RESUMO: O presente artigo analisa a recente inovação normativa, que passou a prever o pagamento de adicional de periculosidade para atividades de trabalhador em motocicleta. Nesse sentido, o estudo versa sobre a inclusão do parágrafo quarto no artigo 193, da CLT, bem como a alteração da Norma Regulamentadora nº 16, do MTE.
Palavras-chave: Adicional de periculosidade. Trabalhador em motocicleta. Norma regulamentadora.
INTRODUÇÃO
Segundo dados do Sistema de Informações de Mortalidade, do Ministério da Saúde, o número de mortes decorrentes de acidentes de trânsito com motos cresceu em mais de 200% nos últimos 10 anos.
Há algum tempo, é comum a existência de notícias sobre acidentes com motociclistas nos telejornais e outros instrumentos de comunicação social, sendo notório que a atividade de trabalhador em motocicleta caracteriza-se como perigosa.
Nesse contexto, o ordenamento jurídico brasileiro foi alterado para normatizar o pagamento do adicional de periculosidade para atividades de trabalhador em motocicleta.
1. REMUNERAÇÃO, SALÁRIO E ADICIONAIS
Dispõe o artigo 457, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), o seguinte:
Art. 457 - Compreendem-se na remuneração do empregado, para todos os efeitos legais, além do salário devido e pago diretamente pelo empregador, como contraprestação do serviço, as gorjetas que receber.
§ 1º - Integram o salário não só a importância fixa estipulada, como também as comissões, percentagens, gratificações ajustadas, diárias para viagens e abonos pagos pelo empregador.
§ 2º - Não se incluem nos salários as ajudas de custo, assim como as diárias para viagem que não excedam de 50% (cinqüenta por cento) do salário percebido pelo empregado.
§ 3º - Considera-se gorjeta não só a importância espontaneamente dada pelo cliente ao empregado, como também aquela que fôr cobrada pela emprêsa ao cliente, como adicional nas contas, a qualquer título, e destinada a distribuição aos empregados.
Segundo o dispositivo acima transcrito, a remuneração do empregado é constituída pelo salário, verba devida e paga diretamente pelo empregador, e pelas gorjetas, que são os valores pagos pelo cliente de forma espontânea ou obrigatória.
O salário se constitui na principal obrigação devida pelo empregador no contrato de trabalho, sendo objeto de diversas garantias outorgadas pelo ordenamento jurídico para a sua proteção quanto ao seu valor, bem como para abriga-lo contra as condutas abusivas do empregador e dos credores do obreiro e do patrão.
Delgado (2013, p. 713), esclarece que “salário é o conjunto de parcelas contraprestativas pagas pelo empregador ao empregado em função do contrato de trabalho”.
O artigo 457, § 1º, da CLT, acima reproduzido, estabelece que o complexo salarial é formado por um salário-base e por outros acréscimos, denominado, pelos especialistas, de sobressalário, que é integrado por adicionais, gratificações, prêmios e abono.
Portanto, o adicional de periculosidade, objeto do presente artigo, possui natureza jurídica de salário, tendo em vista que ele integra o complexo salarial do trabalhador, especificamente, o sobressalário.
Nesse sentido, posiciona-se Cassar (2013, p. 813):
O adicional também se constitui em um sobressalário e possui natureza salarial apesar da finalidade precípua de indenizar a nocividade causada pela situação a que o empregado estava exposto ou submetido. O trabalho em local insalubre, perigoso, noturno, extraordinário e a transferência do empregado para outra localidade são situações que acarretam algum tipo de dano à saúde social, biológica ou mental do empregado e, por isso, ensejam o pagamento do adicional. Na verdade, o empregador paga um plus em virtude do desconforto e da nocividade do trabalho.
Dentre outros, a ordenamento jurídico brasileiro prevê os adicionais de hora extra, noturno, de periculosidade, de insalubridade, de penosidade e de transferência.
Os adicionais se caracterizam como uma retribuição pelo serviço prestado em condições mais gravosas para o trabalhador, que estão tipificadas pela legislação. Assim sendo, suprimida a situação gravosa, suspende o pagamento do respectivo adicional, conforme posição da doutrina especializada e da jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho, consolidada nos seguintes enunciados de súmula:
SUM-80 INSALUBRIDADE
A eliminação da insalubridade mediante fornecimento de aparelhos protetores aprovados pelo órgão competente do Poder Executivo exclui a percepção do respectivo adicional.
SUM-248 ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. DIREITO ADQUIRIDO
A reclassificação ou a descaracterização da insalubridade, por ato da autoridade competente, repercute na satisfação do respectivo adicional, sem ofensa a direito adquirido ou ao princípio da irredutibilidade salarial.
SUM-265 ADICIONAL NOTURNO. ALTERAÇÃO DE TURNO DE TRABALHO. POSSIBILIDADE DE SUPRESSÃO
A transferência para o período diurno de trabalho implica a perda do direito ao adicional noturno.
Após esses esclarecimentos iniciais, passa-se a analisar, no próximo tópico, a normatização do adicional de periculosidade.
2. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE
O pagamento do adicional de periculosidade foi elevado ao status de direito fundamental do trabalhador, estando previsto no artigo 7º, inciso XXIII, da Constituição Federal vigente:
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
[...]
XXIII - adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei;
Esse adicional que remunera atividades perigosas encontra-se regulamentado pela CLT, cujo artigo 193 prescreve que:
Art. 193. São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a:
I - inflamáveis, explosivos ou energia elétrica;
II - roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial.
§ 1º - O trabalho em condições de periculosidade assegura ao empregado um adicional de 30% (trinta por cento) sobre o salário sem os acréscimos resultantes de gratificações, prêmios ou participações nos lucros da empresa.
§ 2º - O empregado poderá optar pelo adicional de insalubridade que porventura lhe seja devido.
§ 3º Serão descontados ou compensados do adicional outros da mesma natureza eventualmente já concedidos ao vigilante por meio de acordo coletivo.
§ 4o São também consideradas perigosas as atividades de trabalhador em motocicleta. (Incluído pela Lei nº 12.997, de 2014)
Observa-se que o adicional de periculosidade é previsto pela CLT para remunerar atividades ou operações perigosas que envolvam inflamáveis, explosivos, energia elétrica, violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal e profissional e, em decorrência da inclusão pela Lei nº 12.997/2014, atividades de trabalhador em motocicleta.
Cairo Júnior (2012, p. 433) inclui ainda as atividades envolvendo radiações ionizantes ou substâncias radioativas como suscetíveis de pagamento do adicional de periculosidade:
Esse adicional também é devido quando o empregado exercer atividades de risco em potencial concernentes a radiações ionizantes ou substâncias radioativas, como estabelecido pela Portaria do MTE nº 518/03.
Trata-se de entendimento apoiado na jurisprudência uniformizada do TST:
OJ-SDI1-345 ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. RADIAÇÃO IONIZANTE OU SUBSTÂNCIA RADIOATIVA. DEVIDO.
A exposição do empregado à radiação ionizante ou à substância radioativa enseja a percepção do adicional de periculosidade, pois a regulamentação ministerial (Portarias do Ministério do Trabalho nºs 3.393, de 17.12.1987, e 518, de 07.04.2003), ao reputar perigosa a atividade, reveste-se de plena eficácia, porquanto expedida por força de delegação legislativa contida no art. 200, “caput”, e inciso VI, da CLT. No período de 12.12.2002 a 06.04.2003, enquanto vigeu a Portaria nº 496 do Ministério do Trabalho, o empregado faz jus ao adicional de insalubridade.
Importante registrar que as atividades ou operações perigosas devem estar tipificadas em norma do Ministério do Trabalho e Emprego. Trata-se da Norma Regulamentadora nº 16.
Ademais, a caracterização da periculosidade far-se-á através de perícia a cargo de Médico do Trabalho ou Engenheiro do Trabalho, devidamente registrado no MTE.
Registra-se ainda que o artigo 194 da CLT e a súmula 132 do TST prescrevem que cessará o direito ao adicional de periculosidade com a eliminação do risco ao trabalhador:
CLT. Art . 194 - O direito do empregado ao adicional de insalubridade ou de periculosidade cessará com a eliminação do risco à sua saúde ou integridade física, nos termos desta Seção e das normas expedidas pelo Ministério do Trabalho.
SUM-132 ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. INTEGRAÇÃO
[...]
II - Durante as horas de sobreaviso, o empregado não se encontra em condições de risco, razão pela qual é incabível a integração do adicional de periculosidade sobre as mencionadas horas.
Isto posto, presentes os requisitos legais e regulamentares, o empregado fará jus ao recebimento do adicional de periculosidade, que corresponde, salvo norma coletiva mais favorável, a 30% do salário-base, ou seja, sem os acréscimos resultantes de gratificações, prêmios, participações nos lucros da empresa ou outras verbas salariais.
3. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE PARA ATIVIDADES DE TRABALHADOR EM MOTOCICLETA
Por meio da Lei nº 12.997, de 18 de junho de 2014, incluiu-se na CLT a previsão de pagamento do adicional de periculosidade para os trabalhadores que prestam serviços em motocicleta.
Art. 193. São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a: (Redação dada pela Lei nº 12.740, de 2012)
[...]
§ 4o São também consideradas perigosas as atividades de trabalhador em motocicleta. (Incluído pela Lei nº 12.997, de 2014).
Trata-se de uma conquista desses tipos de empregados, cuja atividade desenvolvida é caracterizada por um aumento significativo do número de mortes no ambiente de trabalho, o trânsito, tornando a atividade realmente perigosa.
Não obstante a lei acima mencionada ser datada de 18 de junho de 2014, os efeitos pecuniários decorrentes do trabalho em motocicletas apenas passaram a ser devidos a contar da data da inclusão da respectiva atividade nos quadros aprovados pelo Ministério do Trabalho e Emprego, nos termos do artigo 196 da CLT.
Essa inclusão foi efetivada por meio da Portaria MTE n.º 1.565, de 13 de outubro de 2014, que aprovou o anexo 5, da Norma Regulamentadora nº 16, regulamentando as atividades perigosas em motocicleta.
Consoante o anexo 5, da Norma Regulamentadora nº 16, são consideradas perigosas as atividades laborais com utilização de motocicleta ou motoneta no deslocamento de trabalhador em vias públicas.
Dessa forma, a mencionada norma regulamentadora exclui, expressamente, do enquadramento de atividade perigosa, para fins de pagamento do adicional de periculosidade, a utilização de motocicleta ou motoneta exclusivamente no percurso da residência para o local de trabalho ou deste para aquela.
Outrossim, a norma ministerial afasta, da tipificação de atividades perigosas, aquelas em veículos que não necessitem de emplacamento ou que não exijam carteira nacional de habilitação para conduzi-los.
Finalmente, não são suscetíveis de gerar o direito ao adicional de periculosidade as atividades em motocicleta ou motoneta em locais privados; bem como as atividades com uso de motocicleta ou motoneta de forma eventual, assim considerado o fortuito, ou o que, sendo habitual, dá-se por tempo extremamente reduzido.
Portanto, os trabalhadores que desenvolverem atividades com a utilização de motocicleta, nos termos acima delineados, terão direito ao pagamento do adicional de periculosidade, correspondente, salvo norma coletiva mais favorável, a 30% do salário básico do empregado.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ante o exposto, verificou-se que o adicional de periculosidade possui natureza jurídica de salário, cessando o direito ao seu recebimento com a eliminação do risco ao trabalhador.
Os trabalhadores que desenvolvem suas atividades em motocicleta passaram a ter direito ao adicional de periculosidade de 30% do salário básico a partir da publicação da Portaria MTE n.º 1.565, de 13 de outubro de 2014, que aprovou o anexo 5, da Norma Regulamentadora nº 16, regulamentando a Lei nº 12.997, de 18 de junho de 2014, que incluiu o § 4º, no artigo 193, da CLT, para considerar perigoso esse tipo de atividade.
Conclui-se, entretanto, que o adicional de periculosidade é devido apenas para atividades laborais com utilização de motocicleta ou motoneta no deslocamento de trabalhador em vias públicas, não sendo cabível o seu pagamento quando a utilização for, exclusivamente, no percurso da residência para o local de trabalho ou deste para aquela; em locais privados; de forma eventual; ou quando as motocicletas não necessitarem de emplacamento ou de carteira nacional de habilitação para serem conduzidas.
REFERÊNCIAS
CAIRO JÚNIOR, José. Curso de direito do trabalho. 7. ed. Salvador: Juspodivm, 2012.
CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. 8. ed. São Paulo: Método, 2013.
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 12. ed. São Paulo: Ltr, 2013.
Procurador Federal e Professor do curso de Direito da Fundação Universidade do Tocantins. Pós-graduado em Direito Tributário e em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SOUZA, Renan Marcel Bispo de. Adicional de periculosidade para atividades de trabalhador em motocicleta Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 nov 2014, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/41572/adicional-de-periculosidade-para-atividades-de-trabalhador-em-motocicleta. Acesso em: 22 nov 2024.
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