Resumo: o artigo em baila abordará a legalidade da destinação dos honorários sucumbenciais aos advogados públicos.
INTRODUÇÃO
A advocacia é profissão cuja atividade é considerada de meio, ou seja, não há garantia do resultado.
Nesse contexto, nas relações privadas, a contraprestação do trabalho desempenhado pelo advogado dá-se por meio dos honorários contratuais, previamente estipulados. Na advocacia pública, os “honorários contratuais” se consubstanciam no subsídio percebidos pelos procuradores públicos.
Havendo sucesso na demanda judicial, o representante judicial, seja ele público ou privado, fará jus aos honorários de sucumbência, a serem pagos pela parte vencida. Note-se que referida verba tem caráter eventual, constituindo um plus remuneratório em caso de vitória no litígio em juízo.
NATUREZA E TITULARIDADE DA VERBA HONORÁRIA
Na esfera priva, inexiste controvérsia quanto à titularidade dos honorários de sucumbência, cabendo tão-somente ao advogado atuante na causa a destinação dos valores desembolsados pela parte sucumbente.
Contudo, tratando-se da advocacia pública, alguns defendem a destinação da verba em comento para o ente público representado.
Em que pese minoritária corrente, é cediço que os honorários de sucumbência não constituem receita pública, possuindo natureza jurídica de verba privada, de titularidade dos advogados, aí incluídos os membros da Advocacia-Geral da União e das Procuradorias Estaduais e Municipais. Nesse sentido, vejamos o que dispõe a Lei 8.906/1994:
LEI Nº 8.906, DE 4 DE JULHO DE 1994.
Art. 3º O exercício da atividade de advocacia no território brasileiro e a denominação de advogado são privativos dos inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
§ 1º Exercem atividade de advocacia, sujeitando-se ao regime desta lei, além do regime próprio a que se subordinem, os integrantes da Advocacia-Geral da União, da Procuradoria da Fazenda Nacional, da Defensoria Pública e das Procuradorias e Consultorias Jurídicas dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e das respectivas entidades de administração indireta e fundacional.
Art. 23. Os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, tendo este direito autônomo para executar a sentença nesta parte, podendo requerer que o precatório, quando necessário, seja expedido em seu favor.
Ressaltar que o projeto do novo Código de Processo Civil (PL 8.046/2010), além de confirmar a titularidade ao advogado, atribui natureza alimentar à verba em questão, reforçando a relevância da destinação dos honorários ao causídico que atuou na causa:
PROJETO DO NOVO CPC (PL 8.046/2010)
Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.
§ 14. Os honorários constituem direito do advogado e têm natureza alimentar, com os mesmos privilégios dos créditos oriundos da legislação do trabalho, sendo vedada a compensação em caso de sucumbência parcial.
Mister registrar que os honorários de sucumbência não são receita pública, inexistindo lei que institua referida exação. Portanto, já não bastasse a inobservância da Lei 8.906/1994, tem-se que o ente público se apropria da verba honorária sem qualquer embasamento legal.
Outro ponto nodal é a compatibilidade da percepção dos honorários advocatícios com o regime de subsídio. Não há que se falar em afronta ao regime de pagamento em parcela única, eis que a verba de sucumbência tem natureza privada, sendo pago pela parte vencida, e não pelo ente público. Ademais, ainda que fosse pago pelo poder público (o que não ocorre), é cediço que o conceito de subsídio vem sendo demasiadamente flexibilizado, a exemplo do auxílio-moradia, bem como de pleitos como adicional por tempo de serviço, adicional de substituição etc.
No panorama nacional, 20 estados-membros já destinam a seus procuradores a verba honorária, restando apenas 7. Em relação à União, embora ainda não haja o pagamento, houve avanços no entendimento. Com efeito, o Parecer da AGU GQ-24/1994 (que vedada a percepção pelos advogados públicos) foi revogado pelo Parecer AGU 1/2013/OLR/CGU/AGU, que sinalizou a titularidade da verba honorária pelos advogados públicos (http://www.agu.gov.br/page/content/detail/id_conteudo/233349).
DO PROJETO DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
A fim de uniformizar e pacificar o debate, o novo projeto do Código de Processo Civil (PL 8.046/2010) prevê a destinação dos honorários aos advogados públicos nas causas em que a Fazenda Pública restar vitoriosa.
Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.
(...)
§ 19. Os advogados públicos perceberão honorários de sucumbência, nos termos da lei.
Referido dispositivo garantirá a percepção dos honorários de sucumbência aos membros das procuradorias públicas, encerrando com a apropriação indevida da referida verba por alguns entes públicos.
DO JULGAMENTO DA ADIN N. º 20140020168258 - TJDFT
Em 28 de outubro do corrente ano, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios enfrentou a alegação de inconstitucionalidade de lei que destinava os honorários de sucumbência aos advogados públicos.
Foi promulgada em 09 de Julho de 2014 a Lei Distrital n. º 5.369, cujo artigo 7º prevê a destinação dos honorários aos Procuradores do Distrito Federal, vejamos:
Art. 7º Os honorários advocatícios devidos nas causas e nos procedimentos de que participem o Distrito Federal e as pessoas jurídicas integrantes da Administração Indireta, inclusive aqueles decorrentes de acordos, constituem verbas de natureza privada, nos termos da Lei federal nº 8.906, de 1994, e destinam-se aos membros integrantes do Sistema Jurídico do Distrito Federal, respectivamente, sendo repassados na forma disciplinada pela Procuradoria-Geral do Distrito Federal.
Em face do referido dispositivo, o Ministério Público do Distrito Federal ajuizou a ADI n.º 20140020168258, tendo o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios julgado improcedente o pedido ministerial.
Nos termos da decisão, restou confirmado o entendimento de que os honorários de sucumbência têm natureza de verba privada de titularidade dos advogados públicos que atuarem na causa. Vejamos:
ADI -Ação Direta de Inconstitucionalidade
Relator(a): HUMBERTO ADJUTO ULHOA
Processo: 20140020168258ADI
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – PRELIMINARES DE INCOMPETÊNCIA DO TJDFT E DE SUSPENSÃO DO JULGAMENTO DA AÇÃO POR PREJUDICIALIDADE EXTERNA – REJEIÇÃO – LEI DISTRITAL N. 5.369, DE 09 DE JULHO DE 2014 – ARTIGO 7º – DESTINAÇÃO E REPASSE DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE SUCUMBÊNCIA AOS MEMBROS INTEGRANTES DO SISTEMA JURÍDICO DO DISTRITO FEDERAL – ARGUIÇÃO DE VIOLAÇÃO À LEI ORGÂNICA DO DISTRITO FEDERAL (LODF) – IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
1. O art. 113 do Regimento Interno desta Corte de Justiça permite que o relator, em face da relevância da matéria e de seu especial significado para a ordem social e segurança jurídica, após informações e a manifestação do Procurador-Geral do D. F. e do Procurador-Geral de Justiça do Distrito Federal e Territórios, submeta o processo diretamente ao Conselho Especial, que, por sua vez, terá a faculdade de julgar a ação em definitivo.
2. Compete ao TJDFT o julgamento das ações diretas de inconstitucionalidade ajuizadas em face da LEI Orgânica do Distrito Federal (art. 30 da LEI n. 9.868/99 e art. 8º, inc. I, alínea “n”, da LEI n. 11.697/08). Precedentes.
3. Está pendente de exame no colendo STF ação direta de inconstitucionalidade a qual tem por objeto o art. 4º da LEI Federal n. 9.527/1997, que impede a aplicação das disposições constantes do Capítulo V, Título I, da LEI n. 8.906/1994, aos advogados empregados da Administração Pública direta e indireta. Contudo, tal fato, por si só, não é suficiente para determinar o sobrestamento do presente feito, pois a conclusão pela constitucionalidade ou inconstitucionalidade do dispositivo questionado na presente ação (art. 7º da LEI distrital n. 5.369/2014) não depende de juízo sobre a constitucionalidade, ou não, da previsão contida no art. 4º da LEI Federal n. 9.527/1997. Não se pode concluir pela coincidência, parcial ou total, de objeto entre as ações.
4. A LEI Distrital impugnada, de autoria do Poder Executivo, aderiu à ideia de destinar os honorários de sucumbência aos membros integrantes do Sistema Jurídico da Administração Indireta do Distrito Federal, especificamente aos advogados de empresa pública e de sociedade de economia mista do Distrito Federal, sendo repassados na forma disciplinada pela Procuradoria-Geral do Distrito Federal (artigo 7º).
5. É assente na doutrina e na jurisprudência que os honorários advocatícios incluídos na condenação pertencem exclusivamente ao advogado.
6. A matéria disciplinada pela LEI distrital impugnada – que dispõe sobre o Sistema Jurídico do Distrito Federal – está dentro da esfera de competência distrital para legislar sobre o regime jurídico de seus servidores públicos (art. 15, inc. XIII, e art. 71, § 1º, inc. II, ambos da LODF), frisando que o conteúdo da norma impugnada versa sobre critérios procedimentais em matéria processual (destinação e repasse de honorários), subsumido à competência concorrente, nos termos do art. 17, inc. XV, da LODF.
7. Ausência de incompatibilidade entre a remuneração por subsídios e a percepção de honorários advocatícios de sucumbência. A administração pública funciona como mera fonte arrecadadora da verba honorária para ulterior repasse aos legítimos destinatários, os advogados públicos. Doutrina.
8. O colendo STF já alertou para a circunstância de que a verba honorária de sucumbência não constitui vantagem funcional sujeita às normas gerais disciplinadoras da remuneração dos servidores públicos, mas de estímulo instituído, em valor obviamente variável, regulado por legislação específica (RE 217585, Rel. Min. Ilmar Galvão, Primeira Turma, DJ 10/12/1999).
9. A matéria em debate não reflete em aumento de despesa pública decorrente do reajuste de vencimentos, gratificações e outras vantagens remuneratórias. Não há necessidade da verificação dos requisitos fundamentais de prévia dotação orçamentária e autorização específica na LEI de Diretrizes Orçamentárias.
10. Não restaram violados os artigos 14, 19, “caput” e inc. X, e 157, todos da LEI Orgânica do Distrito Federal, invocados pelo autor da ação.
11. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada improcedente.
Ao exame percuciente da questão posta, verifica-se que não há espaço para entendimento diverso do exarado pelo Egrégio TJDFT.
CONCLUSÃO
Depreende-se, pois, que os advogados públicos fazem jus à percepção dos honorários advocatícios nas demandas em que a Fazenda Pública restar vitoriosa, nos termos da legislação de vigência e do hodierno entendimento jurisprudencial.
A observância, pelos entes públicos, da correta destinação da verba de sucumbência promoverá o aprimoramento dos quadros funcionais, e incentivará ainda mais a produtividade e êxito nas demandas integradas pela Fazenda Pública, salvaguardando o interesse público.
Bacharel em Ciências Jurídicas pela Universidade Federal de Pernambuco. Especialista em Direito Civil e Processual Civil. Membro da Advocacia-Geral da União.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: THIAGO Sá ARAúJO THé, . Dos honorários de sucumbência e da destinação aos advogados públicos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 14 nov 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/41618/dos-honorarios-de-sucumbencia-e-da-destinacao-aos-advogados-publicos. Acesso em: 22 nov 2024.
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