Resumo: O presente artigo objetiva analisar a responsabilidade do Poder Público nos casos em que este realiza contrato de empreitada para construção de obras públicas, uma vez que há no caso utilização de mão de obra de trabalhadores para a execução do contrato. A abordagem visa a esclarecer os aspectos fundamentais do tema, principalmente à luz da jurisprudência do TST.
Palavras-Chave: Responsabilidade do Poder Público. Contrato de empreitada. Execução de obra. Inexistência de previsão legal.
Abstract: This article aims to analyze the responsibility of the government where it performs the works contract for construction of public works, since if there is use of labor of workers to perform the contract. The approach aims to clarify the fundamental aspects of the subject, particularly in light of the jurisprudence of TST.
1. Introdução: Noções Gerais
A Responsabilidade do Poder Público nos casos de terceirização de mão de obra é disciplinada na Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST). De com o seu inciso V, os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta só responderão subsidiariamente caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora.
Ressalte-se ainda que a aludida responsabilidade não decorre do mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada, mas deve haver a prova inconteste da inequívoca da negligência, pois está em jogo o patrimônio público.
Extraí-se do enunciado da OJ que inexiste responsabilidade subsidiária ou solidária entre o dono da obra e o empreiteiro, visto que ausente previsão legal. Todavia, são ressalvados os casos em que o dono da obra for uma empresa construtora ou incorporadora.
Desta feita, para perquirir a responsabilidade do Poder Público é fundamental saber se no caso sob análise ele atua como tomador dos serviços ou dono da obra.
O presente artigo tem por finalidade tratar sobre a responsabilidade da administração pública quantos às verbas trabalhistas nos casos em que esta celebra contrato de empreitada para execução de obras públicas.
2 . Execução de Obra – Contrato de Empreitada
Depreende-se da análise dos dispositivos legais que regem o contrato de empreitada, artigos 610 ao 626 do Código Civil, que não há nenhuma norma que discipline a responsabilidade do dono da obra com relação aos encargos trabalhistas dos empregados contratados pelo empreiteiro para a execução do tratado.
Desta feita, por inexistência de previsão normativa, não pode o reclamante ajuizar eventual reclamação trabalhista em face do beneficiário da obra, pois este não detém legitimidade para figurar no seu pólo passivo, ainda que o inadimplemento das parcelas decorra da prestação de serviços para ele.
Nesse sentido, é a Orientação Jurisprudencial nº 191 da SDI - 1 do TST, in verbis:
191. CONTRATO DE EMPREITADA. DONO DA OBRA DE CONSTRUÇÃO CIVIL.
RESPONSABILIDADE. (nova redação) - Res. 175/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011
Diante da inexistência de previsão legal específica, o contrato de empreitada de construção civil entre o dono da obra e o empreiteiro não enseja responsabilidade solidária ou subsidiária nas obrigações trabalhistas contraídas pelo empreiteiro, salvo sendo o dono da obra uma empresa construtora ou incorporadora.
Dessa forma, não há que se falar em responsabilidade solidária e nem mesmo subsidiária, salvo se o dono da obra for uma empresa construtora ou incorporadora. Isso ocorre porque nesses casos será auferido lucro com a atividade de construção civil e este é o seu principal objeto.
Assim, para que o trabalhador, em eventual ação trabalhista, logre êxito na condenação do dono da obra, deve demonstrar que o dono da obra é uma empresa construtora ou incorporadora. Sem isso, não há responsabilidade.
2. Responsabilidade do empreiteiro e do subempreiteiro
Em regra, como já explicado, não existe responsabilidade entre o empreiteiro e o dono da obra, entretanto, situação diversa ocorre quando é realizado um contrato de subempreitada.
A CLT traz regra específica quanto à responsabilidade nessa situação, em seu art. 455, vejamos:
Art. 455. Nos contratos de subempreitada responderá o subempreiteiro pelas obrigações derivadas do contrato de trabalho que celebrar, cabendo, todavia, aos empregados, o direto de reclamação contra o empreiteiro principal pelo inadimplemento daquelas obrigações por parte do primeiro.
Parágrafo único. Ao empreiteiro principal fica ressalvada, nos termos da Lei civil, ação regressiva contra o subempreiteiro e a retenção de importância a este devidas, para a garantia das obrigações previstas neste artigo.
Nesse contexto, quanto se trata de contratos de subempreitada, o empreiteiro principal pode ser demandado juntamente com o subempreiteiro pelas obrigações trabalhistas, ressalvado-lhe o direito de regresso.
Isso ocorre para uma maior proteção ao trabalhador em caso de inadimplência do empregador direto.
Nesse diapasão, com o fito de dar uma maior segurança jurídica quanto ao recebimento das verbas pleiteadas, o reclamante poderá demandar ambos, para tanto basta provar que no caso concreto ocorreu a celebração de uma avença de subempreitada.
3. Responsabilidade do Poder Público como dono da obra nos casos de celebração de contrato de empreitada
Como é cediço, a finalidade da Administração Pública é atender aos interesses da coletividade, para isso presta serviços públicos e realiza a construção de obras.
Na primeira situação, pode inclusive terceirizar atividade-meio, observados os requisitos legais, conforme inciso III da Súmula 331 do TST.
Mesmo nessa hipótese permitida poderá ocorrer a responsabilidade subsidiária do Poder Público, caso evidenciada a culpa in eligendo e a culpa in vigilando.
Por outro lado, importante salientar que essa responsabilidade subsidiária não ocorre nos casos de contratação para a realização de obra pública, pois inexiste previsão legal especifica.
Nessa segunda situação, o ajuste possui natureza civil, no qual o poder público figura meramente como dona da obra, eis que a construção civil, de modo geral, não se insere dentre os seus objetivos sociais e tampouco se inclui dentre as suas atividades secundárias permanentes.
Na verdade, ocorre simples contrato de empreitada, em razão do qual o contratado (empreiteiro) se compromete a executar a obra, uma obrigação de resultado, e todos os encargos trabalhistas sobre os trabalhadores contratados estão sob a sua exclusiva responsabilidade e subordinação
Indo ainda além, pode-se afirmar que o Poder Público não se enquadra nem mesmo na exceção trazida pela OJ -191 da SDI-1, pois não pode ser considerado uma empresa construtora ou incorporadora, vez que a sua atuação no mercado só poderá ocorrer nos casos de relevante interesse coletivo e necessários aos imperativos de segurança nacional, conforme delineado no art. 173 da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB). E a jurisprudência caminha neste sentido, consoante já decidiu o Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região no RO 0000622-70.2011.5.18.0001 de Relatoria do DESEMBARGADOR PAULO PIMENTA, in verbis:
Nessa medida, não há que se perquirir, sequer, acerca da presença da culpa in eligendo ou in vigilando, pois, conforme visto, há completa isenção de responsabilidade, dado o fato de inexistir qualquer relação jurídica entre os empregados contratados pela 1ª Reclamada e o ente da administração indireta licitante de obra pública, mormente em se tratando de contrato submetido a lei de licitações, situação em que sequer a eventual inidoneidade do contratado pode ser imputada à contratante.
Outra razão para a inexistência da responsabilidade do dono da obra está na natureza do contrato celebrado. Isso porque ele realiza um contrato de natureza civil com o empreiteiro. Enquanto que este celebra contrato de trabalho com os seus empregados.
Além disso, o art. 265 do Código Civil Brasileiro afirma que a solidariedade não se presume, mas resulta da lei ou da vontade das partes. Assim, nem mesmo pode se cogitar da aplicação subsidiária da Súmula 331 para buscar a condenação do dono da obra, conforme entendimento pacífico do próprio Tribunal Superior, confira:
RECURSO DE REVISTA. ENTE INTEGRANTE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. DONO DA OBRA. IMPOSSIBILIDADE. ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL Nº 191 DA SBDI-1. A relação jurídica existente entre o empreiteiro e o dono da obra é de natureza civil, enquanto que a relação que se forma entre o empreiteiro e seus empregados é regida pela legislação trabalhista. Assim, nos termos da Orientação Jurisprudencial nº 191 da SBDI-1/TST, o contrato de empreitada firmado com o dono da obra não enseja a condenação solidária ou subsidiária pelas obrigações trabalhistas contraídas pelo empreiteiro. Neste contexto, a decisão do Tribunal Regional, ao aplicar a responsabilidade subsidiária do item IV da Súmula nº 331 do TST, merece reforma. Recurso de revista conhecido e provido. (TST - RR: 314000920095170005 31400-09.2009.5.17.0005, Relator: Aloysio Corrêa da Veiga, Data de Julgamento: 02/10/2013, 6ª Turma, Data de Publicação: DEJT 04/10/2013)
Como acima exposto, não existe na legislação respaldo legal para a condenação do Poder Público nos casos em que este atua como dono da obra. Se esta ocorrer, cabe aos órgãos de representação competente ajuizar os recursos cabíveis para excluir eventual responsabilidade atribuída.
Ausentes os pressupostos constitucionais para a exploração direta de atividade econômica pelo Estado, não poderá nem mesmo atuar como empresa construtora ou incorporadora.
Portanto, da análise da jurisprudência e legislação regente à matéria, o que se percebe é que quando o poder público atua como dono da obra não há que se falar em nenhuma espécie de responsabilidade quanto aos encargos trabalhistas devidos pelo empreiteiro, devendo este arcar sozinho com o seu pagamento.
4. Conclusão
A justiça do trabalho tem como corolário o princípio da proteção, haja vista que visa a resguardar os direitos da parte hipossuficiente na relação empregatícia.
Nesse diapasão, estabelece a responsabilidade subsidiária do tomador de serviço nos casos de terceirização lícita de mão de obra.
Por outro lado, a Justiça do Trabalho não pode negligenciar algumas situações peculiares e fazer condenações indiscriminadas, sob pena de verdadeiro colapso na economia e inviabilização do exercício da atividade empresarial.
Nesse contexto, não há previsão legal de condenação subsidiária ou solidária do dono da obra, salvo se este for uma empresa construtora ou incorporadora. Por oportuno, como visto, o Poder Público nem mesmo pode ser encaixado na exceção, por falta de pressupostos constitucionais para a sua atuação direta na atividade econômica.
Diante da lógica da irresponsabilidade do poder público, poder-se-ia pensar que o legislador ensejou uma amarga desproteção ao trabalhador, mas longe disso, a disposição não visa a prejudicar o trabalhador, mas apenas evitar o comprometimento do mercado financeiro e o desincentivo da construção civil, importante para o crescimento do país e coletivamente para geração de mais empregos e renda.
5. Referências
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm> Acesso em: 20 de outubro de 2014.
BRASIL. Código Civil. LEI No 10.406, DE 10 DE JANEIRO DE 2002. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>. Acesso em: 20 de outubro de 2014.
BRASIL. Decreto-Lei N.º 5.452, DE 1º de maio de 1943. Consolidação das Leis do Trabalho. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm. > Acesso em: 20 de outubro de 2014.
BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Súmula 331. Contrato de prestação de serviços. Legalidade. DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011. Disponível em: < http://www3.tst.jus.br/jurisprudencia/Sumulas_com_indice/Sumulas_Ind_301_350.html > Acesso em: 20 de outubro de 2014.
Procurador Federal, pós graduado em Direito e Processo Civil pela UNICOC
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: AZEVEDO, Armstron da Silva Cedrim. A responsabilidade do poder público como dono da obra nos casos de construção civil - OJ 191 DA SDI -1 do TST Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 25 out 2014, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/41368/a-responsabilidade-do-poder-publico-como-dono-da-obra-nos-casos-de-construcao-civil-oj-191-da-sdi-1-do-tst. Acesso em: 22 nov 2024.
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