RESUMO: O presente texto busca analisar o instituto da aposentadoria por idade híbrida, instituída pela Lei 11.718/2008, contextualizando com recentes decisões do Superior Tribunal de Justiça e da Turma Nacional de Uniformização.
SUMÁRIO: 1 – INTRODUÇÃO. 2 - DA REDUÇÃO DE IDADE PARA OS TRABALHADORES RURAIS. 3 - DO CARÁTER ASSISTENCIAL DA APOSENTADORIA POR IDADE AO SEGURADO ESPECIAL. 4 - DA OFENSA AOS ARTIGOS 48, §3º E 55, §2º, DA LEI 8.213/1991. 5 - CONCLUSÃO.
1. INTRODUÇÃO
Dentre os benefícios previstos pela legislação previdenciária, a aposentadoria por idade merece destaque pela necessidade de amparo àqueles que já contam com a idade avançada.
Para os segurados urbanos do Regime Geral de Previdência Social, a Lei 8.213/1991 estabelece como requisitos o preenchimento: 1) do requisito etário (60 anos de idade para a mulher, e 65 anos de idade para o homem); 2) do período de carência de 180 meses de contribuição.
Para os segurados filiados ao RGPS até 24 de julho de 1991, a carência a ser cumprida está estabelecida no artigo 142 da Lei 8.213/1991:
Ano de implementação das condições |
Meses de contribuição exigidos |
1991 |
60 meses |
1992 |
60 meses |
1993 |
66 meses |
1994 |
72 meses |
1995 |
78 meses |
1996 |
90 meses |
1997 |
96 meses |
1998 |
102 meses |
1999 |
108 meses |
2000 |
114 meses |
2001 |
120 meses |
2002 |
126 meses |
2003 |
132 meses |
2004 |
138 meses |
2005 |
144 meses |
2006 |
150 meses |
2007 |
156 meses |
2008 |
162 meses |
2009 |
168 meses |
2010 |
174 meses |
2011 |
180 meses |
2. DA REDUÇÃO DE IDADE PARA OS TRABALHADORES RURAIS
Para os trabalhadores rurais, seja qual for a espécie de filiação, o art. 48, §1º da Lei 8.213/91 reduziu em 05 (cinco) anos a idade para a concessão da aposentadoria em comento. Vejamos cada uma delas:
A) Art. 11, I, “a”, da Lei 8.213/91: como empregado, aquele que presta serviço de natureza urbana ou rural à empresa, em caráter não eventual, sob sua subordinação e mediante remuneração, inclusive como diretor empregado;
B) Art. 11, V, “g”, da Lei 8.213/91: como contribuinte individual, quem presta serviço de natureza urbana ou rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas, sem relação de emprego;
C) Art. 11, VI, da Lei 8.213/91: como trabalhador avulso, quem presta, a diversas empresas, sem vínculo empregatício, serviço de natureza urbana ou rural definidos no Regulamento;
D) Art. 11, VII, da Lei 8.213/91: como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros.
Temos, portanto, o trabalhador rural na condição de: I) empregado; II) contribuinte individual; III) avulso; IV) segurado especial.
Bem estabelecido o regramento acima, o legislador pátrio tratou de incluir o §3º no art. 48 da lei de benefícios, que assim dispõe:
“§ 3o Os trabalhadores rurais de que trata o § 1o deste artigo que não atendam ao disposto no § 2o deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher. (Incluído pela Lei nº 11,718, de 2008)”
A literalidade do dispositivo legal é clara, não dando margens a dúvidas: apenas o trabalhador rural poderá computar períodos urbanos para completar a carência para a aposentadoria por idade. Registrar que, assim procedendo, o trabalhador rural não contará com a benesse da redução do requisito etário.
Nesse contexto, o INSS, em observância do princípio da legalidade, aplica o art. 48, §3º, da Lei 8.213/1991, quando à época do requerimento administrativo o segurado se enquadrar como trabalhador rural.
Nesse sentido disciplina a Instrução Normativa INSS/PRES Nº 45, DE 6 DE AGOSTO DE 2010:
Art. 214. A aposentadoria por idade dos trabalhadores rurais referidos na alínea “a” do inciso I, na alínea “g” do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11 da Lei nº 8.213, de 1991, será devida para o segurado que, cumprida a carência exigida, completar sessenta anos de idade, se homem, e cinquenta e cinco anos, se mulher.
§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, o trabalhador rural deverá comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, ou, conforme o caso, ao mês em que cumpriu o requisito etário, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência exigida.
§ 2º Os trabalhadores rurais referidos no caput, que não atendam o disposto no § 1º deste artigo, mas que satisfaçam a carência exigida computando-se os períodos de contribuição sob outras categorias, inclusive urbanas, farão jus à aposentadoria por idade ao completarem sessenta e cinco anos de idade, se homem, e sessenta anos, se mulher, observado o § 3º do art. 174. (grifo nosso).
3.DO CARÁTER ASSISTENCIAL DA APOSENTADORIA POR IDADE AO SEGURADO ESPECIAL
Das modalidades de segurado trabalhador rural acima delineadas, tem-se que apenas o segurado especial, em regra, não contribui para o Regime Geral de Previdência Social. Não que esteja dispensado, haja vista que, por força do art. 25 da Lei de Custeio (8.212/1991), é obrigado a recolher determinada alíquota sobre a receita bruta da comercialização da produção:
Art. 25. A contribuição do empregador rural pessoa física, em substituição à contribuição de que tratam os incisos I e II do art. 22, e a do segurado especial, referidos, respectivamente, na alínea a do inciso V e no inciso VII do art. 12 desta Lei, destinada à Seguridade Social, é de: (Redação dada pela Lei nº 10.256, de 2001)
I - 2% da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção; (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 10.12.97).
II - 0,1% da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção para financiamento das prestações por acidente do trabalho. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 10.12.97).
Contudo, igualmente sabido é que o produto do trabalho do segurado especial, em regra, destina-se tão-somente à própria subsistência, não havendo o que se falar em sobra da produção, e por conseguinte, em sua comercialização.
Portanto, na seara previdenciária, a praxe é a consideração do caráter não contributivo (assistencial) da modalidade de filiação do segurado especial.
Nesse viés, a novel redação do §3º, do art. 48 da Lei 8.213/91 veio acolher essa modalidade de trabalhador rural (segurado especial), permitindo que computasse para efeito de carência o período urbano (contributivo).
Com razão o dispositivo em tela, eis que, sendo permitido o cumprimento de toda a carência sem recolhimento previdenciário (para o segurado especial), nada mais justo que o referido segurado computasse período pretérito contributivo.
4.DA OFENSA AOS ARTIGOS 48, §3º E 55, §2º, DA LEI 8.213/1991:
Em que pese a literalidade da norma, o Poder Judiciário vem entendendo de forma diversa.
O Superior Tribunal de Justiça, em análise do REsp 1.367.479/RS em sessão realizada em 04/04/2014, julgou no sentido de que a hipótese de aposentadoria prevista no art. 48, §3º, da Lei 8.213/1991, alberga a condição do segurado especial que queira computar tempo urbano, e vice-e-versa. Vejamos o aresto em comento:
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 535
DO CPC. NÃO CARACTERIZAÇÃO. JULGAMENTO EXTRA PETITA. NÃOOCORRÊNCIA. ARTIGO 48, §§ 3º E 4º DA LEI 8.213/1991, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI 11.718/2008. OBSERVÂNCIA. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
1. A Lei 11.718/2008 introduziu no sistema previdenciário brasileiro uma nova modalidade de aposentadoria por idade denominada aposentadoria por idade híbrida.
2. Neste caso, permite-se ao segurado mesclar o período urbano ao período rural e vice-versa, para implementar a carência mínima necessária e obter o benefício etário híbrido.
3. Não atendendo o segurado rural à regra básica para aposentadoria rural por idade com comprovação de atividade rural, segundo a regra de transição prevista no artigo 142 da Lei 8.213/1991, o § 3º do artigo 48 da Lei 8.213/1991, introduzido pela Lei 11.718/2008, permite que aos 65 anos, se homem e 60 anos, mulher, o segurado preencha o período de carência faltante com períodos de contribuição de outra qualidade de segurado, calculando-se o benefício de acordo com o § 4º do artigo 48.
4. Considerando que a intenção do legislador foi a de permitir aos trabalhadores rurais, que se enquadrem nas categorias de segurado empregado, contribuinte individual, trabalhador avulso e segurado especial, o aproveitamento do tempo rural mesclado ao tempo urbano, preenchendo inclusive carência, o direito à
aposentadoria por idade híbrida deve ser reconhecido.
5. Recurso especial conhecido e não provido. RECURSO ESPECIAL Nº 1.367.479 - RS (2013/0042992-1)
Já não bastasse o flagrante desrespeito ao dispositivo invocado, de igual modo se deixa de observar o art. 55 da Lei de Benefícios, que expressamente veda a possibilidade de se computar o tempo rural (não contributivo) para efeito de carência:
Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:
§ 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento.
Infelizmente, a Turma Nacional de Uniformização, em decisão datada de 12/11/2014, alinhou-se ao entendimento do Superior Tribunal de Justiça.
Nos termos do julgamento do Incidente de Uniformização n. º 5000957-33.2012.4.04.7214/SC, restou decidido pela permissão do cômputo dos períodos trabalhados em atividade rural e urbana, independentemente da atividade desempenhada pelo segurado ao tempo do requerimento administrativo ou preenchimento do requisito etário (Fonte: http://www.cjf.jus.br/cjf/noticias-do-cjf/2014/novembro/e-permitida-a-concessao-de-aposentadoria-hibrida-por-idade-mediante-a-mescla-de-periodos-trabalhados-em-atividade-rural-e-urbana).
5. DA CONCLUSÃO
Por todo o exposto, depreende-se que o entendimento exarado nas decisões supra ofende não só a literalidade da Lei, como também o princípio democrático. O Poder Judiciário não pode substituir a decisão política do legislador pátrio, que detém a representação popular.
Ademais, restaram inobservados os princípios do equilíbrio financeiro e atuarial da Previdência Social, propiciando o aumento do déficit nas contas do Instituto Nacional do Seguro Social.
Nesse contexto, aguardar-se-á uma reviravolta no entendimento do Superior Tribunal de Justiça e da Turma Nacional de Uniformização, a fim de que a jurisprudência se alinhe à cogência dos comandos legais, bem como aos princípios que regem à previdência social.
Bacharel em Ciências Jurídicas pela Universidade Federal de Pernambuco. Especialista em Direito Civil e Processual Civil. Membro da Advocacia-Geral da União.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: THIAGO Sá ARAúJO THé, . Da aposentadoria híbrida à luz da hodierna jurisprudência Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 29 nov 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/41992/da-aposentadoria-hibrida-a-luz-da-hodierna-jurisprudencia. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Maurício Sousa da Silva
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Por: DESIREE EVANGELISTA DA SILVA
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