Resumo: O presente trabalho buscou averiguar as inconstitucionalidades por vício material e formal da Emenda Constitucional nº 20/1998, bem como o art. 13 da referida emenda, que trouxe o critério da baixa renda como requisito de concessão, bem como a interpretação da Emenda. Outrossim, o presente trabalho traz a história do benefício previdenciário, evidenciando um retrocesso social, o que contraria o “princípio do não retrocesso social, ou da Proibição da Evolução Reacionária” (LENZA, 2012, p. 1089).
Palavras-chave: Seguridade Social. Previdência Social. Auxílio reclusão. Baixa-Renda. Dependentes. Emenda Constitucional nº 20/98, Art.13. Inconstitucionalidade.
Abstract: The present study sought to determine the unconstitutionality of material and formal addiction Constitutional Amendment No. 20/1998, as well as art. 13 of the said amendment, which brought the criterion of low income requirement for the grant as well as the interpretation of the Amendment. Furthermore, this work brings the history of social security benefits, indicating a social backlash, which contradicts the "principle of non-retrogression social, or reactionary Prohibition of Evolution" (Lenza, 2012, p. 1089).
Keywords: Social Security. Social Security. Aid seclusion. Low-income. Dependent. Constitutional Amendment No. 20/98, Art.13. Unconstitutional.
Sumário: 1. Introdução – 2. Controle de Constitucionalidade 2.1. Controle Difuso de Constitucionalidade – 2.2. Controle Concentrado de Constitucionalidade – 2.3-. Vícios de Constitucionalidade – 3. Início da Previdência no Brasil – 4. Beneficiários do Regime Geral de Previdência Social – 4.1. Segurados – 4.2. Segurados Obrigatórios – 4.3. Segurados Facultativos - 4.4. Tornando-se um segurado – 4.5. Inscrição e Filiação ao Regime Geral da Previdência Social – 4.6 Manutenção e perda da qualidade de Segurado – 4.7 Dependentes – 5. A previdência Social Frente ao Auxílio-Reclusão – 5.1. Previdência Social no Brasil, qual o Objetivo? – 5.2. Princípios Norteadores da Previdência Social – 5.3. O Retrocesso Histórico do Auxílio-Reclusão - 6. O auxílio Reclusão no Brasil – 6.1. Do Posicionamento Contrário à Concessão do Benefício do Auxílio-Reclusão - 7. O Auxílio-Reclusão. Seus Requisitos e Procedimentos Para a Concessão - 8. As Inconstitucionalidades: Emenda Constitucional nº20/1998 e Art.13 da Mesma Emenda – 8.1. A Inconstitucionalidade Por Vício Material - 8.2. A Inconstitucionalidade Por Vício Formal – 9. Conclusão - 10. Referências Bibliográficas.
No presente trabalho tive por objetivo fazer uma análise crítica no que diz respeito à concessão do benefício previdenciário do auxílio-reclusão à luz da Emenda Constitucional nº 20/98, que por sua vez trouxe significativas modificações no sistema previdenciário, entretanto vou deter-me em apenas uma das alterações, qual seja: A alteração do art.201, IV da Constituição Federal, que nos moldes atuais, exige como requisito indispensável para a concessão do Auxílio-Reclusão, a baixa renda do segurado, trazendo ao debate a possível (in)constitucionalidade da referida EC, no que diz respeito a concessão do já falado benefício, que é uma prestação devida aos dependentes do Segurado Recolhido a Prisão. Abordarei de uma forma geral, quem tem direito ao benefício em questão, e, qual foi o prejuízo trazido pela Emenda Constitucional 20/98, bem como os posicionamentos divergentes e, qual o pacífico. No entanto, sem a pretensão de esgotar qualquer discussão.
Espero que este trabalho possa despertar a curiosidade e a ousadia, não só dos operadores do direito, como também de todos aqueles que de alguma forma possam contribuir para que sejamos uma sociedade mais justa, livre e solidária. Lembrando sempre que nos termos do parágrafo único do art.1º da Constituição Federal, “Todo poder emana do povo[..]”.
Antes de adentrar nas questões polêmicas acerca da Inconstitucionalidade do Art. 201, IV da Constituição, com redação estabelecida pelo Art. 13 da EC.20/1998, que impôs o requisito da baixa-renda para a concessão do Auxílio-Reclusão, é necessário fazer uma breve indagação a respeito da previdência social, ou seja, com qual objetivo ela foi criada?
Igualmente, importante fazer uma breve digressão histórica a respeito do próprio benefício, tentando explicar o motivo pelo qual foi criado, e, a partir de quando foi constitucionalizado no Brasil. Para que seja possível fazer uma comparação do que era e do que é, bem como tirar conclusões, se o benefício evoluiu ou retrogradou.
No que tange a previdência social, não posso deixar de ressaltar alguns princípios norteadores do auxílio-reclusão, pois como é sabido, em qualquer ramo do direito a doutrina e a jurisprudência divergem, sendo os princípios, o alicerce de qualquer base legislativa. Apesar disso, não pretendo me alongar em busca de esgotar princípios, mas sim de fazer referência aos que entendo mais pertinentes com o tema ora abordado.
Por fim, conceituarei o beneficio e os critérios atuais para a sua concessão na via administrativa e, a (in)adequação à Constituição Federal, verificando as possíveis afrontas aos princípios basilares da ordem jurídica, como o da igualdade, o da hipossuficiência e o da dignidade da pessoa humana.
2. Controle de Constitucionalidade
Antes de nos jogarmos ao núcleo do vulcão, é importante fazermos uma breve lembrança acerca do Controle de Constitucionalidade, que nas palavras de Erival Oliveira “é a verificação da compatibilidade vertical que necessariamente deve haver entre a Constituição e as normas infraconstitucionais a ela subordinadas.” (OLIVEIRA, 2011, p. 49). Isso fará com que a o leitor prepare-se psicologicamente para enxergar o tema, com a mente livre de preconceitos. Após, falaremos do inicio da previdência no Brasil, dos beneficiários do Regime Geral da Previdência Social, e aí sim, falaremos da Previdência frente ao Auxílio Reclusão, bem como as inconstitucionalidades, sejam elas por vício material e formal, ficando em evidência assim, a inconstitucionalidade material do Art.13 da EC.20/1998, bem como a inconstitucionalidade formal da mesma emenda.
Todo o contexto histórico deve ser levado em consideração para podermos enxergar com clareza a inconstitucionalidade.
Para podermos entender com maior efetividade, é necessário compreender o modo de Controle de Constitucionalidade, no caso, o difuso, também conhecido como controle repressivo ou posterior, ou ainda como via de exceção ou defesa, ou controle aberto, bem como controle concreto ou incidental. Esse modo de controle pode ser realizado por qualquer juízo ou tribunal do judiciário.
Esse controle é realizado entre as partes em casos concretos, dá-se de modo incidental como prejudicial ao exame de mérito.
Como bem argumenta o Prof. Pedro Lenza, “Pede-se algo ao juízo, fundamentando-se na inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo, ou seja, a alegação de inconstitucionalidade será a causa de pedir processual” (LENZA, 2012, p.269).
Neste meio de controle, temos ações certas, bem como os legitimados (art. 103, CF), o referido controle é feito exclusivamente pelo Supremo Tribunal Federal, por meio de cinco instrumentos processuais, a) Ação Direta de Inconstitucionalidade. b) Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental. c) Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão. d) Representação Interventiva. e) Ação Declaratória de Constitucionalidade. Ressalte-se que os legitimados a proporem as respectivas ações são: I) O Presidente da República. II) A mesa do Senado Federal. III) A mesa da Câmara dos Deputados. IV) A Mesa de Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal. V) O Governador de Estado ou do Distrito Federal. VI) O Procurador Geral da República. VII) O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil. VIII) Partido Político com Representação do Congresso Nacional.
Em pauta de inconstitucionalidade, de imediato, deve-se pensar em alguns dos vícios, ou em ambos, o Material e o Formal, para termos um ato normativo inconstitucional este ato deve ter sido viciado. Para melhor esclarecer a questão verificaremos em que consiste cada um dos vícios.
a. Vício por Inconstitucionalidade Material: é o vício que está em evidência, aquele que se choca com a Lei Maior, ou seja, é o ato normativo que contraria a Constituição Federal. Vejamos a definição atribuída por Lenza:
[...] o vício material (de conteúdo, substancial ou doutrinário) diz respeito à ‘matéria’, ao conteúdo do ato normativo. Assim, aquele ato normativo que afrontar preceito ou princípio da Lei Maior deverá ser declarado Inconstitucional, por possuir vício material. Não nos interessa saber aqui o procedimento de elaboração da espécie normativa, mas, de fato, o seu conteúdo. Por exemplo, uma lei discriminatória que afronta o princípio da igualdade. (LENZA, 2012, p. 254).
De uma sapiência invejada, o Ministro Gilmar Ferreira Mendes, em sua obra Curso de Direito Constitucional, traz importante linhas de argumentação sobre o tema. Vejamos:
É possível que o vício de inconstitucionalidade substancial decorrente do excesso de poder legislativo constitua um dos mais tormentosos temas de controle de constitucionalidade hodierno. Cuida-se de aferir a compatibilidade da lei com os fins constitucionalmente previstos ou de constatar a observância do princípio da proporcionalidade, isto é, de se proceder à censura sobre a adequação e a necessidade do ato legislativo.(BRANCO; COELHO; MENDES, 2011, P.1072).
b. Vício por Inconstitucionalidade Formal: é o vício entranhado no interior da norma, aquele que nasce com ela, um problema procedimental na elaboração, uma desobediência a requisitos impostos pela constituição, como legitimidade, número de votos etc. O Prof. Lenza fulmina qualquer dúvida a respeito do tema. Vejamos:
Como o próprio nome induz, a inconstitucionalidade formal, também conhecida como nomodinâmica, verifica-se quando a lei ou ato normativo infraconstitucional contiver algum vício em sua ‘forma’, ou seja, em seu processo de formação, vale dizer, no processo legislativo de sua elaboração, ou, ainda, em razão de sua elaboração por autoridade incompetente. (LENZA, 2012, p.251).
No mesmo sentido, preleciona Mendes (2011), “Os vícios formais afetam o ato normativo singularmente considerado, sem atingir seu conteúdo, referindo-se aos pressupostos e procedimentos relativos à formação da lei.” (BRANCO; COELHO; MENDES, 2011, P.1070).
Podemos falar ainda em inconstitucionalidade formal orgânica, em inconstitucionalidade formal propriamente dita e em inconstitucionalidade formal por violação a pressupostos objetivos do ato. São desmembrações da inconstitucionalidade por vício formal, mas não aprofundaremos por não ser este vício, o objeto deste trabalho.
3. Início da Previdência no Brasil
Mister é o fato de trazer à baila a história da Previdência Social no Brasil, não adentraremos em indícios de previdência, mas na efetiva previdência propriamente dita, e tem-se como marco, o ano de 1923, com a criação da Lei Eloy Chaves, Decreto Legislativo nº 4.682 que possibilitou Caixas de Aposentadoria e Pensões dos Ferroviários. Portando, o dia da publicação do Decreto, 24 de Janeiro do ano de 1923, é considerado o dia da Previdência Social no Brasil. (ALENCAR, 2009).
No ano de 1934, a Constituição Promulgada trouxe a expressão “Previdência” constante no Art. 121, §1º, “h”, abaixo transcrito:
Art. 121 - A lei promoverá o amparo da produção e estabelecerá as condições do trabalho, na cidade e nos campos, tendo em vista a proteção social do trabalhador e os interesses econômicos do País.
§ 1º - A legislação do trabalho observará os seguintes preceitos, além de outros que colimem melhorar as condições do trabalhador:
[...]
h) assistência médica e sanitária ao trabalhador e à gestante, assegurando a esta descanso antes e depois do parto, sem prejuízo do salário e do emprego, e instituição de previdência, mediante contribuição igual da União, do empregador e do empregado, a favor da velhice, da invalidez, da maternidade e nos casos de acidentes de trabalho ou de morte; (Grifo nosso).
No ano de 1936, o Presidente Vargas decreta o Estado Novo, e no ano de 1937 impõe à nação nova carta, agora outorgada, que não contemplou a tripartição de base de financiamento. Mais adiante, em 1946, pós 2ª Guerra Mundial é promulgada nova constituição, desta vez, insere à expressão “previdência” o adjetivo “social”. (ALENCAR, 2009).
Os anos vão passando e o objetivo é evoluir, “em 1971 com a lei complementar nº 11, foi instituído o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural (Prorural), de caráter assistencial, atribuindo ainda natureza autárquica ao Funrural, que passou a administrar o referido programa” (DIAS; MACEDO, 2010, p.71).
Em 1977 com o advento da Lei 6.439/1977 houve o surgimento do Sinpas – Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social. Que era constituído pelo INPS (Instituto Nacional de Previdência Social), Inamps (Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social), Iapas (Instituto de Administração Financeira da Previdência Social), LBA (Legião Brasileira de Assistência); Funabem (Fundação Nacional de Bem-estar do menor); Dataprev (Empresa de Processamento de Dados da Previdência Social) e Ceme (Central de Medicamentos).(DIAS;MACEDO, 2010).
Com base nas lições de ALENCAR (2009), em 1984, o Decreto nº 89.312, aprovou nova consolidação das leis da previdência social.
O mesmo autor ainda disserta que após a “Diretas já”, houve a convocação de Assembleia Nacional Constituinte, ofertando a Constituição Cidadã de 1988. Onde então, estava contemplado no Art. 201 a seguinte redação:
Art. 201. Os planos de previdência social, mediante contribuição, atenderão, nos termos da lei, a:
I - cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte, incluídos os resultantes de acidentes do trabalho, velhice e reclusão;
II - ajuda à manutenção dos dependentes dos segurados de baixa renda;
III - proteção à maternidade, especialmente à gestante;
IV - proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário;
V - pensão por morte de segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes, obedecido o disposto no § 5º e no art. 202.
§ 1º - Qualquer pessoa poderá participar dos benefícios da previdência social, mediante contribuição na forma dos planos previdenciários.
§ 2º - É assegurado o reajustamento dos benefícios para preservar-lhes, em caráter permanente, o valor real, conforme critérios definidos em lei.
§ 3º - Todos os salários de contribuição considerados no cálculo de benefício serão corrigidos monetariamente.
§ 4º - Os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serão incorporados ao salário para efeito de contribuição previdenciária e conseqüente repercussão em benefícios, nos casos e na forma da lei.
§ 5º - Nenhum benefício que substitua o salário de contribuição ou o rendimento do trabalho do segurado terá valor mensal inferior ao salário mínimo.
§ 6º - A gratificação natalina dos aposentados e pensionistas terá por base o valor dos proventos do mês de dezembro de cada ano.
§ 7º - A previdência social manterá seguro coletivo, de caráter complementar e facultativo, custeado por contribuições adicionais.
§ 8º - É vedado subvenção ou auxílio do Poder Público às entidades de previdência privada com fins lucrativos. (Grifo nosso)
Após a Emenda Constitucional nº 20/1998 o Artigo 201 sofreu forte modificação e ampliação, abaixo transcrito para comparação:
Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a:
I - cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada;
II - proteção à maternidade, especialmente à gestante;
III - proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário;
IV - salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda;
V - pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes, observado o disposto no § 2º.
§ 1º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social, ressalvados os casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física e quando se tratar de segurados portadores de deficiência, nos termos definidos em lei complementar.
§ 2º Nenhum benefício que substitua o salário de contribuição ou o rendimento do trabalho do segurado terá valor mensal inferior ao salário mínimo.
§ 3º Todos os salários de contribuição considerados para o cálculo de benefício serão devidamente atualizados, na forma da lei.
§ 4º É assegurado o reajustamento dos benefícios para preservar-lhes, em caráter permanente, o valor real, conforme critérios definidos em lei.
§ 5º É vedada a filiação ao regime geral de previdência social, na qualidade de segurado facultativo, de pessoa participante de regime próprio de previdência.
§ 6º A gratificação natalina dos aposentados e pensionistas terá por base o valor dos proventos do mês de dezembro de cada ano.
§ 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidas as seguintes condições:
I - trinta e cinco anos de contribuição, se homem, e trinta anos de contribuição, se mulher;
II - sessenta e cinco anos de idade, se homem, e sessenta anos de idade, se mulher, reduzido em cinco anos o limite para os trabalhadores rurais de ambos os sexos e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal.
§ 8º Os requisitos a que se refere o inciso I do parágrafo anterior serão reduzidos em cinco anos, para o professor que comprove exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio.
§ 9º Para efeito de aposentadoria, é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada, rural e urbana, hipótese em que os diversos regimes de previdência social se compensarão financeiramente, segundo critérios estabelecidos em lei.
§ 10. Lei disciplinará a cobertura do risco de acidente do trabalho, a ser atendida concorrentemente pelo regime geral de previdência social e pelo setor privado.
§ 11. Os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serão incorporados ao salário para efeito de contribuição previdenciária e conseqüente repercussão em benefícios, nos casos e na forma da lei.
§ 12. Lei disporá sobre sistema especial de inclusão previdenciária para atender a trabalhadores de baixa renda e àqueles sem renda própria que se dediquem exclusivamente ao trabalho doméstico no âmbito de sua residência, desde que pertencentes a famílias de baixa renda, garantindo-lhes acesso a benefícios de valor igual a um salário-mínimo.
§ 13. O sistema especial de inclusão previdenciária de que trata o § 12 deste artigo terá alíquotas e carências inferiores às vigentes para os demais segurados do regime geral de previdência social. (Grifos nossos).
4. Beneficiários do Regime Geral de Previdência Social
Quando se fala em Previdência Social e Benefícios Previdenciários, surge uma porção de detalhes que consideramos de suma importância a serem esclarecidos, detalhes como o que é segurado, quem são os segurados obrigatórios, os facultativos, como se adquire a qualidade de segurado, a inscrição do segurado, manutenção e perda da qualidade de segurado, carência, bem como quem são os dependentes perante a previdência social. Só após ter esses conhecimentos é possível realizar com convicção a crítica sobre a inconstitucionalidade do benefício. É dizer, não podemos implodir um prédio, sem antes conhecer bem o alicerce.
Observa-se, portanto, que há dois tipos de segurado, o segurado obrigatório e o facultativo, a Lei nº 8.212/1991 arts. 12 e 14, bem como nos arts. 11 e 13 da Lei nº 8.213/1991.
Como vimos acima, a lei divide os segurados em Obrigatórios e Facultativos, e o texto legislativo é autoexplicativo, vejamos o que preceitua o Art. 12 da Lei 8.212/1991:
Art. 12. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
I - como empregado:
a) aquele que presta serviço de natureza urbana ou rural à empresa, em caráter não eventual, sob sua subordinação e mediante remuneração, inclusive como diretor empregado;
b) aquele que, contratado por empresa de trabalho temporário, definida em legislação específica, presta serviço para atender a necessidade transitória de substituição de pessoal regular e permanente ou a acréscimo extraordinário de serviços de outras empresas;
c) o brasileiro ou estrangeiro domiciliado e contratado no Brasil para trabalhar como empregado em sucursal ou agência de empresa nacional no exterior;
d) aquele que presta serviço no Brasil a missão diplomática ou a repartição consular de carreira estrangeira e a órgãos a ela subordinados, ou a membros dessas missões e repartições, excluídos o não-brasileiro sem residência permanente no Brasil e o brasileiro amparado pela legislação previdenciária do país da respectiva missão diplomática ou repartição consular;
e) o brasileiro civil que trabalha para a União, no exterior, em organismos oficiais brasileiros ou internacionais dos quais o Brasil seja membro efetivo, ainda que lá domiciliado e contratado, salvo se segurado na forma da legislação vigente do país do domicílio;
f) o brasileiro ou estrangeiro domiciliado e contratado no Brasil para trabalhar como empregado em empresa domiciliada no exterior, cuja maioria do capital votante pertença a empresa brasileira de capital nacional;
g) o servidor público ocupante de cargo em comissão, sem vínculo efetivo com a União, Autarquias, inclusive em regime especial, e Fundações Públicas Federais;
h) (Execução suspensa pela Resolução do Senado Federal nº 26, de 2005)
i) o empregado de organismo oficial internacional ou estrangeiro em funcionamento no Brasil, salvo quando coberto por regime próprio de previdência social;
j) o exercente de mandato eletivo federal, estadual ou municipal, desde que não vinculado a regime próprio de previdência social;
II - como empregado doméstico: aquele que presta serviço de natureza contínua a pessoa ou família, no âmbito residencial desta, em atividades sem fins lucrativos;
III - (Revogado pela Lei nº 9.876, de 1999).
IV - (Revogado pela Lei nº 9.876, de 1999).
a) quem presta serviço de natureza urbana ou rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas, sem relação de emprego;
b) a pessoa física que exerce, por conta própria, atividade econômica de natureza urbana, com fins lucrativos ou não;
V - como contribuinte individual:
a) a pessoa física, proprietária ou não, que explora atividade agropecuária, a qualquer título, em caráter permanente ou temporário, em área superior a 4 (quatro) módulos fiscais; ou, quando em área igual ou inferior a 4 (quatro) módulos fiscais ou atividade pesqueira, com auxílio de empregados ou por intermédio de prepostos; ou ainda nas hipóteses dos §§ 10 e 11 deste artigo;
b) a pessoa física, proprietária ou não, que explora atividade de extração mineral - garimpo, em caráter permanente ou temporário, diretamente ou por intermédio de prepostos, com ou sem o auxílio de empregados, utilizados a qualquer título, ainda que de forma não contínua;
c) o ministro de confissão religiosa e o membro de instituto de vida consagrada, de congregação ou de ordem religiosa;
d) revogada;
e) o brasileiro civil que trabalha no exterior para organismo oficial internacional do qual o Brasil é membro efetivo, ainda que lá domiciliado e contratado, salvo quando coberto por regime próprio de previdência social;
f) o titular de firma individual urbana ou rural, o diretor não empregado e o membro de conselho de administração de sociedade anônima, o sócio solidário, o sócio de indústria, o sócio gerente e o sócio cotista que recebam remuneração decorrente de seu trabalho em empresa urbana ou rural, e o associado eleito para cargo de direção em cooperativa, associação ou entidade de qualquer natureza ou finalidade, bem como o síndico ou administrador eleito para exercer atividade de direção condominial, desde que recebam remuneração;
g) quem presta serviço de natureza urbana ou rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas, sem relação de emprego;
h) a pessoa física que exerce, por conta própria, atividade econômica de natureza urbana, com fins lucrativos ou não;
VI - como trabalhador avulso: quem presta, a diversas empresas, sem vínculo empregatício, serviços de natureza urbana ou rural definidos no regulamento;
VII – como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros a título de mútua colaboração, na condição de:
a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade:
1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais; ou
2. de seringueiro ou extrativista vegetal que exerça suas atividades nos termos do inciso XII do caput do art. 2o da Lei no 9.985, de 18 de julho de 2000, e faça dessas atividades o principal meio de vida;
b) pescador artesanal ou a este assemelhado, que faça da pesca profissão habitual ou principal meio de vida; e
c) cônjuge ou companheiro, bem como filho maior de 16 (dezesseis) anos de idade ou a este equiparado, do segurado de que tratam as alíneas a e b deste inciso, que, comprovadamente, trabalhem com o grupo familiar respectivo.
§ 1o Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes.
§ 2º Todo aquele que exercer, concomitantemente, mais de uma atividade remunerada sujeita ao Regime Geral de Previdência Social é obrigatoriamente filiado em relação a cada uma delas.
§ 3o (Revogado):
I – (revogado);
II – (revogado).
§ 4º O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social-RGPS que estiver exercendo ou que voltar a exercer atividade abrangida por este Regime é segurado obrigatório em relação a essa atividade, ficando sujeito às contribuições de que trata esta Lei, para fins de custeio da Seguridade Social.
§ 5º O dirigente sindical mantém, durante o exercício do mandato eletivo, o mesmo enquadramento no Regime Geral de Previdência Social-RGPS de antes da investidura.
§ 6o Aplica-se o disposto na alínea g do inciso I do caput ao ocupante de cargo de Ministro de Estado, de Secretário Estadual, Distrital ou Municipal, sem vínculo efetivo com a União, Estados, Distrito Federal e Municípios, suas autarquias, ainda que em regime especial, e fundações.
§ 7o Para serem considerados segurados especiais, o cônjuge ou companheiro e os filhos maiores de 16 (dezesseis) anos ou os a estes equiparados deverão ter participação ativa nas atividades rurais do grupo familiar.
§ 8o O grupo familiar poderá utilizar-se de empregados contratados por prazo determinado ou trabalhador de que trata a alínea g do inciso V do caputdeste artigo, em épocas de safra, à razão de no máximo 120 (cento e vinte) pessoas/dia no ano civil, em períodos corridos ou intercalados ou, ainda, por tempo equivalente em horas de trabalho.
§ 9o Não descaracteriza a condição de segurado especial:
I – a outorga, por meio de contrato escrito de parceria, meação ou comodato, de até 50% (cinqüenta por cento) de imóvel rural cuja área total não seja superior a 4 (quatro) módulos fiscais, desde que outorgante e outorgado continuem a exercer a respectiva atividade, individualmente ou em regime de economia familiar;
II – a exploração da atividade turística da propriedade rural, inclusive com hospedagem, por não mais de 120 (cento e vinte) dias ao ano;
III – a participação em plano de previdência complementar instituído por entidade classista a que seja associado, em razão da condição de trabalhador rural ou de produtor rural em regime de economia familiar;
IV – ser beneficiário ou fazer parte de grupo familiar que tem algum componente que seja beneficiário de programa assistencial oficial de governo;
V – a utilização pelo próprio grupo familiar, na exploração da atividade, de processo de beneficiamento ou industrialização artesanal, na forma do § 11 do art. 25 desta Lei; e
VI – a associação em cooperativa agropecuária.
§ 10. Não é segurado especial o membro de grupo familiar que possuir outra fonte de rendimento, exceto se decorrente de:
I – benefício de pensão por morte, auxílio-acidente ou auxílio-reclusão, cujo valor não supere o do menor benefício de prestação continuada da Previdência Social;
II – benefício previdenciário pela participação em plano de previdência complementar instituído nos termos do inciso IV do § 9o deste artigo;
III – exercício de atividade remunerada em período de entressafra ou do defeso, não superior a 120 (cento e vinte) dias, corridos ou intercalados, no ano civil, observado o disposto no § 13 deste artigo;
IV – exercício de mandato eletivo de dirigente sindical de organização da categoria de trabalhadores rurais;
V – exercício de mandato de vereador do município onde desenvolve a atividade rural, ou de dirigente de cooperativa rural constituída exclusivamente por segurados especiais, observado o disposto no § 13 deste artigo;
VI – parceria ou meação outorgada na forma e condições estabelecidas no inciso I do § 9o deste artigo;
VII – atividade artesanal desenvolvida com matéria-prima produzida pelo respectivo grupo familiar, podendo ser utilizada matéria-prima de outra origem, desde que a renda mensal obtida na atividade não exceda ao menor benefício de prestação continuada da Previdência Social; e
VIII – atividade artística, desde que em valor mensal inferior ao menor benefício de prestação continuada da Previdência Social.
§ 11. O segurado especial fica excluído dessa categoria:
I – a contar do primeiro dia do mês em que:
a) deixar de satisfazer as condições estabelecidas no inciso VII do caputdeste artigo, sem prejuízo do disposto no art. 15 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, ou exceder qualquer dos limites estabelecidos no inciso I do § 9o deste artigo;
b) se enquadrar em qualquer outra categoria de segurado obrigatório do Regime Geral de Previdência Social, ressalvado o disposto nos incisos III, V, VII e VIII do § 10 deste artigo, sem prejuízo do disposto no art. 15 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991; e
c) se tornar segurado obrigatório de outro regime previdenciário;
II – a contar do primeiro dia do mês subsequente ao da ocorrência, quando o grupo familiar a que pertence exceder o limite de:
a) utilização de trabalhadores nos termos do § 8o deste artigo;
b) dias em atividade remunerada estabelecidos no inciso III do § 10 deste artigo; e
c) dias de hospedagem a que se refere o inciso II do § 9o deste artigo.
§ 12. Aplica-se o disposto na alínea a do inciso V do caput deste artigo ao cônjuge ou companheiro do produtor que participe da atividade rural por este explorada.
§ 13. O disposto nos incisos III e V do § 10 deste artigo não dispensa o recolhimento da contribuição devida em relação ao exercício das atividades de que tratam os referidos incisos.
Para se tornar um segurado facultativo é necessário ter dezesseis anos completos, em que pese a Lei 8.213/1991, no art.13 falar em quatorze anos, a Emenda Constitucional nº 20/1998 trouxe a idade mínima de dezesseis anos para trabalhar, salvo quanto ao menor aprendiz. O Decreto 3.048/1999, no art. 11, limitou a filiação como segurado facultativo o mesmo limite da filiação obrigatória, no caso, dezesseis anos. Vejamos a legislação.
Art. 13. É segurado facultativo o maior de 14 (quatorze) anos que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social, mediante contribuição, desde que não incluído nas disposições do art. 11.
O art.11 do Decreto 3.048/1999, diz:
Art. 11. É segurado facultativo o maior de dezesseis anos de idade que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social, mediante contribuição, na forma do art. 199, desde que não esteja exercendo atividade remunerada que o enquadre como segurado obrigatório da previdência social.
§ 1º Podem filiar-se facultativamente, entre outros:
I - a dona-de-casa;
II - o síndico de condomínio, quando não remunerado;
III - o estudante;
IV - o brasileiro que acompanha cônjuge que presta serviço no exterior;
V - aquele que deixou de ser segurado obrigatório da previdência social;
VI - o membro de conselho tutelar de que trata o art. 132 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, quando não esteja vinculado a qualquer regime de previdência social;
VII - o bolsista e o estagiário que prestam serviços a empresa de acordo com a Lei nº 6.494, de 1977;
VIII - o bolsista que se dedique em tempo integral a pesquisa, curso de especialização, pós-graduação, mestrado ou doutorado, no Brasil ou no exterior, desde que não esteja vinculado a qualquer regime de previdência social;
IX - o presidiário que não exerce atividade remunerada nem esteja vinculado a qualquer regime de previdência social; (Redação dada pelo Decreto nº 7.054, de 2009)
X - o brasileiro residente ou domiciliado no exterior, salvo se filiado a regime previdenciário de país com o qual o Brasil mantenha acordo internacional; e (Redação dada pelo Decreto nº 7.054, de 2009)
XI - o segurado recolhido à prisão sob regime fechado ou semi-aberto, que, nesta condição, preste serviço, dentro ou fora da unidade penal, a uma ou mais empresas, com ou sem intermediação da organização carcerária ou entidade afim, ou que exerce atividade artesanal por conta própria. (Incluído pelo Decreto nº 7.054, de 2009)
§ 2º É vedada a filiação ao Regime Geral de Previdência Social, na qualidade de segurado facultativo, de pessoa participante de regime próprio de previdência social, salvo na hipótese de afastamento sem vencimento e desde que não permitida, nesta condição, contribuição ao respectivo regime próprio.
§ 3º A filiação na qualidade de segurado facultativo representa ato volitivo, gerando efeito somente a partir da inscrição e do primeiro recolhimento, não podendo retroagir e não permitindo o pagamento de contribuições relativas a competências anteriores à data da inscrição, ressalvado o § 3º do art. 28.
§ 4º Após a inscrição, o segurado facultativo somente poderá recolher contribuições em atraso quando não tiver ocorrido perda da qualidade de segurado, conforme o disposto no inciso VI do art. 13.
Sendo assim, o artigo 13 da Lei 8.213/1991 foi tacitamente revogado pela Emenda constitucional nº 20/1998.
Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos.
Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente; (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)
II - os pais;
III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente; (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)
IV - (Revogada pela Lei nº 9.032, de 1995)
§ 1º A existência de dependente de qualquer das classes deste artigo exclui do direito às prestações os das classes seguintes.
§ 2º .O enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997)
§ 3º Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal.
§ 4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada.
Pela simples análise do dispositivo supracitado, verifica-se que cada um dos incisos do Art. 16 representa uma, nas palavras de DIAS e MACEDO (2010, p.169), “ordem de vocação previdenciária” onde os dependentes mais próximos, excluem os mais remotos. (Art.16, §1ºda Lei nº 8.213/1991).
Os mesmos autores, em excelente exemplificação, fulminam qualquer dúvida. Ex: “se determinado segurado casado ajudava na manutenção de sua mãe, com o seu falecimento, somente o cônjuge sobrevivente terá direito à pensão, uma vez que é dependente da classe I e a mãe é dependente da classe II.” (DIAS; MACEDO, 2010, p. 170). Verifica-se, portanto, que no exemplo, a esposa do segurado que faleceu, por ser cônjuge, e estar inserta no inciso I do art.16 da Lei nº 8.213/1991, pela ordem de vocação previdenciária, afastou a mãe do segurado, que está na classe II do mesmo artigo (pais).
Além disso, para a previdência, dependente é quem depende economicamente, mas a Lei nº 8.213/1991 em seu art. 16, §4º estabeleceu que “A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada”.
A Constituição Federal de 1988 igualou os direitos entre cônjuges e companheiros, sendo companheiro aquele que vive em união estável. Saliente-se ainda, que segundo o Enunciado de Súmula nº 382 do Supremo Tribunal Federal, não há mais a necessidade da comprovação da vida em comum sobre o mesmo teto. Sendo assim, caímos em outra celeuma, que é o caso do concubinato impuro, ou seja, quando o segurado ou segurada, mantém duas famílias, uma oficial, e outra extra-oficial. A Excelentíssima Juíza Federal Marina Vasques Duarte, disserta sobre o tema, vejamos:
Mesmo quando se trata de concubinato impuro a jurisprudência sempre aceitou a divisão do benefício com a esposa legítima, ainda que a norma civil refute o concubinato impuro. É que a relação jurídica de proteção previdenciária é diversa dá de caráter privado: aquela tem por preocupação primordial a preservação da vida, a dignidade da pessoa humana.Nesse sentido, mesmo antes da Constituição Federal de 1988, o extinto Tribunal Federal de Recursos havia promulgado a Súmula 159 que entendia legítima a divisão da pensão previdenciária entre a esposa e a companheira. Tal posicionamento sempre foi acompanhado pelos tribunais, modificado recentemente em decisão proferida pela STF:
COMPANHEIRA E CONCUBINA – DISTINÇÃO. Sendo o Direito uma verdadeira ciência, impossível é confundir os institutos, expressões e vocábulos, sob pena de prevalecer a babel. UNIÃO ESTÁVEL – PROTEÇÃO DO ESTADO. A proteção do Estado à união estável alcança apenas as situações legítimas e nestas não está incluído o concubinato. PENSÃO – SERVIDOR PÚBLICO – MULHER – CONCUBINA – DIREITO. A titularidade da pensão decorrente do falecimento de servidor público pressupõe vinculo agasalhado pelo ordenamento jurídico, mostrando-se impróprio o implemento de divisão a beneficiar, em detrimento da família, a concubina. (RE 590779, Primeira Turma, Relator Ministro Marco Aurélio, decisão por maioria, julgado em 10/02/2009) – (DUARTE, 2010, p.87).
5. A Previdência Social Frente ao Auxílio-Reclusão
Como a questão a ser analisada é um tanto complexa, antes de analisar as consequências trazidas pela Emenda Constitucional nº20/1998, se faz necessária uma breve indagação: para que serve a previdência social, aquela prevista no Art. 201 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988? Em meu entender, a previdência social equipara-se a um seguro de vida, seguro contra roubo de veículos etc., ou seja, existe para dar uma garantia ao segurado e/ou seus dependentes na possível ocorrência de um evento futuro, certo e/ou incerto, busca proteger o seu segurado e/ou seus dependentes, este é o objetivo principal da previdência, ou seja, dar garantias. Evidente que como qualquer outro seguro, para ser beneficiário, deve-se ter qualidade de segurado, ou seja, o indivíduo tem que ter contribuído para a previdência, seja ele segurado obrigatório ou facultativo.
Com maestria, Jefferson Daibert, esclarece que:
Previdência é o ato ou qualidade do que é previdente, sendo este aquele que prevê, que é prudente. Sendo prudente aquele que previne, previdência é o ato pelo qual se prevê ou se antecipa determinado fato, no sentido de evitar-lhes as consqüências, dano ou mal. É a maneira de antecipar-se, precaver-se contra um futuro que poderá trazer, a cada um de nós resultados não queridos. (DAIBERT, 1978, p.14).
Para corroborar ainda mais com o entendimento, o Prof. Wagner Balera, em poucas linhas, fulmina qualquer dúvida:
A seguridade social tem como propósito fundamental proporcionar aos indivíduos e às famílias a tranqüilidade de saber que o nível e a qualidade de suas vidas não serão significativamente diminuídos, até onde for possível evitá-lo, por nenhuma circunstância econômica ou social. O que interessa ao sistema de seguridade social não é garantir o padrão de vida do indivíduo, mas tão somente assegurar-lhe condições mínimas de sobrevivência digna. (BALERA, 2010, p.30).
Percebe-se que o indivíduo contribui para a previdência social para ter o amparo dela, e a referida Emenda Constitucional, trouxe em seu Art.13 o requisito da Baixa-Renda, que atribuiu à redação do art. 201, IV da Constituição, onde é o único ponto do direito previdenciário em que quem contribui mais perde o direito ao benefício, uma incongruência legislativa.
Não deixaria de falar, mesmo que brevemente, em alguns dos princípios constitucionais norteadores da previdência social, uma vez que se faz necessário a compreensão por completo da ideia principiológica da Previdência Social, vez que contemplados na Magna Carta. O Prof. Wagner Balera, dá ênfase a aplicação dos princípios, com um trecho brilhante: “Toda a legislação constitucional e infraconstitucional deve ser lida na perspectiva ditada pelos princípios, valores e diretrizes constitucionais, que a iluminam e transformam o seu espírito, muitas vezes mantendo a mesma letra” (BALERA, 2010, p.36).
A Constituição da República Federativa do Brasil em seu Art. 194, parágrafo único, preceitua princípios de observância obrigatória pelo poder público na organização da Seguridade Social, abaixo estudaremos cada um dos princípios.
a) Proteção ao Hipossuficiente
Este princípio busca amparar os menos favorecidos, que de certa forma acaba sendo todos nós, porque sempre se trata da pessoa física, frente ao Estado.
Com brilhantismo, o Juiz Federal João Batista Lazzari diz: “ainda que não aceito de modo uniforme pela doutrina previdenciarista, vem sendo admitido com cada vez mais frequência o postulado de que as normas dos sistemas de proteção social devem ser fundadas na ideia de proteção ao menos favorecido.” (CASTRO; LAZZARI, 2004, p.113).
b) Universalidade da Cobertura e do Atendimento
Antes de adentrar na conceituação do princípio da universalidade, se faz mister mencionar o alerta de Daniel Machado da Rocha, de que a universalidade previdenciária não significa atendimento a todos, mas apenas à parcela da população que possui guarida da previdência social. “Poder-se-ia dizer, com o risco de parecer irônico, que estamos diante da hipótese de uma ‘universalidade não universal’, ou de um universo restrito e limitado”. (ROCHA, 2004, p. 138/139).
O mesmo jurista ressalta que a ideia deste princípio é a inclusão social, ou seja, o objetivo de tornar a previdência acessível a todos os que exercem atividade remunerada.
No mesmo sentido, argumenta o Excelentíssimo Procurador Federal Hermes Arrais Alencar que:
Deve o legislador não só vislumbrar todas as contingências que carecem de amparo estatal, como esculpir a proteção na norma legal. Vislumbradas as hipóteses de cobertura, o rol de beneficiários deve ser o mais amplo possível.
A universalidade de cobertura e do atendimento é princípio constitucional que exige constante aplicação do rol de benefícios (e serviços) e dos beneficiários da seguridade social. De outro lado, veda o retrocesso social, porque a marcha imposta pelo constituinte é a do avanço no terreno dos direitos sociais.
De acordo com Wagner Balera, “este principio decorre do princípio da isonomia (art.5º caput, da Constituição Federal de 1988).” (BALERA, 2010, p. 37).
c) Uniformidade e Equivalência dos Benefícios e Serviços às Populações Urbanas e Rurais
Este princípio vem dar amparo ao que preceitua o Art. 5º caput, da Constituição Federal, no tratamento isonômico entre as pessoas, buscou igualar as pessoas, independentemente do local onde trabalham se rural ou urbano. Os Procuradores Federais Eduardo Dias e José de Macedo, melhor explicam o princípio em foco.
...significa que as prestações da seguridade social serão idênticas para toda a população, independentemente do local onde residam ou trabalhem as pessoas (uniformidade dos benefícios e serviços), e que deverão ter valores iguais (equivalência dos benefícios e serviços). ...
Este princípio visa a eliminar a discriminação irrazoável, principalmente no âmbito previdenciário, entre os moradores do campo e os da cidade. (DIAS; MACEDO, 2010, p. 102)
Em que pese o princípio buscar a igualdade dos segurados que trabalhem no meio rural com os que trabalham no meio urbano, mostra a ideia de abrangência da cobertura sem discriminação.
d) Seletividade e Distributividade na Prestação dos Benefícios e Serviços
Da simples análise do texto “Seletividade e Distributividade” se consegue fazer uma compreensão do princípio, mas com maestria, Lazzari e Castro em breve comentário ao princípio, esclarecem qualquer dúvida:
O princípio da seletividade pressupõe que os benefícios são concedidos a quem deles efetivamente necessite, razão pela qual a Seguridade Social deve apontar os requisitos para a concessão de benefícios e serviços. [...] O princípio da distributividade, inserido na ordem social, é de ser interpretado em seu sentido de distribuição de renda e bem-estar social, ou seja, concessão de benefícios e serviços visa-se ao bem estar e a justiça social.
Alencar espanca qualquer questionamento acerca deste tão discutido princípio, vejamos:
Diversamente do que ocorre com os direitos de primeira geração, que se caracterizam como imposição ao Estado de ‘não-fazer’ (exige-se a abstenção estatal, de forma a garantir a liberdade do cidadão), os direitos sociais ingressam em outra dimensão de direitos, os de segunda geração, que, por sua vez, exigem lastro financeiro por parte do Estado-provedor.
Diante da impossibilidade econômico-financeira de o Estado qtender todas as contingências sociais e de contemplar todas as pessoas que residem em território nacional, e com base na doutrina da ‘reserva do possível’, estatui o princípio da seletividade e da distributividade autorizando o legislador eleger os benefícios e serviços que melhor atendam aos mais necessitados.
Esse princípio é o contraponto do princípio da universalidade da cobertura e do atendimento. (ALENCAR, 2009, p. 45)
Em poucas linhas, em nosso entender, está aí o princípio que data maxima venia, foi extirpado do ordenamento jurídico quando da aprovação da EC.20/98, é evidente que há uma desseleção e não uma seleção. Na atual interpretação da norma, o segurado recluso que percebe remuneração acima do estabelecido pela portaria ministerial é excluído da proteção do Estado, ocorre que os beneficiários são os dependentes do segurado recluso e não o próprio.
e) Irredutibilidade do Valor dos Benefícios
Princípio de grande importância no âmbito constitucional, pois garante o mínimo de dignidade à pessoa que é segurada. Ressalte-se que o princípio não garante a corrosão da moeda, apenas garante o aspecto quantitativo. Importante lembrar que também é garantido o mínimo de um salário. E por incrível que pareça, no caso em discussão, onde se estabeleceu a baixa renda como critério, muitos não ganham o valor mínimo, não ganham absolutamente nada!
No mesmo sentido, os Procuradores Federais Dias e Macedo argumentam que o princípio em comento é a “aplicação do princípio da suficiência ou efetividade na medida em que prega que o valor dos benefícios não deve ser reduzido, sob pena de a proteção social deixar de ser eficaz e do beneficiário voltar a cair em estado de necessidade.” (DIAS; MACEDO, 2010, p. 103).
O presente princípio advém do texto esculpido em letras de fogo na magna carta, em seu art. 201, §2º, esse princípio visa, nada mais nada menos, do que garantir a subsistência dos dependentes do segurado, pois este, certamente teve a sua capacidade laborativa restringida, seja pelo acometimento de alguma doença incapacitante, prisão ou morte. Todo benefício previdenciário com caráter substitutivo deverá possuir o mínimo de um piso de um salário mínimo.
Em poucas palavras, Dias e Macedo fulminam qualquer questionamento, vejamos:
Por uma imposição lógica e de justiça, quando os benefícios previdenciários substituírem a remuneração do segurado obrigatório ou o salário de contribuição do segurado facultativo, essas prestações pecuniárias de caráter substitutivo não poderão ter valor mensal inferior ao do salário-mínimo. Os benefícios substitutos da remuneração do trabalhador ou do salário de contribuição do segurado facultativo, para que atendam às necessidades básicas do beneficiário da previdência social, não poderá valor menor do que um salário-mínimo. (DIAS; MACEDO, 2010, p. 111).
g) Equidade na Forma de Participação e Custeio.
Este é um princípio solidário, onde o segurado contribui para custear e é custeado, busca garantir o mínimo a todos. Ou seja, até quem não possui condições de contribuir para a previdência é amparado por ela. Alencar argumenta que “A justiça social significa garantir a cada pessoa o indispensável à satisfação do mínimo existencial. Preconizada no art.193 da Norma Suprema, a justiça social está caracterizada como objetivo da ordem social” (ALENCAR, 2009, p. 49).
Segundo a disciplina constitucional estatuída, equidade na forma de participação no custeio é admitir, atendidos os contornos legais, o atendimento das necessidades sociais (predicado como mínimo irredutível da dignidade de todo ser humano) inclusive daqueles que nada contribuem pecuniariamente para a seguridade social. (ALENCAR, 2009, p.49).
Importante destacar que o Prof. Sérgio Pinto Martins menciona a opção legislativa pela concessão de salário família e auxílio-reclusão aos dependentes do segurado de baixa renda como critério de SELETIVIDADE (MARTINS, 2005).
h) Princípio do Equilíbrio Financeiro e Atuarial.
Nas palavras de Castro e Lazzari,
[...] significa que o poder público deverá, na execução da política previdenciária, atentar sempre para a relação entre custeio e pagamento de benefícios, a fim de manter o sistema em condições superavitárias, e observar as oscilações da média etária da população, bem como sua expectativa de vida, para a adequação dos benefícios a estas variáveis. (CASTRO; LAZZARI, 2004, p.121).
Entendo que o equilíbrio atuarial deve ser observado sob dois aspectos:
a) Entre o valor arrecadado com as contribuições e o valor pago aos beneficiários da previdência;
b) Entre o valor pago pelo contribuinte e o que ele receberá quando atingido pelo risco social (doença, aposentadoria, auxílio-reclusão).
Lazzari e Castro asseveram que este Princípio só foi instituído constitucionalmente em 1998, pela Emenda Constitucional nº 20, que alterou o caput do art. 201 da Constituição.
É em atenção a este princípio que, desde a promulgação da referida Emenda Constitucional, vêm sendo criados mecanismos que limitam a concessão de benefícios (o Auxílio-Reclusão é o principal exemplo), no que tange o auxílio-reclusão, a EC trouxe ainda a expressão Segurado de Baixa Renda, fazendo com que a abrangência do auxílio ficasse ainda mais restrita, confrontando-se com a letra “b” supracitada.
i) Princípio da Contributividade
Os Arts. 40 e 201 da Constituição da República Federativa do Brasil estabelecem que a Previdência Social terá caráter contributivo, fazendo com que o contribuinte torne-se um segurado da Previdência Social. Dias e Macedo explanam, com sábias palavras, sobre este princípio, vejamos:
[...] o texto constitucional, ao afirmar que a previdência social tem caráter contributivo, refere-se especificamente ao protegido pela previdência social, e não a sociedade como um todo. É dizer: a Constituição Federal estabelece que o direito às prestações de previdência social requer, do protegido, uma contraprestação contributiva. A proteção previdenciária estatal, portanto, não é provida a titulo gratuito, mas a título oneroso. A contributividade no sentido exposto,é um dos valores que informam de modo característico a previdência social. (DIAS; MACEDO, 2010, p.107).
Primeiramente cumpre ressaltar, que o auxílio-reclusão foi instituído para dar garantia de subsistência aos dependentes do apenado.
Alves aduz que o auxílio-reclusão foi instituído pela primeira pelo Decreto n.22.872, de 29 de junho de 1933, que regulamentava o IAPM, cujo art. 63 previa:
Art.63. O associado que não tendo família houver sido demitido do serviço da empresa, por falta grave, ou condenado por sentença definitiva que resulte perda do emprego, e preencher todas as condições exigidas neste decreto para a aposentadoria, poderá requerê-la, mas esta só lhe será concedida com metade das vantagens pecuniárias a que teria direito se não houvesse incorrido em penalidade.
Parágrafo único. Caso o associado esteja cumprindo pena de prisão, e tiver família sob sua exclusiva dependência econômica, a importância da aposentadoria a que se refere este artigo será paga ao representante legal de sua família, enquanto perdurar a situação de encarceramento. (ALVES, 2007, p. 28).
O mesmo autor informa que em 1934 criou-se o IAPB através do Decreto nº 24.615, que no mesmo ano, por meio do Decreto nº 54 que organizou e regulamentou o auxílio-reclusão em seu art. 67, vejamos:
Art.67. Caso o associado esteja preso, por motivo de processo ou cumprimento de pena, e tenha beneficiário sob sua exclusiva dependência econômica, achando-se seus vencimentos suspensos, será concedida aos seus beneficiários, enquanto perdurar essa situação, pensão correspondente à metade da aposentadoria por invalidez a que teria direito, na ocasião da prisão. (ALVES, 2007, p.28).
Em 1960, na Lei Orgânica da Previdência Social, nº 3.807/1960, foi regulamentado o auxílio-reclusão, onde também falou na carência de 12 (doze) meses, como se fosse plenamente possível saber o dia em que se estaria atrás das grades! O art. 43 da referida lei previa:
Art. 43. Aos beneficiários do segurado, detento ou recluso, que não receba qualquer espécie de remuneração da empresa, e que houver realizado no mínimo 12 (doze) contribuições mensais, a previdência social prestará auxílio-reclusão na forma dos arts. 38, 39, 40 desta lei.
§1º O processo de auxílio-reclusão será mantido com certidão do despacho da prisão preventiva ou sentença condenatória.
§2º O pagamento da pensão será mantido enquanto durar a reclusão ou detenção do segurado o que será comprovado por meio de atestados trimestrais firmados por autoridade competente. (ALVES, 2007, p.28).
Como visto, o auxílio-reclusão está presente na Seguridade Social desde 1933 quando foi instituído pelo Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Marítimos. Ocorre que a Constituição do Brasil só previu essa prestação previdenciária na Lei Maior de 1988, em seu art. 201, I. Vejamos:
Art.201. Os planos de previdência social, mediante contribuição, resultantes de acidentes do trabalho, velhice e reclusão.
I.Cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte, incluídos os resultantes do acidente do trabalho, velhice e reclusão. (ALVES, 2007, p.29).
Quando da promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil em 05 de outubro de 1988, todos os segurados da previdência faziam jus ao benefício em comento, independentemente da renda que recebiam. Mais tarde, com o advento da Lei nº 8213/1991, em seu art.80, regulamentava o auxílio-reclusão, que também não limitava o recebimento do benefício apenas aos segurados que auferissem a Baixa Renda.
O artigo supramencionado teve sua redação substancialmente alterada pela Emenda Constitucional nº 20/1998, passando a ter a seguinte composição:
Art.201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a
IV- salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de Baixa Renda.
O requisito da Baixa Renda foi instituído pelo art.13 da referida Emenda, e possui a seguinte redação:
Art.13. Até que a lei discipline o acesso ao salário-família e auxílio-reclusão para os servidores, segurados e seus dependentes, esses benefícios serão concedidos apenas àqueles que tenham renda bruta mensal igual ou inferior a R$ 360,00 (trezentos e sessenta reais), que, até a publicação da lei, serão corrigidos pelos mesmos índices aplicados aos benefícios do regime geral da previdência social.
Este breve relato histórico é para que se possa dar o devido valor ao benefício em comento, e se evidencie uma retrocessão no direito previdenciário causado por uma Emenda Constitucional.
6. O Auxílio Reclusão no Brasil.
Como já argumentado, o benefício previdenciário em destaque, tem como objetivo amparar os dependentes do segurado recolhido à prisão, tal benefício foi “codificado pelo INSS como B/25, o auxílio-reclusão é benefício previdenciário de caráter substitutivo da renda do trabalho, devido aos dependentes do segurado de baixa renda recolhido à prisão.” (ALENCAR, 2009, p.541).
O objetivo principal do benefício em foco é e sempre foi a “de garantir a subsistência da família do segurado detento ou recluso, durante o período no qual a família se ressente da perda temporária de uma fonte de subsistência.” (ALENCAR, 2009, p.541).
Eduardo Dias e José Macedo argumentam ainda, que “a reclusão do segurado [...] impede o exercício de atividade remunerada, fazendo com que a fonte de subsistência das pessoas que dele dependam seja cortada.” (DIAS; MACEDO, 2010, p. 279)
O mesmo autor ainda fundamenta que é “em face dessa contingência social, que elimina a capacidade de auto-sustento dos dependentes do segurado recluso, é concedido o benefício de auxílio-reclusão.” (DIAS; MACEDO, idem).
A Excelentíssima Dra. Juíza Federal Marina Vasques Duarte argumenta que “o auxílio-reclusão é benefício muito semelhante à pensão por morte. A diferença básica é que no auxílio-reclusão o segurado está impossibilitado de exercer atividade remunerada por estar detido.” (DUARTE, 2010, p.342).
O Art. 80 da Lei nº 8.213/1991, traz o conceito o do benefício previdenciário do auxílio-reclusão, qual seja:
Art.80. O auxílio-reclusão será devido, nas mesmas condições da pensão por morte aos dependentes do segurado recolhido à prisão, que não receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio doença, de aposentadoria ou de abono de permanência em serviço.
Parágrafo único. O requerimento do auxílio-reclusão deverá ser instruído com certidão do efetivo recolhimento à prisão, sendo obrigatória para a manutenção do benefício, a apresentação de declaração de permanência na condição de presidiário.
Argumente-se ainda, que se deve conjugar o presente artigo com o Art. 116, caput, do Decreto 3.048/1999, que em seu bojo traz o requisito da baixa-renda, abaixo transcrevemos:
Art.116. O auxílio-reclusão será devido, nas mesmas condições da pensão por morte, aos dependentes do segurado recolhido à prisão que não receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, aposentadoria ou abono de permanência em serviço, desde que o seu último salário de contribuição seja inferior ou igual a R$ 360,00.
Hodiernamente o valor constante no artigo supracitado é atualizado, estabelecido, por portaria, a atual é a de nº 15 de 10 de Janeiro de 2013, que estabeleceu que o último salário de contribuição seja inferior ou igual a R$ 971,78 (novecentos e setenta e um reais e setenta e oito centavos).
Na visão de DUARTE e MACEDO as mudanças trazidas ao texto constitucional, mais precisamente ao art.201, IV, por via da Emenda Constitucional 20/1998, com a devida venia, não foi das melhores, vez que o benefício previdenciário do auxílio reclusão tem caráter eminentemente substitutivo, substitui os rendimentos do trabalho do segurado trancafiado. (DUARTE; MACEDO, 2010).
Com sabedoria e lógica, a melhor doutrina argumenta contra o novo requisito trazido pela Emenda, vejamos:
A reclusão, para aqueles que estão na faixa de proteção do Regime Geral de Previdência Social – RGPS, causará, sempre, um estado de necessidade das pessoas que dependiam economicamente do segurado recluso. Neste tipo de benefício, não dá para fazer a seleção dos beneficiários levando-se em conta a renda do segurado recluso. Qualquer que seja essa renda, dentro do limite de proteção do Regime Geral de Previdência Social – RGPS, a reclusão do segurado causará inexoravelmente o estado de necessidade para as pessoas que dele dependiam economicamente.
Por outro lado, o Art. 201, §2º, da Constituição Federal dispõe que nenhum benefício que substitua o salário de contribuição ou rendimento do trabalho do segurado terá valor mensal inferior ao mínimo. Não quer a Constituição Federal que os benefícios de caráter substitutivo tenham valor mensal inferior a um salário mínimo. Ora, fica difícil compreender que a mesma Constituição, por obra do legislador constitucional reformador, estaria proibindo a concessão de renda substitutiva ao dependente do segurado que foi preso. É dizer: um dispositivo fruto da obra do constituinte originário estabelece um valor mínimo para os benefícios que tenham viés substitutivo, ao passo que um outro, elaborado pelo legislador constitucional reformador, estaria permitindo que o dependente do segurado recluso que tenha renda superior a R$ 798,30 não seja amparado pelo Regime Geral de Previdência Social – RGPS de forma alguma. (DIAS; MACEDO, 2010, p.280).
Hoje em dia, o valor estabelecido pela portaria ministerial é de R$ 971,78, (quem receber até este valor será considerado de baixa renda), esse requisito, por afetar diretamente a situação econômica dos dependentes do segurado, podendo, inevitavelmente colocá-los em situação de miserabilidade, não poderia ser um requisito estanque. Tal requisito, irrefutavelmente, afronta o princípio da proporcionalidade.
Segundo MÜLLER (p. 218, apud BONAVIDES, 2010, p.393) “Há violação do princípio da proporcionalidade, com ocorrência de arbítrio, toda vez que os meios destinados a realizar um fim não são por si mesmos apropriados e ou quando a desproporção entre meios e fins é particularmente evidente, ou seja, manifesta.”.
Atualmente o valor de referência para consideração da baixa renda é de R$ 1.025,81, valor de Janeiro de 2014[1].
Saliente-se que para o preclaro prof. Sérgio Pinto Martins, o benefício do auxílio-reclusão deveria ser expurgado do mundo jurídico, sob o argumento de que “[...] não é possível que a pessoa fique presa e ainda a sociedade como um todo tenha que pagar um benefício à família do preso, como se estivesse falecido. De certa forma, o preso é quem deveria pagar por se encontrar nessa condição, principalmente por roubo, furto, tráfico, estupro [...]” (MARTINS, 2005, p. 414).
Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:
[...]
§5 – Nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total.[...].
O Prof. Hélio Gustavo Alves, em sua Obra o Auxílio-Reclusão – Direito dos Presos e de Seus Familiares, com sabedoria, aniquila o posicionamento do Prof. Sérgio Pinto Martins, senão vejamos:
[...] Sérgio Pinto Martins de forma sociológica, numa análise crua, faz refletir se o auxílio-reclusão deveria continuar existindo ou não.
Mas numa reflexão constitucional e também sociológica mais aprofundada, nos leva a ratificar o auxílio-reclusão, pois se o segurado está preso, uma das razões, é porque o Estado não lhe deu meios para que tivesse uma melhor condição educacional, familiar e de vida. (ALVES, 2007, p. 35).
Pelo exposto, é evidente a necessidade da manutenção do benefício no ordenamento jurídico, além do mais, a extinção seria um flagrante retrocesso.
7.O auxílio-reclusão. Seus requisitos e procedimentos para a concessão
O auxílio-reclusão será devido nas mesmas condições da pensão por morte aos dependentes do segurado recolhido a prisão, em sucinta análise, é o que diz o art.80 da Lei 8.213/1991, salvo quanto ao requisito da baixa renda, essa se aplica apenas ao benefício previdenciário do auxílio-reclusão, ou seja, ao segurado (vivo) apenado. Lilian Souza de Castro, lembra que “Equipara-se a condição de recolhido à prisão a situação do segurado com idade entre 16 e 18 anos que tenha sido internado em estabelecimento educacional ou congênere, sob custódia do Juizado de Infância e da Juventude.” (SOUZA, 2011, p. 161).
O benefício em destaque possui entranhando em suas raízes um único objetivo, proteger os dependentes do segurado preso. No entanto, existe o tão debatido requisito da baixa renda, implementado pela Emenda Constitucional nº 20/1998, que é aferido, tomando por base o último salário auferido pelo segurado. Ocorre que pode acontecer do indivíduo não ter tido salário, mas o indivíduo apenado possuir ainda, a qualidade de segurado, em assim sendo, os dependentes farão jus ao benefício. (SOUZA, 2011).
Dito isso, passaremos aos requisitos para a concessão do benefício.
a. Antes de pensar em qualquer coisa, o indivíduo recolhido à prisão deverá ter qualidade de segurado, ou seja, estar filiado ao Regime Geral da Previdência Social.
b. Verificar se a renda do segurando (último salário de contribuição) enquadra o apenado como “segurado de baixa renda”.
c. Por ter o benefício, o objetivo de proteção dos dependentes do segurado recluso, o mesmo deverá possuir dependentes. (Decreto nº 3.048/1999, Art. 116, §1º).
d. Analisar em qual regime prisional o apenado foi enquadrado, só faz jus ao benefício os apenados em regime semiaberto e fechado. (Decreto nº 3.048/1999, Art. 116, §5º).
e. O pedido do benefício deverá ser instruído com a certidão do efetivo recolhimento do segurado à prisão, firmada pela autoridade competente. (Decreto nº 3.048/1999, Art. 116, §2º).
f. Após a concessão, deverá o beneficiário apresentar trimestralmente comprovação da situação prisional do apenado, que é expedida pela autoridade competente. (Decreto nº 3.048/1999, Art. 117, §1º)
Marina Vasques Duarte, alerta que o segurado não poderá estar recebendo nenhuma remuneração ou proventos decorrentes de outros benefícios previdenciários, ou seja, não pode o segurado estar em gozo de auxílio doença e cumulá-lo com o auxílio-reclusão, poderá escolher o mais vantajoso. Ressalta ainda, que o benefício em comento não exige o cumprimento de carência como requisito. (DUARTE, 2010.)
No que diz respeito ao regime prisional fechado, é evidente o direito ao benefício, pois não há possibilidades do indivíduo auferir renda. O Prof. Cezar Roberto Bitencourt, caracteriza tal regime dizendo que:
Quem cumpre pena em regime fechado não tem direito a frequentar cursos, quer de instrução, quer profissionalizantes. E o trabalho esterno só é possível (ou admissível) em obras ou serviços públicos, desde que o condenado tenha cumprido, pelo menos, um sexto da pena. (BITENCOURT, 2012, p.604).
O mesmo autor argumenta sobre as regras do regime semiaberto, aduzindo que:
[...]Nesse regime, o condenado terá direito de frequentar cursos profissionalizantes, de instrução de 2º grau ou superior. Também ficará sujeito ao trabalho em comum durante o período diurno, em colônia agrícola, industrial ou em estabelecimento similar. Aqui, no regime semiaberto, o trabalho externo é admissível, inclusive na iniciativa privada, ao contrário do que ocorre no regime fechado. Este, o serviço externo, pode ser o penúltimo estágio de preparação para o retorno do apenado ao convívio social. O próximo e derradeiro passo será o livramento condicional.. (BITENCOURT, 2012, p. 605).
Como o trabalho exercido pelo apenado no regime semiaberto tem caráter eminentemente ressocializador, e não de garantir a própria subsistência, pois está é garantida pelo Estado, é que se viabilizou a possibilidade do benefício aos dependentes do segurado recluso nesse regime. Tal possibilidade foi criada através do Parecer CJ/nº 2.583/2001.
8. As Inconstitucionalidades: Emenda Constitucional nº20/1998 e Art.13 da mesma emenda.
A discussão aqui travada é em torno do requisito Baixa Renda, instituído pela Emenda Constitucional. Há evidente inconstitucionalidade por vício material entranhado na referida alteração Constitucional.
Obviamente o requisito da baixa renda surgiu com um único objetivo, o de restringir a concessão do benefício previdenciário do auxílio reclusão, excluindo abruptamente os segurados com proventos superiores ao estabelecido, no momento, pelo INSS, por portaria ministerial. Tal atitude é de uma incongruência Constitucional.
Segundo o Hélio Gustavo Alves, o INSS e parte da doutrina entendem que a renda a ser considerada para concessão do benefício é a do segurado.
O poder judiciário até o mês de março de 2009 entendia e julgava, tendo por base a renda dos dependentes.
Lembramos ainda do Enunciado de Súmula nº 05 da Turma de Uniformização da 4ª Região, que assim regulamentava “para fins de concessão do auxílio-reclusão, o conceito de renda bruta mensal se refere à renda auferida pelos dependentes e não à do segurado recluso”.
No entanto em 25.03.2009 o Supremo Tribunal Federal, guardião e último interprete da Constituição, espancou a discussão, dizendo ser a renda do segurado que deveria ser utilizada como parâmetro. A matéria foi debatida por meio de dois Recursos Extraordinários (REs 587365 e 486413), transcreveremos apenas o primeiro, porque ambos trazem a mesma fundamentação. Abaixo transcrevemos parte do decisum.
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. CONSTITUCIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. ART. 201, IV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. LIMITAÇÃO DO UNIVERSO DOS CONTEMPLADOS PELO AUXÍLIO-RECLUSÃO. BENEFÍCIO RESTRITO AOS SEGURADOS PRESOS DE BAIXA RENDA. RESTRIÇÃO INTRODUZIDA PELA EC 20/1998. SELETIVIDADE FUNDADA NA RENDA DO SEGURADO PRESO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO PROVIDO. I – Segundo decorre do art. 201, IV, da Constituição, a renda do segurado preso é a que deve ser utilizada como parâmetro para a concessão do benefício e não a de seus dependentes. II – Tal compreensão se extrai da redação dada ao referido dispositivo pela EC 20/1998, que restringiu o universo daqueles alcançados pelo auxílio-reclusão, a qual adotou o critério da seletividade para apurar a efetiva necessidade dos benefícios. III – Diante disso, o art. 116 do Decreto 3.048/1999 não padece do vício da inconstitucionalidade. IV – Recurso extraordinário conhecido e provido. (RE 587365, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, Julgado em 25/03/2009, REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO. DJe-084 DIVULG 07-05-2009 PUBLIC 08-05-2009 EMENT VOL-02359-08 PP-01536).
Diante do posicionamento do STF, fazemo-nos a seguinte pergunta, exemplificativa e irresignativa: Os dependentes do segurado recluso, que possuísse uma remuneração mensal de R$ 1.026,00 (um mil e vinte e seis reais), estarão livres da fome, das prestações de aluguel, água, luz etc., ou seja, terão como manter-se? E, de contrapartida, os dependentes do segurado recluso que possuísse remuneração de até R$ 1.025,81 (um mil e vinte e cinco reais com oitenta e um centavos), não terão condições de subsistência, e por isso fazem jus ao auxílio? A situação hipotética tem por objetivo mostrar o nexo, com a afronta ao princípio da isonomia e o da dignidade da pessoa humana, já citado, onde a situação hipotética nos parece estar, segundo a lei, diante de um tratamento desigual para iguais, ressaltando que a situação hipotética aqui criada, é a mais pura realidade. Com todo o respeito, não nos parece que o posicionamento da Suprema Corte esteja igualando os desiguais, mas sim, desigualando os iguais, e vamos além, não tomamos por parâmetro a renda do segurado, mas sim, a sua qualidade de segurado, uma vez que a base de cálculo do benefício em comento utiliza a renda do segurado como parâmetro para o seu próprio custeio no futuro, bem como o imediato custeio de todo o complexo previdenciário, basta aplicar os princípios.
Não podemos deixar de citar, a brilhante citação do Professor Ingo Sarlet, vejamos:
Assim, vale lembrar que a dignidade evidentemente não existe apenas onde é reconhecida pelo direito e na medida que este a reconhece. Todavia, importa não olvidar que o Direito poderá exercer papel crucial na sua proteção e promoção, não sendo, portanto, sem completamente sem fundamento que se sustentou até mesmo a desnecessidade de uma definição jurídica da dignidade da pessoa humana, na medida em que, em última análise se cuida de valor próprio da natureza como ser humano como tal. (SARLET, 2011, p.53).
Pedimos vênia a Suprema Corte, para discordar veementemente da interpretação dada ao art. 13 da Emenda Constitucional nº 20/1998. E colacionar a esplêndida e bem fundamentada interpretação dada ao dispositivo pelo Excelentíssimo Procurador Federal, Hermes Arrais Alencar, vejamos:
Pedimos, nesse momento, que o leitor esvazie a mente, e se detenha exclusivamente nas palavras contidas no Art.13 da Emenda Constitucional nº 20: Art. 13. “Até que a lei discipline o acesso ao salário–família e auxílio-reclusão para os servidores, segurados e seus dependentes, esses benefícios serão concedidos apenas àqueles que tenham renda bruta mensal igual ou inferior a R$ 360,00 (trezentos e sessenta reais), que, até a publicação da lei, serão corrigidos pelos mesmos índices aplicados aos benefícios do regime geral da previdência social”.
Diz a norma que esses benefícios (salário-família e auxílio-reclusão) serão concedidos apenas “àqueles”, mas quem seriam “àqueles”? No caso em apreço, auxílio-reclusão, temos que ele (auxílio-reclusão) somente é concedido a dependentes (art.18,II, b, da LB). São os dependentes que fazem jus.
Quando o art.13 diz que esse benefício, auxílio-reclusão, será concedido apenas “àqueles”, a única substituição admissível desse termo será valendo-se da expressão “dependentes”. Note-se que não podemos colocar ali, no lugar de “àqueles”, a palavra “segurado”, justamente porque o auxílio-reclusão não é concedido ao segurado, mas sim ao dependente.
A fórmula lingüística adotada no art.13 acomoda, com sucesso na transmissão de idéias, duas frases:
1) Salário-família será concedido apenas aos segurados que tenha renda bruta mensal igual ou inferior a R$ 360,00;
2) Auxílio-reclusão será concedido apenas aos dependentes que tenham renda bruta mensal igual ou inferior a R$ 360,00;
Sintetizados numa única frase: “esses benefícios serão concedidos apenas àqueles que tenham renda bruta mensal igual ou inferior a R$ 360,00”.
Concordando o leitor com a interpretação que acaba de ser sugerida, restará óbvio que a restrição não é feita com relação aos segurados de baixa-renda, mas aos dependentes de baixa-renda. (ALENCAR, 2009, p.543/544).
Sem sombra de dúvidas, há de se levar em conta a hermenêutica da norma, uma interpretação constitucional, que ao pé da letra, seria a salvação da norma em comento, porque analisar a renda do dependente é interpretar a norma com razoabilidade, é verificar a verdadeira situação de dependência fática, com a dependência legal, porque uma coisa é ser dependente, nos estritos termos da lei, outra é ser dependente de fato. A interpretação feita por Alencar, além de estar formalmente correta, é a mais aceitável, obviamente estaria, mesmo assim, restringindo a concessão do benefício, que não é certo, pois o objetivo da previdência é ampliar, e não, restringir.
Infelizmente, não é essa a interpretação que está sendo feita. O Supremo Tribunal Federal, como visto, decidiu que a renda a ser considerada é a do segurado.
De todo o arcabouço já delineado, é fácil discernir a inconstitucionalidade da Emenda, porque afronta princípios constitucionais, e mais, não iguala os iguais, esquecendo o legislador, dos Direitos Fundamentais, cunhados em letras de fogo na Magna Carta.
A exigência da baixa renda é inconstitucionalidade flagrante, ainda mais em se tratando da renda do segurado, uma possível solução é a interpretação feita por Alencar, onde seria considerado como parâmetro, a renda dos dependentes (como estava sendo feito), ou então, fosse estabelecido um teto máximo de concessão para todos, que não fosse inferior ao mínimo. Porque se for observado o critério atual, onde não se concede o auxílio aos dependentes do segurado que auferir renda superior ao estabelecido pela portaria ministerial, a previdência faz pior do que conceder benefício com valor inferior ao salário mínimo, pois não fornece absolutamente nada! Só restando para os dependentes duas alternativas, a) se estiverem capazes, qualificados e o mercado de trabalho lhes oferecer uma oportunidade de emprego, devem trabalhar e se sustentar, ou b) esperar que o segurado venha a óbito, onde então passarão a receber o benefício de pensão por morte.
Como visto, a Emenda Constitucional restringe a concessão do benefício, que ao contrario, deveria ampliar. Protegendo e educando o os dependentes do segurado recolhido à prisão, para que esses não caiam nos mesmos trilhos daqueles.
Não é difícil perceber, pelo todo exposto, que há uma flagrante inconstitucionalidade material arraigada a norma, paulatinamente demonstraremos esses vícios.
De início, dirigimo-nos ao art. 1º, inciso III da Constituição Federal, onde é contemplado o princípio da dignidade da pessoa humana, tendo como objetivo possuir uma nação livre, justa e solidária.
Hélio Gustavo Alves, argumentando que a Emenda desvirtua os objetivos sociais, e por isso já é inconstitucional. Vejamos:
A Carta Magna não deixo de trazer de forma destacada a segurança jurídica constitucional, podemos dizer como direito fundamental o Direito Social, a Seguridade Social, tendo dispositivos específicos sobre saúde, assistência e previdência social.
A Lei Maior, no art. 193, que inaugura o Título VIII, tem estampado a Ordem Social, em que faz parte deste contexto garantir e valorizar o Primado do Trabalho, como Objetivo o bem estar e, por fim, a Justiça Social.
Logo a seguir no mesmo Título, o capítulo II traz o conceito de Seguridade Social, solidificado pelos princípios que acompanham o texto constitucional, fazendo parte dela a saúde, a Assistência e a Previdência Social, esta última assegura os direitos fundamentais, bem como as necessidades primordiais dos segurados ou dependentes, garantindo a dignidade da pessoa humana.
Feita essa necessária introdução sobre Seguridade Social, que está na Carta Magna, como meio de alcançar a Justiça Social, trazemos a redação do Art. 195, §5º, para demonstrar que o Art. 13 da Emenda 20, que alterou o art.201, IV é inconstitucional por violar o preceito fundamental do “plano de custeio e benefícios”. (ALVES, 2007, p.92).
Indo um pouco mais além, se a situação for observada com olhos críticos, verificaremos uma situação ainda mais inusitada. Vejamos:
O segurado comete um crime, é trabalhador e é a única fonte de renda da família. Ressalte-se aqui, por oportuno, que a lei não fez distinções de crimes, então qualquer um está sujeito a ser punido. Por exemplo, quando o sujeito se envolve em acidente de trânsito. Portanto, após o indivíduo ser trancafiado a família dá inicio aos trâmites legais pleiteando a concessão do benefício previdenciário do auxílio-reclusão, quem pleiteia é quem necessita, é quem não possui mais a fonte de renda! Portanto, é fácil perceber que a pena de prisão acometida ao segurado, acaba condenando também os seus dependentes (esposa, filhos, enteados etc.) mostrando, novamente, afronta a Constituição Federal, que em seu art. 5, inciso XLV, que diz: “Nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido.” (Grifo nosso) (BARROSO;JUNIOR, 2012, p. 70).
Observa-se que argumentos não faltam para fundamentar a inconstitucionalidade por vício material do Art. 13 da Emenda Constitucional nº 20/1998.
Além do vício material, a Emenda Constitucional nº 20/1998 é muito questionada quanto ao trâmite, que não teria obedecido ao processo legislativo, tão pouco aos critérios para que se emende a Constituição da República Federativa do Brasil, bem como a estrita obediência ao processo de revisão dos projetos de lei, ou seja, não seguiu os artigos 59, 60 e 65 da Constituição. Portanto, violou o princípio do devido processo legislativo, incidindo em vício formal, àquele entranhado na genética da lei.
O Ilustre Hélio Gustavo Alves, citando Heloisa Hernandes Derzi que em seu artigo trouxe o histórico dos caminhos que seguiu a Emenda Constitucional nº 20/1998 e que a tornam, irrefutavelmente, inconstitucional. Vejamos:
Como se vê, não se pode aprovar apenas parte do projeto de lei ou de emenda à Constituição, uma vez que as duas Casas do Congresso Nacional devem chegar a um consenso sobra as alterações propostas durante o procedimento legislativo, sem que uma se sobreponha à outra. O atual ordenamento constitucional não autoriza que o Presidente da Câmara dos Deputados seccione os projetos de lei ou emenda.
Com relação à Emenda 20/98, esta originou-se da Proposta de Emenda Constitucional – PEC 33/95, encaminhada pelo Poder Executivo à Câmara dos Deputados, através da Mensagem 306, de 17 de março de 1995. Após discussões e emendas, foi aprovada em sessão plenária, em 17 de julho de 1996, e dali enviada ao Senador Federal na mesma Data, tendo sido designado o Senador Beni Veras para relator. Este, por sua vez, apresentou um projeto substitutivo – PEC 33/96 -, após ter sofrido inúmeras emendas naquela Casa revisora.
Tendo retornado à Casa iniciadora em 8 de outubro de 1997, o PEC 33/96 foi substancialmente alterado por emendas de redação, adição, substituição e supressão, seja em artigos, parágrafos, alíneas ou importantes palavras e expressões, que terminaram por modificar totalmente o seu conteúdo.
Ao final, após a votação do último Destaque de Votação em Separado – DVS, o Presidente da Câmara dos Deputados houve por bem encaminhar ao Senador, para redação final, apenas parte do Substitutivo da PEC 33/96, ou seja, apenas nos pontos em que tinha havido discordância entre duas Casas, decidindo promulgar o restante.
Consta, entretanto que as matérias divergentes das Casas do Parlamento foram além das modificações informadas pelo Presidente da Câmara ao Senado: foram adicionados novos dispositivos não constantes do texto Substitutivo do Senado (PEC 33/96), o que significa que esses não foram objeto de apreciação anterior pela Casa Revisora. Donde podemos concluir que foi viciado o processo legislativo de formação da Emenda 20/98, vez que não caminhou pelas vias regulamentares previstas na Constituição Federal,ou seja, conjugando a vontade das duas Casas Legislativas. (Grifos no original). (DERZI, 2001, p.21 apud ALVES, 2007, p. 87).
Verifica-se, portanto, que há dois vícios de inconstitucionalidade, o Material constante no art.13 da Emenda Constitucional nº 20/1998 e o Formal, relativo ao processo de transformação do projeto de emenda à constituição em Emenda.
Como já falado, no presente trabalho buscou-se fazer uma análise sobre uma possível inconstitucionalidade da Emenda Constitucional nº 20/1998 e do seu Art. 13. No que diz respeito ao implemento do requisito baixa renda.
Uma interpretação inteligente, e em consonância com a Lei Maior estava sendo dada pelos diversos órgãos do judiciário ao texto legal. Infelizmente o Supremo fez uma interpretação às avessas, que só dá privilégios ao próprio sistema previdenciário. Percorrendo o árduo caminho previdenciário e constitucional, sobre a possível inconstitucionalidade da referida emenda, não restam dúvidas sobre a flagrante inconstitucionalidade, ocorre que Supremo Tribunal Federal, quando da sua interpretação exageradamente restritiva ao Art.201, inciso IV da Lei das Leis, acabou por vincular os demais órgãos do poder judiciário, sendo assim, hoje a baixa renda que é considerada, refere-se à do segurado, ocasionando verdadeira atrocidade na família (dependentes) do preso. Uma justiça que aplica a letra fria da lei, fato e norma, esquecendo de aplicar o valor.
A Suprema Corte ao apreciar o tema por meio do Recurso Extraordinário nº 587365, dizendo qual seria a melhor interpretação da norma, não deu relevância para princípios basilares, e quando isso ocorre, o reflexo é sentido pelo povo. Mais pessoas desamparadas e sem meios imediatos de subsistência, com grandes possibilidades de virem a ser sustentadas pelo Estado, isso mesmo, pelo Estado, só que agora não na qualidade de dependentes do segurado, e sim como apenados. Por lógica, quando o Estado desampara as pessoas, estas ficam vulneráveis, as tentações do crime, nas promessas de dinheiro rápido e fácil.
Ressalte-se que a lei poderia estabelecer um teto máximo para o salário de benefício, amparando todos os dependentes do segurado, que se encontrem em situação de total desamparo, observando-se sempre a renda familiar.
Por fim, espero ansiosamente que o Supremo Tribunal Federal reveja a atual interpretação literal do dispositivo 201, IV da Constituição, e se norteiem pelos princípios constitucionais basilares de qualquer estado democrático de direito, isonomia e dignidade da pessoa humana. Assim, lembramos do Art. 1º, § único da Constituição da Republica Federativa do Brasil, “Todo poder emana do povo...”. Sendo assim, com a palavra, o povo brasileiro!
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[1] http://agencia.previdencia.gov.br/e-aps/servico/350
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