SUMÁRIO: CONTRATOS ADMINISTRATIVOS. LICITAÇÕES. CONCEITO. PRINCÍPIOS. RECURSOS. CRIMES. CONCLUSÃO.
INTRODUÇÃO
O Poder Público não pode ter a liberdade que possuem os particulares para contratar. Ele deve sempre se nortear por dois valores distintos:
a) isonomia: todo administrador público deve tratar igualmente todos os administrados;
b) probidade: o Poder Público deve sempre escolher a melhor alternativa para os interesses públicos.
A licitação é o procedimento administrativo por meio do qual o Poder Público, mediante critérios preestabelecidos, isonômicos e públicos, busca escolher a melhor alternativa para a celebração de um ato jurídico.
Neste trabalho, buscaremos traçar linhas gerias desse instituto administrativo.
DESENVOLVIMENTO
Conceito e princípios
Como dito, licitação é o procedimento administrativo por meio do qual o Poder Público, mediante critérios preestabelecidos, isonômicos e públicos, busca escolher a melhor alternativa para a celebração de um ato jurídico.
Preferiu-se optar por um conceito amplo (ato jurídico), que envolve tanto os atos administrativos quanto os contratos.
A licitação era, segundo um aspecto já superado, ora um procedimento, ora um ato administrativo.
Para gaston geze, baseado nos ensinamentos de seu mestre dugaid, a licitação era um ato administrativo, condição que investia alguém numa situação jurídica que poderia gerar uma contratação.
O entendimento predominante, no entanto, é aquele que se firma no sentido de que a licitação é um conjunto de atos, portanto, um procedimento.
A discussão, se a licitação é instituto do Direito Administrativo ou do Direito Financeiro, tinha relevância prática no passado porque um dispositivo da Constituição anterior preceituava que a licitação tinha natureza jurídica de Direito Financeiro, uma vez que disciplinava receitas e despesas públicas.
Nos dias atuais, a Constituição passou a legislar expressamente sobre licitação, superando tal discussão. A licitação é um instituto, por excelência, do Direito Administrativo (art. 22, inc. XXVII, da CF).
No Direito brasileiro, o ato licitatório não faz parte da licitação, ou seja, o contrato licitado é efetivamente diferente do procedimento da licitação.
O contrato não faz parte do procedimento licitatório. O vencedor da licitação poderá até não ser contratado. Ele tem apenas uma expectativa de direitos.
Art. 37, inc. XXI – “ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações”.
Esse inciso consagra um dos princípios da licitação, qual seja: o dever de licitar. A Administração direta ou indireta tem o dever de efetivar licitação, para contratar regularmente.
Art. 22. “Compete privativamente à União legislar sobre:
XXVII – normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1.º, III”.
Compete privativamente à União legislar sobre normas gerais de licitação. Isso significa que outros entes federativos poderão legislar sobre normas específicas em matéria de licitação. Há, portanto, uma competência concorrente. Conclui-se, então, que todos podem editar leis sobre licitação, mas devem obedecer àquelas normas traçadas pela União.
As normas legislativas que venham da União são: normas gerais (de âmbito nacional) e normas estritamente federais (de âmbito da União). A doutrina não chega a um acordo sobre o que venha a ser uma norma geral. Pode-se dizer, contudo, que a norma geral abarca uma generalidade maior do que a da lei comum. Disso se extrai que a norma geral traz um comando genérico, permitindo a outra norma tratar do mesmo assunto.
O legislador estabeleceu, na Carta Magna, as normas gerais de caráter essencial para a licitação, tendo em vista a existência de entes federativos díspares. Com isso, visou unificar a licitação em todo o país.
O art. 173, § 1.º, inc.III, da Constituição Federal, trata especificamente das sociedades de economia mista e empresas públicas que exploram atividades econômicas.
O caput do art. 175 da Constituição Federal afirma que as concessões e as permissões de serviços públicos devem ser antecedidas de licitação.
O Decreto-Lei n. 200/67 foi revogado pelo Decreto-Lei n. 2.300/86.
A Lei n. 8.666/93 disciplina as normas gerais da licitação e aplica-se a todo o país, conforme dispõe o seu art. 1.º.
Alguns autores acreditam que na Lei mencionada existem dois tipos de normas: normas gerais e normas específicas. As primeiras seriam de observância para todos, por se tratarem de normas de caráter geral. As últimas, no entanto, vinculariam apenas as licitações federais, ficando desobrigados os outros entes federativos. Outros autores chegam a catalogar a referida Lei, dizendo, artigo por artigo, quais são, ou não, normas gerais ou normas específicas. Incorrem em erro, pois não levam em conta uma diferença básica, qual seja: o artigo é uma unidade de redação, enquanto que a norma é uma unidade lógica, ou seja, toda norma tem hipótese e preceito.
O art. 3.º da Lei n. 8.666/93 estabelece os princípios da licitação e termina sua redação observando: “... e dos princípios que lhe são correlatos”. Dessa maneira, verifica-se que o rol de princípios previstos nesse artigo não é exaustivo.
O art. 3.º, caput, da Lei 8.666/93 faz referência aos princípios da legalidade, impessoalidade e moralidade. O princípio da eficiência não está relacionado. Isso porque, quando a Lei n. 8.666 surgiu, em 1993, ainda não existia o caput do art. 37 da Constituição Federal com sua redação atual (“...obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência”). Essa lhe foi dada, em 1998, com a EC n. 19.
O princípio da isonomia está previsto no caput do art. 5.º da Constituição Federal.
Esse princípio não se limita a “os iguais devem ser tratados igualmente; os desiguais devem ser tratados desigualmente, na medida de suas desigualdades”.
Para o Prof. celso antonio bandeira de melo, é errado imaginar que o princípio da isonomia veda todas as discriminações. Discriminar (retirando seu sentido pejorativo) é separar um grupo de pessoas para lhes atribuir tratamento diferenciado do restante. Nesse sentido, toda a norma jurídica discrimina, porque incide sobre algumas pessoas e sobre outras não.
Ser probo, também imprescindível nas licitações, é escolher objetivamente a melhor alternativa para os interesses públicos.
O instrumento convocatório é o ato administrativo que convoca a licitação, ou seja, é o ato que chama os interessados a participarem da licitação; é o ato que fixa os requisitos da licitação. É chamado, por alguns autores, de “lei daquela licitação”, ou de “diploma legal que rege aquela licitação”. Geralmente vem sob a forma de edital, contudo, há uma exceção: o convite (uma modalidade diferente de licitação).
O processamento de uma licitação deve estar rigorosamente de acordo com o que está estabelecido no instrumento convocatório. Os participantes da licitação têm a obrigação de respeitar o instrumento convocatório.
As licitações não podem ser julgadas por meio de critérios subjetivos ou discricionários. Os critérios de julgamento da licitação devem ser objetivos, ou seja, uniformes para as pessoas em geral. Exemplo: em uma licitação foi estabelecido o critério do menor preço. Esse é um critério objetivo, ou seja, é um critério que não varia para ninguém. Todas as pessoas têm condições de avaliar e de decidir.
Princípios Correlatos aos do Art. 3.º da Lei n. 8.666/93
Princípio do procedimento formal (Prof. Hely Lopes Meirelles)
Estabelece que as formalidades prescritas para os atos que integram as licitações devem ser rigorosamente obedecidas.
Princípio da adjudicação compulsória
Esse princípio tem uma denominação inadequada.
Ele afirma que, se em uma licitação houver a adjudicação, esta deverá ser realizada em favor do vencedor do procedimento. Essa afirmação não é absoluta, uma vez que várias licitações terminam sem adjudicação.
Princípio do sigilo das propostas
É aquele que estabelece que as propostas de uma licitação devem ser apresentadas de modo sigiloso, sem que se dê acesso público aos seus conteúdos.
Recursos
A Lei n. 8.666/93 prevê, no Cap. V – art. 109, três tipos de recursos possíveis no processo licitatório:
a) recurso hierárquico;
b) representação;
c) pedido de reconsideração.
Os três recursos aperfeiçoam o sistema de controle interno da licitação, por serem conhecidos e processados pela própria Administração Pública, não se confundindo com o direito de petição (art. 5.º, inc. XXXIV, da CF) nem com a possibilidade de representação, seja ao Ministério Público ou ao Tribunal de Contas. Tais instrumentos (petição e representação) podem ser exercitados por qualquer pessoa e serão ou não atendidos além dos limites da Administração-licitante.
a) Recurso hierárquico
O recurso hierárquico (ou recurso administrativo em sentido estrito) é cabível contra:
a) habilitação ou inabilitação do licitante;
b) julgamento das propostas;
c) anulação ou revogação da licitação;
d) indeferimento, alteração ou cancelamento de inscrição no registro cadastral.
O prazo para a interposição será de 5 dias, salvo se a modalidade for a do convite e o recurso dirigido contra a habilitação, ou inabilitação, e contra o julgamento, hipóteses em que será de 2 dias úteis. O prazo é contado a partir da intimação ou da lavratura do termo (para os que estiverem presentes).
b) Representação
Cabe a representação contra decisões havidas no processo licitatório e que não comportam recurso hierárquico. É dirigida à autoridade superior para que se altere decisão emanada da autoridade inferior (Ex.: modificação do objeto da licitação).
c) Pedido de reconsideração
O pedido de reconsideração é cabível contra decisão que impôs as sanções de declaração de inidoneidade para licitar ou contratar. É dirigido ao ministro de Estado ou ao secretário estadual ou municipal, no prazo de 10 dias úteis.
Efeitos e Processamento
Os recursos operam efeitos devolutivos, salvo aqueles contra habilitação ou inabilitação, que sempre produzirão efeitos suspensivos.
Os demais apenas produzirão efeitos suspensivos por decisão da autoridade destinatária do recurso. A decisão, que concede ou não o aludido efeito, é discricionária. Para conceder o referido efeito, porém, deverá a autoridade motivar o ato, indicando o interesse público presente.
A interposição dos recursos hierárquico e de representação deve ser comunicada aos demais licitantes, que poderão impugná-los no prazo de 5 dias úteis.
Sempre que um recurso for provido, os efeitos serão retroativos, alcançando o ato desde a sua edição.
Se não ocorrer a interposição de recursos, ou seja, se os licitantes não impugnarem as decisões no curso do processo licitatório, decaindo do direito de recorrer, aqueles atos passarão a ser definitivos, operando-se a preclusão administrativa, ou coisa julgada administrativa.
Como dito, o sistema de recursos não se confunde com a possibilidade de representação ao Tribunal de Contas e ao Ministério Público (como permite o art. 113) ou com o direito de petição. Ambos podem ser exercitados por qualquer pessoa, e não apenas pelos proponentes ou licitantes. Em verdade, a comunicação ao Tribunal de Contas (ver art. 74, § 2.º, da CF) é autêntica denúncia.
LICITAÇÕES – CRIMES
A Lei n. 8.666/93 descreve condutas típicas, permitindo a apuração da responsabilidade penal, independentemente da responsabilização administrativa e civil.
A despeito de a referida lei somente ser inteiramente aplicável na órbita da Administração Pública Federal, os dispositivos que consagram a responsabilização penal constituem normas gerais, daí serem aplicáveis em todo o território nacional. Estados, Distrito Federal e Municípios não podem legislar a respeito, porque não reúnem competência para tanto. Apenas a União (art. 22, inc. I, da CF) pode legislar em matéria penal.
A descrição de condutas típicas pela Lei de Licitações provocou a revogação parcial do CP, caso, por exemplo, do tipo previsto no art. 326 (devassar o sigilo de proposta de concorrência pública, ou proporcionar a terceiro o ensejo de devassá-lo). Assim, subsistem apenas tipos penais não incompatíveis com os novos tipos previstos na Lei n. 8.666/93.
Aplicam-se à Lei de Licitações as mesmas regras gerais para a determinação do momento consumativo dos delitos e para as hipóteses de tentativa, concurso, desistência voluntária e arrependimento eficaz, dentre outras previstas na parte geral do Código Penal.
O bem jurídico protegido tanto poderá ser a moralidade administrativa como a regularidade do processo licitatório ou o patrimônio público.
O sujeito ativo dos delitos, previstos na Lei de Licitações, será sempre a pessoa física a quem se atribua a conduta ilícita, podendo ou não manter vínculo com a Administração (funcional ou contratual). Assim, poderão ser apontados como autores os particulares que participam do certame; os membros da Comissão de Licitação; a autoridade administrativa ou qualquer contratado.
Todos os delitos descritos na Lei de Licitação são punidos apenas a título de dolo, não havendo possibilidade de punição a título de culpa.
A ação penal sempre será pública incondicionada, não dependendo, pois, de requisição ou representação.
Todos os tipos penais autorizam a imposição da pena de detenção, não havendo a previsão para a imposição da pena de reclusão.
CONCLUSÃO
Toda instituição pública tem obrigação de zelar pelo correto uso dos recursos, especialmente quando contrata serviços ou adquire bens. Para isso, deve respeitar as regras dispostas na Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, a Lei das Licitações.
Pretendíamos apresentar breves noções acerca desse instituto tão importante para a transparência e lisura dos contratos efetuados pelo Poder Público.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Constituição Federal de 1988,
Lei 8666 de 1993 (normas gerais de licitações e contratos),
Lei 10520 de 2002 (normas sobre a modalidade pregão).
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 22ª ed. São Paulo: Malheiros, 1997;
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo . 23ª ed. São Paulo: Editora Atlas, 2009
BANDEIRA DE MELLO Celso Antônio, Curso de Direito Administrativo - Ed. Malheiros JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos – 14. Ed. São Paulo: Dialética, 2010
ROCHA FURTADO Lucas, Curso de Licitações e Contratos Administrativos - Ed. Fórum
Procuradora Federal
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SIXTO, Luisa Webber Troian. Noções Gerais sobre a Licitação Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 28 nov 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/41989/nocoes-gerais-sobre-a-licitacao. Acesso em: 22 nov 2024.
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