É escopo do presente trabalho sistematizar, para fins de melhor compreensão e divulgação do direito, os atos gratuitos que devem ser praticados pelos cartórios de registro de pessoas naturais.
O serviço de registro civil das pessoas naturais realiza e dá publicidade aos fatos e negócios jurídicos relacionados à pessoa humana e é relevante uma vez que tais atos e negócios interessam não apenas ao indivíduo em questão mas a terceiros e, em última análise, à toda sociedade.
Nos assentos do cartório de registro civil de pessoas naturais constarão os mais relevantes acontecimentos da vida do indivíduo, desde seu casamento até sua morte. São objeto de registro o nascimento, a adoção de menores, o óbito, o casamento, a conversão da união estável em casamento, e o casamento religioso com efeitos civis, as emancipações, as interdições, as sentenças declaratórias de ausência e de morte presumida e as opções de nacionalidade.
Sobre esta base registral serão também averbados os atos que modificam o conteúdo do registro, como o reconhecimento de filiação, a alteração de nome, a separação, o divorcio ou a anulação ou nulidade do casamento. As averbações, pois, são assentos acessórios.
É com base nas certidões obtidas perante o registro de pessoas naturais que normalmente é provado o estado civil e o estado de família da pessoa, situação que pode interessar a outros indivíduos com os quais ela trave relações ao longo da vida. A posse de estado, presunções legais e quaisquer outros meios de prova também poderão comprovar o estado civil ou o estado de família, porém, cuida-se de comprovação muito mais difícil e sujeita a discussões. A certidão, diversamente, tem a indiscutível vantagem da clareza e segurança oriundas da fé pública de que se revestem os atos dos registradores.
Feita este breve digressão sobre o escopo do registro público de pessoas naturais, é possível vislumbrar a relevância que o acesso ao conteúdo de tais registros tem para a vida em sociedade. É por meio das informações prestadas por este serviço que mais facilmente se comprovará a existência de uma pessoa, o seu estado civil ou regime de bens, o seu falecimento, filiação ou capacidade para a prática de atos.
Diante disso, a Lei de Registros Públicos (Lei 6.015/73), desde 1989 previa a gratuidade dos assentos de nascimento e de óbito para qualquer pessoa, sendo que aos reconhecidamente pobres seriam ainda gratuitas a primeira certidão respectiva.
Art. 30. Das pessoas reconhecidamente pobres não serão cobrados emolumentos pelo registro civil de nascimento e pelo assento de óbito e respectivas certidões. (Redação dada pela Lei nº 7.844, de 1989)
§ 1° O estado de pobreza será comprovado por declaração do próprio interessado ou a rogo, em se tratando de analfabeto, neste caso acompanhada da assinatura de duas testemunhas. (Incluído pela Lei nº 7.844, de 1989)
§ 2° A falsidade da declaração ensejará a responsabilidade civil e penal do interessado. (Incluído pela Lei nº 7.844, de 1989)
Anteriormente à Lei 7.844/89, a gratuidade já era prevista neste mesmo artigo da Lei de Registros Públicos. Porém, a situação de pobreza exigia atestado da autoridade competente:
Art. 30. Das pessoas comprovadamente pobres, à vista de atestado da autoridade competente, não será cobrado emolumento pelo registro civil e respectiva certidão.
Atualmente, desde a Lei 9.534/97, aos reconhecidamente pobres, que assim se declararem sob pena de responsabilização civil e criminal, é reconhecida a gratuidade não apenas do assento de nascimento e óbito e respectiva certidão, mas de quaisquer certidões extraídas pelo registro civilde pessoas naturais.
Àqueles que não se encontrarem em situação de pobreza, continua a ser prevista a gratuidade dos registros de nascimento e óbito e a primeira certidão respectiva. Esta a redação atual do dispositivo em comento:
Art. 30. Não serão cobrados emolumentos pelo registro civil de nascimento e pelo assento de óbito, bem como pela primeira certidão respectiva. (Redação dada pela Lei nº 9.534, de 1997)
§ 1º Os reconhecidamente pobres estão isentos de pagamento de emolumentos pelas demais certidões extraídas pelo cartório de registro civil. (Redação dada pela Lei nº 9.534, de 1997)
§ 2º O estado de pobreza será comprovado por declaração do próprio interessado ou a rogo, tratando-se de analfabeto, neste caso, acompanhada da assinatura de duas testemunhas. (Redação dada pela Lei nº 9.534, de 1997)
§ 3º A falsidade da declaração ensejará a responsabilidade civil e criminal do interessado. (Incluído pela Lei nº 9.534, de 1997)
É salutar a previsão de gratuidade de tais atos e certidões, pois a certidão de nascimento é o primeiro passo para o exercício da cidadania. É a partir dela que serão obtidos os demais documentos pessoais e mais facilmente comprovada a existência, capacidade e estado familiar e civil da pessoa.
O artigo 50 da Lei de Registros Públicos prevê o dever de registro de todo nascimento ocorrido no País. As exceções a esta regra são os filhos de estrangeiros a serviço de seu país e os índicos não integrados.
Art. 50. Todo nascimento que ocorrer no território nacional deverá ser dado a registro, no lugar em que tiver ocorrido o parto ou no lugar da residência dos pais, dentro do prazo de quinze dias, que será ampliado em até três meses para os lugares distantes mais de trinta quilômetros da sede do cartório. (Redação dada pela Lei nº 9.053, de 1995)
Porém, como lembra Loureiro, o registro do nascimento não é pressuposto de aquisição de direitos, embora essencial para a integração da pessoa à família e à sociedade e grande facilitador para o exercício de direitos.
A ausência do registro de nascimento, entretanto, não impede a pessoa de adquirir e exercer direitos, visto que tais prerrogativas decorrem da personalidade, e esta é adquirida com o nascimento com vida, e não com o registro. Tampouco importa a inexistência” jurídica da pessoa, uma vez que o nascimento, o nome e outros atributos da personalidade podem ser provados por outros meios. De qualquer forma, o registro do nascimento é essencial para a integração do recém-nascido na família e no meio social, facilitando o exercício dos direitos fundamentais a serem garantidos pelo Estado.
Daí porque o registro é um dever – e não mera opção – que a lei incumbe a determinadas pessoas em consideração à sua proximidade como registrando ou com o fato do nascimento
É igualmente salutar incentivar, por meio da gratuidade, o registro do óbito, dada sua relevância, pois marca o fim da personalidade do ser humano. Demais disso, o serviço de registro civil tem o dever de comunicar os óbitos registrados a vários órgãos, repercutindo tal registro em várias áreas. A comunicação ao INSS, por exemplo, servirá para que seja cessado eventual benefício pago ao falecido. O IBGE também é informado dos falecimentos, pois este dado entrará na elaboração dos mapas de mortalidade, que servem para orientar a elaboração de políticas públicas.
Em 2002 o Código Civil veio ampliar a gratuidade de atos praticados pelo registro civil de pessoas naturais em favor dos reconhecidamente pobres. O artigo 1.512 do referido código passou a contemplar, também a gratuidade da habilitação, registro e primeira certidão de casamento:
Art. 1.512. O casamento é civil e gratuita a sua celebração.
Parágrafo único. A habilitação para o casamento, o registro e a primeira certidão serão isentos de selos, emolumentos e custas, para as pessoas cuja pobreza for declarada, sob as penas da lei.
Desta feita, percebe-se desde logo que a intenção do legislador foi dar efetividade ao artigo 226,§ 6o da Constituição, que muito embora reconheça a união estável como entidade familiar, determina que a lei deva facilitar sua conversão em casamento. Deveras, o estado civil das pessoas casadas é uma situação jurídica formalizada que pode ser facilmente comprovada por meio de certidão, dispensando o recurso a testemunhas e discussões que as pessoas em união estável estão sujeitas caso necessitem comprovar sua condição de companheiros. Portanto, caso exista o desejo de unir-se em matrimônio, os custos já não são mais empecilho para os mais necessitados, como era antigamente.
A gratuidade dos atos praticados pelo registro civil de pessoas naturais é tratada com indiscutível seriedade pela Lei 6.015/73, a qual veda a inserção, nas certidões, de expressões que indiquem a condição de pobreza e torna obrigatória a exibição, em local de grande visibilidade, de informações claras a respeito da gratuidade. O oficial do cartório que descumprir a gratuidade está sujeito a sanções, inclusive a perda da delegação. Em contrapartida, a declaração de pobreza falsa ensejará a responsabilização civil e criminal do interessado.
Art. 30. Não serão cobrados emolumentos pelo registro civil de nascimento e pelo assento de óbito, bem como pela primeira certidão respectiva. (Redação dada pela Lei nº 9.534, de 1997)
§ 1º Os reconhecidamente pobres estão isentos de pagamento de emolumentos pelas demais certidões extraídas pelo cartório de registro civil. (Redação dada pela Lei nº 9.534, de 1997)
§ 2º O estado de pobreza será comprovado por declaração do próprio interessado ou a rogo, tratando-se de analfabeto, neste caso, acompanhada da assinatura de duas testemunhas. (Redação dada pela Lei nº 9.534, de 1997)
§ 3º A falsidade da declaração ensejará a responsabilidade civil e criminal do interessado. (Incluído pela Lei nº 9.534, de 1997)
§ 3o-A Comprovado o descumprimento, pelos oficiais de Cartórios de Registro Civil, do disposto no caput deste artigo, aplicar-se-ão as penalidades previstas nos arts. 32 e 33 da Lei no 8.935, de 18 de novembro de 1994. (Incluído pela Lei nº 9.812, de1999)
§ 3o-B Esgotadas as penalidades a que se refere o parágrafo anterior e verificando-se novo descumprimento, aplicar-se-á o disposto no art. 39 da Lei no 8.935, de 18 de novembro de 1994. (Incluído pela Lei nº 9.812, de 1999)
Em conclusão, vê-se que a Lei de Registros Públicos tornou gratuitos os assentos de nascimento e óbito, fundamentais para o exercício da cidadania e para a consecução de políticas públicas, para todas as pessoas, bem como as primeiras certidões respectivas. Já para os reconhecidamente pobres, todas as certidões perante o registro civil de pessoas naturais são gratuitas, bem como a habilitação e o registro do casamento. O conhecimento de tais direitos é indiscutivelmente relevante, para que as pessoas, sobretudo as mais necessitadas, não tenham receio de exercer seus direitos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BULOS, UadiLammêgo. Curso de Direito Constitucional. 7a ed. São Paulo: Saraiva, 2012
CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional. 13a ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2007.
CENEVIVA, Walter. Lei dos Registros Públicos Comentada. 20a ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
OLIVEIRA, Lourival Gonçalves de. Notários e Registradores: Lei n. 8.935, de 18.11.1994. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2009.
Graduada em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Pós-Graduada em Direito pela Universidade Anhanguera-Uniderp. Procuradora Federal.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SOLLERO, Barbara Tuyama. Atos gratuitos do registro civil de pessoas naturais Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 03 dez 2014, 05:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42060/atos-gratuitos-do-registro-civil-de-pessoas-naturais. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Maria Laura de Sousa Silva
Por: Franklin Ribeiro
Por: Marcele Tavares Mathias Lopes Nogueira
Por: Jaqueline Lopes Ribeiro
Precisa estar logado para fazer comentários.