Introdução
O presente estudo objetiva analisar a possibilidade de concessão benefício previdenciário denominado salário maternidade à segurada empregada nas hipóteses de despedida arbitrária por parte do empregador durante o período de estabilidade no emprego em razão da condição de gestante.
Desenvolvimento
O salário-maternidade é um benefício do trabalhador previsto no artigo 7º, inciso XVIII da Constituição Federal que dispõe que são direito dos trabalhadores urbanos e rurais a licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias.
Os artigos 71 e 72 da Lei nº 8.213/91 normatizam a matéria no âmbito da legislação infraconstitucional prevendo que o salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade e que o salário-maternidade para a segurada empregada ou trabalhadora avulsa consistirá numa renda mensal igual a sua remuneração integral.
Da leitura do artigo 72 da Lei nº 8.213/91 pode se observar, de plano, que o salário maternidade não observa o valor do teto de benefícios previsto no artigo 33 da Lei nº 8.213/91, posto que a segurada perceberá integralmente a remuneração que percebia no exercício de sua atividades.
Por sua vez, o artigo 26, inciso VI da Lei 8.213/91 dispensa de carência o benefício de salário-maternidade para a segurada empregada, avulsa e doméstica. Para a empregada contribuinte individual se exige a carência de 10 meses, nos termos do artigo 25, inciso III da Lei 8.213/91.
Assim, para fazer jus ao salário-maternidade, a segurada empregada deve atender aos seguintes requisitos: comprovação da maternidade e qualidade de segurada.
O Decreto 6.122, de 13 de junho de 2007 incluiu o parágrafo único do artigo 97 do Decreto 3.048/99 arrolando a segurada desempregada no rol dos beneficiários do salário-maternidade:
Art. 97. O salário-maternidade da segurada empregada será devido pela previdência social enquanto existir relação de emprego, observadas as regras quanto ao pagamento desse benefício pela empresa. (Redação dada pelo Decreto nº 6.122, de 2007)
Parágrafo único. Durante o período de graça a que se refere o art. 13, a segurada desempregada fará jus ao recebimento do salário-maternidade nos casos de demissão antes da gravidez, ou, durante a gestação, nas hipóteses de dispensa por justa causa ou a pedido, situações em que o benefício será pago diretamente pela previdência social. (Incluído pelo Decreto nº 6.122, de 2007)
Observe-se, entretanto, que não foram contempladas todas as hipóteses de desemprego, mas tão somente a rescisão do contrato de trabalho antes da gravidez e a rescisão do contrato de trabalho durante a gravidez motivada por dispensa com justa causa e por pedido de demissão.
Ou seja, a nova redação do Decreto 3.048 excluiu de sua previsão a dispensa sem justa causa durante a gestação.
O motivo da exclusão é explicitado na redação do art. 241 da Instrução Normativa INSS/PRES nº 20, de 11 de outubro de 2007:
Art. 241. O pagamento do salário-maternidade não pode ser cancelado, salvo se após a concessão forem detectados fraude ou erro administrativo.
§ 1º O salário-maternidade da segurada empregada será devido pela Previdência Social enquanto existir relação de emprego, observadas as regras quanto ao pagamento desse benefício pela empresa.
§ 2º Durante o período de graça a que se refere o art. 13 do RPS, a segurada desempregada fará jus ao recebimento do salário-maternidade nos casos de demissão antes da gravidez, ou, durante a gestação, nas hipóteses de dispensa por justa causa ou a pedido, situações em que o benefício será pago diretamente pela Previdência Social.
§ 3º Considerando que a Constituição Federal no art. 10, inciso II, alínea “b” do ato das Disposições Constitucionais Transitórias, veda a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, observar-se-á as normas seguintes:
I - a responsabilidade pelo pagamento do salário-maternidade será da empresa, que deverá responder pelos salários do período;
II - ocorrido o fato gerador dentro do período de manutenção da qualidade de segurada, para a requerente cujo último vínculo seja de empregada deverá ser observado:
a) tratando-se de dispensa por justa causa ou a pedido, o benefício será concedido pela Previdência Social, tendo em vista o parágrafo único, art. 97 do RPS;
b) tratando-se de dispensa arbitrária ou sem justa causa ocorrida no período entre a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, o benefício não poderá ser concedido, considerando tratar-se de obrigação da empresa/empregador;
III – a requerente deverá assinar declaração específica com a finalidade de identificar a causa da extinção do contrato de trabalho;
IV – havendo dúvida fundada, o servidor poderá encaminhar consulta à Vara do Trabalho local ou ao Tribunal Regional do Trabalho, solicitando informação sobre a existência de reclamatória trabalhista ajuizada pela requerente contra o empregador.
Assim, o salário-maternidade não poderia, em tese, ser concedido à segurada dispensada sem justa causa durante a gravidez simplesmente porque esta goza da garantia constitucional da estabilidade no emprego, nos termos do artigo 10, inciso II, “b” do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias e artigos 391 a 400 da Consolidação das Leis do Trabalho.
Dispõe expressamente o artigo 392 da CLT que a empregada gestante tem direito à licença-maternidade de 120 (cento e vinte) dias, sem prejuízo do emprego e do salário.
Assim, o artigo 392 da CLT garante a empregada gestante, durante o curso da licença maternidade, o pagamento do salário integral pelo empregador.
Todavia, caso ocorra efetivamente a despedida arbitrária da empregada gestante, não nos parece condizente com o ordenamento jurídico a recusa ao pagamento do salário maternidade pelo órgão previdenciário, sem, contudo, ser excluída a responsabilidade do empregador pelo pagamento das contribuições previdenciárias devidas no período de estabilidade no qual houve a demissão.
Em que pese num primeiro momento a conclusão seja no sentido de que a empregada gestante demitida sem justa causa deva recorrer a Justiça do Trabalho para obter ser readmitida no emprego em razão da sua estabilidade, não nos parece correto que nesse período de fragilidade decorrente do parto e os cuidados inerentes aos primeiros meses de vida da criança tenha a empregada gestante que promover ação trabalhista e todos os percursos inerentes a propositura dessa medida para obter seu direito ao salário maternidade.
De outro turno, o artigo 10, inciso II da Constituição Federal veda a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, motivo pelo qual a Administração Previdenciária determina o pagamento do salário maternidade à gestante despedida por justa causa, hipótese na qual há uma falha de conduta da empregada que acaba por cometer uma falta funcional. Obviamente que a causa da demissão não constitui requisito a ser avaliado para a concessão ou não do benefício em exame, todavia não nos parece coerente que a gestante demitida sem justa causa não tenha direito à obtenção do benefício de salário maternidade enquanto a gestante demitida por justa causa tenha esse direito assegurado administrativamente, quando a situação de fragilidade de ambas é absolutamente idêntica.
Consequentemente, cabe a Autarquia Previdenciária o pagamento da licença maternidade, bem como promover a cobrança das contribuições previdenciárias devidas incidentes sobre a remuneração que seria paga a empregada gestante durante o período de estabilidade e licença maternidade do empregador que efetuou a demissão sem justa causa.
Tal medida judicial deve ser proposta por iniciativa própria da Autarquia Previdenciária. Há legitimação ordinária, posto que o objeto da ação á a cobrança dos valores devidos a título de contribuição previdenciária incidente sobre as verbas trabalhistas que não foram pagas a empregada gestante, e não as verbas trabalhistas em si, cuja legitimidade competiria a empregada gestante.
No nosso entender a ação a ser proposta pelo ente previdenciário é a ação ordinária frente à justiça do trabalho, posto que ainda que o objeto da ação não seja o reconhecimento de direitos trabalhistas, as contribuições previdenciárias pleiteadas pela Autarquia são oriundas da relação de trabalho, enquadrando a medida nos termos do artigo 114, inciso I da Constituição Federal, bem como compete a Justiça do Trabalho a cobrança das contribuições previdenciárias decorrentes de decisões proferidas pelos juízes e Tribunais do Trabalho, sendo que para a cobrança das contribuições em questão, necessário o prévio reconhecimento da despedida arbitrária da gestante cuja matéria é inerente as lides trabalhistas.
Cumpre observar que, caso a empregada gestante demitida promova ação trabalhista pleiteando as verbas trabalhistas oriundas do contrato de trabalho encerrado indevidamente, as ações deverão ser reunidas em razão da conexão, posto ser comum a causa de pedir.
Conclusão
Diante do exposto, pode se concluir que nas hipóteses de dispensa sem justa causa durante o período de estabilidade da empregada gestante cabe ao ente previdenciário conceder o benefício de salário maternidade quando requerido administrativamente e, ato contínuo, promover a competente medida judicial objetivando a cobrança das contribuições previdenciárias devidas pelo empregador frente a Justiça do Trabalho.
Procurador Federal e Especialista em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - SP.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MICCHELUCCI, Alvaro. Salário Maternidade - Linhas Gerais e Despedida Arbitrária pelo Empregador durante o período de Estabilidade no Emprego Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 21 jul 2014, 05:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/40223/salario-maternidade-linhas-gerais-e-despedida-arbitraria-pelo-empregador-durante-o-periodo-de-estabilidade-no-emprego. Acesso em: 22 nov 2024.
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