1. INTRODUÇÃO
A presente obra tem por objetivo analisar o protesto de títulos, abordando seu conceito, suas formalidades e alcance no sistema jurídico pátrio.
2. DESENVOLVIMENTO
A Lei n.º 9.492/97, que define a competência e regulamenta os serviços concernentes ao protesto de títulos e outros documentos de dívida, aduz já em seu artigo 1º o conceito de protesto, que restou vazado nos seguintes termos:
“Art. 1º Protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida.”
Vale dizer que a normatização do conceito de protesto veio de encontro com os anseios da doutrina. José Antônio Saraiva (1947) nos ensina que:
“o protesto é ato público e solene exigido por esta lei para a completa garantia do exercício do direito regressivo do credor, porque estabelece a prova da observância oportuna de determinadas formalidades e diligências”
Já para José Maria Whitaker (1928) conceitua-se o protesto como “ato oficial pelo qual se prova a não realização da promessa contida na letra”.
Assim, percebe-se que o protesto de títulos e outros documentos de dívida documenta, de modo solene e autêntico, dotado de presunção legal de veracidade e legitimidade, a exata observância dos preceitos legais para o devido exercício dos direitos cambiários. O protesto é uma formalidade, ele é solene, ou seja, há que se obedecer um rito legalmente estabelecido, atestando a diligência do portador do título para seu recebimento ou para aceite, não tendo o portador, apesar de sua diligência, logrado êxito no seu desiderato. O imortal Cesare Vivante (1904) esclarece que o protesto é ato oficial pelo qual se constata pelo notário a falta de pagamento ou aceite, sendo requisito indispensável para a devida ação de regresso, não suprível por qualquer outra prova.
Assim, o protesto de títulos se apresenta como ato público, dotado de fé-pública, que tem precipuamente duas funções: uma eminentemente probatória, da apresentação do título e do resultado da intimação, a segunda é uma função conservatória, pois assegura o direito de regresso aos coobrigados.
O titular de um direito pode se utilizar de meios que a legislação lhe oferece para assegurá-lo e lhe tornar efetivo, mesmo antes que ocorra qualquer violação. É nesse contexto que surge o protesto como ato formal extrajudicial que tem por finalidade conservar e ressalvar direitos, caracterizando a mora do devedor.
3. DA SOLENIDADE PARA O ATO
O protesto cambial é revestido de formalidades rigorosas, uma vez que é insubstituível por outros meios de prova. Ocorre que existem atos para os quais o ordenamento jurídico exige determinada forma, ou rito de formas, e há ainda atos que, não menos formais, têm como exigência uma única forma ad solemnitatem. O ato do protesto depende não só de uma formalidade porque deve obedecer aos requisitos da lei, sob pena de nulidade, é uma formalidade qualificada porque somente será considerado válido se feito pelo tabelião de protestos, seguindo-se estritamente o procedimento prescrito na Lei n.º 9.492/97. Assim, percebe-se a necessidade de rigoroso respeito aos procedimentos previstos em lei.
Forte exemplo da necessidade de estrito cumprimento do procedimento legal para o ato de protesto é a exclusão da falência quando o devedor empresário provar vício em protesto ou em seu instrumento. Vejamos o artigo 96, VI, da Lei n.º 11.101/05:
“Art. 96. A falência requerida com base no art. 94, inciso I do caput, desta Lei, não será decretada se o requerido provar:
I – falsidade de título;
II – prescrição;
III – nulidade de obrigação ou de título;
IV – pagamento da dívida;
V – qualquer outro fato que extinga ou suspenda obrigação ou não legitime a cobrança de título;
VI – vício em protesto ou em seu instrumento”;
(omissis)
4. DO OBJETO DO PROTESTO – DOCUMENTOS PROTESTÁVEIS
O já analisado artigo 1º da Lei n.º 9.492/97 não restringe o protesto aos títulos de crédito. Acertadamente, o legislador não vinculou o protesto aos referidos títulos, sendo possíveis outras espécies de protesto. Assim, poderá ser levado a protesto qualquer documento que caracterize uma obrigação líquida e vencida. O art. 9ª da Lei de Protestos, restringe a análise do tabelião aos aspectos formais do título. Vejamos:
“Art. 9º Todos os títulos e documentos de dívida protocolizados serão examinados em seus caracteres formais e terão curso se não apresentarem vícios, não cabendo ao Tabelião de Protesto investigar a ocorrência de prescrição ou caducidade.”
Ademais, há que se registrar que não há necessidade de o título ou o documento de dívida se revestir do requisito da executividade para que possa ser objeto de protesto, tendo em vista que a própria Lei de Protestos se refere à prova do inadimplemento ou descumprimento de obrigação originada em títulos ou outros documentos de dívida. Claramente quis o legislador abranger o protesto para toda obrigação verificável documentalmente.
5. O PROTESTO DE DOCUMENTOS E A AÇÃO MONITÓRIA
A ação monitória se encontra prevista em nosso ordenamento jurídico nos artigos 1.102 e seguintes do Código de Processo Civil, cuja redação se segue:
Art. 1.102.a - A ação monitória compete a quem pretender, com base em prova escrita sem eficácia de título executivo, pagamento de soma em dinheiro, entrega de coisa fungível ou de determinado bem móvel.(Incluído pela Lei nº 9.079, de 14.7.1995)
Art. 1.102.b - Estando a petição inicial devidamente instruída, o Juiz deferirá de plano a expedição do mandado de pagamento ou de entrega da coisa no prazo de quinze dias. (Incluído pela Lei nº 9.079, de 14.7.1995)
Primeiramente, cabe ressaltar que o legislados não definiu o que é “prova escrita”, para fins de aceitação da ação monitória, tendo adotado a mesma postura quanto à definição de “documento de dívida” para o protesto. Acertada a estratégia legislativa uma vez que não haveria razão para se engessar os títulos, que variam no tempo.
Assim, se qualquer prova escrita se mostra suficiente para o ajuizamento de ação monitória, que sabidamente é mais gravosa que o protesto, uma vez que nela se expede mandado judicial de pagamento de dívida, não há qualquer óbice lógico sustentável para justificar que os mesmos documentos fiquem excluídos do âmbito do protesto.
Evidentemente que a prova escrita que sustenta a ação monitória não precisa ser prova que consubstancie direito líquido e certo, bastando a prova que sustente o crédito, que represente a obrigação. Vale transcrever o acórdão do Superior Tribunal de Justiça acerca prescindibilidade de prova literal do valor para o ajuizamento de ação monitória.
PROCESUAL CIVL. NÃO HÁ FALAR EM NULIDADE DO ACÓRDÃO DOS EMBARGOS DE DECLARÇÃO QUANDO O TRIBUNAL RESOLVEU A QUESTÃO, EMBORA NÃO DA MANEIRA ALMEJADA PELA RECORENTE. PARA SATISFAÇÃO DO REQUISTO DA MONITÓRIA BASTA PROVA ESCRITA DA EXISTÊNCIA DA DÍVIDA. IRRELEVANTE A INTIMAÇÃO DO PROTESTO DA DUPLICATA DE SERVIÇOS QUANDO HÁ NOS AUTOS PROVA DA RELAÇÃO JURÍDICA ENTRE AS PARTES E O DÉBITO DA RECORENTE.
1. Quanto à assertiva de violação do art. 53 do CP, sem razão a recorrente, haja vista que enfrentadas todas as questões levantadas pela parte, porém em sentido contrário almejado. 2. À falta de prequestionamento, inviável o exame da suposta afronta dos demais dispositivos apontados pela recorrente. Incidência do verbete sumular 28/STF. 3. Para propositura de ação monitória, não é preciso que o autor disponha de prova literal do valor. A 'prova escrita' é todo e qualquer documento que autorize o Juiz a entender que há direto à cobrança de determina dívida. 4. Irrelevante, no caso, ausência da intimação par o protesto da duplicata de serviços, quando comprovada, por outros documentos, a dívida da recorrente. Em relação à liquidez do débito e à oportunidade de devedor discutir os valores cobrados, a lei assegura-lhe a via dos embargos, previstos no art. 102c do CP, que instauram amplo contraditório a respeito, devendo, por isso, a questão ser dirimida pelo Juiz. O fato de ser necessário acertamento de parcelas correspondentes ao débito principal e, ainda, os acessórios, não inibe o emprego do processo monitório. 5. A ausência de impugnação específica do fundamento do acórdão, atrai a incidência da súmula 283/STF. Recurso não conhecido. (Resp 240.043/ES, Rel. Min. Luís Felipe Salomão, 4ª Turma, DJe 13/10/2008)
Dessa forma, concluímos que o protesto de títulos e outros documentos de dívida tem por finalidade provar o inadimplemento e o descumprimento de obrigação, ou seja, constituir em mora o devedor, não exigindo os requisitos de certeza, liquidez e exigibilidade.
6. CONCLUSÃO
Diante do que restou exposto, verificamos a importância do ato solene e oficial que é o protesto de títulos, que tem como finalidade comprovar a diligência do credor, e a falta de pontualidade do devedor, conservando, ainda direitos de regresso aos coobrigados. O estudo dos requisitos da ação monitória ainda nos permite concluir que seus objetivos se mostram simétricos ao do protesto, sendo um na esfera judicial e outro na extrajudicial.
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL, Código Civil (2002), Portal: www.planalto.gov.br
BRANDELLI, Leonardo. Teoria geral do direito notarial. São Paulo: RT, 1998.
CENEVIVA, Walter. Lei dos Registros Públicos Comentada. 13ª ed. São Paulo: Saraiva, 1999.
CHAVES, Carlos Fernando Brasil e REZENDE, Afonso Celso F. Tabelionato de Notas e o Notário Perfeito. 7ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013.
LOPES, Seabra. J. Direito dos Registos e Notariado - 2ª ed. Coimbra: Livraria Almedina, 2002.
RIBEIRO, Luiz Paulo Aliende. Regulação da Função Pública Notarial e de Registro. São Paulo: Saraiva. 2009
SARAIVA, José Antônio. A cambial. Rio de Janeiro. Volume I, 1947.
VIVANTE, Cesare. Instituições de Direito Comercial. 3ª ed. São Paulo: Livraria C. Teixeira & Cia. 1928.
WHITAKER, José Maria. Letra de Câmbio. 1ª edição. São Paulo: Livraria Acadêmica Saraiva & Cia Editores. 1928
Graduada em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Pós-Graduada em Direito pela Universidade Anhanguera-Uniderp. Procuradora Federal.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SOLLERO, Barbara Tuyama. Algumas considerações acerca do protesto de títulos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 05 dez 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42097/algumas-consideracoes-acerca-do-protesto-de-titulos. Acesso em: 22 nov 2024.
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