1. INTRODUÇÃO
Este breve estudo tem como escopo analisar a modificação das competências do IBAMA em matéria de licenciamento ambiental após a entrada em vigor da Lei Complementar 140/2011. Para tanto, serão analisadas as características gerais da atribuição de licenciamento ambiental pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA antes e depois da vigência da Lei Complementar 140/2011.
A importância desse estudo se deve ao fato de que são frequentes os conflitos de atribuições entre os órgãos ambientais das diversas esferas federativas acerca do exercício do licenciamento ambiental, sendo que a melhor definição dessas competências é fundamental para que o desenvolvimento das atividades econômicas (que em geral demandam a utilização de recursos ambientais) seja promovido em sintonia com a preservação da qualidade ambiental.
Assim, mediante breve exposição acerca dos dispositivos legais reguladores da matéria, busca-se demonstrar que a despeito da redução de suas competências licenciatórias, o IBAMA ainda possui relevante papel no licenciamento ambiental, sendo necessária a elucidação de dúvidas nessa seara para fins de dissipar conflitos que podem resvalar na insegurança jurídica dos cidadãos, do Poder Público e principalmente causar prejuízos ao meio ambiente.
2. A EVOLUÇÃO DA FUNÇÃO DO IBAMA EM TEMA DE LICENCIAMENTO AMBIENTAL
O licenciamento ambiental é um dos instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente instituído pelo art. 9º, IV, da Lei 6.938/81, sendo indispensável a realização desse procedimento de licenciamento para a execução pelos particulares ou pelo Poder Público de atividades efetivamente ou potencialmente capazes de gerar degradação ambiental. Ou seja, como regra, a utilização de recursos ambientais pelos particulares ou pelo Poder Público dependerá de prévia aprovação do órgão ambiental competente.
A justificativa para a existência do licenciamento ambiental no direito brasileiro passa inevitavelmente pela análise do art. 225 da Constituição Federal, o qual positivou no texto constitucional como direito fundamental da pessoa humana o meio ambiente ecologicamente equilibrado. Embora a previsão legal do licenciamento ambiental (art. 9º, IV, da Lei 6.938/81) preceda à elaboração da Constituição Federal de 1988, é inegável que o licenciamento tem fundamento constitucional na preservação da qualidade ambiental (art. 225 da CF/88), bem como no fato de que as atividades econômicas devam obrigatoriamente prestigiar a defesa do meio ambiente (art. 170, VI, da CF/88). Outrossim, pode-se de dizer que o licenciamento ambiental também encontra fundamento na previsão do art. 225, §1º, IV, Constituição Federal de 1988, de realização de estudo prévio de impacto ambiental como exigência para a realização de atividade ou obra potencialmente causadora de significativo impacto ambiental.
Nesse sentido, a incorporação de critérios ambientais ao processo de desenvolvimento de atividades econômicas depende inexoravelmente da efetivação do licenciamento ambiental, o qual se constitui em ferramenta indispensável para a busca do desenvolvimento sustentável como preconizado na Constituição Federal. Porém, antes mesmo da Constituição, a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente já trazia na consagração de seus objetivos a necessidade do desenvolvimento sustentável como base de apoio para o licenciamento ambiental. A esse respeito, vale a transcrição do escólio de José Afonso da Silva:
“São dois valores aparentemente em conflito que a Constituição de 1988 alberga [desenvolvimento econômico e proteção ao meio ambiente] e quer que se realizem no interesse do bem estar e da qualidade de vida dos brasileiros. Antes dela, a Lei 6.938, de 31.8.1981 (arts. 1º e 4º), já havia enfrentado o tema, pondo, corretamente, como o principal objetivo a ser conseguido pela Política Nacional do Meio Ambiente a compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico. A conciliação dos dois valores consiste, assim, nos termos deste dispositivo, na promoção do chamado desenvolvimento sustentável, que consiste na exploração equilibrada dos recursos naturais, nos limites da satisfação das necessidades e do bem-estar da presente geração, assim como de sua conservação no interesse das gerações futuras.”[1]
Logo, tamanha a importância do licenciamento ambiental na busca do desenvolvimento sustentável, não se pode prescindir na legislação de uma regulamentação adequada e clara sobre o tema, principalmente sobre a questão referente à competência para o exercício do licenciamento ambiental, que foi melhor esclarecida com edição da Lei Complementar 140/2011, alterando substancialmente as competências da União, que na área do licenciamento, são executadas pelo IBAMA.
De início, cabe ter em consideração que o licenciamento ambiental, parcela do poder de polícia ambiental conferido a todos os entes federativos em razão da competência comum do art. 23 da Constituição Federal, teve seu conceito delineado pela Resolução 237-1997 do CONAMA, in verbis:
“procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, considerando as disposições legais e regulamentares e as normas técnicas aplicáveis ao caso.”
Na mesma toada, conceitua o art. 2º, inciso I, da Lei Complementar 140/2011 que considera-se licenciamento ambiental “o procedimento administrativo destinado a licenciar atividades ou empreendimentos utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental”.
Contudo, a grande problemática que os empreendedores (particulares e Poder Público) enfrentavam era saber a quem se dirigir para o obter o licenciamento ambiental das atividades que pretendiam realizar, ou seja, quem seria o órgão integrante do Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA responsável por receber e autorizar esse procedimento administrativo previsto para a localização, instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais.
As principais diretrizes para a definição do órgão ambiental competente para o licenciamento ambiental tinham previsão normativa na Lei 6.938/81 e na Resolução 237-1997 do CONAMA, sendo que após a edição da Lei Complementar 140/2011, esta lei passou a reger com primazia os critérios para a definição das competências em matéria de licenciamento ambiental.
No caso do IBAMA, antes da alteração legislativa empreendida pela Lei Complementar 140/2011, o art. 10 da Lei 6.938/81 (com a redação conferida pela Lei 7.804/89) estabelecia de forma ampla e irrestrita a sua atuação em caráter supletivo, in verbis:
“Art. 10. A construção, a instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, considerados efetiva ou potencialmente poluidores, bem como os capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental. Dependerão de prévio licenciamento de órgão estadual competente, integrante do Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA, e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, em caráter supletivo, sem prejuízo de outras licenças exigíveis. (Redação conferida pela Lei 7.804/1989).
Como se nota, a Lei 6.938/81 já exigia a obrigatoriedade do licenciamento ambiental para atividades geradoras de significativo impacto ambiental, atribuindo aos órgãos estaduais a competência para o exercício primário do licenciamento, cabendo ao IBAMA uma atuação nessa seara chamada pela lei de supletiva. Assim, definiu-se uma regra geral de que caberia aos Estados o licenciamento ambiental, possibilitando-se ao IBAMA uma atuação nesses licenciamentos estaduais de forma supletiva.
Essa atuação supletiva era entendida pelo IBAMA como uma atuação adicional ou complementar, mediante a qual o IBAMA eventualmente avocava para si o exercício de competências licenciatórias dos Estados e Municípios, intervindo sempre que entendesse necessário e conveniente. Ficava claro que a legislação permitia ao IBAMA essa obrigação de funcionar como ‘órgão de superposição de licenciamento ambiental”, sendo facultado ao IBAMA a atuação no licenciamento sempre que entendesse pela configuração falhas ou omissões nos licenciamentos executados pelos Estados ou Municípios. Esse caráter de superposição da atuação do IBAMA era reforçado sobretudo pela redação do §2º, do art. 11, da Lei 6.938/81 (redação da Lei 7.804/1989) que estabelecia que “a fiscalização e controle da aplicação de critérios, normas e padrões de qualidade ambiental serão exercidos pelo IBAMA, em caráter supletivo da atuação do órgão estadual e municipal competentes”.
A previsão de interferência do IBAMA nas competências licenciatórias de Estados e Municípios era vista com maus olhos pela doutrina, diante de provável inconstitucionalidade em razão da deterioração do pacto federativo, por permitir que entidade da União (IBAMA), interfira e atue como fiscalizadora do exercício de competências de Estados e Municípios, gerando conflitos sobre quem seria o ente federativo com competência para executar o licenciamento ambiental.
Sobre o detalhamento dessa atuação supletiva do IBAMA em tema de licenciamento ambiental, oportuna a transcrição da opinião de Paulo de Bessa Antunes:
“O IBAMA exerce funções de caráter supletivo na atividade de licenciamento ambiental e na consequente fiscalização do efetivo cumprimento dos termos nos quais foi concedida a licença; isto porque o licenciamento é fundamentalmente desempenhado pelos órgãos estaduais do SISNAMA. Por atividade supletiva, não se deve entender uma atividade exercida em substituição daquela desempenhada pelo órgão estadual de controle ambiental. A atividade supletiva limita-se a atender aspectos secundários do processo de licenciamento. Entende-se, igualmente, como atividade supletiva a atividade complementar ao processo de licenciamento.”[2]
Observa-se que na anterior sistemática de licenciamento ambiental prevista pelo art. 10 da Lei 6.938/81 existia uma interferência do IBAMA na execução das competências licenciatórias dos Estados e Municípios. Tal interferência, amparada na interpretação do caput do art. 10 da Lei 6.938/81, revelava justamente esse caráter de superposição da competência IBAMA para o licenciamento, sendo possível perceber uma nota de superioridade das atividades de licenciamento do IBAMA sobre os procedimentos engendrados nas esferas estaduais e municipais.
Além dessa competência supletiva do IBAMA à regra geral do licenciamento ambiental estadual, estabelecia o §2º do art. 10 da Lei 6.938/81 (redação conferida pela Lei 7.804/1989) que nos casos e prazos previstos em resolução do CONAMA, o licenciamento ambiental do art. 10 dependeria de homologação do IBAMA. Ora, como se verifica, mais um dispositivo prevê esse caráter supervisor da atividade do IBAMA na área de licenciamento ambiental, pois por decisão do Conselho Nacional do Meio Ambiente, poderia a conclusão do procedimento de licenciamento ambiental de competência dos Estados (regra geral) depender de aprovação do IBAMA.
Por fim, a Lei 6.938/81 (redação da Lei 7.804/1989) previa um outro critério para definição das competências do IBAMA em tema de licenciamento ambiental, que era o critério dos impactos das atividades econômicas a serem licenciadas, ou critério da predominância do interesse. Aqui, a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente determinava ser da competência do IBAMA o licenciamento ambiental de atividades e obras capazes de causar significativo impacto ambiental, de âmbito nacional ou regional (art. 10, §4º, da Lei 6.938/81), afastando, nessas hipóteses, a regra geral da competência estadual para o exercício do licenciamento ambiental.
Com o objetivo de melhor detalhar as competências para o exercício da atividade de licenciamento ambiental, bem como solucionar dúvidas que ainda permaneciam a despeito do regramento geral da Lei 6.938/81, foi editada pelo CONAMA a Resolução 237-1997, a qual adota como critério para distribuição da competência essencialmente esse critério do impacto ambiental ou da predominância do interesse em relação aos impactos ambientais. Nesse sentido, o art. 4º da Resolução 237-1997 do CONAMA expõe que:
“Art. 4º - Compete ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, órgão executor do SISNAMA, o licenciamento ambiental, a que se refere o artigo 10 da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, de empreendimentos e atividades com significativo impacto ambiental de âmbito nacional ou regional, a saber:
I - localizadas ou desenvolvidas conjuntamente no Brasil e em país limítrofe; no mar territorial; na plataforma continental; na zona econômica exclusiva; em terras indígenas ou em unidades de conservação do domínio da União.
II - localizadas ou desenvolvidas em dois ou mais Estados;
III - cujos impactos ambientais diretos ultrapassem os limites territoriais do País ou de um ou mais Estados;
IV - destinados a pesquisar, lavrar, produzir, beneficiar, transportar, armazenar e dispor material radioativo, em qualquer estágio, ou que utilizem energia nuclear em qualquer de suas formas e aplicações, mediante parecer da Comissão Nacional de Energia Nuclear - CNEN;
V- bases ou empreendimentos militares, quando couber, observada a legislação específica.”
Destarte, a Resolução 237-1997 do CONAMA em harmonia com o antigo art. 10, §4º, da Lei 6.938/81, estabelecia que ao IBAMA caberia o licenciamento ambiental de atividades econômicas cujos impactos ambientais fossem nacionais ou ultrapassassem as fronteiras de um Estado da Federação, exemplificando hipóteses em seguida nas quais estaria configurada a competência do IBAMA.
No entanto, não obstante as boas intenções da Resolução 237-1997 do CONAMA em adotar critérios de repartição das competências de licenciamento ambiental, críticas diversas surgiram na doutrina apontando a inconstitucionalidade da distribuição de competências por meio desse instrumento normativo. Outrossim, a Resolução 237-1997 também não apresentava a solução adequada para o problema da justaposição de licenciamentos ambientais, atuações concomitantes entre os entes federativos, ou mesmo possíveis casos de omissão na exigência de licenciamento.
Para a solução dessa problemática, utilizando-se da abertura constitucional autorizada pelo parágrafo único do art. 23 da Constituição Federal, o qual prevê a possibilidade da regulamentação do exercício das competências comuns em matéria ambiental pelos entes federados, viabilizando o caráter cooperativo da Federação brasileira, foi editada a Lei Complementar 140/2011.
A referida lei complementar alterou sobremaneira o regime de repartição de competências para o exercício do licenciamento federal pelos entes federados, havendo modificação substancial das atribuições do IBAMA nessa seara.
De fato, a partir da Lei Complementar 140/2011 alterou-se o quadro normativo da distribuição de competências para o licenciamento ambiental, tendo a lei complementar modificado a redação do art. 10 da Lei 6.938/81, bem como revogado os seus antigos §§ 2º e 4º, os quais tratavam respectivamente da homologação de licenciamentos ambientais pelo IBAMA em casos específicos definidos pelo CONAMA e do critério de licenciamento ambiental pela predominância do interesse (quando caberia ao IBAMA o licenciamento de atividades e obras com significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional).
Importante é a transcrição da nova redação do art. 10 conferida pela Lei Complementar 140/2011:
“Art. 10. A construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental dependerão de prévio licenciamento ambiental.
§ 1o Os pedidos de licenciamento, sua renovação e a respectiva concessão serão publicados no jornal oficial, bem como em periódico regional ou local de grande circulação, ou em meio eletrônico de comunicação mantido pelo órgão ambiental competente.”
Da nova regra prevista pelo art. 10 da Lei Complementar 140/2011, constata-se que o licenciamento ambiental continua, como regra geral, sendo atribuição dos Estados, isto é, dos órgãos ambientais estaduais.
Como visto, eliminou-se qualquer referência à competência supletiva do IBAMA, extinguindo poderes do IBAMA de atuar de modo complementar em licenciamentos promovidos por Estados e Municípios. Nessa toada, a Lei Complementar 140/2011 ainda definiu a competência supletiva como sendo aquela em que o ente da Federação substitui o ente federativo originariamente detentor das atribuições em hipóteses especificamente nela definidas (art. 2º, II, da Lei Complementar 140/2011)[3].
Além disso, foi revogada a antiga previsão legal de homologação pelo IBAMA de licenciamentos ambientais de outros entes federativos em hipóteses definidas pelo CONAMA (§2º do art. 10 da Lei 6.938/81), bem como também foi extinta a atuação supletiva do IBAMA na fiscalização e controle da aplicação de critérios, normas e padrões de qualidade ambiental (§2º do art. 11 da Lei 6.938/81).
Do novo regime de regulamentação das competências para o exercício do poder de polícia ambiental pelos entes federativos com a utilização do licenciamento ambiental, nota-se uma sensível tendência em retirar do IBAMA em muitos casos o licenciamento ambiental, de modo a viabilizar que a Autarquia ambiental da União concentre esforços nos casos de licenciamento que mais diretamente apresentem reflexos no âmbito nacional.
A Lei Complementar 140/2011 cuidou também de revogar o §4º do art. 10 da Lei 6.938/81, extinguindo a competência do IBAMA para o licenciamento ambiental de atividades que causem significativo impacto regional ou nacional. Tal mudança, representou a diminuição da importância do critério de licenciamento segundo a predominância do interesse ou segundo a extensão dos danos dos impactos ambientais produzidos para que fossem adotados paralelamente a esse critério, novas perspectivas, a exemplo do critério geográfico, do critério da dominialidade do bem público atingido pela atividade ou do ente federativo instituidor da unidade de conservação.
O art. 7º, XIV, da Lei Complementar 140/2011 trouxe a previsão legal das competências licenciatórias da União, a serem exercidas por meio do IBAMA, conforme se observa abaixo:
“Art. 7o São ações administrativas da União:
(...)
XIV - promover o licenciamento ambiental de empreendimentos e atividades:
a) localizados ou desenvolvidos conjuntamente no Brasil e em país limítrofe;
b) localizados ou desenvolvidos no mar territorial, na plataforma continental ou na zona econômica exclusiva;
c) localizados ou desenvolvidos em terras indígenas;
d) localizados ou desenvolvidos em unidades de conservação instituídas pela União, exceto em Áreas de Proteção Ambiental (APAs);
e) localizados ou desenvolvidos em 2 (dois) ou mais Estados;
f) de caráter militar, excetuando-se do licenciamento ambiental, nos termos de ato do Poder Executivo, aqueles previstos no preparo e emprego das Forças Armadas, conforme disposto na Lei Complementar no 97, de 9 de junho de 1999;
g) destinados a pesquisar, lavrar, produzir, beneficiar, transportar, armazenar e dispor material radioativo, em qualquer estágio, ou que utilizem energia nuclear em qualquer de suas formas e aplicações, mediante parecer da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen); ou
h) que atendam tipologia estabelecida por ato do Poder Executivo, a partir de proposição da Comissão Tripartite Nacional, assegurada a participação de um membro do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), e considerados os critérios de porte, potencial poluidor e natureza da atividade ou empreendimento;”
Nos termos da Orientação Jurídica Normativa (OJN) nº 43/2012, da Procuradoria Federal do IBAMA, deve-se reconhecer que não é possível mais falar-se na definição de atividades de impacto regional ou nacional para fins de fixação da competência de licenciamento do IBAMA, estando revogado o critério genérico previsto no art. 4º, da Resolução 237-1997 do CONAMA.[4]
Sobre os novos critérios para o exercício pelo IBAMA do licenciamento ambiental introduzidos com a Lei Complementar 140/2011, destaca Frederico Amado:
“De efeito, o legislador observou o critério da dominialidade do bem público da União ao prever a competência licenciatória federal no caso de empreendimentos localizados ou desenvolvidos no mar territorial, na plataforma continental ou na zona econômica exclusiva; localizados ou desenvolvidos em terras indígenas.
Por sua vez, será da competência federal o licenciamento de empreendimentos localizados ou desenvolvidos em unidades de conservação instituídas pela União, tendo sido consagrado o critério do ente federativos instituidor da unidade de conservação, exceto em Áreas de Proteção Ambiental – APAs.
(...)
Já o critério da extensão do impacto ambiental foi observado na delimitação das competências federais para licenciar empreendimentos localizados ou desenvolvidos conjuntamente no Brasil e em país limítrofe; localizados ou desenvolvidos em 2 (dois) ou mais Estados; destinados a pesquisar, lavrar, produzir, beneficiar, transportar, armazenar e dispor material radioativo, em qualquer estágio, ou que utilizem energia nuclear em qualquer de suas formas e aplicações, mediante parecer da Comissão Nacional de Energia Nuclear – CNEN.”[5]
Por fim, ainda caberá ao IBAMA o licenciamento dos empreendimentos cuja localização compreenda concomitantemente áreas das faixas de terrestre e marítima da zona costeira exclusivamente nos casos previstos em tipologia estabelecida por ato do Poder Executivo, a partir de proposição da Comissão Tripartite Nacional, assegurada a participação de um membro do CONAMA e considerados critérios de porte, potencial poluidor e natureza da atividade ou empreendimento. Trata-se de critério aberto, que poderá definir futuras hipóteses de competência do IBAMA especificamente para esses empreendimentos localizados na zona costeira.
De todo o exposto, o que se observa é que a competência do IBAMA para o exercício do licenciamento ambiental após a Lei Complementar 140/2011 passou a ser mais restrita, com a extinção de eventuais funções supletivas de licenciamento que anteriormente se poderiam atribuir ao IBAMA. Outrossim, a Lei Complementar 140/2011 cuidou de definir os casos específicos em que o IBAMA terá a competência para o licenciamento ambiental, sendo portanto, regra geral, de competência dos Estados o licenciamento ambiental, quando não expressamente atribuído pela legislação ao IBAMA.
3. CONCLUSÃO
Ante todo o aqui exposto, é possível notar que as alterações nas competências do IBAMA para o exercício do licenciamento ambiental foram substanciais, tendo a Lei Complementar 140/2011 imposto uma ruptura paradigmática no modo de compreender o papel do IBAMA nessa matéria. Nessa senda, os novos critérios adotados pela Lei Complementar 140/2011 restringiram a atuação do IBAMA essencialmente aos casos de atividades econômicas nas quais sejam potencialmente afetados interesses nacionais.
Após a Lei Complementar 140/2011, exige-se uma releitura da Resolução 237-1997 do CONAMA, de modo a compatibilizar os seus dispositivos com as novas regras adotadas na lei. Sem dúvida nenhuma, tem-se como grande mérito da Lei Complementar 140/2011 a repartição das competências ambientais, estabelecendo quanto ao licenciamento ambiental formas de evitar a sobreposição de atuação dos entes federativos.
Em que pese as críticas aos alguns dispositivos da Lei Complementar 140/2011, é notório que a definição dos critérios de distribuição das competências para o licenciamento ambiental tem contribuído para a eliminação de dúvidas, propiciando segurança jurídica aos cidadãos e ao Poder Público na busca do órgão ambiental competente para o licenciamento, favorecendo o êxito do licenciamento ambiental como instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente.[6]
4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AMADO, Frederico. Direito Ambiental Esquematizado. 5.ed. São Paulo: Método, 2014, p. 189-190.
ALONSO JR, Hamilton; FINK, Daniel Roberto. Aspectos Jurídicos do Licenciamento Ambiental. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003.
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BRASIL. Lei n. 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6938.htm>. Acesso em 23.11.2014.
BRASIL. Lei Complementar 140, de 08 de dezembro de 2011. Fixa normas, nos termos dos incisos III, VI e VII do caput e do parágrafo único do art. 23 da Constituição Federal, para a cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios nas ações administrativas decorrentes do exercício da competência comum relativas à proteção das paisagens naturais notáveis, à proteção do meio ambiente, ao combate à poluição em qualquer de suas formas e à preservação das florestas, da fauna e da flora; e altera a Lei no 6.938, de 31 de agosto de 1981. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/Lcp140.htm>. Acesso em 23.11.2014.
BRASIL. Resolução CONAMA nº 237, de 19 de dezembro de 1997. Disponível em: < http://www.mma.gov.br/port/conama/res/res97/res23797.html>. Acesso em 23.11.2014.
FIORILLO, Celso Antônio Pacheco Filho. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 11ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2010.
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 17ª ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Malheiros, 2009.
MUKAI, Toshio. A Lei Complementar nº 140, de 08 de dezembro de 2011, que fixa diretrizes para a cooperação entre os entes federativos em matéria ambiental. Revista Fórum de Direito Urbano e Ambiental. Belo Horizonte, ano 10, n. 60, nov./dez. 2001.
_____. ADin 4757, Arguindo Inconstitucionalidade da Lei Complementar nº 140/2011. Revista Síntese de Direito Administrativo, ano VII, nº 81, setembro de 2012.
Orientação Jurídica Normativa nº 43/2012 da PFE-IBAMA, disponível em <http://www.agu.gov.br/page/content/detail/id_conteudo/96663>, acesso em 25.11.2014.
TRENNENPOHL, Curt; TRENNENPOHL, Terence. Licenciamento Ambiental. 2. ed. Niterói: Impetus, 2008.
SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. 6. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2007, p. 26-27.
[1] SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. 6. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2007, p. 26-27.
[2] ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 12ª ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2009, p. 163.
[3] Essas hipóteses em que é possível a atuação supletiva são agora excepcionais, e somente autorizadas nos casos previstos nos artigos 14, §3º, e 15 da Lei Complementar 140/2011. Assim, somente nestes casos seria cabível a atuação supletiva do IBAMA.
[4] Orientação Jurídica Normativa nº 43/2012 da PFE-IBAMA, disponível em <http://www.agu.gov.br/page/content/detail/id_conteudo/96663>, acesso em 25.11.2014.
[5] AMADO, Frederico. Direito Ambiental Esquematizado. 5.ed. São Paulo: Método, 2014, p. 189-190.
[6] Atualmente encontra-se em trâmite no Supremo Tribunal Federal a ADI 4757 contra a Lei Complementar 140/2011, ajuizada pela Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente (ASIBAMA).
Procurador Federal atuante na Procuradoria-Federal em Goiás, órgão de execução da Advocacia-Geral da União. Pós-graduado em Direito Público pela Universidade de Brasília - UnB. Pós-graduado em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera-Uniderp. Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Goiás - UFG.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CARVALHO, Victor Nunes. A Lei Complementar 140/2011 e a redução das competências do IBAMA em matéria de licenciamento ambiental Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 04 dez 2014, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42091/a-lei-complementar-140-2011-e-a-reducao-das-competencias-do-ibama-em-materia-de-licenciamento-ambiental. Acesso em: 22 nov 2024.
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