Resumo: Conforme entendimento recentemente consolidado pelo plenário do Supremo Tribunal Federal a exigência de prévio requerimento administrativo nas ações judiciais para concessão de benefícios previdenciários não constitui uma ofensa ao princípio constitucional do livre acesso à justiça ou inafastabilidade da jurisdição, mas sim condição da ação pela ausência do interesse de agir, já que não haveria lesão ou ameaça a direito.
Palavras-chaves: Supremo Tribunal Federal; RECURSO EXTRAORDINÁRIO RE Nº 631240; prévio requerimento administrativo; ações previdenciárias.
Introdução
O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), por maioria de votos (sete favoráveis e dois contrários), em 27/08/2014, acompanhando a posição do ministro Luís Roberto Barroso, relator do Recurso Extraordinário (RE) 631240, com repercussão geral reconhecida, proferiu parcial provimento ao pedido do INSS determinando a imprescindibilidade do prévio requerimento administrativo para o conhecimento de ação judicial cujo objeto seja a concessão de benefício previdenciário.
Restaram vencidos os ministros Marco Aurélio e Cármem Lúcia, que entenderam que "a exigência de prévio requerimento junto ao INSS para o ajuizamento de ação representa restrição à garantia de acesso universal à Justiça"
Por intermédio desta importante decisão judicial exarada por nossa mais alta Corte Constitucional findou-se com antigas divergências jurisprudenciais existentes perante as Turmas Recursais e Regionais, na Turma Nacional de Uniformização, nos Tribunais Regionais Federais e no Superior Tribunal de Justiça, e por conseguinte, uniformizou-se entendimento, fornecendo segurança jurídica ao nosso ordenamento.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO RE Nº 631240.
Conforme notícia divulgada no sítio do Supremo Tribunal Federal, o Ministro Luís Roberto Barroso em seu voto entendeu que o requerimento administrativo anterior a postulação judicial caracteriza-se como requisito para a constituição da lesão ou ameaça a direito, ou seja, do interesse de agir, condição da ação e não como entrave ao acesso ao Judiciário. Nas palavras do Ministro:
“Não há como caracterizar lesão ou ameaça de direito sem que tenha havido um prévio requerimento do segurado. O INSS não tem o dever de conceder o benefício de ofício. Para que a parte possa alegar que seu direito foi desrespeitado é preciso que o segurado vá ao INSS e apresente seu pedido”, afirmou o ministro.
O ministro Barroso entendeu que a ausência do protocolado do requerimento administrativo junto ao INSS caracteriza falta do interesse de agir, já que a autarquia previdenciária não poderia deferir o benefício de ofício, dependendo este ato de uma postulação ativa.
Conforme entendimento do STF esta exigência não fere a garantia de livre acesso ao Judiciário, previsto no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal, não significando o exaurimento de todas as instâncias administrativas a reivindicação do prévio requerimento administrativo, uma vez que negado o benefício, não há impedimento ao segurado para que ingresse no Judiciário antes que eventual recurso seja examinado pela autarquia. Nas palavras do ministro Luís Roberto Barroso:
"a exigência não fere a garantia de livre acesso ao Judiciário, previsto no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal, pois sem pedido administrativo anterior, não fica caracterizada lesão ou ameaça de direito".
Assim, somente nos casos em que o pedido administrativo for negado, total ou parcialmente, ou em que não houver resposta no prazo legal de 45 dias pelo INSS é restará caracterizada a lesão/ameaça ao direito e, portanto, o interesse de agir, requisito necessário para o ingresso pelo segurado com a ação judicial para a concessão de benefício previdenciário.
Ressaltou, entretanto o Ministro, dois casos nos quais não há esta exigência de pedido administrativo prévio para o conhecimento da ação judicial, quais sejam, demandas judiciais que envolvam pedidos de revisão de benefícios, a não ser nos casos em que seja necessária a apreciação de matéria de fato, bem como nos casos em que a posição do INSS seja notoriamente contrária ao direito postulado.
Em virtude da repercussão geral reconhecida no Recurso Extraordinário (RE) 631240, aproximadamente 8.600 processos judiciais em trâmite em nosso ordenamento jurídico ficaram sobrestados, aguardando posicionamento de nossa Corte Constitucional.
Vejamos a ementa da decisão do Plenário Virtual que reconheceu a existência de repercussão geral da matéria:
“CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. PREVIDÊNCIÁRIO. PRÉVIA POSTULAÇÃO ADMINISTRATIVA COMO CONDIÇÃO DE POSTULAÇÃO JUDICIAL RELATIVA A BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. EXISTÊNCIA.
Está caracterizada a repercussão geral da controvérsia acerca da existência de prévia postulação perante a administração para defesa de direito ligado à concessão ou revisão de benefício previdenciário como condição para busca de tutela jurisdicional de idêntico direito” (RE 631240 RG/MG, rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 09/12/2010, DJe 14/04/2011).
Objetivando dar continuidade a este elevado número de ações judiciais sobrestadas, no dia 03/09/2014 o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) deliberou acerca das regras de transição a serem aplicadas a estes processos judiciais que envolvem pedidos de concessão de benefício ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) sem a precedência de processo administrativo junto à autarquia federal.
A Defensoria Pública da União e a Procuradoria Geral Federal, por intermédio de ajuste devidamente aprovado pelo STF, acordaram que deverão continuar sobrestadas as ações judiciais. Inicialmente, no prazo de 30 dias, o requerente do benefício deve ser intimado pelo juízo para postular administrativamente perante o INSS, sob pena de extinção do processo. Posteriormente, a autarquia também será intimada a se manifestar, no prazo de 90 dias. Sendo deferido administrativamente o pedido ou nos casos em que ele não puder ser analisado por motivo atribuível ao próprio requerente, a ação deverá ser extinta. Caso contrário, fica caracterizado o interesse em agir, devendo ter seguimento o pedido judicial da parte.
Ficaram excluídas da referida exigência as ações ajuizadas em juizados itinerantes, considerando que esta espécie de juizados normalmente são realizados em locais nos quais não há agência do INSS, sendo um entrave a efetivação do direito a requisição do prévio pedido administrativo para o ajuizamento de ação judicial, quando não existe na localidade posto de atendimento da autarquia previdenciária.
Por fim, definiu-se ainda que, nos casos em que o INSS já apresentou contestação de mérito no curso do processo judicial fica mantido seu trâmite, uma vez que a contestação caracteriza o interesse em agir.
“(a) os pedidos judiciais de concessão de benefícios dependem de prévio requerimento administrativo (mas não do exaurimento da via administrativa, ou seja, não se exige a interposição de todos os recursos cabíveis, bastando uma primeira decisão desfavorável ou a demora na resposta). (b) é dispensado o requerimento administrativo nos pedidos de concessão quando o entendimento do INSS sobre a questão de direito for reiteradamente e notoriamente contrário ao pretendido pelo segurado; (c) os pedidos de manutenção, restabelecimento e revisão de benefício previdenciário também dispensam o prévio requerimento administrativo quando se tratar de matéria exclusivamente de direito; (d) e, por outro lado, ações de manutenção, restabelecimento e revisão que envolverem matéria de fato são condicionadas ao requerimento anterior ao INSS.”
Na prática, inúmeros segurados, por vezes erroneamente orientados, ajuizavam ações judiciais sem que antes fosse solicitado administrativamente o reconhecimento do direito, impedindo o INSS de analisar acerca do preenchimento dos requisitos legais para a concessão do benefício, transmitindo esta importante tarefa ao Poder Judiciário.
Em diversas hipóteses o benefício previdenciário era devido, sem contudo ter tido a autarquia previdenciária oportunidade de concessão deste direito, já que não existia pedido perante as agências do INSS, transferindo mais uma vez ao Judiciário a demanda administrativa da autarquia, abarrotando especialmente seus Juizados Especiais Federais. De acordo com o ranking dos 100 maiores litigantes da Justiça brasileira, divulgado pelo CNJ, o INSS ocupa a 1ª posição tanto na lista nacional quanto na lista da Justiça Federal, sendo o maior litigante do Judiciário Brasileiro.
O INSS tem verificado contudo que, visando adimplir com esta exigência do prévio requerimento administrativo para o ingresso de ação judicial, que já vinha sido exigida em outras decisões judiciais, inclusive do Superior Tribunal de Justiça, inúmeros segurados tem requerido benefícios previdenciários apenas apresentando documentos pessoais, tais como identidade e CPF, sem que seja juntado ao processo administrativo qualquer documento comprobatório do direito, visando tão somente a carta de indeferimento do benefício para fins de ingresso junto ao Judiciário.
Entendemos que, uma vez comprovada judicialmente à situação supramencionada, o que poderia ocorre com a juntada integral dos autos administrativos ao processo judicial, este requerimento administrativo possa ser entendido como inexistente, já que o fundamento da exigência de requisição do prévio pedido administrativo para o ajuizamento de ação judicial, qual seja a oportunidade de análise prévia do órgão competente, restará esvaziada.
Conclusão
Por intermédio desta importante decisão judicial exarada por nossa mais alta Corte Constitucional, Supremo Tribunal Federal, nos autos do Recurso Extraordinário (RE) 631240, uniformizou-se entendimento quanto à necessidade do prévio requerimento administrativo para o conhecimento de ação judicial cujo objeto seja a concessão de benefício previdenciário, resolvendo a insegurança jurídica causada pelas decisões divergentes que existiam em nosso sistema jurídico.
Referências Bibliográficas
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, Senado, 1988.
Notícias do Supremo Tribunal Federal. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=273812. Acesso em: 23 set. 2014.
Interesse Processual, Benefícios Previdenciários e Recurso Extraordinário 631240 do STF. Disponível em: http://jus.com.br/artigos/31926/interesse-processual-beneficios-previdenciarios-e-recurso-extraordinario-631240-do-stf#ixzz3E9SR3SlY. Acesso em: 23 set. 2014.
Procuradora Federal desde 03/03/2008, atualmente lotada na Procuradoria Federal Especializada do INCRA; Ex. Procuradora do Estado do Pará; Ex. Defensora Pública do Estado do Pará e Ex. Advogada do Banco do Estado do Pará.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: AVILA, Kellen Cristina de Andrade. Notas sobre a recente decisão judicial do STF acerca do prévio requerimento administrativo nas ações para concessão de benefícios previdenciários - recurso extraordinário RE Nº 631240. Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 06 out 2014, 07:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/41126/notas-sobre-a-recente-decisao-judicial-do-stf-acerca-do-previo-requerimento-administrativo-nas-acoes-para-concessao-de-beneficios-previdenciarios-recurso-extraordinario-re-no-631240. Acesso em: 22 nov 2024.
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