RESUMO: O texto busca abordaras alterações legislativas e jurisprudenciais de conceitos normativos do benefício de prestação continuada, bem como as razões e consequências do texto legal vigente.
O benefício de prestação continuada tem fundamento no art. 203, V, da Constituição Federal. Vejamos:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
Em nível infraconstitucional, o benefício sob comento foi regulamentado pela Lei nº 8.742/93 e pelo Decreto nº 6.214/2007 (Regulamento do Benefício de Prestação Continuada), que tratou de definir os conceitos de deficiência, idoso, família e hipossuficiência. Em relação a tais termos, pode-se dizer que, desde o advento da norma regulamentadora até a atualidade, todos eles sofreram diversas e variadas alterações tanto de ordem legislativa quanto jurisprudencial.
Com efeito, a começar pelo conceito de idoso, a redação original estabelecia a idade de 70 (setenta) anos para que alguém fosse considerado como tal. A redação atual reduziu esse patamar para 65(sessenta e cinco anos). No que toca à família, considerou-se inicialmente como tal “a unidade mononuclear, vivendo sob o mesmo teto, cuja economia é mantida pela contribuição de seus integrantes”. Após alteração, entendeu-se o termo como o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei no 8.213/91, desde que vivessem sob o mesmo teto. À época, as pessoas listadas em tal dispositivo legal eram o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido. A redação atual dispõe que família é a composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
A fim de regulamentar o conceito de hipossuficiência, o art. 20, §3º, da Lei nº 8.742/93 estabeleceu que é considerada incapaz de prover a manutenção da pessoa idosa ou deficiente a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. Ocorre que o Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral (RE 567.985/MT e RE 580.963/PR), declarou a inconstitucionalidade incidenter tantum do dispositivo legal mencionado e, em termos sucintos, assentou o entendimento que o Superior Tribunal de Justiça já havia firmado, qual seja, que o critério objetivo estabelecido na Lei nº 8.742/93 não é o único a ser considerado para a aferição da hipossuficiência, sendo possível a utilização de outros parâmetros, a partir do livre convencimento motivado do juiz. Vejamos a ementa do acórdão proferido no REsp 1.112.557-MG, representativo de controvérsia:
RECURSO ESPECIAL REPTIVO. ART. 105, I, ALÍNEA CDA CF.DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENFÍCIO ASISTENCIAL. POSIBLIDAE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILDAE DO BENFICÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO ARENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILAR FOR SUPERIOR A1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSOESPECIAL PROVIDO.1. A CF/8 prevê em seu art. 203, caput einciso V, a garantia deum salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição àSeguridadeSocial, àpessoa portadora de deficiência eao idoso que comprovem não possuirmeios de prover àprópria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conformedispuser alei.
2. Regulamentando comando constitucional, aLei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe que será devida concessão de benefício assistencial aos idos eàs pessoas portadoras de deficiência que não possuammeios de prover a própria manutenção, ou cuja família possua renda mensal percapita inferior a1/4 (um quarto) dosalário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal jádeclarou, por maioriade votos, aconstitucionalidade dessa limitação legal relativa ao requisito econômico,no julgamento da ADI 1.23/DF (Rel. para oacórdão Min. NELSON JOBIM, DJU1.6201).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com adignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere àgarantia dascondições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado demodoa amparar irrestritamente ao cidadão social economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve serconsiderada aúnica forma de se comprovar que apessoa não possui outros meiospara prover aprópria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois éapenasum elemento objetivo par se aferir anecessidade, ou seja, presume-se absolutamente amiserabilidade quando comprovada arenda per capita inferior a1/4 dosalário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial, vige oprincípio do livreconvencimento motivado do Juiz (art. 13 do CP) enão o sistema de tarifaçãolegal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar percapita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidadedo beneficiado. De fato, não se pode admitir avinculação do Magistrado adeterminado elemento probatório, sob pena decercear oseu direto dejulgar.
7. Recurso Especial provido.”(Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 19.11.2009)
Por derradeiro, no que toca ao conceito de deficiência, a Lei nº 12.470/2011 estabeleceu o que adiante segue:
“Art. 20. [...]
§2º. Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
[...]
§10º. Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do §2º deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.
Assim, constata-se que a alteração legislativa adotou como deficiência a definição utilizada na Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência, aprovada pelo Decreto legislativo nº 186/2008. Com isso, pode-se dizer que se delineou o que antes era vaga e imprecisamente denominado de incapacidade para a vida independente e para o trabalho. Tal alteração legal elucidou de vez várias discussões jurídicas, tais como a possibilidade de menor perceber o benefício e a impossibilidade de incapacidade temporária ensejar uma concessão.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. DOU 05.10.1988.
BRASIL. Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. DOU 25.07.1991.
BRASIL. Decreto nº 3.048, de 06 de maio de 1999. Aprova o regulamento da Previdência Social e dá outras providências. DOU 07.05.1999.
LEITÃO, André Studart; MEIRINHO, Augusto Grieco Sant´Anna. Manual de Direito Previdenciário. Saraiva: São Paulo, 2014. 839p.
IBRAHIM, FABIO ZAMBITTE. Curso de Direito Previdenciário. 19.ed. Niterói: Impetus, 2014. 976p.
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