurador autárquico) anteriormente ocupados na SUDENE.
2 - As aposentadorias do falecido servidor foram concedidas antes da promulgação das Emendas Constitucionais nº 19, 20 e 34, não lhe atingindo tais alterações normativas.
3 - O de cujus recebia proventos decorrentes de aposentadoria estatutária de cargo técnico federal, desde 1980, e, tendo prestado novo concurso público, passou a exercer o cargo de procurador federal, quando foi aposentado compulsoriamente em 1990. Ou seja, quando completou condições para fazer jus ao recebimento da segunda aposentadoria, não havia nenhuma norma que vedasse sua acumulação.
4 - As alterações posteriores, especialmente a procedida pela EC nº 20/1998, não podem vir a retirar as garantias constitucionais do ato jurídico perfeito, do direito adquirido, informado pelo princípio basilar da segurança jurídica, da dignidade da pessoa humana, do valor social do trabalho.
5 - Deve o julgador ser fiel à lapidar regra que se contém no art. 5º, da LICC, no sentido de que a superveniência do art. 11 da EC 20/98, se por um lado constitucionalizou a vedada acumulação de provento com vencimento, não vedou, todavia, a viabilidade jurídico-constitucional de o falecido servidor receber os dois proventos concedidos 18 anos e 8 anos, respectivamente, antes da referida alteração constitucional, posto que se trata de uma hipótese concreta, que já havia se formado antes das alterações em referência. Ficando regularizadas, juridicamente, aquelas situações funcionais que se constituíram até a (AC 446435 PE Acórdão fl. 02) data da publicação da Emenda Constitucional nº 20/98. E, no caso dos autos, o servidor já tinha, de há muito, consolidada suas duas inativações.
6 - As duas aposentadorias já consolidadas antes da entrada em vigor da EC nº 20/98, porque estão abrigadas pelo direito adquirido e pelo ato jurídico perfeito, que são garantias constitucionais pétreas, restaram intocadas pela própria redação do referido art. 11, em sua compreensão, pois, no ponto, dispôs para o futuro a validade de suas normas. É necessário, pois, a harmonização dos princípios e regras da Constituição, para a sua correta e, sobretudo, justa aplicação.
7 - Apelação provida.
Data da Decisão: 15/12/2009
Data da Publicação: 07/01/2010 (grifamos)
Se por um lado a superveniência do art. 11 da EC 20/98 constitucionalizou a vedação da acumulação de provento com vencimento, não vedou, todavia, a viabilidade jurídico-constitucional de o servidor receber os dois proventos concedidos antes da referida alteração constitucional, posto que se trata de uma hipótese que já havia se formado antes das alterações em referência.
2. DECADÊNCIA PARA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
A decadência é prevista na Lei 9.784, de 29 de janeiro de 1999 que regula, no âmbito da Administração Pública Federal, o processo administrativo, verbis:
CAPÍTULO XIV
DA ANULAÇÃO, REVOGAÇÃO E CONVALIDAÇÃO
Art. 53. A Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos.
Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.
§ 1o No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.
§ 2o Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato. (grifamos)
Uma análise detalhada do ordenamento jurídico revela que o prazo de cinco anos foi tradicionalmente consolidado e repetido em diversas situações nas quais o Estado (Administração Pública) figura, de alguma maneira, como sujeito da relação jurídica.
Como exemplo do afirmado, é possível destacar as seguintes normas: art. 21 da Lei 4.717/65 (ação popular); art. 142, I da Lei 8.112/90 (pena de demissão ao servidor público); art. 1º. Do Decreto 20.910/32 (prescrição contra fazenda pública); art. 1º.C da Lei 9.494/97 (prescrição das pretensões indenizatórias contra prestadores de serviço público); art. 173 e 150, parágrafo 4º. e 174 do CTN (regulam a decadência da constituição e prescrição da pretensão de cobrança do crédito tributário, sem falar no art. 168 que regula a repetição do indébito); art. 10 do Decreto-Lei 3.365/41 (caducidade para ultimarem-se os atos concretos à desapropriação por necessidade ou utilidade pública); art. 23, I da Lei 8.429/92 (prescrição da pretensão persecutória da improbidade administrativa); dentre outras.
A bem da verdade, o que se observa é uma clara opção legislativa, que estabelece o lapso temporal de cinco anos como razoável à estabilização das situações jurídicas constituídas entre o Estado e os administrados.
Nosso ordenamento jurídico, com exceção de normas específicas[1], consagra o quinquênio como prazo razoável para que a Administração adote as medidas necessárias ao alinhamento de seus atos à legalidade. A fixação de um prazo surge como imperativo do Estado de Direito, que sustentado sob o pilar da segurança jurídica, impede que a incerteza quanto a provimentos da Administração predomine ad eternum, sob a constante possibilidade de invalidação dos atos praticados.
Impende ressaltar que o Superior Tribunal de Justiça tem aplicado, de forma analógica, o prazo decadencial de cinco anos constante do art. 54 da Lei n° 9.784, de 1999, a atos praticados pelos Estados da Federação, em clara observância aos princípios da proteção à confiança e boa-fé. Convém trazer a lume a ementa de emblemático acórdão proferido pelo egrégio STJ sobre a matéria, de relatoria do Senhor Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, quando do julgamento do RMS n° 24.430/AC:
RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ISONOMIA SALARIAL CONCEDIDA PELO PODER PÚBLICO COM BASE EM PARECER DA PROCURADORIA-GERAL DO ESTADO DO ACRE. VERBA DE REPRESENTAÇÃO CONFERIDA AOS PERITOS CRIMINAIS DESDE 1993. SUPRESSÃO POR AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. PREPONDERÂNCIA DO PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA E DA RAZOABILIDADE. CONVALIDAÇÃO DOS EFEITOS JURÍDICOS. INTERREGNO DE MAIS DE DEZ ANOS. REDUTIBILIDADE SIGNIFICATIVA DOS PROVENTOS. RECURSO ORDINÁRIO PROVIDO.
1. O poder-dever da Administração de invalidar seus próprios atos encontra limite temporal no princípio da segurança jurídica, pela evidente razão de que os administrados não podem ficar indefinidamente sujeitos à instabilidade originada do poder de autotutela do Estado, e na convalidação dos efeitos produzidos, quando, em razão de suas consequências jurídicas, a manutenção do ato atenderá mais ao interesse público do que sua invalidação.
2. A infringência à legalidade por um ato administrativo, sob o ponto de vista abstrato, sempre será prejudicial ao interesse público; por outro lado, quando analisada em face das circunstâncias do caso concreto, nem sempre a sua anulação será a melhor solução. Em face da dinâmica das relações jurídicas sociais, haverá casos em que o próprio interesse da coletividade será melhor atendido com a subsistência do ato nascido de forma irregular.
3. O poder da Administração, destarte, não é absoluto, na seara da invalidação de seus atos, de forma que a recomposição da ordem jurídica violada está condicionada primordialmente ao interesse público. O decurso do tempo ou a convalidação dos efeitos jurídicos, em certos casos, é capaz de tornar a anulação de um ato ilegal claramente prejudicial ao interesse público, finalidade precípua da atividade exercida pela Administração.
4. O art. 54 da Lei 9.784/99, aplicável analogicamente ao presente caso, funda-se na importância da segurança jurídica no domínio do Direito Público, estipulando o prazo decadencial de 5 anos para a revisão dos atos administrativos viciosos (sejam eles nulos ou anuláveis) e permitindo, a contrario sensu, a manutenção da eficácia dos mesmos, após o transcurso do interregno mínimo quinquenal, mediante a convalidação ex ope temporis, que tem aplicação excepcional a situações típicas e extremas, assim consideradas aquelas em que avulta grave lesão a direito subjetivo, sendo o seu titular isento de responsabilidade pelo ato eivado de vício.
5. A efetivação do ato que reconheceu a isonomia salarial entre as carreiras de Perito Legal e Delegado de Polícia do Estado do Acre, com base apenas em parecer da Procuradoria-Geral do Estado, e o transcurso de mais de 5 anos, por inusitado que se mostre, consolidou uma situação fática para a qual não se pode fechar os olhos, vez que produziu consequências jurídicas inarredáveis. Precedente do Pretório Excelso.
6. Recurso Ordinário provido, para cassar o ato que suprimiu a verba de representação percebida pelos recorrentes. (RMS 24430/AC, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA TURMA, julgado em 03/03/2009, DJe 30/03/2009) (grifamos)
A aplicação do referido prazo quinquenal a situações diversas das previstas pela Lei n° 9.784, de 1999, não revela um uso equivocado da regra, mas a utilização de seus parâmetros para dar maior aplicabilidade ao princípio da segurança jurídica em todo o ordenamento jurídico pátrio. Não obstante, convém destacar o entendimento jurisprudencial acerca de sua correta interpretação, na esfera de competência da referida Lei n° 9.784/99.
A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento dos Mandados de Segurança n° 9.112/DF e n° 9.157/DF, da relatoria da Ministra Eliana Calmon, e do Mandado de Segurança nº 9.115/DF, da relatoria do Ministro Cesar Asfor Rocha, todos na sessão do dia 16 de fevereiro de 2005, negou toda e qualquer eficácia retroativa ao artigo 54 da Lei nº 9.784/99.
Determinou-se, nos mencionados julgados, que a eficácia da Lei de Processo Administrativo, por consectário lógico, somente poderia se dar a partir de sua vigência, de sorte que o prazo decadencial por ela estipulado não poderia ser contado da prática dos atos ilegais a ela anteriores, mas sim de sua publicação. Esclarece os deslindes da questão, com propriedade, a Senhora Ministra Eliana Calmon, relatora do MS n° 9.112/DF, em excerto que se reproduz, verbis:
(...)
Ora, até 1999, data da Lei 9.784, a Administração podia rever os seus atos, a qualquer tempo (art. 114 da Lei 8.112/90). Ao advento da lei nova, que estabeleceu o prazo de cinco anos, observadas as ressalvas constitucionais do ato jurídico perfeito, do direito adquirido e da coisa julgada (art. 5º, XXXVI, CF), a incidência é contada dos cinco anos a partir de janeiro de 1999. Afinal, a lei veio para normatizar o futuro e não o passado. Assim, quanto aos atos anteriores à lei, o prazo decadencial de cinco anos tem por termo a quo a data da vigência da lei, e não a data do ato.
A questão, idêntica à presente, foi bastante discutida por ocasião do encurtamento do prazo para a ação rescisória, oportunidade em que o STF, pelo voto do Ministro Moreira Alves, posicionou-se no AR 905/DF:
Ação Rescisória. Decadência. Direito Intertemporal. Se o restante do prazo de decadência fixado na lei anterior for superior ao novo prazo estabelecido pela lei nova, despreza-se o período já transcorrido, para levar-se em conta, exclusivamente, o prazo da lei nova, a partir do início da sua vigência. (DJ 28/4/78)
No mesmo sentido antigos julgados, referidos pelo Ministro Teori Zavascki - RE 37.223, Min. Luiz Gallotti, em 10/7/58 e RE 93.110/RJ, rel. Min. Xavier de Albuquerque, em 5/11/80 e AR 1.025-6/PR, em 13/8/81. (MS 9112/DF, Rel. Ministra ELIANA CALMON, CORTE ESPECIAL, julgado em 16/02/2005, DJe 14/11/2005)
No mesmo sentido se orienta a lição de COUTO E SILVA[2]:
A regra do art. 54 da Lei nº 9784/99, como normalmente acontece com as regras jurídicas, tem, por certo, vocação prospectiva, isto é, sua aplicação visa ao futuro e não ao passado. Quer isso dizer, portanto, que o prazo de cinco anos fixado naquele preceito, tem seu termo inicial na data em que a Lei nº 9.784/99 começou a viger, até porque a atribuição de eficácia retroativa à norma legal instituidora do prazo de decadência muito possivelmente atingiria situações protegidas pela garantia constitucional dos direitos adquiridos.
As considerações feitas acima levam, inevitavelmente, à conclusão de que, quando a lei, visando à paz social, entende de fixar prazos para o exercício de alguns direitos potestativos, o decurso do prazo sem o exercício do direito implica a extinção deste, pois, a não ser assim, não haveria razão para a fixação do prazo. Tal consequência (a extinção do direito) tem uma explicação perfeitamente lógica: é que nos direitos potestativos subordinados a prazo, o que causa intranquilidade social não é, propriamente, a existência da pretensão (pois deles não se irradiam pretensões) nem a existência da ação, mas a existência do direito. O que intranquiliza não é a possibilidade de ser exercitada a pretensão ou proposta a ação, mas a possibilidade de ser exercido o direito. Assim, tolher a eficácia da ação, e deixar o direito sobreviver (como ocorre na prescrição), de nada adiantaria, pois a situação de intranquilidade continuaria de pé.
Infere-se, daí, que quando a lei fixa prazo para o exercício de um direito potestativo, o que ela tem em vista, em primeiro lugar, é a extinção desse direito.
Sobre o tema em comento, imprescindível é a lição de COUTO E SILVA[3]:
A Administração Pública, quando lhe cabe esse direito [à invalidação] relativamente aos seus atos administrativos, não tem qualquer pretensão quanto ao destinatário daqueles atos. Este, o destinatário, entretanto, fica meramente sujeito ou exposto a que a Administração Pública postule a invalidação perante o Poder Judiciário ou que ela própria realize a anulação, no exercício da autotutela administrativa.
À luz desses pressupostos, é irrecusável que o prazo do art. 54 da Lei n° 9784/99 é de decadência e não de prescrição. O que se extingue, pelo transcurso do prazo, desde que não haja má fé do interessado, é o próprio direito da Administração Pública federal de pleitear a anulação do ato administrativo, na esfera judicial, ou de ela própria proceder a essa anulação, no exercício da autotutela administrativa.
Em razão da natureza decadencial do prazo em comento, algumas consequências jurídicas são observadas, como por exemplo, a impossibilidade de suspensão ou interrupção do prazo decadencial e, ainda, a possibilidade de arguição, de ofício, da decadência, pelo juiz; ao contrário do que, ordinariamente, a doutrina e a legislação preceituam quanto à prescrição.
Em um Estado de Direito o poder das autoridades constituídas não é absoluto, estando sujeito a princípios e regras jurídicas que visam garantir parcela de segurança aos cidadãos, em detrimento das intervenções estatais que tangenciem seus direitos. Aliada à tradicional concepção liberal do Estado de Direito (império da lei), consoante expressa nossa Carta Constitucional, se alinha um elemento democrático (art. 1º, da CF/88), a fim de que o poder político seja legitimado pelas escolhas dos cidadãos, por meio de seus representantes.
Como um dos corolários do Estado de Direito, exsurge, então, o princípio constitucional da segurança jurídica, que ao lado do princípio da legalidade, sustenta os pilares desse paradigma de Estado.
Conforme leciona COUTO E SILVA[4], a segurança jurídica é um princípio que se ramifica em duas partes, uma objetiva e outra subjetiva.
A primeira é atinente à irretroatividade das leis, à vedação do alcance de novas disposições normativas a atos jurídicos perfeitamente consumados sobre a égide da legislação anterior. Tal acepção do princípio, muito antes de alcançar guarida em nosso ordenamento jurídico (Lei de Introdução ao Código Civil – Decreto Lei n° 4.657, de 1942, art. 6°; Lei de Processo Administrativo – Lei n° 9.784, de 1999, art. 2°, XIII) e Constituição (art. 5°, XXXVI, da CRFB), logrou prestígio, inicialmente, no pensamento absolutista de Thomas Hobbes, quando em suas reflexões quanto ao direito de punir do Estado na obra "O Leviatan", asseverou que uma ação só é passível de pena se previamente existir uma norma que a proíba e que para ela estabeleça uma sanção (no law after a fact done, can make it a crime); esta não é, senão, uma referência clara ao princípio do Direito Penal: nullum crimen sine lege, nulla poena sine lege, na concisa expressão latina concebida por Feuerbach.
Embora verificada no seio do pensamento absolutista, a segurança jurídica, em sua conotação objetiva, foi desenvolvida com maior propriedade no Estado Liberal, visando claramente a resguardar os interesses dos cidadãos contra as intervenções do Estado, cuja atuação legislativa se destinava, de forma precípua, a regular as relações de direito público. Perpassando os limites temporais, a segurança jurídica (vedação a irretroatividade das leis) consolidou-se no direito contemporâneo, quer como preceito constitucional (como em nossa Carta Constitucional) ou infraconstitucional (em países como a França e Alemanha), consoante o já verificado.
A acepção subjetiva do conceito de segurança jurídica é recente e guarda correlação com o princípio da proteção à confiança. Em conformidade com os ensinamentos de COUTO E SILVA, este princípio impõe ao Estado limitações na liberdade de alterar sua conduta e de modificar atos que produziram vantagens para os destinatários, mesmo quando ilegais, ou atribui-lhe consequências patrimoniais por essas alterações, sempre em virtude da crença gerada nos beneficiários, nos administrados ou na sociedade em geral de que aqueles atos eram legítimos, tudo fazendo razoavelmente supor que seriam mantidos[5].
A aparência de regularidade dos atos administrativos, decorrente da presunção de regularidade de que gozam, nutre nos administrados expectativas acerca do comportamento e entendimento da Administração, pautando condutas e relações jurídicas. A reversão ou modificação dos efeitos engendrados pela prática de atos administrativos pode ensejar consequências mais repudiáveis ao direito do que o próprio vício de legalidade invocado pela Administração para a invalidação, sobretudo quando considerada a boa-fé do administrado.
Mais uma vez recorre-se aos profícuos ensinamentos de COUTO E SILVA[6] sobre a matéria:
Parece importante destacar, nesse contexto, que os atos do Poder Público gozam da aparência e da presunção de legitimidade, fatores que, no arco da história, em diferentes situações, têm justificado sua conservação no mundo jurídico, mesmo quando aqueles atos se apresentem eivados de graves vícios. O exemplo mais antigo e talvez mais célebre do que acabamos de afirmar está no fragmento de Ulpiano, constante do Digesto, sob o título «de ordo praetorum» (D.1.14.1), no qual o grande jurista clássico narra o caso do escravo Barbarius Philippus que foi nomeado pretor em Roma. Indaga Ulpiano: «Que diremos do escravo que, conquanto ocultando essa condição, exerceu a dignidade pretória? O que editou, o que decretou, terá sido talvez nulo? Ou será válido por utilidade daqueles que demandaram perante ele, em virtude de lei ou de outro direito?». E responde pela afirmativa.
Não é outra a solução que tem sido dada, até hoje, para os atos praticados por «funcionário de fato». Tais atos são considerados válidos, em razão – costuma-se dizer – da «aparência de legitimidade» de que se revestem, apesar da incompetência absoluta de quem os exarou. Na verdade, o que o direito protege não é a «aparência de legitimidade» daqueles atos, mas a confiança gerada nas pessoas em virtude ou por força da presunção de legalidade e da «aparência de legitimidade» que têm os atos do Poder Público.
Diante das legítimas expectativas dos administrados, fica clarividente que a Administração não poderá, indiscriminadamente, de forma extroversa, interferir na esfera jurídica dos administrados de boa-fé, mediante a invalidação de seus próprios atos, e que estes deverão subsistir em seus efeitos, no intuito de que se preserve a paz social, sob pena de que seja malferido o princípio da segurança jurídica em sua acepção subjetiva.
Nesse particular, a segurança torna-se obséquio externo ou funcionalizador da juridicidade, restringindo-a desde o nascedouro. Almiro do Couto e Silva ressalva a origem protetiva da legalidade contra abusos estatais. Ou seja, a mesma vontade geral que lhe embasa, por vezes, corrige seus próprios excessos intransigentes, pena da invariável adstrição ao 'legal', com o passar das situações já conformadas no tempo, deixe intranquilos e atônitos os súditos que confiaram na legitimidade das anteriores diretrizes administrativas. Trata-se da correção valorativa.
A boa fé, como consectário do princípio da moralidade, impõe à Administração o dever de respeitar as situações jurídicas consolidadas sob a égide dos atos administrativos praticados, pois estes revelam a conduta e entendimento desposados pelo Poder Público, sendo vedada a adoção de comportamentos contraditórios (venire contra factum proprium) que lesem os administrados, atentando contra suas expectativas legítimas.
Reforçando essas impressões, decisão do Superior Tribunal de Justiça:
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. REVOGAÇÃO DE ATO ANULÁVEL OU NULO PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. ART. 54 DA LEI 9.784/1999. PRAZO DECADENCIAL. TERMO A QUO.
1. O entendimento do Superior Tribunal de Justiça é de que o direito de a Administração Pública rever os atos – anuláveis ou nulos – dos quais decorram efeitos favoráveis para os destinatários está sujeito ao prazo de decadência quinquenal, previsto no art. 54 da Lei 9.784/1999. No entanto, a regra não se aplica de forma retroativa, e, nos atos anteriores à citada norma, o termo a quo é o dia 1º.2.1999, data em que a lei entrou em vigor.
2. Na hipótese em tela, os servidores, ora recorrentes, foram notificados em 27.3.2000 da necessidade de devolução dos valores excessivamente recebidos a título de Vantagem Pessoal Nominalmente Identificada – VPNI, dentro, portanto, do quinquênio legal. 3. Recurso Especial não provido. (REsp. 1.189.767-ES, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 01/06/2010, DJe 01/07/2010)
Relevantíssima, também, a jurisprudência do e. Tribunal de Justiça de Minas Gerais:
EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. ACUMULAÇÃO TRÍPLICE DE APOSENTADORIAS. INADMISSIBILIDADE. CASSAÇÃO DE APOSENTADORIA. DECURSO DO PRAZO DECADENCIAL PARA O DESFAZIMENTO DO ATO. LEIS FEDERAL E ESTADUAL ESTABELECENDO ESTE PRAZO EM CINCO (5) ANOS APLICAÇÃO DA SÚMULA 105 DO TRIBUNAL DE CONTAS DE MINAS GERAIS. DIFERENÇA ENTRE DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO.
- A acumulação de cargos públicos somente é permitida nas hipóteses expressamente elencadas na Constituição Federal (art. 37, XVI, "b"). No direito brasileiro, a permissão para acumulação de cargos e/ou proventos sempre teve como parâmetro a possibilidade de sua cumulação na atividade, e nunca existiu, na história republicana, norma constitucional a permitir a acumulação tríplice de proventos e vencimentos.
- O art. 11 da Emenda Constitucional nº 20/98 convalidou as situações anteriores, com respeito à acumulação de proventos e remuneração, no caso dos servidores que, aposentados, ingressaram novamente no serviço público através de concurso, em data anterior à publicação da Emenda Constitucional nº 20/98, e desde que limitadas a dois cargos.
- Decorridos 5 (cinco) anos do ato concessivo da aposentadoria, prazo durante o qual quedou-se inerte a Administração, opera-se a decadência, posto que o ato administrativo, aqui, gerou efeitos no campo de interesses individuais, não sendo absoluta o poder de autotutela da Administração. Mesmo antes da edição da Lei Estadual nº 14.184, de 1º de fevereiro de 2002 (art. 65), o direito de a Administração invalidar os atos por ela praticados, estava sujeito a prazo decadencial por força do princípio da igualdade entre os sujeitos da relação jurídica. Segundo a Súmula 105 do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, "nas aposentadorias, reformas e pensões concedidas há mais de cinco anos, bem como nas admissões ocorridas em igual prazo, contado a partir da entrada do servidor em exercício, o Tribunal d e Contas determinará o registro dos atos que a Administração já não puder anular, salvo comprovada má-fé". - O instituto da decadência não se confunde com o da prescrição, não se aplicando àquele a súmula 85 do STJ nem o Decreto 20.910/32. (Apelação Cível 1.0024.09.731274-8/003, Relator(a): Des.(a) Wander Marotta , 7ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 01/10/2013, publicação da súmula em 04/10/2013) (grifamos)
MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR APOSENTADO SOB A ÉGIDE DO TEXTO CONSTITUCIONAL DE 1988 E ANTERIORMENTE À VIGÊNCIA DA EC 20/98. CUMULAÇÃO DE DUAS APOSENTADORIAS. ATO QUE ANULOU A SEGUNDA APOSENTADORIA COM BASE EM PARECER DO TCMG. DECADÊNCIA. AUSÊNCIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DAS DUAS APOSENTADORIAS À ÉPOCA DA CONCESSÃO DA SEGUNDA INATIVIDADE. SENTENÇA CONCESSIVA DA ORDEM MANTIDA.
1. A Administração tem um prazo decadencial de cinco anos para rever seus atos, desde que deles advenha aspecto patrimonial positivo para o destinatário de boa-fé. Leis 9.784/99, art. 54, c/c 14.184/2002, art. 65. Ultrapassado esse prazo, impossível a anulação de aposentadoria percebida de boa-fé pelo servidor.
2. Para que se anule aposentadoria anteriormente concedida ao servidor, cujos proventos foram percebidos por vários anos, não prescinde o Poder Público de instaurar o devido processo administrativo, garantindo-se o direito de defesa ao interessado. 3. A cumulação de cargos efetivos ou de aposentadorias, era possível antes da edição desta Emenda Constitucional, eis que o texto da Carta Política não continha vedação a respeito. (Ap Cível/Reex Necessário 1.0024.04.389047-4/001, Relator(a): Des.(a) Jarbas Ladeira , 2ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 21/02/2006, publicação da súmula em 17/03/2006) (grifamos)
É conveniente citar, a título de exemplo, que o Superior Tribunal de Justiça, lastreado no art. 54 da Lei de Processo Administrativo, para respaldar a perenização de situação jurídica já consolidada, ponderando a confiança pelo decurso do tempo, manteve ato administrativo inconstitucional.
Expõe-se o julgado:
RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. ENQUADRAMENTO DE PROFESSORA DO ESTADO DE TOCANTINS, COM BASE EM ASCENSÃO FUNCIONAL. LEI ESTADUAL DE TOCANTINS 351/92, POSTERIORMENTE REVOGADA. NORMA INCONSTITUCIONAL. ATO PRATICADO SOB OS AUSPÍCIOS DO ENTÃO VIGENTE ESTATUTO DO MAGISTÉRIO DO ESTADO DE TOCANTINS. PREPONDERÂNCIA DO PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA E DA RAZOABILIDADE. CONVALIDAÇÃO DOS EFEITOS JURÍDICOS. SERVIDORA QUE JÁ SE ENCONTRA APOSENTADA. RECURSO ORDINÁRIO PROVIDO.
1. O poder-dever da Administração de invalidar seus próprios atos encontra limite temporal no princípio da segurança jurídica, pela evidente razão de que os administrados não podem ficar indefinidamente sujeitos à instabilidade originada do poder de autotutela do Estado, e na convalidação dos efeitos produzidos, quando, em razão de suas consequências jurídicas, a manutenção do ato atenderá mais ao interesse público do que sua invalidação.
2. A infringência à legalidade por um ato administrativo, sob o ponto de vista abstrato, sempre será prejudicial ao interesse público; por outro lado, quando analisada em face das circunstâncias do caso concreto, nem sempre sua anulação será a melhor solução. Em face da dinâmica das relações jurídicas sociais, haverá casos em que o próprio interesse da coletividade será melhor atendido com a subsistência do ato nascido de forma irregular.
3. O poder da Administração, destarte, não é absoluto, de forma que a recomposição da ordem jurídica violada está condicionada primordialmente ao interesse público. O decurso do tempo ou a convalidação dos efeitos jurídicos, em certos casos, é capaz de tornar a anulação de um ato ilegal claramente prejudicial ao interesse público, finalidade precípua da atividade exercida pela Administração.
4. O art. 54 da Lei 9.784/99 funda-se na importância da segurança jurídica no domínio do Direito Público, estipulando o prazo decadencial de 5 anos para a revisão dos atos administrativos viciosos (sejam eles nulos ou anuláveis) e permitindo, a contrario sensu, a manutenção da eficácia dos mesmos, após o transcurso do interregno quinquenal, mediante a convalidação ex ope temporis, que tem aplicação excepcional a situações típicas e extremas, assim consideradas aquelas em que avulta grave lesão a direito subjetivo, sendo o seu titular isento de responsabilidade pelo ato eivado de vício.
5. Cumprir a lei nem que o mundo pereça é uma atitude que não tem mais o abono da Ciência Jurídica, neste tempo em que o espírito da justiça se apoia nos direitos fundamentais da pessoa humana, apontando que a razoabilidade é a medida sempre preferível para se mensurar o acerto ou desacerto de uma solução jurídica.
6. O ato que investiu a recorrente no cargo de Professora Nível IV, em 06.01.93, sem a prévia aprovação em concurso público e após a vigência da norma prevista no art. 37, II da Constituição Federal, é induvidosamente ilegal, no entanto, a sua efetivação sob os auspícios de legislação vigente à época, (em que pese sua inconstitucionalidade), a aprovação de sua aposentadoria pelo Tribunal de Contas, e o transcurso de mais de 5 anos, consolidou uma situação fática para a qual não se pode fechar os olhos, vez que produziu consequências jurídicas inarredáveis. Precedente do Pretório Excelso.
7. A singularidade deste caso o extrema de quaisquer outros e impõe a prevalência do princípio da segurança jurídica na ponderação dos valores em questão (legalidade vs segurança), não se podendo ignorar a realidade e aplicar a norma jurídica como se incidisse em ambiente de absoluta abstratividade.
8. Recurso Ordinário provido, para assegurar o direito de a recorrente preservar sua aposentadoria no cargo de Professor, nível IV, referência 23, do Estado do Tocantins.
(RMS 24339/TO, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA TURMA, julgado em 30/10/2008, DJe 17/11/2008)
A imprescindibilidade de se reconhecer não apenas a adequação mas também a constitucionalidade da norma decadencial invocada cingem-se ao reconhecimento da supremacia dos princípios da segurança jurídica e da boa-fé, os quais possuem significativo relevo.
Em outras palavras, não se pode olvidar que a segurança jurídica, modernamente denominada “confiança legítima” e que induz à necessidade de proteção da confiança dos administrados nos atos produzidos pelo Poder Público, tem sido a base para interpretação e efetivação de direitos. É preciso levar em conta que, a partir do momento em que a Administração concedeu a aposentadoria, por meio de ato formal precedido, ainda que presumidamente, da verificação do preenchimento dos requisitos legais necessários à obtenção do benefício, fez surgir para o administrado uma situação jurídica com plena aparência de legalidade e legitimidade.
Os atos administrativos, quando editados, trazem em si a presunção de legitimidade, ou seja, a presunção de que nasceram de acordo com as devidas normas vigentes. Essa característica não depende de lei expressa, mas deflui da própria natureza do ato administrativo, como ato emanado de agente integrante da estrutura do Estado.
Vários são os fundamentos dados a essa característica. O fundamento precípuo, no entanto, reside na circunstância de que se cuida de atos emanados de agentes detentores de parcela do Poder Público, imbuídos, como é natural, do objetivo de alcançar o interesse público que lhes compete proteger. Desse modo, inconcebível seria admitir que não tivessem a aura de legitimidade, permitindo-se que a todo momento sofressem algum entrave oposto por pessoas de interesses contrários. Por esse motivo é que se há de supor que presumivelmente estão em conformidade com a lei. É que o ato emanado do Estado, dotado de presunção de legitimidade e aparência de legalidade, em virtude do decurso do tempo e da boa-fé do destinatário, fez gerar a estabilização da situação jurídica, de forma que não mais poderá a Administração, em caso de suposto “vício”, suprimir os efeitos favoráveis que o ato produziu para o seu destinatário, em observância ao princípio da segurança jurídica.
Se, de um lado, não se pode relegar o postulado de observância dos atos e condutas aos parâmetros estabelecidos na lei, de outro é preciso evitar que situações jurídicas permaneçam por todo o tempo em nível de instabilidade, o que evidentemente, provoca incertezas e receios entre os indivíduos. Nessa esteira de raciocínio, tem-se que a prescrição e a decadência são fatos jurídicos por meio dos quais o Direito confere destaque à imperiosidade de se estabilizarem as relações constituídas, propiciando a concretização do princípio da segurança jurídica.
A propósito, vale citar escólio de Celso Antônio Bandeira de Mello:
“Os institutos da prescrição, da decadência, da preclusão (na esfera processual), do usucapião, da irretroatividade da lei, do direito adquirido, são expressões concretas que bem revelam esta profunda aspiração à estabilidade, à segurança, conatural ao Direito”[7].
A noção de interesse público ou de utilidade pública, em torno da qual se estrutura e gira todo o Direito Público, pode exigir, em dadas situações, a permanência no mundo jurídico do ato originalmente inválido, em razão da necessidade da segurança jurídica.
Cumpre enfatizar que é o direito à segurança que define a sustentação e a eficácia do ordenamento jurídico, nas palavras da Ministra do Supremo Tribunal Federal, Carmen Lúcia Antunes Rocha, garantindo “que cada pessoa [...] durma e acorde ciente de que os seus direitos são os que estão conhecidos no sistema, e que a mudança não se fará senão segundo o quanto nele estabelecido”[8].
A expressão segurança jurídica, em seu desenvolvimento doutrinário e jurisprudencial, conforme Luís Roberto Barroso, passou a designar um conjunto abrangente de ideias e conteúdos, que incluem: “1. a existência de instituições estatais dotadas de poder e garantias, assim como sujeitas ao princípio da legalidade; 2. a confiança nos atos do Poder Público, que deverão reger-se pela boa-fé e pela razoabilidade; 3. a estabilidade das relações jurídicas, manifestada na durabilidade das normas, na anterioridade das leis em relação aos fatos sobre os quais incidem e na conservação de direitos em face da lei nova; 4. a previsibilidade dos comportamentos, tanto os que devem ser seguidos como os que devem ser suportados; 5. a igualdade na lei e perante a lei, inclusive com soluções isonômicas para situações idênticas ou próximas”. [9]
A segurança que se pode esperar do ordenamento jurídico está, pois, em que ele traga um mínimo normativo de princípios que assegurem direitos fundamentais, o que pressupõe a estabilidade das relações, notadamente daquelas firmadas a partir de ato emanado do próprio Estado.
Nessa senda, tem-se que a segurança jurídica deve ser vista como princípio que nos diz que a decisão certa e justa seja adotada de modo a promover a concretização de direitos fundamentais, não permitindo que a prevalência de outros princípios, ainda que da mais alta envergadura, como é o princípio da legalidade, por inadequados à hipótese de regência, possam subverter o tão caro fim colimado com a inauguração do Estado de Direito, tal seja, promover a justiça e assegurar a estabilidade das relações jurídicas constituídas.
Sendo assim, o conteúdo normativo do art. 54 da Lei Federal n° 9.784/99 equivale a uma regra, não cabendo ao operador do direito efetuar juízos de ponderação, tendo em vista que estes já foram previamente estabelecidos pelo legislador ordinário. Assim, uma vez observadas as situações fáticas que se coadunam com as elementares da norma-regra, resta ao operador, tão somente, reconhecer a decadência do direito de anular da Administração.
CONCLUSÃO:
Duas aposentadorias já consolidadas antes da entrada em vigor da EC nº 20/98, porque estão abrigadas pelo direito adquirido e pelo ato jurídico perfeito, que são garantias constitucionais pétreas, restaram intocadas pela própria redação do referido art. 11 da CF/88, em sua compreensão, pois, no ponto, dispôs para o futuro a validade de suas normas. É necessário, pois, a harmonização dos princípios e regras da Constituição, para a sua correta e, sobretudo, justa aplicação. As alterações posteriores, especialmente a procedida pela EC nº 20/1998, não podem vir a retirar as garantias constitucionais do ato jurídico perfeito, do direito adquirido, informado pelo princípio basilar da segurança jurídica, da dignidade da pessoa humana, do valor social do trabalho. Deve-se atentar, ainda, para a decadência, sendo que o transcurso do lapso temporal faz nascer situação jurídica dotada de estabilidade, o que também deve ser observado pela administração pública.
REFERÊNCIAS
COUTO E SILVA, Almiro do. O Princípio da Segurança Jurídica (Proteção à Confiança) no Direito Público Brasileiro e o Direito da Administração Público de Anular os seus Próprios Atos: o prazo decadencial do art. 54 da Lei do Processo Administrativo da União (Lei n 9.784/99), Revista Brasileira de Direito Público RBDP, Porto Alegre, v. vol 06, n. jul/set, p. 7-59, 2004.
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 18. ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 113
ROCHA, Carmen Lúcia Antunes. O princípio da coisa julgada e o vício de inconstitucionalidade. In: Constituição e segurança jurídica: direito adquirido, ato jurídico perfeito e coisa julgada. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2005. p. 168-169.
BARROSO, Luís Roberto. Em algum lugar do passado: segurança jurídica, direito intertemporal e o novo Código Civil. In: Constituição e segurança jurídica: direito adquirido, ato jurídico perfeito e coisa julgada. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2005. p. 139-140.247
[1] Em razão do que dispõe o art. 103-A, da Lei 8.213/91, foi conferida ao INSS a prerrogativa de revisão de seus atos administrativos no prazo decadencial de 10 (dez) anos.
[2] COUTO E SILVA, Almiro do. O Princípio da Segurança Jurídica (Proteção à Confiança) no Direito Público Brasileiro e o Direito da Administração Público de Anular os seus Próprios Atos: o prazo decadencial do art. 54 da Lei do Processo Administrativo da União (Lei n 9.784/99), Revista Brasileira de Direito Público RBDP, Porto Alegre, v. vol 06, n. jul/set, p. 7-59, 2004.
[3] COUTO E SILVA, Almiro do. Op. cit.
[4] COUTO E SILVA, Almiro do. Op. cit.
[5] COUTO E SILVA, Almiro do. Op. cit.
[6] COUTO E SILVA, Almiro do. Op. cit.
[7] BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 18. ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 113
[8] ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. O princípio da coisa julgada e o vício de inconstitucionalidade. In: Constituição e segurança jurídica: direito adquirido, ato jurídico perfeito e coisa julgada. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2005. p. 168-169.
[9] BARROSO, Luís Roberto. Em algum lugar do passado: segurança jurídica, direito intertemporal e o novo Código Civil. In: Constituição e segurança jurídica: direito adquirido, ato jurídico perfeito e coisa julgada. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2005. p. 139-140.247
Procuradora Federal em exercício na Procuradoria-Seccional Federal em Campinas/SP.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BITTENCOURT, Isabela Cristina Pedrosa. Acumulação de duas aposentadorias pelo servidor e a decadência para a administração rever seus atos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 25 jun 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/39939/acumulacao-de-duas-aposentadorias-pelo-servidor-e-a-decadencia-para-a-administracao-rever-seus-atos. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Danilo Eduardo de Souza
Por: maria edligia chaves leite
Por: MARIA EDUARDA DA SILVA BORBA
Por: Luis Felype Fonseca Costa
Por: Mirela Reis Caldas
Precisa estar logado para fazer comentários.