1. CONCEITO GERAL
É considerada testamentaria o conjunto de atribuições a serem desempenhadas pelo testamenteiro na administração do monte-mor deixado pelo autor da herança via testamento, para o fiel comprimento do ato de última vontade. O testamenteiro é um administrador, que está sujeito a prestação de contas, podendo inclusive responder com seus bens particulares se vier a causar dano ao monte que esteve sob sua responsabilidade.
A maior atribuição do testamenteiro é defender a validade do testamento, fazendo eficaz a disposição de última vontade do autor da herança. O imortal Clóvis Beviláqua (1958) nos ensina que o testamentario é, na verdade, um “funcionário de ordem privada”, rechaçando assim a tese de mandato sui generis para ser cumprido depois da morte do mandante, que é o testador. Beviláqua aponta que o testamenteiro não se trata de um mandatário, pois não representa a pessoa de cuja sucessão de trata, tampouco representa os herdeiros ou mesmo os legatários.
De acordo com o artigo 1.976 do Código Civil, é livre a nomeação de um ou mais testamenteiros, dentre as pessoas naturais e capazes, sendo pessoa de confiança do testador, podendo ele ser herdeiro necessário, instituído, legatário ou ainda pessoa não contemplada na sucessão. Assim, pode o testador nomear somente uma pessoa como testamenteiro, indicando substitutos, ou várias pessoas conjuntamente, inclusive definindo atribuições. Não pode, contudo, ser nomeadas pessoas jurídicas ou menores de dezoito anos, não emancipadas, os ausentes e as pessoas interditadas.
Nos casos em que o autor da herança não tenha herdeiros necessários, ele poderá por meio de testamento instituir seus herdeiros e legatários, e nessas hipóteses (de ausência de herdeiros necessários) pode ele conceder ao testamenteiro a posse e administração da herança. Nesses casos, deverá o testamenteiro requerer o inventário, cumulando as funções de inventariança e a testamentaria.
Evidentemente, é direito do testamenteiro recusar a indicação do testador, não se traduzindo a testamentaria em múnus público, como acontece com a guarda.
Carlos Maximiliano (1943) nos ensina que tanto o co-herdeiro, quanto o legatário e o co-legatário podem exercer a testamentaria, tanto de forma dativa quanto instituída, e ele tem preferência a estranhos.
3. DO ENCARGO
Em que pese o disposto no artigo 1.985 do Código Civil, de que o testamenteiro pode se fazer representar, em juízo ou fora dele, mediante mandatário com poderes especiais, há que ressaltar que o encargo da testamentaria não se transmite aos herdeiros do testamenteiro, e nem é delegável. Vejamos:
“Art. 1.985. O encargo da testamentaria não se transmite aos herdeiros do testamenteiro, nem é delegável; mas o testamenteiro pode fazer-se representar em juízo e fora dele, mediante mandatário com poderes especiais.”
A possibilidade de representação não confronta com a natureza indelegável do encargo, mesmo porque há determinadas atribuições e tarefas que reclamam a intervenção de profissional técnico especializado, como por exemplo, o advogado, que é quem poderá postular em juízo.
4. DAS ATRIBUIÇÕES
Como já dito alhures, caso o testamenteiro tenha a posse e administração da herança, caberá a ele requerer o inventario. O artigo 1.137 do Código de Processo Civil estabelece as atribuições do testamenteiro, vejamos:
Art. 1.137. lncumbe ao testamenteiro:
I - cumprir as obrigações do testamento;
II - propugnar a validade do testamento;
III - defender a posse dos bens da herança;
IV - requerer ao juiz que Ihe conceda os meios necessários para cumprir as disposições testamentárias.
Existem também outras atribuições genéricas, como a obrigação do testamenteiro apresentar o testamento em juízo para que ele seja aberto, conhecido, registrado e devidamente cumprido. Evidentemente que a abertura do testamento somente ocorrerá nos casos em que a manifestação de última vontade tiver sido feita em sede de testamento cerrado.
A atribuição primordial do testamenteiro é propugnar pela validade do testamento, mesmo que contrarie interesses de todos os herdeiros, do inventariante e demais interessados. É evidente que o testador, ao nomear determinada pessoa para tal ministério, nela confiava, e caso o testamenteiro seja o administrador, ele responderá por atos de gestão e poderá incorrer em responsabilidade civil nos casos de negligência.
A testamentaria se encerra normalmente pela conclusão de todos os encargos a que se obrigara o testamenteiro, sendo que ela também pode se encerrar pela morte do testamenteiro, destituição do seu cargo, por determinação judicial, ou ainda por perda superveniente da capacidade civil.
5. DOS DIREITOS E DEVERES
Tendo em vista o cumprimento de todos os deveres da testamentaria, o testamenteiro terá direito a um pagamento, que se chama de vintena. Tal prêmio pode ser livremente fixado pelo testador, ou ainda arbitrado judicialmente, sendo que dever-se-á ser levado em conta o trabalho do testamenteiro, assim como o valor da herança.
O prêmio não ultrapassará o percentual de 5% da herança, e deverá ser paga somente da parte disponível, ou seja, o múnus da testamentaria não poderá afetar a legítima. O pagamento da vintena deverá ocorrer mediante espécie, pois não é autorizado ao testamenteiro adjudicar qualquer bem móvel ou imóvel, em hasta ou praça, da herança sob sua administração. A natureza jurídica da vintena é de honorário, ou seja, retribuição por um serviço prestado, não sendo considerada como benefício ou presente. Ademais, terá direito o testamenteiro ao ressarcimento dos gastos efetivados em decorrência do cumprimento do testamento.
Por se tratar de mera administração do patrimônio alheio, deverá o testamenteiro prestar contas daquilo que recebeu e gastou, devendo as contas ser apresentadas ao juiz da causa. Caso não haja a apresentação das contas, qualquer herdeiro pode pedir que o juiz autorize o não pagamento da vintena.
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1989
GOMES, Orlando. Sucessões. Rio de Janeiro: Forense, 1997
MAXIMILIANO, Carlos. Direito das sucessões. Rio de Janeiro: Freitas Bastos. 1943.
RUGGIERO, Roberto de. Instituições de Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 1957.
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito das Sucessões. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2006
Precisa estar logado para fazer comentários.